Out 4, 2013

O Mel no Tratamento de Feridas

Honey in Wound Treatment

 

Ana Raquel Dinis

Enfermeira nas Farmácias Holon

Corresponding author: araqueldinis@gmail.com

 

Resumo

O mel tem adquirido importância no tratamento de feridas devido às suas propriedades particulares, nomeadamente acidez, actividades antibacteriana, anti-inflamatória e antioxidante, e acções osmótica, desbridante e desodorizante.

Quando utilizado em apósitos é denominado mel medicinal, sendo produzido segundo critérios rigorosos. Deste modo é possível a sua utilização segura.

Existem diversos estudos sobre a aplicação de apósitos com mel em feridas agudas e crónicas, verificando-se bons resultados no tratamento de abcessos, queimaduras, enxertos, feridas infectadas, úlceras de perna, úlceras de pressão, feridas cirúrgicas e suas deiscências e úlceras de pé diabético.

Neste artigo são apresentados quatro casos onde a aplicação de apósitos com mel em feridas multitratadas se mostrou bastante eficiente. Embora seja necessária mais investigação, os apósitos de mel deverão ser considerados uma alternativa eficaz no tratamento de diferentes tipos de ferida, particularmente aquelas multitratadas e complexas.

Palavras-Chave

Mel; feridas; cicatrização; estudo de caso

Abstract

Honey has gained importance in wound treatment due to his particular properties such as acidity, antibacterial, anti-inflammatory and antioxidant activities and osmotic, debriding and deodorizing actions.

When used in wound dressings it is called medical grade honey and is produced using quality control criteria. Thus it can be used safely.

There are several studies about the use of honey as a wound dressing in acute and chronic wounds with good results in the treatment of abscesses, burns, donor sites, graft sites, infected wounds, leg ulcers, pressure ulcers, surgical wounds with and without dehiscence and diabetic foot ulcers.

This article presents four cases where honey dressings application proved to be quite efficient. Although further research is needed, honey dressings should be considered as an effective alternative treatment for different wound types, particularly chronic wounds and those with multiple treatment.

Keywords

Honey; wounds; healing; case study

 

Introdução

Há milhares de anos que o mel é utilizado pelo Homem nas mais diversas situações. Existem textos com mais de 4000 anos, onde é relatada a utilização de mel no tratamento de feridas (Cooper et al, 2009). Recentemente assistiu-se a um renascer do interesse pelo mel devido às suas propriedades promissoras. No quotidiano, o enfermeiro depara-se, por vezes, com a apresentação tardia de feridas, frequentemente num estado avançado de infecção e inflamação. Para prevenir o agravamento da infecção são usados os diversos apósitos disponíveis. Contudo, o uso constante dos mesmos produtos provoca habituação e consequente estagnação da evolução da ferida. O desenvolvimento de diferentes apósitos contendo mel constitui, assim, uma nova oportunidade no tratamento de diversos tipos de ferida, com especial ênfase nas feridas multitratadas.

As propriedades do mel

O mel é um produto natural composto por hidratos de carbono (75-80%), dos quais se destacam a glicose e a frutose, por água (17%), aminoácidos, minerais e vitaminas, os quais variam com o tipo de planta a partir do qual foi colhido o néctar. Estão descritas diversas propriedades do mel, as quais são abordadas em seguida (Cooper et al, 2009; Molan, 2011; Seckam & Cooper, 2013).

Acção osmótica

A acção osmótica do mel leva à saída de linfa dos tecidos profundos, melhora a oxigenação e permite um maior aporte de nutrientes às células do leito da ferida. Adicionalmente mantém o leito da ferida suficientemente húmido para que o apósito não adira, diminuindo assim a dor e o trauma associados à mudança do mesmo. Por outro lado, este ambiente húmido promove um desbridamento autolítico, sendo também benéfico para a cicatrização, sem permitir contudo um crescimento bacteriano no leito da ferida (Cooper et al 2009, Seckam & Cooper, 2013).

Actividade antioxidante

O mel apresenta uma grande quantidade de antioxidantes. Estes neutralizam os radicais livres, moléculas altamente reactivas causadoras de dano celular e produzidas durante a fagocitose. Estes radicais promovem oxidação, a qual vai activar protéases que destroem citoquinas, factores de crescimento e matriz extracelular, essenciais ao processo de cicatrização (Cooper et al 2009).

Acidez do mel

A acidez do mel é benéfica para o tratamento de feridas. Um meio ácido permite a dissociação de mais oxigénio ligado à hemoglobina para o leito da ferida, o qual é essencial para o crescimento de fibroblastos. A acidez também diminui a actividade das protéases melhorando, assim, a cicatrização.

Na prática clínica, na presença de inflamação, a aplicação de mel no leito da ferida sobre um terminal nervoso mais sensibilizado pode causar dor, a qual desaparece habitualmente ao fim de pouco tempo (Cooper et al, 2009; Molan 2011).

Acção desbridante

A existência de tecido desvitalizado no leito da ferida é prejudicial à cicatrização. A melhoria do fluxo linfático devido à acção osmótica do mel vai permitir a chegada de maior quantidade de plasminogénio ao leito da ferida. Concomitantemente, o mel inactiva o inibidor do activador do plasminogénio (PAI), permitindo que exista mais plaminogénio a ser convertido em plasmina, a qual digere a fibrina, sendo esta última a responsável pela aderência do tecido desvitalizado ao leito da ferida. O resultado final é a promoção do desbridamento autolítico (Molan, 2011; Seckam & Cooper, 2013).

Actividade anti-inflamatória

Existem diversos estudos que suportam a actividade anti-inflamatória do mel, havendo evidência que esta não se deva directamente às suas propriedades antibacterianas. A presença de um estado inflamatório moderado e de curta duração é imprescindível para iniciar o processo de cicatrização. Quando essa inflamação é excessiva, o número de neutrófilos e macrófagos aumenta, bem como as espécies reactivas de oxigénio (ROS) por eles produzidas, as quais causam dano celular. Por outro lado, o peróxido de hidrogénio, uma ROS, atrai mais neutrófilos, formando-se um ciclo vicioso. A actividade antioxidante do mel é capaz de quebrar este ciclo diminuindo, assim, a inflamação. Por outro lado, a acção desbridante do mel também contribui para a diminuição da inflamação, visto que o tecido desvitalizado estimula a resposta inflamatória (Cooper et al, 2009; Molan 2011).

Actividade antibacteriana

A actividade antibacteriana do mel deve-se ao seu alto teor de açúcar, baixo pH e produção enzimática de peróxido de hidrogénio. Em 1988, Peter Molan constatou que o mel de manuka (Leptospermum scoparium da Nova Zelândia) possui uma potente actividade antibacteriana não dependente de peróxido de hidrogénio. Vários estudos demonstraram que o mel de Leptospermum seleccionado consegue manter níveis significativos de actividade antibacteriana mesmo em feridas altamente exsudativas.

O mel possui actividade antibacteriana de largo espectro, sendo eficaz contra estirpes multirresistentes. Um estudo in vitro, realizado em 2009, sobre o efeito do mel em bactérias planctónicas e biofilmes sugere que o mel possui um efeito bactericida contra estes agentes patogénicos das feridas. Existem vários estudos sobre este assunto, porém necessitam de ser validados após o desenvolvimento de um teste fiável para detecção de biofilmes (Cooper et al, 2009; Seckam & Cooper, 2013).

Acção desodorizante

As bactérias metabolizam preferencialmente glicose. Porém, na sua ausência as bactérias anaeróbias metabolizam aminoácidos, resultando na produção de compostos de enxofre, aminas e amónias, causadoras de cheiro fétido nas feridas. A metabolização da glicose produz compostos com odor neutro, sendo este o motivo pelo qual a aplicação de mel nas feridas promove uma rápida diminuição de odor (Cooper et al, 2009).

Prevenção de cicatriz  hipertrófica

As espécies reactivas de oxigénio formadas durante o processo inflamatório estimulam a actividade fibroblástica, responsável pela produção de fibras de colagénio necessárias à cicatrização. Em situações em que a inflamação é prolongada há uma hiperprodução das ROS, que pode levar à hipergranulação e à fibrose. Atendendo a que o mel previne a formação de radicais livres, existe uma diminuição do risco de formação de cicatriz hipertrófica (Cooper et al, 2009).

O mel no tratamento de feridas

De modo a utilizar com segurança produtos com mel no tratamento de feridas é necessário cumprir alguns requisitos tais como, avaliação da quantidade de mel no produto e sua actividade antibacteriana, esterilização com radiação gama e seu registo como dispositivo médico.

Cooper (2009) refere diversos estudos sobre a aplicação de apósitos com mel em feridas agudas e crónicas, nos quais se obtiveram resultados promissores no tratamento de abcessos, queimaduras, enxertos de pele (região dadora e receptora), feridas infectadas, úlceras de perna, úlceras de pressão, feridas cirúrgicas, deiscências de feridas cirúrgicas e úlceras de pé diabético.

As diversas propriedades do mel permitem que este seja aplicado em tecido de epitelização, granulação, desvitalizado e necrótico. Porém, a frequência da troca de apósitos deverá ser estipulada de acordo com o nível de exsudado. É necessário atender à aplicação de apósitos com mel em feridas com tecido necrótico espesso, uma vez que ao estar afastado do fluido intersticial o mel irá desidratar ainda mais o tecido devido à sua acção osmótica.

 

Estudos de caso

Para este estudo foi efectuada uma colheita de dados dos utentes e caracterização da ferida, com registo de evolução escrito e fotográfico. Foram utilizados dois tipos de apósitos com mel medicinal. Os casos apresentados já realizavam terapia compressiva antes de ser implementado o tratamento com mel.

 

Caso 1 – Sra. M. F. G.

Mulher de 60 anos, com úlcera no maléolo interno da perna esquerda, a realizar tratamento desde 22/09/2010. Tem como antecedentes pessoais relevantes insuficiência venosa e acidente de viação, em 1974, com traumatismo da perna esquerda. Foram utilizados vários apósitos, nomeadamente hidrofibra simples e com prata, apósito não aderente com iodopovidona, entre outros, que a utente não tolerou devido a queixas álgicas intensas no local da lesão. O tratamento foi complementado com terapia compressiva desde o início. A 05/11/2010, altura em que iniciou tratamento com mel, a lesão apresentava essencialmente tecido desvitalizado e algum tecido de granulação, exsudado seroso em pequena quantidade, sem odor e sem edema.

Tratamento implementado

Limpeza com solução salina e aplicação de apósito hidroactivo em poliuretano com 30% de mel medicinal e ligadura de longa-tração. A 22/11/2010 foi mudada terapia compressiva para meia de compressão. A 02/12/2010 devido ao aparecimento de uma nova lesão foi alterado o tratamento para apósito de alginato não aderente impregnado com mel medicinal de manuka, mantendo-se a meia de compressão. A 10/01/2011 as lesões encontravam-se encerradas. A utente mantém utilização da meia de compressão. (Figuras 1 a 4)

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Figura 1 – 05/11/2010 – Dimensões: (1) 3×1,5cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 7.

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Figura 2 – 02/12/2010 – Dimensões: (1) 1,5x1cm; (2) 1×0,9cm; (3) 1x1cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 3.

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Figura 3 – 20/12/2010 – Dimensões: (1) 0,5×0,3cm; (2) 0,6×0,3cm; (3) encerrada. Exsudado ausente. Dor 5.

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Figura 4 – 10/01/2011 – Lesões encerradas.

 

 

 

Caso 2 – Sr. J. S.

Homem de 77 anos, com úlcera na face externa da perna direita, a realizar tratamento desde 01/2008. Como antecedentes pessoais relevantes apresenta insuficiência venosa e doença cardíaca. Durante os quase três anos de evolução da lesão foram aplicados inúmeros apósitos como: hidrofibra simples e com prata, apósito não aderente com e sem iodopovidona, sulfadiazina de prata, entre outros, sem sucesso na cicatrização. A 12/11/2010, dia em que iniciou tratamento com mel, a lesão apresentava essencialmente tecido de granulação, exsudado hemato-purulento em moderada quantidade, cheiro fétido e pele perilesional ruborizada.

Tratamento implementado

Limpeza com solução salina e aplicação de apósito de alginato não aderente impregnado com mel medicinal de manuka. Foi mantida a terapia compressiva com ligadura de compressão. Após 10 semanas com este tipo de tratamento a lesão encerrou e o utente iniciou utilização de meia de compressão. (Figuras 5 a 8)

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Figura 5 – 12/11/2010 – Dimensões: (1) 6x6cm. Exsudado hemato-purulento em moderada quantidade. Dor: 4.

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Figura 6 – 13/12/2010 – Dimensões: (1) 3,5x1cm; (2) 1×0,9cm; (3) 2,8×2,4cm. Exsudado sero-purulento em moderada quantidade. Dor: 4.

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Figura 7 – 13/01/2011 – Dimensões: (1) encerrada; (2) 0,5×0,3cm; (3) 1,3×0,3cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 2.

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Figura 8 – 31/01/2011 – Lesões encerradas.

 

Caso 3 – Sra. R. S.

Mulher de 84 anos, com úlceras no maléolo interno da perna direita, a realizar tratamento desde 07/12/2010. Os antecedentes pessoais relevantes são a arritmia cardíaca e a insuficiência venosa. Realizou tratamento com hidrofibra com prata, hidrogel e placa hidrocoloide, não tolerando nenhum devido a intensas queixas álgicas. A 31/12/2010 apresentava duas lesões com tecido desvitalizado, pele perilasional ruborizada, exsudado seroso em pequena quantidade e sem odor, tendo-se iniciado tratamento com mel.

Tratamento implementado

Limpeza com solução salina e aplicação de apósito hidroactivo em poliuretano com 30% de mel medicinal e meia de compressão. Na região perilesional foi aplicado um spray protector cutâneo. A 13/01/2011 devido à maceração da pele perilesional, foi alterado o tratamento para apósito de alginato não aderente impregnado com mel medicinal de manuka, mantendo-se a meia de compressão. A 14/03/2011 as lesões encontravam-se encerradas. A utente mantém utilização da meia de compressão. (Figuras 9 a 12)

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Figura 9 – 31/12/2010 – Dimensões: (1) 2×0,8cm; (2) 0,8×0,5cm. Exsudado seroso em moderada quantidade. Dor: 7.

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Figura 10 –­­­­­ 13/01/2011 – Dimensões: (1) 1,5×1,2cm; (2) 0,4×0,3cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 2.

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Figura 11 – 10/02/2011 – Dimensões: (1) 1,4×0,5cm; (2) encerrada. Exsudado seroso em moderada quantidade. Dor: 5.

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Figura 12 – 14/03/2011 – Lesões encerradas.

 

Caso 4 – Sra. E. S.

Mulher de 77 anos, com duas úlceras na face interna da perna esquerda, a realizar tratamento há 11 anos. Os antecedentes pessoais relevantes são insuficiência venosa, hipertensão arterial e dislipidémia. Destacam-se, também, como antecedentes familiares trombose venosa profunda na mãe e úlcera de perna no pai. Durante os anos de tratamento foram utilizados incontáveis tipos de apósitos, sendo o último a hidrofibra com prata. A 24/01/2011, quando iniciou tratamento com mel, a lesão proximal apresentava tecido de granulação e desvitalizado e a lesão distal essencialmente tecido desvitalizado, pele perilesional ruborizada, o exsudado era seroso em pequena quantidade e sem odor.

Tratamento implementado

Limpeza com solução salina e aplicação de apósito de alginato não aderente impregnado com mel medicinal de manuka. Foi mantida a terapia compressiva com ligaduras de curta-tracção. Ao fim de doze semanas com este tratamento, a lesão proximal encontrava-se encerrada e a lesão distal com aproximadamente metade do tamanho. (Figuras 13 a 16)

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Figura 13 – 24/01/2011 – Dimensões: (1) 1,5×1,5cm; (2) 1,5x1cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 4.

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Figura 14 – 07/02/2011 – Dimensões: (1) 1,2x1cm; (2) 1,6×0,6cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 4.

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Figura 15 – 24/03/2011 – Dimensões: (1) encerrada; (2) 1,7×0,4cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 3.

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Figura 16 – 11/04/2011 – Dimensões: (1) encerrada; (2) 1×0,4cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 3.

Considerações finais

Os casos apresentados, embora distintos, evoluíram favoravelmente podendo constatar-se que o mel apresenta, globalmente, propriedades vantajosas para a resolução de feridas com diferentes características. A rápida cicatrização foi uma surpresa positiva, principalmente no segundo caso onde se verificou o encerramento em 10 semanas de uma lesão com quase três anos de evolução.

O apósito hidroactivo em poliuretano com 30% de mel medicinal revelou uma rápida acção desbridante e redução da dor no local da ferida. Porém, a sua humidade excessiva, bem como o tipo de adesivo foram prejudiciais para a pele perilesional, ainda que tenha sido aplicado um spray protector cutâneo. O apósito de alginato não aderente impregnado com mel medicinal de manuka teve uma boa resposta nos vários tipos de tecido, levando a uma rápida cicatrização. Infelizmente verificou-se um aumento da dor no leito da ferida em dois dos casos, no momento da mudança do apósito. Torna-se, assim, fundamental escolher o tipo de apósito em conformidade com as características das feridas, para que se possa optimizar o tratamento com o mínimo de efeitos adversos.

Um processo cicatricial mais rápido acarreta benefícios para o utente devolvendo-lhe autonomia e qualidade de vida e, também, para a Instituição de Saúde através da diminuição dos gastos em recursos materiais e humanos. Os apósitos com mel devem, portanto, ser considerados como opção, particularmente nas feridas multitratadas.

No futuro será importante a realização de mais ensaios clínicos com grupos de controlo e amostras significativas, de modo a validar as vantagens e desvantagens no uso de mel nos diferentes tipos de ferida, comparativamente a outros apósitos usados como tratamento de primeira linha. Embora existam indícios de que o mel possa desempenhar um papel importante na eliminação e prevenção da formação de biofilmes é necessária maior investigação sobre este problema particularmente importante e de difícil solução.

Referências bibliográficas

Cooper, R., Molan, P., White, R. (2009). Honey in Modern Wound Management. Malta: Wounds UK.

Molan, P. C. (2011). The evidence and the rationale for the use of honey as a wound dressing. Wound Practice and Research 19(4), 204–220.

Seckam, A., & Cooper R. (2013). Understanding how honey impacts on wounds: an update on recent research findings. Wounds International , 4 (1), 20-24.

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Mar 15, 2013

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SILVER CALCIUM-ALGINATE MATRIX IN INFECTED WOUNDS: CASE STUDIES

MATRIZ DE ALGINATO DE CÁLCIO CON PLATA EN HERIDAS INFECTADAS: ESTUDIOS DE CASO

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AUTORES: Vítor Santos, Ana Sofia Santos, Elsa Menoita

Resumo

A identificação e tratamento da infecção nas feridas varia e nem sempre é um processo fácil, no entanto, a base do diagnóstico deve assentar na clinica, na identificação dos sinais e sintomas, embora possa em alguns casos ser necessário recorrer a exames microbiológicos. Para o tratamento da infecção são várias as opções disponíveis, sendo todas elas válidas e eficazes. No entanto na última década, o dominio em termos de tratamento local da infecção em feridas, pertence aos apósitos com prata. Esta hegemonia tem vindo a ser desafiada nos últimos tempos, por apósitos alternativos e principios activos alternativos. Assim o sendo os pensos com prata, atravessaram um processo evolutivo, que os coloca em condições de continuar como uma opção extremamente válida e eficaz no tratamento da infecção em feridas. Um exemplo deste processo é o apósito que consiste numa matriz de alginato com prata iónica, que para além da apresentação associada a espuma de poliuretano, passa a ter um pelicula de matriz de alginato com prata iónica e uma versão em pasta. Com este artigo pretendo dar a conhecer os primeiros estudos de caso efectuados em Portugal, onde se evidencia a eficácia destes apósitos no tratamento da infecção de feridas crónicas.

Palavras Chave: Infecção, feridas crónicas, estudo de caso

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Abstract

The identification and treatment of infection in wounds varies and is not always an easy process, however, it must be based on clinical diagnosis, identification of signs and symptoms, but may in some cases be necessary to run microbiological tests. For treatment of infection are several options available, all of which are valid and effective. However in the last decade, silver dressings dominated, the field in terms of local treatment of infection in wounds. This hegemony has been challenged in recent times by alternative dressings with new alternative substances. As so, the silver dressings crossed an evolutionary process, which puts them in a position to continue as an extremely valuable and effective option to treat wound infection. An example of this process is the dressing consisting of an alginate matrix with silver ion, which in addition to the presentation associated with polyurethane foam, is now accompanied by a film of alginate matrix with silver ion and a paste version. With this article I intend to make known the first case studies carried out in Portugal, where it shows the efficacy of these dressings in the treatment of chronic wound infection.

Keywords: Infection, chronic wounds, case study

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Enquadramento da Problemática    

A prata é um elemento que tem sido utilizado com intenções curativas há mais de 2000 anos. De acordo com Grahan, citado por Ousey (2009), a prata é uma terapia antiga tendo sido já utilizada pelos romanos para a purificação da água e, no século XVIII, como agente antibacteriano. Os navegadores portugueses na altura dos descobrimentos foram mesmo “pioneiros” ao utilizarem peças de prata nos barris de água, de modo a que se mantivesse potável ao longo dos vários meses de viagem no mar.  Já no século XIX, descobriu-se que os iões de prata têm propriedades antimicrobianas e que uma solução altamente diluida de nitrato de prata inibe fortemente o crescimento de Staphylococcus aureus (Klasen citado por Ousey, 2009). A sua utilização desde o século XIX, prende-se com o facto de possuir fortes propriedades antimicrobianas, o que potenciou a sua importação para a vertente medicinal. No século XX, segundo White citado por Ousey (2009), a prata e os seus compostos, foram então utilizados por profissionais de saúde para combater infeções bacterianas em feridas agudas e crónicas. Ao longo dos últimos 40 anos, aumentou ainda mais o interesse da utilização da prata em produtos de cuidados a feridas, devido ao aumento da resistência bacteriana aos antibióticos (Ousey, 2009). Desde a década de 60 do século XX, com o uso tópico da prata com a intenção de tratar feridas, nomeadamente queimaduras infectadas, através de um creme de nitrato de prata a 0,5%, de forma eficaz, a popularidade da prata tem vindo a aumentar, e muito se deve à sua eficácia no tratamento de feridas infectadas. A prata actua no metabolismo bacteriano, inibindo assim a sua replicação e a possibilidade de desenvolver resistência, actuando em vários microrganismos, nomeadamente, bactérias aeróbias, anaeróbias, gram-positivas (Staphylococcus aureus, Streptococcus hemolyticus), gram-negativas (Pseudomonas aeruginosas), fungos e vírus.  A prata apresenta-se sobre a forma de apósitos e cremes, pelo que a sua concentração varia. É, então, fundamental compreender a importância das concentrações de prata aplicadas na ferida, pois uma quantidade excessiva pode levar a atrasos na cicatrização. Sabemos hoje em dia que a prata mantém a sua capacidade antibacteriana, com baixas concentrações (0,001-0,06 partes por milhão), diminuindo assim o risco de toxidade (Shu-Fen, 2008).

A prata é encontrada como uma série de compostos, mas são os iões Ag+, o agente antimicrobiano ativo. Na forma metálica (elementar), para se tornar bactericida, a prata (átomo Ag) tem que se ionizar, ou seja, perder um eletrão e tornar-se um ião de prata (Ag+). Isto acontece em contacto com o ar, mas ainda mais facilmente em exposição aquosa. Já os compostos que contêm iões de prata, têm a vantagem de a mesma se destacar do composto que a transporta com maior facilidade quando exposta a ambientes húmidos (Leaper, et al; 2012). Assim, quando o apósito entra em contacto com o exsudado da ferida ocorre troca de iões Ag+, com os de sódio Na +, presentes no exsudado.

Os iões Ag+ ligam-se à membrana das células bacterianas causando rutura da parede das mesmas. Perante isto, os iões de prata são transportados para o interior da célula e perturbam as funções da mesma ligando-se às proteínas de ADN e ARN e, interferem na produção de energia, função da enzima e replicação celular. (Leaper, et al,2012 e Hampton, 2010). Apesar de ainda não existirem Estudos controlados randomizados que o comprovem,  vários estudos experimentais em animais revelaram que, ao reduzir a carga bacteriana, a prata reduz a ação anti-inflamatória, através da redução da atividade das metaloproteinases (interfere com a actividade do ião de Zinco), citoquinas pró-inflamatória e apoptose celular (Leaper, et al,2012)

A prata pode ser incorporada em pensos através de várias formas diferentes, principalmente sob a forma de prata elementar ou no estado iónico. Ag+ é a forma iónica, a qual tem demonstrado possuir um amplo efeito antimicrobiano. Existem poucos pensos com prata no estado iónico, sendo que nesta categoria se pode incluir a matriz de alginato de cálcio com prata iónica que pode ter 3 formas de apresentação: Pelicula simples, película associada a espuma de poliuretano e pasta.

De acordo com Opasanon et al. (2012), a pelicula consiste numa formulação complexa, que inclui cálcio e alginato de prata, combinados com água de ligação a 10 %.  No caso da pasta, esta apresenta cerca de 40% de hidratação, consiste numa pasta amorfa e homogénea que se adapta bem ao leito da ferida, ajudando a evitar eventuais “espaços mortos” onde possam florescer bactérias e está indicada em feridas com pouco exsudado.

Quando a pelicula ou pasta entram em contacto com o exsudado da ferida, o fluido é absorvido pela matriz de alginato o que provova dilatação e suavização da matriz, fazendo com que as moléculas de prata e alginato de cálcio libertem os iões de prata para a ferida (figura 1), de acordo com Opasanon et al. (2012).

Figura1

Figura 1: Acção da matriz de alginato com prata iónica (in: http://www.bbraun.com )

Dado que a matriz de alginato contém água de ligação na sua estrutura, a humidificação do produto antes da aplicação não é necessária, sendo que as experiências in vitro demonstraram que o efeito antimicrobiano tem início na primeira hora de utilização do penso, devido à disponibilidade de prata iónica.

De acordo com Opasanon et al. (2012) foi demonstrado in vitro que a difusão de iões de prata a partir da matriz  produz uma concentração estável de iões de prata de cerca de 60 ppm (partes por milhão) ao longo de sete dias (Figura 2), sendo que comparativamente, tem sido sugerido que a concentração mínima necessária para obtenção de um efeito antimicrobiano deve ser de 20 a 40 ppm.

Figura2

Figura 2: Libertação de prata, da matriz de alginato com prata iónica ( In : http://www.woundsinternational.com/pdf/ )

Estudos de Caso

A metodologia utilizada nestes estudos de caso, visa demonstrar os efeitos do antimicrobiano prata sob a forma de matriz de alginato de cálcio, no tratamento de infecção de feridas, em especial na feridas crónicas. Foram portanto realizados estudos de caso que procuraram evidenciar as vantagens de duas apresentações deste apósito. Para tal foi efectuada uma documentação do historial clínico do doente e caracterização da ferida, bem como monitorização da área desta, com recurso a planimetria digital, recorrendo à análise de fotos digitais no software OsiriX. Esse mesmo registo fotográfico serviu como base para uma avaliação mais qualitativa da evolução da ferida.

Caso n.º 1: Sr. A. O.

Homem de  72 anos de idade, com úlcera venosa infra-maleolar, na face interna  da perna direita, desde há 7 meses. Foi avaliado o Indice de Pressão Tornozelo-Braço (IPTB), que era de 0,86, pelo que permite a utilização de terapia compressiva, que é indispensável para o controlo da insuficiência venosa do doente. O tratamento anterior consistia com hidrofibra com prata e compressas como apósito secundário + terapia compressiva de curta tracção. Apesar da utilização de um penso com prata e de também já ter sido utilizado com regularidade desde há cerca de 6 semanas, uma solução de limpeza com Betaina + PHMB, o que permite excluir a presença de biofilme, a evolução cicatricial continuava lenta. Assim optou-se pela utilização de um penso de prata iónica, com resultados muito satisfatórios, permitindo o encerramento da lesão em cerca de 1 semana (ver figuras 3 a 6).

Tratamento Implementado: Limpeza com PHMB+ betaina solução PHMB+Betaina gel “X” e hidrofibras com prata, de 23/3/2012 a 14/5/2012 + terapia compressiva. Em 14/5/2012,  aplicou matriz de alginato de cálcio com prata em pelicula.

Figura3

Figura 3: Ferida exsudativa, coberta de parcialmente com fibrina, no inicio do tratamento com surfactante e hidrofibras com prata.

Figura4

Figura 4: Cerca de 1 mês e meio depois a ferida evoluiu favoravel mas lentamente, tem agora metade da área. Apresenta lesão satélite devida ao facto de o doente ter retirado e depois voltar a colocar mal as ligaduras de compressão, devido a prurido. Note-se que as lesões e pele perilesional foram irrigadas com iodopovidona pelo doente. Nesta ocasião opta-se pela pelicula de Alginato de Cálcio com Prata.

Figura5,6

Figura 5 e 6: Cerca de 1 semana depois da aplicação da matriz de Alginato de Cálcio com Prata, tanto a lesão original como a lesão satélite estão cicatrizadas, o apósito secundário foi espuma de poliuretano.

Caso n.º 2: Sr. A. N.

Homem de  84 anos de idade, com lesão de etiologia traumática no pé esquerdo há cerca de 3 meses, apresenta mais especificamente: Lesão de cerca de 5 cm2 associada a: loca de 7 cm de profundidade em direcção ao arco plantar, uma segunda loca 5cm de profundidade em direcção à face interna do pé lateral ao tendão de Aquiles e uma terceira loca de 3cm de profundidade em direcção à face externa do pé, também lateral ao tendão de Aquiles. Tem ainda uma lesão satélite abaixo e ao lado, que comunica com a superior. Sem tecido necrótico visível (Figuras 7 a 8)

Apresenta exsudado muito elevado, viscoso, cheiro fétido, amarelo esverdeado. Fez ciprofloxacina sem grande efeito há cerca de uma semana, préviamente ao inicio dos tratamentos. Nesta fase ainda eram visiveis e palpáveis abcessos laterais e do arco plantar, coincidentes com as locas exploradas por sonda. Estes abcessos, laterais apesar da irrigação abundante com soro fisiológico, mantinham-se pouco alterados, pelo que foram efectuados 2 orificios de drenagem nas faces laterais do calcâneo, após punção com lâmina de bisturi, o que permitiu uma lavagem mais eficaz, com drenagem abundante de liquido purulento. Após remoção do exsudado purulento foram aplicadas compressas embebidas em solução de betaina + PHMB, nas locas, durante 20 minutos. Após este periodo de limpeza foi aplicado Gel “X” de betaina + PHMB e uma hidrofibra com prata. O penso secundário era um poliuretano de 20cmX20cm que ficava completamente saturado e extravasava em grande quantidade para a ligadura.

Figura7 Figura8

Figura 7 e 8: Aspecto inicial das lesões, que evidencia tecido de granulação muito infectado, escurecido sem brilho, altamente friável. Note-se na face lateral do pé posterior, celulite na região dos abcessos identificados. Após esta intervenção a melhoria foi pouco notória, embora ainda assim a quantidade de exsudado espesso tenha diminuido significativamente.

A 16 de Maio de 2012, a evolução era positiva, com ligeira redução do volume do exsudado, que ainda assim saturava a totalidade do poliuretano 20cmX20cm, embora fosse menos espesso e tivesse um cheiro menos intenso. Nesta ocasião tivemos disponível o penso matriz de alginato de cálcio com prata e decidimos testar a sua eficácia neste caso complexo (figuras 9 e 10).

Figura9 Figura10

Figura 9 e 10: Penso de matriz de Alginato de cálcio com prata (pelicula) aplicado In situ. Nesta faze volvidas cerca de 3 semanas de tratamento, nota-se ligeira redução de edema e dos sinais de celulite, apesar de as locas manterem as dimensões originais.O material foi aplicado na máxima extensão das locas e em todos os orificios existentes. Apesar da sua textura semi-rigida, este material ao fim de alguns minutos começa a dissolver-se com a temperatura corporal e exsudado e molda-se a toda a superficie da ferida, locas incluídas, o que é extremamente vantajoso.

A 18 de Maio de 2012, dois dias depois da primeira aplicação do novo apósito denota-se uma redução moderada do exsudado, passando o poliuretano de 20cmX20cm a estar com apenas cerca de 80% de saturação, cheiro menos fétido. O tecido de granulação que se mantinha ainda escurecido, passa a ter uma tonalidade visivelmente mais clara. Todo o apósito foi dissolvido, apenas se verificando alguns vestigios na espuma de poliuretano. A loca externa, está agora encerrada, sem permitir passagem de dedo (que antes permitia) ou  mesmo pinça ou sonda.

Figura11 Figura12 Figura13

Figuras 11,12 e 13

A 20 de Maio de 2013, apenas 4 dias depois da 1ª aplicação da matriz de alginato de cálcio com prata os resultados são evidentes, o exsudado  é muito reduzido (cerca de 25% de saturação do poliuretano), mais fluído, seroso, orificios com drenagem também serosa reduzida. Sem odor perceptível. Loca da lesão principal, resume-se a 1 cm, marginal à parte superior desta das “9h às 2h”.Denota-se ligeira margem de tecido de epitelização no polo inferior da ferida. Lesões satélites mantidas, mas sem comunicação entre sí. (Figuras 14 a 16).

Figura14 Figura15,16

Figuras 14,15 e 16

A 28 de Maio de 2012, verifica-se que o apósito manteve-se integro desde a última realização de penso em lesão satélite, pelo que permanece no local. Por acumulação de depósitos de fibrina no tecido de granulação ao longo do tempo foi novamente aplicada solução de PHMB+Betaina (Figura 17). A lesão satélite inferior aumenta gradualmente devido a processo osteomielitico do calcâneo. Inicia Antibioticoterapia. Na lesão principal: tecido de granulação preenche  toda a lesão até à superficie da pele, não sendo distinguível qualquer vestigio de existência de locas. Tecido de granulação saudável, vermelho vivo, brilhante. Neste ponto temos a infecção local da ferida controlada, apenas permanecendo a osteomielite do calcâneo.

Figura17

A 30 de Maio de 2012, temos a lesão satélite original completamente cicatrizada. Lesão satélite inferior  em evolução (maioritáriamente fibrina e osteófitos). Margem de cerca de 0,5 cm de tecido de epitelização no pólo inferior (figura 18).

Figura18

A 11 de Junho de 2012, a lesão principal resume-se a uma “banda” de tecido de granulação de cerca de +/- 0,6 cm de largura, com retalho cutâneo (residual da loca original) sobreposto. Lesão osteomielítica do calcâneo com cerca de 50% da superficie coberta de tecido de granulação.Tem hiperqueratose satélite, sugestiva de osteófito subjacente (figura 19). Manteve tratamento em curso às duas lesões, sendo que em 15 de Julho se encontravam completamente encerradas (figura 20 e 21).

Figura19 Figura20 Figura21

Caso n.º 3: Sra. C. F.

Mulher de  99 anos de idade, diabética tipo II, com úlcera por pressão, categoria IV, calcâneo esquerdo, em desbridamento autolitico desde há duas semanas. Tratamento anterior Hidrogel + hidrocolóide (c/ plantago) associado a  desbridamento cortante conservador (técnica “slice”), visto a região dos calcâneos ser bastante sensível ao desbridamento cortante, que está contra indicado na maioria destes casos. A 9 de Junho de 2012, apresenta  uma área moderada de tecido necrótico húmido, de coloração amarelada e sinais de infecção do compartimento superficial, como o tecido de granulação escurecido e friavel, sem brilho, cheiro fétido, com exsudado reduzido. Nesta fase seria oportuno iniciar um antimicrobiano tópico, pois denota-se desde já “wound-breakdown”, com destruição de tecido saudável perilesional devido à infecção. No entanto a maioria das opções disponiveis, principalmente no que respeita a pensos com prata, consistem em materiais altamente absorventes como hidrofibras, alginatos, hidroalginatos e espumas, que face ao tecido necrótico que ainda se verifica, iriam provocar a sua desidratação, em vez de incentivar a sua remoção por autólise em ambiente húmido. Em alternativa poderia pensar-se em utilizar uma compressa de poliamida não aderente com prata, pois não tem capacidade de absorção, no então seria uma medida com fraco impacto pois também esta opção não conseguiria dar continuidade ao processo de desbridamento em curso, nem tão pouco, por consequência conseguiria actuar através do tecido necrosado remanescente na superficie da ferida. Assim sendo, tendo em conta que a matriz de alginato de cálcio com  prata em pasta possui cerca de 40% de água, e apesar da empresa que desenvolveu o produto não ter estudos concretos acerca da sua eventual acção no estímulo ao desbridamento autolitico, decidimos testar o comportamento do produto face a uma ferida infectada, com  tecido necrosado húmido em moderada quantidade. Decidiu-se inclusive deixar o material aplicado durante uma semana. A evolução foi bastante favorável e foi de encontro às expectativas, revelando-se como um produto de eleiç\ao nestes casos específicos (figuras 22 a 25)  Tratamento Implementado: Limpeza com PHMB + betaina solução (para mais fácil remoção de detritos) e matriz de prata iónica + alginato c/ 40% H2O, apresentação em pasta.

Figura22Figura23Figura24Figura25Figura26

Caso n.º 4: Sra. C. P.

Mulher de  61 anos de idade, com úlcera venosa de localização pouco comum, na face anterior da perna esquerda, compartimento tendinoso anterior, desde há 8 meses. De acordo com a doente, apresentava nesse membro desde há vários meses edema perimaleolar, formando-se uma protuberância nessa zona, que a dada altura ficou ruborizada com mais calor que a restante pele circundante, originando prurido intenso e ardor. De acordo com a doente a ferida teve origem ao “coçar” a área afectada.

Era seguida no Centro de saúde da área de residência com tratamento pouco optimizado para a etiologia da úlcera e estado do leito da ferida. Como terapia compressiva tinha meia elástica de compressão 20 mmHg, sendo o tratamento local da ferida feito com Hidrofibras com prata desde há vários meses por apresentar exsudado de cheiro fétido e espesso. O tecido de granulação apresentava-se muito escurecido e sem brilho, altamente friável. Pele quente ao toque, com rubor perilesional e regional, mais compatível com eczema venoso, podendo excluir-se a hipotese de celulite. De acordo com a doente nunca tinha sido efectuado nenhum estudo por doppler do memebro inferior. O IPTB obtido foi de 0,93 tendo sido seleccionada a terapia compressiva de curta tracção, sendo o grande desafio efectuar uma redistribuição da pressão sub-ligadura de modo a abranger a área em questão, com pressão que surta efeitos terapêuticos. Normalmente essa área é uma das zonas da perna menos afectadas pela terapia compressiva, de acordo com a técnica que uso habitualmente, a técnica de Peter Staudinger, pelo que a solução passou por utilizar uma variante do cruzado em “8” no tornozelo, que permita evitar excesso de pressão e fricção durante a caminhada, que é indispensável quando se utiliza a terapia compressiva de curta tracção. A infecção local do leito da ferida era bastante severa, tal como descrito, sem grande resposta à terapêutica em curso (hidrofibras com prata), pelo que se optou por excluir a provável presença de biofilme  e começar desde logo o tratamento com prata iónica, pois tem um inicio de acção mais rápido e uma maior disponibilidade de prata que o penso anteriormente utilizado, sendo que não havia tempo a perder no que respeita ao tratamento, visto que já estavamos perante várias áreas de “wound-breakdown”, pelo que a ferida estava a aumentar de tamanho desde há um mês de acordo com a doente. A evolução foi extremamente satisfatória e graças a um tratamento optimizado de acordo com o diagnóstico de situação efectuado a lesão cicatrizou no espaço de cerca de um mês, pondo fim a 8 meses de evolução e dor intensa (ver figuras 27 a 32).

Tratamento Implementado: Limpeza com PHMB + betaina solução, seguida de Matriz de alginato com prata iónica, em película, como apósito secundário foi utilizado uma espuma de poliuretano + terapia compressiva de curta tracção. Foi ainda aplicado um corticóide na pele perilesional. Nos últimos tratamentos, por apresentar pouco exsudado, optou-se por aplicar matriz de alginato com prata iónica em pasta.

Figura27 Figura28 Figura29 Figura30 Figura31 Figura32

 

Caso n.º 5: Sr. P. S.

Homem de  32 anos de idade, com história de Quisto dermóide sacro-coccigeo (Sinus Pilonidalis), desde há 12 meses com dois episódios de abcesso associados, faz Exerése do mesmo a 20 de Setembro de 2012, sem reconstrução por retalho, ficando loca cirúrgica para cicatrizar por segunda intenção. A ferida apresentava-se moderadamente exsudativa, com exsudado espesso, fétido e leito da ferido com tecido de granulação escurecido e friável. Dada a sua localização, considera-se como tendo grande risco de contaminação/infecção. Devido ao curto periodo de existência da lesão, a hipotese de apresentar biofilme é excluida apesar de apresentar depósitos de fibrina abundantes. A lesão estava a ser tratada com gaze impregnada em hidrogel e compressas como apósito secundário. Deu-se prioridade às aplicação de um apósito com prata iónica, de modo a controlar os níveis de contaminação/infecção e equilibrar o ambiente húmido com uma espuma de poliuretano. Considerando que estas lesões demoram cerca de 3 meses em média para cicatrizar, o facto desta lesão ter encerrado em apenas um mês, ilustra a eficácia do tratamento optimizado seleccionado para este caso (ver figuras 33 a 41)

Tratamento Implementado: Irrigação com soro fisiológico, seguida de Matriz de alginato com prata iónica, em pasta, com o objectivo de começar desde cedo a tratar a infecção, mas ao mesmo tempo optimizando o ambiente húmido de modo a facilitar o destacar da fibrina presente no leito da ferida + espuma de poliuretano. Os tratamentos seguintes incluiram Apósito de matriz de alginato com prata iónica em película + espuma de poliuretano.

Figura33 Figura34 Figura35 Figura36 Figura37 Figura38 Figura39 Figura40 Figura41

Considerações Finais

Após a apresentação destes casos, emerge uma questão: haverá diferença entre os vários pensos com prata? Na nossa opinião a resposta é sem dúvida:sim!

Não falamos apenas no tipo de tecnologia utilizada na impregnação da prata no apósito, mas também  do tipo de apósito utilizado, pois sabemos que classicamente os pensos com prata consistem na sua maioria em apósitos com material altamente absorvente, como é o caso de espumas de poliuretano, hidrofibras e fibras de alginato de cálcio, pois de facto a maioria das feridas é altamente exsudativa quando está infectada. No entanto quando a ferida está infectada, mas pouco exsudativa, a aplicação destes apósitos é contraproducente, pois vai deiquilibrar o ambiente húmido necessário à cicatrização da ferida e fomentar a deposição de fibrina na superficie da ferida. Assim para este tipo de feridas torna-se extremamente útil a aplicação de um apósito antimicrobiano com algum grau de hidratação como é o caso dos apósitos de matriz de alginato de cálcio com prata iónica, que tal como o nome indica, a prata já se encontra no estado iónico devido a essa hidratação, trazendo mais beneficios no tratamento da infecção. Assim, nem todos os antimicrobianos são úteis em todos os contextos.

Para cada caso específico deve ser seleccionado o antimicrobiano com o perfil mais adequado. O diagnóstico adequado de infecção na ferida e a selecção de um antimicrobiano ajustado, são um aspecto critico a não descurar.

A matriz  de alginato com prata iónica permite uma libertação gradual e sustentada;

Após humedecimento com o exsudado as fracções da matriz espalham-se por todo o leito da ferida. Sob a forma de película apresenta hidratação de 10% liberta iões Ag+ quase de imediato e de forma contínua – libertação começa durante a 1ª hora de contacto e apresenta a maior concentração de prata iónica disponível,quando em comparação com os seus pares. Apresenta libertação sustentada ao longo de 7 dias, cerca de 60 partes por milhão (Opasanon et al., 2012)

De facto olhando para os resultados obtidos, trata-se uma nova opção para o tratamento avançado de feridas, a ter sériamente em conta como opção na resolução de situações complexas, tal como no caso de úlceras de etiologia arterial, como o caso apresentado nas figuras 42 a 44.

Figura42,43 Figura44

Figura 43: Lesão 4 dias depois, com tecido de granulação vermelho vivo, menos pálido e com redução de 3,2 cm2 de área.

Referências Bibliográficas

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World Union of wound healing societies. (2008). Principles of Practice: wound infection in clinical practice: an internacional consence. Londres: WUWHS.

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Mar 12, 2013

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WOUND BIOFILM APPROACH: CASE STUDIES

ENFOQUE DE LAS HERIDAS CON BIOFILMS: ESTUDIOS DE CASO

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AUTORES: Vítor Santos, Ana Sofia Santos, Elsa Menoita

Resumo

Os microrganismos são estruturas simples, que estão presentes nos mais diversos habitats, mas capazes de desenvolverem comportamentos bastante complexos. O conceito de  biofilme tem emergido gradualmente de estudos científicos durante longo período de tempo, porém, nas últimas duas décadas, essa concepção tem avançado  consideravelmente.Estima-se que mais de 90% dos microrganismos vivem sob a forma de  biofilmes e praticamente não existe nenhuma superfície que não possa ser ou vir a ser  colonizada por bactérias . Em suma, os microrganismos apresentam-se nos ambientes  aquosos, tanto na forma planctónica com na forma séssil. Na forma planctónica os microrganismos encontram-se em suspensão e dispersos no meio aquoso, e na forma  séssil encontram-se aderidos a superfícies sólidas sob a forma de biofilmes. As feridas não  são excepção e a presença de biofilme nestas é um fenómeno importante a considerar.  Com este artigo, pretende-se demonstrar a aplicação de estratégias para a gestão de  biofilmes, com recurso à metodologia de estudo de caso.

Palavras-chaves: Biofilmes, feridas crónicas, estudo de caso

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Abstract

Microorganisms are simple structures that are present in various habitats, but able to develop enough complexos. The behavior of biofilm concept has emerged gradually scientific studies for a long period of time, however, the last two decades, this design has advanced  considerably . it is estimated that over 90% of living microorganisms in the form of  biofilms and practically there is no surface which can not be or become colonized by  bacteria. In sum, the microorganisms are presented in aqueous environments, either as planktonic to the sessile form. In order planktonic microorganisms are suspended and dispersed in the aqueous medium and form sessile are adhered to solid surfaces in the form of biofilms. The wounds are no exception and the presence of these biofilms is an  important phenomenon to consider. With this article, we intend to demonstrate the application of strategies to manage biofilms, using the case study methodology.

Key words: Biofilms, chronic wounds, case study

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Enquadramento da Problemática   

Para Rhoads et al. (2008), é necessário fazer um update do paradigma continuum contaminação-infecção, porque ele não tem em consideração os biofilmes, o seu ciclo de vida, que em muito constrasta com o defendido: invasão (contaminação), proliferação (colonização) e reacção do hospedeiro (infecção), verificando-se que mesmo a presença de bactérias parece ter um efeito indesejável, com atraso na cicatrização. Esta situação tem  sido designada de colonização crítica. O conceito de colonização crítica foi desenvolvido na tentativa de reconhecer o papel crítico da carga bacteriana (bioburden) responsável pelo atraso na cicatrização, mas sem sinais óbvios de infecção (Edwards & Harding, 2004, citados por Phillips et al., 2010). Na realidade, o conceito de colonização crítica, provavelmente, descreve a presença de um biofilme numa ferida crónica (Phillips et al., 2010). A microbiologia tradicional caracterizou durante anos as células encontradas em suspensões como planctónicas (Widgerow, 2008). Estas células foram exaustivamente avaliadas, isoladas e identificadas. Algumas das bactérias planctónicas estudadas têm a capacidade de aderir em várias superfícies, formando biofilmes, assumindo assim a forma séssil.

Para Rhoads et al. (2008), todas as feridas crónicas têm bactérias na sua superfície, para além disso as bactérias do biofilme não estão uniformemente distribuídas no leito da ferida. Actualmente, o método mais confiável para confirmar a presença de biofilme microbiano é a microscopia especializada (Phillips et al., 2010). Foi realizado um estudo de referência por James et al. (2008), citados por Phillips et al., (2010) e Wolcott e Rhoads (2008), através de microscopia de imagem electrónica a 50 feridas crónicas e 16 agudas. Os autores verificaram que, 60% das feridas crónicas possuíam biofilme e apenas 6% das feridas agudas apresentavam biofilme (Steinberg, 2011; James et al., 2008; Widgerow, 2008). Estes resultados sugerem para os autores que, não só as feridas crónicas apresentavam biofilme, como, também, a sua presença pode prejudicar a cicatrização, contribuindo para a cronicidade das feridas.

Trata-se portanto de uma entidade, com grande relevância clínica, no que concerne ao tratamento de feridas crónicas e sendo urgente a definição de medidas sistematizadas para o seu controlo, com base em evidência cientifíca credível. Biofilme microbiano é definido como uma associação de células microbianas fixadas às superfícies, bióticas ou abióticas, envolvidas numa complexa matriz extracelular de substâncias poliméricas.

De acordo com Costerton (1984) e Bester et al. (2010) citados por Phillips et al. (2010):

– Fixam-se em poucos minutos;

– As microcolónias formam-se dentro de 2-4 horas;

– A matriz forma-se em 6- 12 horas, tornando o biofilme cada vez mais resistente a biocidas e a antibióticos;

O biofilme maduro pode começar a desprender bactérias planctónicas dentro 2-4 dias. Um biofilme maduro depois de libertar células bacterianas pode recuperar num espaço temporal de 24 horas. Gibson et al. (2009), refere que a persistência de biofilme estabelece uma fonte inflamatória a longo prazo:

– Espécies reactivas de oxigénio (EROS);

– Proteases (MMP’s);

Para Rhoads et al. (2008), o biofilme pode desencadear uma resposta imunitária com aumento de MMP, senescência com incapacidade funcional dos fibroblastos, queratinócitos, e das células endoteliais para iniciar a angiogénese.

Muito se tem debatido sobre o diagnóstico dos biofilmes nas feridas crónicas e se estes podem ser observados a olho nú. De acordo com Phillips et al., (2010), os biofilmes são estruturas microscópicas, contudo, quando se desenvolvem durante um longo período sem sofrerem qualquer perturbação podem tornar-se espessos o suficiente para serem observados a olho nú.

Clinicamente, os biofilmes têm sido observados com frequência como uma camada fina translúcida, brilhante na ferida infectada, não respondendo a terapias antimicrobianas e não mostrando sinais de cicatrização (Widgerow, 2008). É de advertir que, nem todas as espécies bacterianas que formam  biofilmes são observáveis a olho nú (Phillips et al., 2010). Para os mesmos autores, alguns biofilmes microbianos podem ser visualmente detectados por causa da produção de pigmentos, como por exemplo, o verde pyocyanin produzido por Pseudomonas (Dietrich et al., 2006, citados por Phillips et al., 2010). Por vezes, também se verificam dificuldades na distinção de biofilmes e tecido desvitalizado pouco aderente e consistente (slough – depósitos de fibtina/resíduos). O slough tem sido descrito como viscoso, amarelo, e relativamente opaco, enquanto que os biofilmes encontrados nas feridas têm uma aparência mais gelificada e brilhante (Hurlow & Bowler, 2009, citados por Phillips et al., 2010).

Quadr.1

As feridas crónicas são muitas vezes geridas através de uma única estratégia de cada vez. De facto, estratégias sequenciais muitas vezes resultam em fracasso para cicatrizar a ferida (Association for the Advancement of Wound Care, 2008). De acordo com o estudo de Wolcott e Rhoads (2008)  realizado a 190 pessoas com úlceras de perna, entre 2002 e 2006, recorreu-se às estratégias de gestão do biofilme e, verificaram que 146 (77%) apresentaram cicatrização completa e 44 (23%) não apresentaram cicatrização completa. Deste modo, as estratégias de gestão de biofilme têm os seguintes objectivos:

– Reduzir a carga biofilme;

– Evitar a reconstituição do biofilme (Phillips et al., 2010).

Steinberg (2011) acrescenta, referindo que há cinco principais formas de, possivelmente, prevenir, reduzir e controlar os biofilmes: 1) Prevenir a fixação de bactérias; 2) Prevenir a formação de biofilme; 3) Interromper o biofilme para permitir a penetração tópica de agentes antimicrobianos; 4) Interferir com quorum-sensing; 5) Melhorar a dispersão de bactérias dos biofilmes para as bactérias planctónicas poderem ser mais facilmente destruidas.

Stoodley et al. (2001), citados por Association for the Advancement of Wound Care (2008), também, referem que o biofilme leva cerca de 24 horas para restabelecer a sua biomassa. Após a ruptura com desbridamento e tratamento tópico – ex. Surfactantes – há uma janela de oportunidade de 24 horas, utilizando antimicrobianos, de forma a não se recuperarem.

Quadr.2

Agentes Anti-Biofilme em Tratamento de Feridas

Surfactantes

Surfactante é uma abreviação de “agente activo de superfícies”, que significa “activo à superfície”. Um surfactante é caracterizado pela sua tendência de adsorver em superfícies e interfaces. Este permite reduzir a tensão superficial dos fluidos aquosos. Esta característica permite-lhes actuar como substâncias detergentes, agentes humificantes, e emulsionantes, sendo intensivamente usados no controlo da formação de biofilmes no equipamento industrial, especialmente na indústria alimentar. Os surfactantes utilizados na eliminação de biofilmes nas feridas aumentam a solubilidade e melhoram a limpeza. O resultado da baixa tensão superficial induzida pelo surfactante ajuda na remoção de detritos e bactérias (Andriessen & Eberlein, 2008, citados por Cutting, 2010). Os surfactantes existentes no mercado português são a betaíne, sob a forma associada com polihexanida, que será posteriormente mencionada e a espuma de poliuretano com surfactante F-68 com e sem prata.

A betaína é um alcalóide surfactante que é encontrado na cana-de-açúcar, em outras plantas e animais. Tem alta solubilidade em água e induz um efeito de stress osmótico no factor rhamnolipid, factor de virulência produzido pela P. aeruginosa, que causa lise de macrófagos e leucócitos polimorfonucleares (Van Gennip et al., 2009, citados por Cutting, 2010). A betaína interfere também na produção de homoserina lactona (factor de virulência) e na actividade de sinalização célula-célula (quorum sensing) (Goldberg et al., 2008, citados por Cutting, 2010).

Antimicrobianos

 É importante referir que o biofilme é mais susceptível a antimicrobianos quando ainda não está aderido a um substrato de forma irreversível (Association for the Advancement of Wound Care, 2008). Os antimicrobianos têm o objectivo de evitar a reconstituição do biofilme, eliminando as células planctónicas que foram desagregadas por mecanismos físicos (Phillips et al., 2010).

Antibióticos sistémicos

Quando os antibióticos são usados como um único agente, não conseguem eliminar a causa da cronicidade da ferida na maioria das vezes, devido aos mecanismos de sobrevivência dos biofilmes. Estes eliminam os sintomas da infecção provocada pelos biofilmes, mas não o próprio biofilme, levando ao aparecimento de infecções recorrentes. Clinicamente verifica-se, muitas vezes, uma melhoria a curto prazo no leito da ferida após a administração do antibiótico, seguida por uma posterior deterioração ou recalcitrância. Tal facto, possivelmente, deve-se à falha do antibiótico para reduzir a biocarga (bioburden) a um nível em que as defesas do hospedeiro podem prevalecer, resultando em reconstrução do biofilme e sua resistência (Association for the Advancement of Wound Care, 2008). Costerton et al. (1999) acrescenta, referindo que, as infecções continuam a se propagar mesmo após o término do tratamento dos antibióticos, pois somente as células planctónicas são destruídas. Rhoads et al. (2008) referem que, os antibióticos são eficazes apenas 25-32%, eliminando somente as células superficiais, ou seja, aquelas metabolicamente activas. Assim, as bactérias incorporadas na matriz que estavam em estado de hibernação começam a metabolização. Para além disso, as células bacterianas podem separar-se da estrutura do biofilme em qualquer fase da infecção e estabelecer uma nova infecção aguda (Costerton et a.l, 1999).

Anti-Microbianos

Uma vez que o tratamento inclui técnicas de desbridamento e antibióticos sistémicos, os anti-microbianos poderão ser eficazes, pois penetram  na membrana do próprio biofilme e causam  morte celular (Rhoads et al. , 2008). Os biocidas não selectivos como o álcool, o hipoclorito de sódio, a água oxigenada, lesam as células do hospedeiro, mas não as bactérias em biofilme (Wolcott & Rhoads, 2008).  Os biocidas mais amplamente utilizados no tratamento de feridas com biofilmes são a prata, mel, iodo e PHMB (Phillips et al., 2010, Steinberg, 2011). Anti-microbianos tópicos, tais como prata (Chaw et al., 2006; Percival et al., 2008 citados por Association for the Advancement of Wound Care, 2008), o mel (Okhiria et al., 2004; Irish et al., 2006, citados por Association for the Advancement of Wound Care, 2008), o iodo sob forma de cadexomero fornecem alguma evidência do seu valor na gestão de biofilme, não com o objectivo da sua erradicação, mas através da aplicação de múltiplas estratégias (biocidas e desbridamento), desencadeiam stress ao biofilme, fazendo com que os anti-microbianos possam ser mais bem-sucedidos.

Figura nº1 – Penetração do anti-microbiano antes e depois da acção de surfactantes e biocidas

Figur.1

Mel

A inibição de biofilmes por mel in vitro tem sido relatado (Alandejani et al, 2009; Merckoll et al, 2009; Okhiria et al., 2009 citados por Cooper, 2010). O mel tem sido proposto como uma intervenção anti-biofilme, ainda mais porque a sua molécula de açúcar mais comum (frutose) interfere com a adesão de P. aeruginosa às células hospedeiras. Constatou-se que no caso dos Staphylococcus Aureus, o mel reduz significativamente a formação de biofilme na concentração de 1% (w/v) e a na concentração de 5% (w/v) impediram a formação de biofilme. Assim, os autores Irish, Cartere Blair (2007) defendem a aplicação do mel como profilaxia na formação de biofilmes, sendo que outros como Merckoll et al (2009), focam a carente informação sobre a acção do mel no biofilme, argumentando que, a maioria dos estudos in vitro são referentes a microorganismos sobre a forma planctónica. Okhiria et al (2009) salientam ainda a necessidade da realização de mais estudos in vivo, para determinar a concentração inibitória minima (CIM) de mel para o biofilm, de forma, que a sua acção não promova o crescimento do biofilme.

Iodo

Num  modelo de biofilmes desenvolvido por Hill et al. (2006), vários pensos foram avaliados contra biofilmes de 7 dias (maduros) e biofilmes de 3 dias (jovens). Os pensos com iodo exterminaram todas as células bacterianas do biofilme.  Num estudo de Phillips et al. (2010), realizada em pele suína, comprovou-se que o cadexómero de iodo eliminou um biofilme de Pseudomonas Aeruginosa. Contudo, o iodo, como a iodopovidona apresenta toxicidade celular, inibe fortemente o crescimento celular e em concentrações superiores a 0,1% elimina totalmente a actividade mitótica. Em concentrações mais baixas, a inibição observada é aproximadamente proporcional à dose. Balin et al. (2002) observaram uma menor taxa de cicatrização de feridas, em pessoas tratadas com altas concentrações de iodopovidona. No entanto, o iodo noutras formulações, como cadexemero de iodo, não apresenta citotoxicidade, pois o iodo é liberto de forma gradual e é eficaz contra biofilmes (Rhoads et al., 2008). Outra desvantagem prende-se com o facto de nas feridas exsudativas, ficar inactivado mais rapidamente, o que pode permitir mais facilmente a reconstituição do biofilme, por eventual escassez de anti-microbiano.

PHMB

A polihexanida influencia muito pouco os lípidos neutros presentes nas membranas celulares humanas, pelo que, não afecta os tecidos e possui a capacidade de especificidade de acção eliminando organismos de forma selectiva, sendo considerada uma solução eficaz na limpeza de feridas, preferencialmente adequada nas feridas contaminadas, colonizadas e infectadas (Faria, 2009). A sua actividade pico ocorre entre um pH 5-6 (Broxton et al., 1984, citados por Cutting, 2010). É considerado um produto seguro, com baixa taxa de reacções adversas (Schnuch et al, 2007, citados por Cutting, 2010) e é compatível com outros produtos ao nível do tratamento de feridas em ambiente húmido assim como é eficaz na eliminação de biofilmes (Gray et al., 2010; Faria, 2009).  Num estudo in vitro realizado por Kaehn (2009), citado por Cutting (2010), comparando a eficácia de quatro soluções esterilizadas (solução salina, solução de Ringer, solução de PHMB com betaína e dicloridrato octenidine) numa ferida, PHMB com Betaína foi a única solução completamente eficaz na limpeza da ferida.

Foi realizado um estudo retrospectivo sobre a eficácia da lavagem com PHMB e betaína em solução ou gel (Moller et al., 2008), onde foram incluídos vários tipos de feridas. Em cada mudança de penso, a ferida foi limpa com solução de PHMB para irrigação e, dependendo da decisão clínica, o PHMB gel também foi utilizado. Posteriormente foi aplicado um penso de espuma. No início do estudo, 41% das pessoas tinham a ferida com sinais de infecção. Estas receberam  em conjunto com o PHMB solução ou gel. Após o tratamento, a taxa de infecção da ferida desceu de 41% para 3%. A cicatrização foi conseguida em 80% das feridas e 3% não apresentaram melhoria. A avaliação demonstra que o PHMB gel ou solução foi indolor em 99% dos casos e cerca de 66% das pessoas relataram uma melhoria no odor da ferida. O tratamento foi bem tolerado, com uma melhoria na qualidade de vida das pessoas.

Prata

Percival et al. (2007), citados por Rhoads et al. (2008) realizaram um estudo in vitro, e concluíram que a prata em forma iónica tem capacidade de prevenir a formação de biofilmes. De acordo com Bjarnsholt et al. (2007), citados por Steinberg (2011) e Percival et al. (2007, 2008), citados por Rhoads et al. (2008), vários estudos em laboratório demonstraram que a prata tem um efeito letal sobre os organismos do biofilme.

Contudo, um estudo in vitro concluiu que a concentração de prata nos diversos pensos é baixa para eliminar o biofilme (Bjarnsholt et al., 2007 citados por Rhoads et al., 2008). De acordo com Bjarnsholt et al. (2007), citados por Steinberg (2011), a prata só poderá ter efeito sobre o biofilme em altas concentrações, o que pode ser superior 1 a 10 vezes que a concentração necessária para eliminar em forma planctónica. No entanto, este estudo foi realizado in vitro em biofilmes de P. aeruginosa e não in vivo em biofilmes em feridas crónicas (Rhoads et al., 2008). Contudo, com o estudo de Newman et al. (2006), citados por Widgerow (2008), levantam-se algumas questões: será que a prata apresenta igual eficácia para todos os agentes microbianos? O seu estudo sugeriu que o S. aureus é menos susceptível a prata iónica do que P. aeruginosa, pois foi preciso mais tempo de exposição de prata para induzir a morte celular em S. aureus (24 horas) em comparação com P. Aeruginosa

Estudos de Caso

De modo a demonstrar os efeitos das várias estratégias de gestão de Biofilme, foram realizados estudos de caso que procuraram evidenciar as vantagens de alguns dos agentes antibiofilme descrito. Para tal foi efectuada uma documentação do historial clínico do doente e caracterização da ferida, bem como monitorização da área desta, com recurso a planimetria digital, recorrendo à análise de fotos digitais no software OsiriX. Esse mesmo registo fotográfico serviu como base para uma avaliação mais qualitativa da evolução da ferida.

Caso n.º 1: Sr. A. P.

Homem com 72 anos de idade, com ulceração venosa na face interna da perna, acompanhada de eczema venoso e edema moderado (++). Foi calculado o Indice de Pressão tibio-braquial (IPTB), cujo valor era de 0.93. Ferida com 40 dias de evolução, sem resposta a antimicrobianos tópicos, superficie coberta de fibrina. Apresenta critérios diagnósticos compatíveis com a presença de biofilme.

Tratamento Implementado: Terapia Compressiva de curta tracção, cadexómero de iodo + Compressa não-aderente com iodopovidona, aplicação de pomada corticóide (betametasona) na pele perilesional. A ferida cicatrizou 3 dias depois, pelo que se assumiu a eficácia do cadexómero de iodo na neutralização de algum eventual biofilme presente na ferida (Figuras 2 a 4).

Figur.2

Figur.3

Figur.4

Caso n.º 2: Sr. S. B.

Homem com 78 anos de idade, pé diabético, com status pós amputação trans-metatarsica dos dedos do pé esquerdo há 5 semanas, aquando do inicio do estudo.

Tratamento anterior da deiscência com hidrofibra com prata, sem sucesso, houve agravamento com aumento da área e aumento de tecido inviável.

Tratamento Implementado: Desbridamento Cortante Conservador, lavagem com solução salina e aplicação de Alginato com mel manuka+ Espuma de poliuretano (Figuras 5 a 9), com o objectivo de contribuir para remoção de tecido inviável, bem como evidenciando a acção do mel numa ferida com suspeita de biofilme, infectada, com aparente “resistência” ao antimicrobiano prata.

Figur.5

Figur.6

Figur.7

Figur.8

Figur.9

Caso n.º 3: Sr. F. M.

Homem anos 67 anos de idade, com úlcera venosa na face externa da perna esquerda, com evolução de 6 meses, tratamento anterior com apósito de hidrofibras com prata e terapia compressiva de longa tracção. A lesão aparentemente evoluiu de forma positiva durante os primeiros 4 meses, estando estagnada à dois meses, de acordo com o doente. Aparentemente apresenta metade do seu tamanho original. De acordo com o doente o tratamento inicial foi feito com hidrofibras sem prata, passando a hidrofibras com prata, quando a ferida estagnou, começou a apresentar exsudado espesso e de cheiro fétido, embora sem sucesso. Assim temos uma ferida com alguns sinais clinicos de infecção/colonização critica, no que respeita ao compartimento superficial da ferida, mas sem resposta ao antimicrobiano aplicado, pelo que é válido considerar a hipotese de ter biofilme bacteriano. Ao iniciar o estudo de caso foi de novo efectuada avaliação vascular, apresentando um IPTB de 0.88, válido para aplicação de terapia compressiva, que já estava inclusive em curso.

No que respeita ao restante quadro clinico, o doente apresentava dor, edema algo acentuado, apesar da terapia compressiva de longa tracção, cerca de 50% da superficie da ferida coberta por fibrina. Sem evolução há dois meses e com tratamento dirigido à etiologia e quadro clinico da ferida, optei por excluir então o biofilme com a aplicação do surfactante betaina, associado a PHMB.

Tratamento Implementado: Aplicação de compressas em não tecido com solução de PHMB + Betaína durante 15 minutos; Penso de poliuretano + Ac. Hialurónico com iodo; terapia compressiva de curta-tracção, que pareceu fazer mais sentido num doente que é autónomo e ao qual foi explicado os beneficios de caminhadas diárias com este tipo de material e realização de exercicios em repouso que activem a bomba gemelar. Os resultados foram bastante positivos, levando a crer que o principal problema residia mesmo numa eventual presença de biofilme, como podemos verificar pela evolução positiva descrita nas figuras 10 a 13.

Figur.10

Figur.11 Figur.12 Figur.13

Caso n.º 4: Dona C. G.

O caso da Dona C.G. de 81 anos de idade, é um caso de desespero, por parte de uma pessoa que convive há 2 anos  com uma úlcera venosa na face antero-externa da perna direita,  e na maior parte do tempo com dor, exsudado espesso, odor fétido, edema acentuado. Distingue-se à superficie da ferida uma aparente camada translúcida. Trata-se de uma lesão tratada por vários profissionais diferentes ao longo deste período de tempo, em que de acordo com a doente se alternou entre períodos de estagnação e agravamento da lesão.  O tratamento mais recente inclui um apósito com prata e antibiótico sistémico, sem resposta positiva, apenas houve uma ligeira melhoria na dor e exsudado aquando da toma do antibiótico , que rapidamente reverteu com o fim  deste (de acordo com a doente).

Procurando excluir causas mais graves, deste atraso e agindo de acordo com as boas práticas, avaliou-se o IPTB, que revelou 0.85, logo complementado pela restante observação de sinais clinicos na perna e historial da doente, permitiu excluir doença arterial periférica e apostar em terapia compressiva. Assim, uma vez mais se apostou na betaina com PHMB, visto que com este quadro clinico é legitimo pensar na eventual presença de biofilme.

Tratamento Instituido: Aplicação de compressas em não tecido com solução de PHMB + Betaína durante 15 minutos; Aplicação PHMB+ Betaína em gel, Penso de poliuretano com prata e terapia compressiva de curta-tracção, efectuando os respectivos ensinos acerca dos cuidados a ter com a terapia compressiva e de como fazer uma eficaz activação da bomba gemelar (ver figuras 14 a 17).

Figura 14: Aspecto inicial da ferida. Leito da ferida inviável , com bordos encovados, vastos depósitos de fibrina, tecido de granulação muito escurecido, foi aplicada Betaina com PHMB.

Figur.14

Figur.15

Figur.16

Figur.17

Caso n.º 5: Sra. E. M.

Senhora com 89 anos de idade, diabética, úlcera de pressão na região sagrada, com evolução de 2 anos, de acordo com a família. Tem ainda como problemas activos, anemia e hipertensão arterial, que se encontra controlada e demência cerebro-vascular. Está acamada, incontinete de ambos os esfincteres e sem capacidade para se mobilização. Desde há uns meses a familia colocou uma cobertura de colchão de pressão alterna, mas de eficácia duvidosa, devido ao reduzido tamanho das células de ar.

Num primeiro contacto, apresentava sinais de infecção, como descoloração do tecido de granulação, exsudado aumentado, odor fétido. O tratamento anterior consistia em compressa não aderente com iodopovidona e compressas.

Tratamento Instituido: Aplicada phmb + betaina associado a antimicrobiano com Ag+. Mais uma vez se optou pela terapêutica dirigida ao biofilme, pois a ferida encontrava-se com sinais de infecção estagnada à vários meses. Boa evolução cicatricial (Figuras 18 e 19).

Figur.18 Figur.19

Caso n.º 6: Sra. M. C.

Mulher de  48 anos de idade, com úlcera venosa no terço inferior, face interna, da perna esquerda de apresentação retro-maleolar, desde há 7 meses. Trata-se de uma senhora com factores de risco laborais acentuados, pois trabalha numa unidade fabril de enlatados, que obriga a várias horas de pé no posto de trabalho, sem activação da bomba gemelar. A terapia compressiva que utilizava foi instituida empiricamente, com recurso a meia elástica, que possuiu um perfil mais de prevenção e não é tão eficaz na fase de tratamento de uma úlcera venosa. Apesar de não ter outros factores de risco, acresce complexidade à ferida o facto de se localizar na região posterior do maléolo.  Obteve-se um IPTB de 0,99. Tratamento anterior com hidrofibra, tem 90% da área da ferida com fibrina.

Figura 20: Aspecto inicial da ferida, coberta por fibrina, com algumas áreas de tecido de granulação escurecido. O exsudado era espesso e fétido.

Figur.20 Figur.21 Figur.22 Figur.23

Tratamento Implementado: Aplicação de PHMB + betaina solução durante 15 minutos – manteve 20% da área da ferida com fibrina. De seguida aplicada Betaina+PHMB gel e uma espuma de poliuretano; terapia compressiva de curta tracção, com “reshaping “ da zona retro-maleolar. Mais uma vez pretende-se demonstrar a eficácia de um plano de tratamento dirigido de acordo com um diagnóstico minucioso da etiologia da ferida e suas implicações anatómicas, bem como da avaliação do leito da ferida, cruzando estes dados com o historial da doente. De facto dois aspectos emergem: necessidade de optimização da terapia compressiva e excluir a presença de um provável biofilme (Figuras 20 a 23). Foram efectuados ensinos acerca de exercicios para minimizar a imobilidade no posto de trabalho.

Nesta série de estudos de caso, destaca-se sem dúvida a utilização de Betaina+PHMB, pois permite destacar todos os detritos do leito da ferida, incluindo eventual biofilme, sem necessidade de desbridamento e com minimo dano  para os tecidos saudáveis (Figuras 24 a 28).

Figur.24 Figur.25

Permite ainda associar outros tipos de apósitos, visto que nenhum destes elementos interage com os restantes principios activos que integram materias para tratamento de feridas. Verifica-se claramente uma maior eficácia associado a um antimicrobiano de libertação gradual, embora em casos colonização critica, sem infecção clinica, por si só seja eficaz, como se pode verificar no caso nº 6.

Figur.26Figur.27Figur.28

Considerações Finais

As estratégias de gestão do biofilme, são algo que acaba por ser efectuado na preparação do leito da ferida, no entanto há ganhos positivos se a aplicação destas estratégias for orientada por uma observação clinica rigorosa da ferida e seu historial.

Deve ser dado enfâse ao papel do biofilme na ferida crónica/complexa e mobilizar as estratégias de forma sistemática para este problema. Em feridas que reunam critérios para suspeita de biofilme, deve ser aplicado um agente anti-biofilme, para excluir a sua presença, quanto mais não seja um surfactante no processo de limpeza desta. Devem-se dirigir esforços no sentido de maximizar as possibilidades de erradicação desta entidade, que causam inevitávelmente atraso cicatricial, que vai implicar mais sofrimento para a pessoa com ferida e gastos enormes no seu tratamento, bastando ter em conta os exemplos acima demonstrados, que evidencia a resolução em poucos dias, de casos que implicavam consumos prolongados de material por largos meses, em que as feridas permaneciam estagnadas. Tudo isto são aspectos a considerar e que vêm reforçar a importância de uma avaliação clínica rigorosa  e eficaz por parte do enfermeiro, de modo a optimizar as opções terapêuticas de que dispõe e conseguir também melhores resultados sob o ponto de vista económico social e logo, na qualidade de vida da pessoa com ferida.

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Mar 5, 2013

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NURSING INTERVENTION FOR BIOFILM MANAGEMENT IN COMPLEX WOUNDS

INTERVENCIÓNS DE ENFERMERÍA EN EL TRATAMIENTO DE HERIDAS EN COMPLEJAS CON BIOFILMS

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AUTORES: Inês Pedro, Simone Saraiva

Resumo

A deposição de microrganismos numa superfície, normalmente resulta na formação de biofilme sendo também estratégias desenvolvidas pelos microrganismos para se protegerem de fatores agressivos externos.

Atualmente sabe-se que numa ferida complexa existem vários biofilmes que vivem em completos agregados, e que a sua composição é diferente de biofilme para biofilme.

Objetivo: Com este trabalho, pretende-se criar, sobretudo, um algoritmo de atuação para controle dos biofilmes. Este algoritmo vai consistir em intervenções de enfermagem pois, é a área que nos interessa estudar.

Metodologia: Foi executada uma pesquisa na EBSCO, abrangendo todas as bases de dados disponíveis. Foram procurados artigos científicos publicados em Texto Integral (data da pesq.), publicados entre 2005 e 2011, usando as seguintes palavras-chave: Ferida (Full Text) AND Biofilmes (Full Text) AND Gestao (Full Text). Foram ainda usadas as seguintes palavras chave: Wound (Full Text) AND Biofilms (Full Text) AND Cuidar (Full Text). Foi utilizado a metodologia de PI(C)OD e selecionados 14 artigos, do total de 71.

Conclusão: Com as intervenções identificadas, foi elaborado um algoritmo de intervenções de enfermagem para gestão de biofilmes, tendo por base a mais recente evidência científica.

PALAVRAS-CHAVE: Feridas crónicas, Biofilmes, Gestão, Intervenções

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Abstract

Deposition of microorganisms on a surface, usually results in the formation of biofilm, but also microorganism’s strategies to protect themselves from external toxic factors.

Currently it is known that there are several complex wound in biofilms because they live in complete aggregates and that the composition is different for biofilm to biofilm.

Objective: This study is intended to create, above all, an algorithm for controlling actuation of biofilms. This algorithm will consist of nursing interventions because the area is interested in the study.

Methodology: Research was carried out in EBSCO (all databases). Were searched scientific articles published in full text (…), published between 2005 and 2011, using the following keywords: Wound (Full Text) AND Biofilmes (Full Text) AND Management (Full Text). Also using the following keywords: Wound (Full Text) AND Biofilmes (Full Text) AND Care (Full Text). We used the method of PI(C)OD and selected 14 articles of a total of 71.

Conclusion: With the interventions identified, we organized an algorithm nursing interventions for the management of biofilms, based upon the most recent evidence about this theme.

KEYWORDS: Chronic wound, Biofilms, Management, Interventions

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Introdução

O aumento da esperança média de vida e o acréscimo da co-morbilidade das doenças crónicas na população adulta e idosa, aliada à busca incessante da melhoria da qualidade de vida, estão intimamente relacionados com o progresso dos cuidados de saúde. A elevada prevalência das feridas crónicas no contexto atual e o seu impacto tanto a nível individual como económico, dado os elevados custos associados ao seu tratamento, tornam este aspeto da saúde um assunto relevante em saúde pública e consequentemente remete para a reflexão critica sobre a qualidade dos cuidados de saúde.

Nesse sentido, o tratamento de feridas crónicas representa um grande desafio para os profissionais de saúde, de onde se destacam os enfermeiros pela natureza da sua profissão. Sobre isto, relembramos uma das competências do enfermeiro de cuidados gerais referidas pela Ordem dos Enfermeiros, “em conformidade com o diagnóstico de enfermagem, os enfermeiros (…) utilizam técnicas próprias da profissão de enfermagem, com vista à manutenção e recuperação das funções vitais, nomeadamente, (…) circulação, comunicação, integridade cutânea e mobilidade.” (Ordem dos Enfermeiros: Competências do enfermeiro de cuidados gerais; artigo 9.º, n.º4; 2003).

Neste contexto, tem havido um aumento exponencial da investigação científica na área de tratamento de feridas, cujo conhecimento produzido é fundamental na tomada de decisão clínica dos enfermeiros. A existência de informação é um dos aspetos essenciais para a tomada de decisão.

O tratamento de feridas é uma área complexa que requer uma intervenção avançada, centrada numa abordagem holística da pessoa, para isso há necessidade de haver por parte dos enfermeiros uma prática baseada na evidência, uma a gestão clínica integrada da ferida e um trabalho entre uma equipe multidisciplinar, quando a situação assim o exige. Cientes desta necessidade têm-se como objetivo centrar esta revisão da literatura na gestão de biofilmes em feridas crónicas/complexas, fazendo-se uma breve abordagem sobre a fisiopatologia das feridas crónicas e o impacto dos biofilmes na cicatrização das mesmas.

Sabe-se que as feridas são ruturas estruturais ou fisiológicas no tegumento que incitam respostas de reparação complexa e baseada na interação entre células inflamatórias e mediadores. A cicatrização de feridas é, assim, um processo fisiológico, através da qual o corpo substitui e recupera o tecido danificado, restabelecendo a integridade da pele com a maior brevidade de tempo possível. As feridas agudas seguem progressivamente e de forma atempada as fases de cicatrização: hemóstase, inflamação, proliferação e regeneração ou maturação. Já as feridas crónicas, pela sua natureza complexa, permanecem estagnadas numa das fases, geralmente inflamatória. Segundo Amstrong e Jude (2002) e Yager e Nwomeh (1999), citados por Wolcott et al (2009)23, o estado inflamatório é marcado pelo aumento de citoquinas pro-inflamatórias (Interleucina-1, Fator Necrose Tumoral-α, Interferão-gama), elevação dos níveis de metaloproteinases (MMP2, MMP8, MMP9) e quantidade excessiva de neutrófilos; sendo estes fatores que prolongam o tempo de cicatrização para além do normalmente esperado.

Existe uma série de barreiras para a cicatrização e fatores que aumentam o risco de infeção numa ferida, como por exemplo a idade, doenças sistémicas (diabetes mellitus, alterações hematológicas, doenças cardiovasculares…), nutrição pobre, desidratação, baixa resposta imunitária, baixa perfusão tecidular de oxigénio, etc. Infelizmente, mesmo quando estas barreiras são bem geridas, os resultados nem sempre parecem ser significativamente melhorados (Cutting, 2010; Percival e Cutting, 2009; Wolcott e Rhoads, 2008).2,16,24

Na ferida crónica há várias abordagens a ter para que esta evolua de uma forma positiva até à sua completa cicatrização. Por conseguinte, têm sido feitos vários estudos para detetar as causas que inibem a sua cura, levando a ferida a ficar estagnada.

É inevitável que feridas crónicas sejam colonizadas por microrganismos, mas o sistema imunitário quando inato, geralmente elimina a carga microbiana no decurso da cicatrização de feridas. No entanto, quando este está comprometido, a proliferação da carga microbiana sobrecarrega a resposta do sistema imunológico podendo levar à colonização crítica e até à infeção (Steinberg e Siddiqui, 2011)19.

Os microrganismos multiplicam-se e proliferam na forma planctónica ou séssil. Na forma planctónica os microrganismos apresentam-se em suspensão e dispersos num líquido aquoso; enquanto em formato de biofilme, estes apresentam-se na sua forma séssil aderidos a superfícies sólidas.

Os biofilmes têm sido associados a infeções crónicas em feridas, porque estes organismos geralmente resistem aos mecanismos de defesa do hospedeiro e às intervenções dos antimicrobianos, aproveitando-se das condições da ferida para ganhar vantagem e proliferar. Pensa-se que 65% a 80% das feridas devam a sua cronicidade e complicações infeciosas adjacentes, à formação de biofilmes (James et al, 2008; citados por Lenselink e Andriessen, 2011)10. Ainda a acrescentar que segundo James et al (2008) citados por Steinberg e Siddiqui (2011)19, a evidência direta da presença de biofilmes em feridas foi comprovada em 2008, quando biópsias de feridas agudas e crónicas foram recolhidas e analisadas por microscopia eletrónica. A mesma fonte refere que 60% das feridas crónicas mostrou biofilme, em comparação com apenas 6% das feridas agudas.

Os biofilmes são comunidades geralmente polimicrobianas em constante mudança que estão fixas a superfícies bióticas ou abióticas. Este forma-se e fixa-se numa ferida segundo três estadios principais: adesão reversível, adesão irreversível e maturação da substância polimérica extracelular (EPS). Tal como refere Phillips et al (2010), no primeiro estadio, os microrganismos encontram-se na forma planctónica, e pela sua natureza, tendem a fixar-se numa superfície e, eventualmente, tornar-se-ão num biofilme; contudo nesta fase a adesão ainda é reversível. No segundo estadio, a adesão passa a ser irreversível pois, os microrganismos multiplicam-se, diferenciam a sua expressão genética e aderem mais firmemente à superfície, no intuito de sobreviverem. No último estadio, os microrganismos sintetizam e excretam uma substância polimérica extracelular protetora que adere firmemente a uma superfície viva ou inanimada, constituindo-se assim o biofilme. Depois de fixos e maduros, os biofilmes também têm a capacidade de dispersar para outras localizações e estabelecer novos biofilmes (Steinberg e Siddiqui, 2011).19

De acordo com Phillips PL et al (2010)18, em Biofilms: made easy da Wounds International, um biofilme pode ser descrito como conjunto de bactérias incorporados numa camada espessa e viscosa – substância polimérica extracelular (EPS), que protege os microrganismos contra ameaças externas. A composição da EPS está de acordo com o microrganismo presente, mas geralmente é constituída por polissacarídeos, proteínas, glicolípidos e ADN bacteriano (Stoodley, 2009; Flemming, 2007; e Sutherland, 2001; citados por Phillips et al, 2010)18.

Os microrganismos que constituem o biofilme podem atuar sinergicamente, utilizando moléculas de Quorum Sensing para comunicarem uns com os outros e assim garantir a sua sobrevivência. Isto leva a que algumas espécies prosperem juntas e formem comunidades polimicrobiana que, por sua vez, têm maior virulência e patogenicidade. Tal, leva a que se verifique uma reduzida suscetibilidade aos antimicrobianos e se reforce a formação de novos biofilmes (Percival e Wolcott, 2011).17

Como é mais difícil suprimi-lo, os microrganismos e seus componentes extracelulares, que incorporam o biofilme, vão prolongar a fase inflamatória da ferida indefinidamente, atrasando o processo de cicatrização (Percival e Cutting, 2009)16. Como a resposta inflamatória crónica nem sempre é bem-sucedida na remoção do biofilme, o próprio biofilme ao proteger-se aumenta a produção de exsudado, o que proporciona uma fonte de nutrição que o ajuda a perpetuar-se.

Como se pode perceber, os biofilmes são estruturas microscópicas, sendo considerados por vários autores como uma entidade invisível, pois atualmente o método mais fiável para confirmar a presença de biofilme microbiano é a microscopia especializada (Phillips et al, 2010)18.

Então o biofilme passa a ser uma entidade com que os enfermeiros se devem preocupar, quando tratam da pessoa com ferida, para que esta evolua até à sua cicatrização total. Para que isto seja possível, torna-se pertinente fazer uma revisão da literatura das intervenções e estratégias de enfermagem na gestão de biofilmes que estão presentes em grande parte das feridas complexas/crónicas. Tal, garante a eficácia dos cuidados de enfermagem, ultrapassando as limitações e barreiras causadas pelos biofilmes na cicatrização da ferida e consequentemente contribuiu para a melhoria da qualidade de vida da pessoa com ferida crónica e sua família.

Metodologia

No processo da Prática Baseada na Evidência, recorre-se ao formato “PI(C)O”, para a formulação da pergunta de investigação, que será a seguinte: “Na ferida crónica ou complexa (P), quais os cuidados de enfermagem a ter (I) para a gestão de biofilmes (O)?”. Onde o problema/participantes são as feridas crónicas ou complexas sem evolução cicatricial. Como é uma revisão bibliográfica não se realizaram intervenções e os outcomes são as intervenções de enfermagem para gestão de biofilmes.

Foi consultado o motor de busca EBSCO, com acesso às bases de dados: Business Source Complete, CINAHL (Plus with Full Text), MEDLINE (Plus with Full Text), Cochrane Database of Systematic Reviews, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Library, Information Science & Technology Abstracts, Nursing & Allied Health Collection: Comprehensive, MedicLatina, Health Technology Assessments, Academic Search Complete e ERIC; tendo sido procurados artigos científicos publicados em Texto Integral (25 a 28 de Maio de 2012), publicados entre 2000 e 2012, usando os seguintes descritores (palavras-chave): Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Management (Full Text); Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Chronic (Full Text); Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Intervention (Full Text); e  Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Nurs* (Full Text).

Obteve-se um total de 71 artigos, tendo sidos selecionados 14 artigos através de um conjunto de critérios de inclusão e exclusão.

Considerou-se um período temporal de 12 anos, de modo a beneficiar de uma maior abrangência face ao conhecimento existente sobre a matéria em análise.

No problema/participantes os critérios de inclusão foram artigos que abordem feridas crónicas ou complexa com suspeita ou certeza da presença de biofilme e os critérios de exclusão foram artigos que abordem ferida aguda exclusivamente, artigos com repetição de guidelines e artigos que falem exclusivamente do diagnóstico de biofilmes.

Nas intervenções os critérios de inclusão foram as intervenções de enfermagem a pessoa com ferida com suspeita ou mesmo presença de biofilme e os critérios de exclusão foram as intervenções dirigidas à pessoa com ferida aguda e as intervenções à pessoa com ferida sem presença de biofilme.

No desenho os critérios de inclusão foram todo o tipo de artigos e os critérios de exclusão foram todos os resultados da pesquisa que não apresentem o tipo de estudos dos critérios de inclusão.

Para conhecer e organizar os diferentes tipos de produção de conhecimento e metodologias científicas patentes nos artigos filtrados, utilizou-se a escala de seis níveis de evidência de Guyatt & Rennie (2002)6.

Resultados

O desbridamento é essencial, rentável e eficaz na indução da cicatrização de feridas estagnadas. 2,5,17,18,19,20,23,24 Este facilita uma oportunidade para intervenção de antibiótico e antimicrobianos, e é rentável pois diminuí custos com antibióticos, amputação, hospitalização e morte.23

Remover o biofilme e prevenir a sua reconstituição pelo desbridamento é necessário para inverter desequilíbrios moleculares e iniciar a cura.19 No entanto, nenhuma forma de desbridamento ou limpeza é suscetível de remover a totalidade de um biofilme, e todas as bactérias remanescentes tem o potencial de regenerar o formar biofilme maduro em poucos dias.18 Pois, por si só, não garante que o biofilme se reconstitua, sendo necessária a utilização de antimicrobianos.5

Existem vários tipos de desbridamento contudo, os mais eficazes para a gestão do biofilme são o desbridamento cortante conservador (slice), o desbridamento mecânico (fibra de monofilamentos e lavagem pulsátil), o desbridamento cirúrgico e o desbridamento biológico (larvaterapia).

Vários autores defendem que a técnica de desbridamento cortante é a mais eficaz porque minimiza o stress, infeção, inflamação, exsudado e tecido necrótico causado pelo biofilme.23 Pois remove células senescentes, promove o equilíbrio dos materiais biológicos, melhora a microcirculação e normaliza a nível bioquímico.23

Os princípios do desbridamento cortante são: primeiro alterar a anatomia do leito da ferida, removendo locas, sinus tractus e tunelizações; segundo remover fibrina e tecido desvitalizado (incluindo a EPS do biofilme); e terceiro remover ossos descorados, fazendo o diagnóstico de osteomielite.24

Já o desbridamento mecânico, fibra de monofilamentos artificial remove bactérias, exsudado sero-purulento e biofilme bacteriano. Demonstra maior potência na remoção microbiana quando usado com um líquido de limpeza detergente e é fácil de utilizar. Por isso, é eficiente e rentável face a outros métodos de desbridamento mecânico.7

A larvaterapia ou terapia larval é outra forma de desbridamento eficaz porque as secreções e excreções das larvas inibem a formação de biofilme, reduzindo os fatores de degradação envolvidos na acumulação de biofilme.19,23

No entanto, nenhuma forma de desbridamento ou limpeza é suscetível de remover a totalidade de um biofilme, e todas as bactérias remanescentes tem o potencial de regenerar o formar biofilme maduro em poucos dias.18 Pois por si só não garante que o biofilme se reconstitua, sendo necessária a utilização de antimicrobianos tópicos como a prata.5 A prata tem um efeito letal sobre os microrganismos, mas em concentrações elevadas de biofilme, a quantidade necessária pode ser 10-100 vezes superior à concentração necessária para matar os microrganismos em forma planctónica 19, quantidade que não é aconselhada a existir nos pensos tópicos atuais para o tratamento de feridas pelo risco de toxicidade. Vários estudos in vitro têm indicado que aplicação tópica de prata e iodopovidona, por si só, têm pouco efeito sobre os biofilmes.10

Os princípios envolvidos na prevenção da reconstituição do biofilme incluem a utilização de pensos e de agentes antimicrobianos de largo espectro como: prata, iodo, mel e PHMB que existem em diversas formulações.18

O cadexomero de iodo é um agente eficaz anti-séptico para feridas cronicamente exsudativas que atua contra a produção de glicocálix ou material polimérico, destruindo diretamente a estrutura do biofilme.19 Este pode ser usado na supressão de biofilmes sem causar dano significativo nas células do hospedeiro.16

A polihexanida é uma solução eficaz e segura na limpeza de feridas crónicas, principalmente quando há suspeita de presença de biofilme.2,8 Tem atividade biocida de amplo espectro e não há relatos de bactérias resistentes. Provoca lise celular, induzindo na membrana um stress osmótico.2 A irrigação com a solução de polihexanida com o surfactante (betaína) é adequada para preparação do leito de feridas para remover biofilmes antes de um tratamento posterior e para a absorção de odores da ferida.8 Para feridas cavitárias existe a polihexanida com betaína em gel.

Lenselink e Andriessen (2011)10 dizem que penso de polihexanida contendo biocelulose permite o tratamento antimicrobiano contínuo. Este promove com a limpeza das feridas, a redução do biofilme em feridas estagnadas, sendo a sua aplicação segura, confortável e com dor reduzida para os pacientes. 10

O mel é bactericida contra todas as estirpes de bactérias19, atuando inclusive em estirpes bacterianas, como o Staphylococus aureus resistente à vancomicina.16 Contém substâncias bactericidas que penetram no biofilme.19 Verificou-se que o mel tem propriedade biocida, provocando efeitos sobre o ciclo celular, pois é inibidor da mitose celular.13 Atua nos vários estadios do biofilme e em diferentes estirpes de bactérias e, uma vantagem dos múltiplos modos de ação do mel é que o risco de desenvolvimento de resistência bacteriana é diminuído sendo, por isso, uma alternativa aos antibióticos.13 A sua ação biocida prende-se com o aumento da osmolaridade e teor de glucose, que estimula a ação dos macrófagos e, com habilidade para diminuir o aporte de água às bactérias e o pH.13

Wolcott e Rhoads (2008)24 defendem que com o desbridamento, o ideal é a utilização de agentes antibiofilme que rompam a estrutura do biofilme. O uso simultâneo de antibiofilmes com antimicrobianos tradicionais provavelmente terá um efeito sinérgico sobre o tratamento de infeções de biofilme. Também referem que a lactoferrina, xilitol e prata podem ser aplicados em simultâneo e que têm um poder sinérgico no combate aos biofilmes. Inclusivamente afirmam a existência de pensos impregnados com prata ou cadexómoro de iodo, combinados com a Lactoferrina ou o Xilitol. Os mesmos autores referem que agentes antibiofilme como:

  • RIP (RNA-III inhibiting peptide) e Furanona C30, que inibe o Quorum Sensing;
  • Dispersin B, alginase e depolimerases fago são agentes que degradam a substância polimérica extracelular (EPS);
  • EDTA (Ácido Etilenodiamino Tetra-Acético), deferoxamina e transferrinas são catadores de ferro;
  • Gallium e açúcares em álcool são metabólitos falsos.

No tratamento de feridas crónicas com biofilme, se deve incluir o desbridamento, agentes antibiofilme (lactoferrina, xilitol, farnesol) e antissépticos tópicos, como o iodo e a prata iônica. 17

Já Fonseca (2011)5 e Percival e Cutting (2009)16  completam e complementam a informação sobre agentes anti-biofilme, nomeadamente:

  • Lactoferrina, proteína presente nos fluidos gengivais e na saliva, que tem propriedades de ligação do ferro, bloqueando a fixação de bactérias planctónicas a uma superfície e inibindo o primeiro passo na formação de biofilme; 5,16
  • Gallium, este perturba processos dependentes do ferro pois, muitos sistemas biológicos não conseguem distinguir Ga3+ de Fe3+; 5,16
  • Xylitol, este interfere com a formação do biofilme; 5,16
  • Dispersin B, este atinge a substância polimérica extracelular, degradando a estrutura do biofilme; 5,16
  • Mel, este possui atividade antibacteriana e modula a atividade da célula monocítica. 16

Fonseca (2011)5 ainda menciona que foi descrita, recentemente, a aplicação de gel de EDTA numa ferida e que esta pode ter alguma eficácia contra biofilmes de pseudomona aeruginosa.

Os agentes antibiofilme têm demonstrado ser menos tóxicos que os antimicrobianos tradicionais.16

O uso simultâneo do desbridamento cortante e ultra-sons são os mais eficazes. 5,18 Outra estratégia é perturbar o biofilme em feridas por meio da ultrassonografia e estimulação elétrica.5 A ultrassonografia é utilizada para remover tecido não viável e interromper o Quorum-Sensing (QS), diminuindo a virulência coordenada; e a estimulação elétrica é utilizada para promover a penetração de agentes tópicos.5,19

Em alguns casos, os autores recorrem ainda a tecnologias avançadas, como: derivados de plaquetas, fator de crescimento das células beta e oxigenoterapia hiperbárica.24

A utilização de substâncias naturais que estimulam o crescimento celular pode promover a melhoria do processo de regeneração, como é o caso do uso de células derivadas da medula óssea ou células estaminais. A utilização de fagos, que particularmente os biofilmes jovens parecem ser mais suscetíveis.5

Além de desbridamento e antibiofilmes ainda se pode utilizar antibioterapia sistémica adequada. Os antibióticos foram considerados por alguns autores um adjuvante nesta questão, mas sempre de forma cautelosa. Pois a preocupação crescente em relação ao aumento de resistências bacterianas com antibióticos, encoraja a examinar alternativas, possivelmente melhores.24

Conclusão

Pelo difícil diagnóstico e irradicação do biofilme em feridas estagnadas, o biofilme e considerado por muitos autores como a entidade mais preocupante no tratamento da ferida. No tratamento de feridas para a gestão do biofilme, devem ser utilizadas concomitantemente estratégias para a eliminação de microrganismos em forma planctónica e forma séssil.17

Atualmente, e no âmbito do tratamento de feridas, faz todo o sentido explorar-se cientificamente intervenções de gestão do biofilme em feridas crónicas, de forma a atingir a excelência e inovação dos cuidados de enfermagem. A prática baseada na evidência é o caminho para a promoção da qualidade de vida dos doentes e o equilíbrio entre custo-eficácia nas instituições de saúde.

Por isso, foi criado um algoritmo (figura.1), centrando na área de enfermagem, de atuação para a gestão de biofimes em feridas estagnadas, que será exposto a seguir.

Fig.1

Referências Bibliográficas

1. Craig, J.; Smyth, R. (2004). Prática Baseada na Evidência. Loures: Lusociência. pp.4 [1]

2.Cutting, K. F. (2010). Adressing the challenge of wound cleansing in the modern era. British Journal of Nursing, Vol. 19, No11. [2]

3.European Wound Management Association. (2005). Identifying criteria for wound infection. London: MEP Ltd. [3]

4.European Wound Management Association. (2006). Management of wound infection. London: MEP Ltd. [4]

5.Fonseca, António P. (2011). Biofilms in wound: an unsolved problem?. European Wound Management Association Journal, Vol. 11, No2. [5]

6.Guyatt G, Rennie D. (2002). Users guides: essentials of evidence-based clinical practice. Chicago, IL: American Medical Association. [6]

7.Haemmerle, G. et al. (2011). The wound debrider: a new monofilament fibre technology. British Journal of Nursing (Tissue Viability Supplement), Vol. 20, No6. [7]

8.Horrocks, Ann (2006). Prontosan wound irrigation and gel: management of chronic wounds. British Journal of Nursing, Vol. 15, No 22. [8]

9.James, Garth; et al (2008). Biofilms in chronic wounds. Wound Repair and Regeneration, 16, pp. 37-44. [9]

10.Lenselink, E.; Andriessen, A. (2011). A cohort study on the efficacy of polyhexanide-containing biocellulose dressing in the treatment of biofilms in wounds. Journal of Wound Care, Vol. 20, No11. [10]

11.Machado, Sílvia M. O. (2005). Avaliação do efeito antimicrobiano do surfactante cloreto de benzalcónio no controlo da formação de biofilmes indesejáveis. Tese de Mestrado: Universidade do Minho. [11]

12.Menoita, E., Santos, V., Testas, C., Gomes, C., Santos, A. (2012). Biofilms: Knowing the entity. Journal of Aging & Innovation, 1 (2): 23-32. [12]

13.Merckoll, Patricia; et al. (2009). Bacteria, biofilm and honey: A study of the effects of honey on ‘planktonic’ and biofilm-embedded chronic wound bacteria. Scandinavian Journal of Infectious Diseases, 41, pp. 341 – 347. [13]

14.Ordem dos Enfermeiros (2003). Competências do enfermeiro de cuidados gerais. Divulgar, artigo 9.º, n.º4, pp.7-8. [14]

15.Plano Nacional de Saúde (2004/2010). Orientações Estratégicas. Lisboa: Ministério da Saúde, Vol. 2, pp. 132-133. [15]

16.Percival, S. L.; Cutting, K. F. (2009). Biofilms: possible strategies for suppression in chronic wounds. Nursing Standart, Vol. 23, No32. [16]

17.Percival, S. L.; Wolcott, R. D. (2011). Biofilms and their management: from concept to clinical reality. Journal of Wound Care, Vol. 20, No5. [17]

18.Phillips, P. L.; et al. (2010). Biofilms made easy. Wounds International. Vol. 1, Issue3. [18]

19.Steinberg, John; Siddinqui, Farah (2011). The Chronic Wound and the role of biofilme. Podiatry Management. [19]

20.Thomson, Collete H. (2011). Biofilms: do they affect wound healing?. International Wound Journal, Vol. 8, No1. [20]

21.Westgate, Samantha; Cutting, Keith (2011). The role of microbial biofilms in chronic and acute wounds. Nursing & Residentlai Care, Vol. 13, No 11. [21]

22.Wolcott, R. D.; et al. (2010). Chronic wounds and the medical biofilme paradigm. Journal of Wound Care, Vol. 19, No2. [22]

23.Wolcott, R. D.; et al. (2009). Regular debridement is the main tool for maintaining a healthy wound bed in most chronic. Journal of Wound Care, Vol. 18, No2. [23]

24.Wolcott, R. D.; Rhoads D. D. (2008). A study of biofilme-based wound management in subjects with critical limb ischaemia. Journal of Wound Care, Vol. 17, No 4. [24]

 

 



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Nov 23, 2012

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HEALING OF COMPLEX WOUNDS: RESULTS OF THE APPLICATION OF A COMPLEX OF HYALURONIC ACID AND IODINE

CICATRIZACION DE HERIDAS COMPLICADAS: RESULTADOS DE LA APLICACIÓN DE UN COMPLEJO DE ÁCIDO HIALURÓNICO Y YODO
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AUTORES: Vítor Santos, Ana Sofia Santos, Elsa Menoita

Resumo

O ácido hialurónico, um glicosaminoglicano (GAG), é um polissacárido encontrado em muitos locais no corpo humano, tais como o tecido da pele, olhos e tecido conjuntivo. Ela também é encontrada em outros mamíferos e bactérias. Como um componente da matriz extracelular, o seu papel na reparação de feridas, entre outros, é o de proporcionar uma estrutura temporária para suportar a formação de tecido novo. Aproveitando a ação terapêutica do ácido hialurônico numa aplicação tópica de benefício clínico comprovado mostrou-se desafiante. Um novo desenvolvimento da tecnologia hyaluronan, compreendendo hialuronato de sódio e complexo de iodo, oferece uma nova abordagem na exploração dos benefícios do ácido hialurónico e entregando reais benefícios clínicos para uma vasta gama de tipos de feridas complexas. Assim foram realizados os estudos de caso apresentados neste artigo, os primeiros em que se utilizou este produto em Portugal, com o apoio da Queenlabs, Lda.

Palavras-chave: Ácido hialurônico; cicatrização;  ferida; antimicrobiano; iodo, case study

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Abstract

Hyaluronic acid, a glycosaminoglycan (GAG), is a polysaccharide found in many places in the human body, such as skin tissue, eye tissue and in all kinds of connective tissue. It is also found in other mammals and bacteria. As a component of the extracellular matrix, its role in wound repair, among others, is to provide a temporary structure to support the formation of new tissue. Harnessing the therapeutic action of hyaluronic acid in a topical application of proven clinical benefit proved challenging. A new development in technology hyaluronan, comprising sodium hyaluronate and iodine complex, offers a new approach in exploiting the benefits of hyaluronic acid and delivering real clinical benefits for a wide range of types of wounds complex. So we carried out the case studies presented in this article, the first ones in which this product is used in Portugal, with the support of Queenlabs, Lda.

Keywords: Hyaluronic Acid, healing, wound; antimicrobial; iodine

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INTRODUÇÃO

O ácido hialurónico, é um polímero de ocorrência natural dentro da pele, que tem sido extensivamente estudado desde a sua descoberta, em 1934. Tem sido usado numa ampla variedade de áreas médicas tão diversas como ortopedia e cirurgia cosmética, mas é na engenharia de tecidos que têm sido obtidos os maiores avanços. Os produtos de degradação desta macromolécula têm uma diversidade de propriedades que lhe conferem vantagens no campo de cicatrização da ferida. Pode ser fabricado sob várias formas, desde géis, ou apósitos sólidos.

Recentemente, a investigação sobre a cicatrização de feridas expandiu dramaticamente. Este tem sido alimentado por uma série de descobertas, particularmente nos últimos 25 anos. Técnicas descritas no último quarto de século incluem a cultura de queratinócitos humanos em 1975, o primeiro análogo dérmico em 1979, e a descoberta de uma variedade de citocinas e mediadores inflamatórios que modulam a cicatrização de feridas (Chen, 1999). A abertura de cada campo levou a explosões em tecnologia, que teve ramificações em quase todos os ramos da medicina. Na área da cicatrização de feridas, os produtos de engenharia variam de pensos simples para feridas, a substitutos de pele formados a partir de culturas mistas, o chamados enxertos sitéticos.

De um modo geral, as pesquisas têm se concentrado em duas áreas. A primeira delas, as complexas interações baseadas em mediadores inflamatórios e citocinas, que está além do âmbito do presente artigo, mas é um campo de possibilidades que surgem,  e no qual, por exemplo, a manipulação de moléculas específicas podem afetar a cicatrização de feridas. A segunda grande área em estudo, consiste no enfoque sobre a matriz extracelular e das suas interacções com as células.

A investigação sobre a matriz extracelular tem sido geralmente centrada em dois materiais:  matrizes de colagenio e ácido hialurônico. A matriz de colagénio foi a primeira a ser desenvolvida, na década de 1980. Yannas et al.  desenvolveram uma matriz composta de sulfato de condroitina de colagénio. Todos os produtos de colágeno utilizadas desta forma tem um origem xenogenética, geralmente utilizando colágeno bovino com outro produto, como por exemplo a celulose regenerada oxidada (Price et al., 2005).

Em contraste com a matriz de colagénio, os materiais de ácido hialurónico são derivados a partir do produto mesma base, que é altamente conservada entre as espécies. É necessária uma modificação química a fim de se obter uma estrutura de um polímero estável, mas o material é essencialmente o mesmo, independentemente da sua origem. Além disso, o material é relativamente único no campo da engenharia de tecidos uma vez que os seus produtos de degradação parecem ser activos na cicatrização de feridas. Isto conduziu a uma riqueza de pesquisa dentro do campo da cicatrização de feridas e permitiu que o material pudesse ser usado numa variedade de formas.

O Ácido Hialurónico

O ácido hialurónico foi descoberto pela primeira vez no humor vítreo do olho em 1934 e foi subsequentemente sintetizado in vitro, em 1964. É um polímero com base numa unidade dupla de dois açúcares:. Ácido D-glucurónico e N-acetil -glucosamina. Os produtos de degradação do ácido hialurónico parecem ter propriedades que afectam activamente a cicatrização de feridas e cinética celular (Chen 1999). Os estudos indicaram que a maioria dos efeitos atribuídos à molécula são aplicáveis a uma faixa estreita de produtos de degradação e, por conveniência, os fragmentos são agora divididos em variedades de cadeia curta e longa.

Cicatrização de Feridas e o Ácido Hialurônico + Iodo

Em 1991, West et al. demonstraram que a degradação produtos de ácido hialurônico consistiram num factor pró-angiogênico, e observou que esse efeito foi limitado a fragmentos de entre 4 e 25 de dissacarídeos de comprimento. Este foi um dos primeiros estudos com modulação do ambiente da ferida por ácido hialurônico. A resposta angiogênica foi confirmado em 1994 e em 1997, sendo posteriormente esta resposta atribuída a um efeito sobre as vias de sinalização intracelular reforçada pela co-aplicação do factor de  crescimento endotelial vascular. Esta resposta tem particular importância na biologia tumoral, onde parece ser parcialmente responsável pela maior angiogenese verificada em certos tumores (Price et al.,2005).

A adesão celular à matriz extracelular também parece estar estreitamente relacionada com o receptor de CD44 e ácido hialurónico. Existem provas claras de que este é o meio preferencial de fixação para fibroblastos, e pode ser o meio pelo qual as células aderem primáriamente ao substrato independentemente da motilidade subsequente (Price et al.,2005).

A deposição de colagénio pelos fibroblastos é um dos factores-chave na reconstituição da matriz de suporte na lesão e é a natureza desta deposição que determina em grande parte a qualidade da cicatriz. Há também evidências de que a aplicação de ácido hialurónico leva a uma remodelação da matriz extracelular melhorada com uma deposição de colágeno, mais ordenada, com menor degradação.

A interação dos queratinócitos com ácido hialurônico é complexo. Existe um corpo de evidência que sugere que a molécula se encontra dentro dos epitélios normais, sendo que parece, haver preferencial interacção com CD44 em aspectos apicais e lateral da célula. Este é deslocado, de forma seletiva, por fragmentos> 10U mas não <10U.  A interação entre células e ácido hialurônico peri-celular, provavelmente, depende da resposta da célula ao EGF,  que modula fortemente a acção deste. Pensa-se que o ácido hialurónico tenha um número de inter-funções dependentes na cicatrização de feridas e é uma parte integrante da matriz extracelular (ECM), providenciando-lhe estabilidade e elasticidade. É um composto altamente higroscópico (retêm humidade); atrai grandes quantidades de água para o espaço extracelular, com vários efeitos no processo de cicatrização da ferida. Ao manter um ambiente húmido, o ácido hialurônico protege as células contra os efeitos da secura, também ajudando a célula no movimento, ajudando a célula em divisão para dissociar-se do seu substrato e fornecer uma matriz hidratada, o que facilita esse mesmo movimento.

O ácido hialurônico não parece ter um papel ativo na modificação da resposta inflamatória. A inflamação inicia o processo de cicatrização, mas a resposta inflamatória precisa ser moderado, senão a reparação tecidular não pode prosseguir normalmente e a matriz não tem a estabilidade necessária para a migração celular e proliferação. Parece ter um efeito contra os radicais livres, embora sua ação específica seja desconhecida. Além disso, é pensado para moderar a resposta inflamatória através das suas interacções específicas com constituintes da resposta inflamatória, estabilizando actividade de citoquinas e reduzindo os danos induzidos pelas proteases.

O ambiente de cicatrização húmido criado após aplicação tópica de ácido hialurônico interage com o apósito secundário, que permite alguma evaporação da água para o ambiente. À medida que a concentração de água reduz, o ácido hialurónico atrai mais água e factores de crescimento dos tecidos circundantes. De vido ao seu elevado peso molecular vai actuar como uma bomba, em relação aos factores de crescimento, que se vão tornando cada vez mais concentrados na ferida e optimizar potencial de cicatrização (Price et al.,2005).

Apesar dos benefícios potenciais do uso do ácido hialurônico, existem fatores que limitam a sua acção na prática clínica. Reconhece-se unanimemente que a ferida não é um ambiente estéril. Todos os ferimentos são colonizados por bactérias (biocarga) que podem influenciar o processo de cicatrização. O sistema imunitário do hospedeiro está mobilizado para controlar  a proliferação bacteriana  e manter um equilíbrio, o que contribui para que a cicatrização possa ser alcançada. No entanto, há momentos em que as defesas do hospedeiro estão saturadas e os números de bactérias continuam a subir e a concorrer por nutrientes bem como produzir toxinas bacterianas com impacto negativo na cicatrização de feridas. A gestão da carga bacteriana pela otimização de defesas do hospedeiro e na redução do número de bactérias é aceite como um princípio importante no tratamento de feridas. Os efeitos da carga bacteriana são particularmente relevantes quando se considera o uso tópico de ácido hialurónico. A promoção de um ambiente húmido pela ação higroscópica do ácido hialurônico, não só proporciona um ambiente ideal para a proliferação de acolhimento cel-intracelular e mobilização, mas também induz um ambiente no qual as bactérias podem multiplicar-se. Além disso, um certo número patógenos comuns em feridas, podem produzir hialuronidase, a enzima responsável para o fraccionamento do seu elevado peso molecular, como um subproduto (Dechert,2006).

Enquanto a fragmentação molecular ocorre naturalmente dentro da ferida, a decomposição rápida da molécula altera a acção do material, que afectam os benefícios potenciais da sua aplicação tópica. Uma estratégia para minimizar este facto é esterificar o ácido hialurónico, o que origina um produto com uma maior resistência à acção de hialuronidase, mas afecta a acção higroscópico do produto: quanto mais esterificado, menor a sua capacidade hidrofílica. Outra abordagem possível é combinar o ácido hialurónico com um composto antimicrobiano eficaz, que fornece protecção contra a degradação da hialuronidase, tal como iodo (Cutting,2011).

O iodo foi usado para a prevenção e tratamento da infecção por mais de 150 anos, sendo que possui um largo espectro de actividade antimicrobiana, rapidamente inibindo bactérias, leveduras, bolores, protozoários e vírus. O iodo é ainda eficaz contra bactérias formadoras de endosporos. Estafilococos resistentes e sensíveis à meticilina têm sido identificados como igualmente susceptíveis ao iodo. Acredita-se que a ligação de iodo com proteínas conduz à desnaturação por oxidação em aminoácidos, actuando nas pontes de hidrogénio. Estas alterações afectam a estrutura e a função de tanto a integridade estrutural das bactérias e a sua actividade enzimática, e, portanto, têm vérios efeitos sobre a função microbiana. Assim, as alterações nas paredes celulares, membranas e resultam na morte citoplasma rápida após a exposição ao iodo (Cutting,2011).

Alguma preocupação foi levantada sobre os efeitos colaterais (dor na aplicação) e toxicidade do iodo no tratamento de feridas. Alguns estudos têm mostrado que o iodo pode ter efeitos negativos sobre a cultura de tecidos, ou seja, granulócitos, monócitos, queratinócitos e fibroblastos; no entanto, outros relatos têm sugerido que essa toxicidade tópica provavelmente não é de relevância clínica e é dose dependente. Houve também um pequeno número de relatos de casos de estudo, que sugerem que o uso tópico de produtos com iodo podem afetar a função da tireóide. De um modo  geral, não há risco claro para pessoas aparentemente saudáveis. Leaper e Durani na sua revisão que apenas foram encontradas anomalias menores em múltiplos artigos, tais como um aumento no iodo ligado à proteína, mas não houve alterações em testes de função da tireóide. As complicações graves só foram encontradas em extensa exposição ao iodo em alta concentração (risco de disfunção tireoideia hiper ou hipotireoidismo, acidose metabólica), enquanto o risco para pacientes normais é mínima. Deve-se ter especial cuidado na aplicação de produtos à base de iodo em pessoas com disfunção tireoideia conhecida ou queimaduras extensas, crianças, mulheres grávidas ou lactantes. Um relatório de uma reunião de consenso internacional sobre o uso de iodo no tratamento de feridas, foi deduzido que formulações de libertação lenta que geram baixas concentrações de iodo numa lesão foram eficazes e não tóxicas. As reacções alérgicas ao iodo são raras. Quando ocorrem, parecem estar relacionadas com os compostos usados em associação com o iodo, tais como povidona, no composto iodopovidona (Dechert, 2006).

Recentemente foi desenvolvido um complexo patenteado de hialuronato de sódio 1,5% (sal de sódio de ácido hialurónico,), produzido por um processo de fermentação, iodeto de potássio a 0,15% (Kl) e iodo 0,1%. De acordo com o fabricante, a concentração (0,1% de iodo) é baixa em comparação com soluções antissépticas existentes, a fim de minimizar a ocorrência de irritação, embora mantendo as  propriedades do iodo contra bactérias que podem causar degradação de ácido hialurônico. Trata-se de um composto indicado para o tratamento de uma variedade de feridas agudas e crónicas complexas. Dentro da solução, o ácido hialurônico destina-se a promover um ambiente húmido e maximizar o potencial de cicatrização através do apoio à viabilidade e migração celular, mantendo o ambiente extracelular hidratado, potenciando os fatores de crescimento. A adição de iodo destina-se primariamente para actuar como uma protecção antimicrobiana para hialuronidase, enquanto que ao mesmo tempo, fornece protecção antimicrobiana para a ferida. Isso prolonga a disponibilidade do ácido hialurónico na ferida, optimizando a sua acção sobre a cicatrização de feridas (Cutting,2011).

Existe, portanto, um grande conjunto de evidências a partir de estudos científicos para indicar que o ácido hialurónico pode afectar, de um modo benéfico, vários dos componentes da cicatrização de feridas. Assim, o ácido hialurónico tem sido utilizado in vivo no tratamento de feridas com algum sucesso.

Estudos de Caso

Para a realização destes estudos de caso, foi efectuada uma breve documentação do historial clínico do doente e caracterização da ferida. A área foi foi monitorizada recorrendo planimetria digital, com análise de fotos digitais no software OsiriX. Esse mesmo registo fotográfico serviu como base para uma avaliação mais qualitativa da evolução da ferida.

  • Caso n.1: Sra. P.S.

Senhora com 52 anos de idade, pé diabético, com úlcera neuropática em tuberosidade óssea da face lateral do pé direito, com 3 meses de evolução.

Tratamento anterior com várias terapêuticas avançadas, sem sucesso. Foi calculado no membo inferior direito (membro afetado) um indice de pressão tibio-braquial  (IPTB) de 0.98, o que exclui de acordo com a observação clinica do membro, doença arterial. No membro contralateral o IPTB era de 0,96.

Tratamento Implementado: Foram efectuados 2 tratamentos com alginato de cálcio + Ác. Hialurónico com iodo, num espaço temporal de 10 dias, obtendo-se cicatrização completa(Figuras 1 e 2).

Figura 1

Figura 2

  • Caso n.2: Sr. J.C

Homem com 88 anos de idade, úlcera de etiologia arterial na face externa da perna direita, com evolução de 1 mês. Foi efectuado desbridamento de extensa área de necrose seca com flutuação e drenagem subjacente, com técnica em tampa. Trata-se de um doente acamado, cujos antecedentes pessoais conhecidos são a hipertensão arterial, hipercoelesterolémia, insuficiência renal crónica, anemia e insuficiência cardíaca congestiva. Foi calculado o IPTB, que era de 0,612 no membro afectado (direito) e de 0,7 no membro contralateral (esquerdo). Apresentava dor intensa, exsudado espesso moderado, tecido de granulação pálido, odor fétido, apenas ligeiro edema maleolar, musculo gemelar atrofiado, pele frágil, brilhante e sem pêlos, fria, rubor pendente e palidez da perna com elevação. Tempo de re-preenchimento do leito ungueal superior a 3 segundos. Trata-se portanto de uma ferida extremamente complexa e com poucas possibilidades de vir a cicatrizar, ou mesmo evitar a amputação do membro que era encarada pelo médico assistente como a hipotese mais provável. Foi medicado com apósito transdérmico de fentanil, com dose ajustavel ao longo do tempo, suplemento de ferro e foram pedidas análises de controlo.

Tratamento local da Ferida: Durante 3 dias foi aplicado Alginato Ag+, de modo a combater a infecção. O apósito secundário consistiu em espuma de poliuretano. Quando se reduziram os sinais de infecção local, foi aplicado alginato de cálcio + Ác. Hialurónico com Iodo e um poliuretano como apósito secundário. A evolução da ferida está representada nas figuras 3 a 10. Em cerca de um mês e meio esta lesão arterial diminuiu 84%.

Figura 3

Figura 4

Figura 5

Figura 6

Figura 7

Figura 8

Figura 9

Figura 10

  • Caso n.3: Sr. G.E.

Homem com 58 anos de idade, pé diabético, com “pé de charcot há cerca de 11 anos, úlcera neuropática na convexidade plantar, desde há 10 anos. Foi efectuado estudo com doppler, tendo sido obtido um IPTB de 0,81, o que sugere doença arterial ligeira apesar de apresentar pouco sinais sugestivos desta patologia no membro inferior, tem inclusive tempo de re-preenchimento leito ungueal inferior a 3 segundos. No membro contralateral tem um IPTB equivalente de cerca de 0,87. Doente com calçado adaptado, mas com necessidade de revisão por técnico da área ou Podologista. De modo a incidir no principal factor etiológico da lesão, o alivio da pressão local passou a ser efectuado com recurso a uma bota de walker.  A lesão apresenta alguma profundidade, cuja aparência é exacerbada pelas volumosas hiperqueratoses que apresenta em todo o bordo da úlcera. Apresenta tecido de granulação pálido, sem tecido necrótico ou depósitos de fibrina. Exsudado moderado, sem odor, sem edema local.

Tratamento anterior com compressa não-aderente com iodo, sendo o penso secundário compressas.

Tratamento: A abordagem terapêutica passou pelo desbridamento das hiperqueratoses para efectuar um “reshape” das margens da úlcera. Uma vez que se trata de uma úlcera com vários anos de duração tentou-se excluir a presença de biofilmes, com a aplicação de polihexanida+betaina em solução e em gel nos primeiros 3 tratamentos (1 dia de intervalo), associado a uma matriz de alginato com prata iónica. Após esta abordagem iniciou-se a aplicação de Ác. Hialurónico com Iodo associado a um poliuretano como penso secundário, sendo o penso efectuado de 2 em 2 dias. Nas figuras 11 a 18, encontra-se a evolução fotográfica e da área da lesão ao longo dos dois meses de tratamento, que levaram à sua cicatrização completa, apesar infelizmente não ter uma foto com a pele completamente integra, é impressionante a evolução que sofreu uma úlcera que teve a sua génese há cerca de uma década atrás.

Figura 11

Figura 12

Figura 13

Figura 14

Figura 15

Figura 16

Figura 17

Figura 18

Considerações Finais

Antes de experimentar o produto a expectativa não era muito grande pois até agora o feedback  disponível acerca da utilização de ácido hialurónico em feridas, era muito “sui generis”, na medida em que produzia alguns casos de sucesso, mas noutras situações aparentemente equivalentes não se conseguia extrapolar o sucesso obtido em situações anteriores. Este tipo de situação veio a esclarecer-se quando se  começou a publicar documentos acerca da necessidade de esterificação do ácido hialurónico e processos de degradação por parte da biocarga da lesão. Estes factos vieram colocar neste principio activo o “rótulo” de apósito duvidoso, sendo que se deixou de ouvir falar deste no meio cientifico durante alguns anos, no que concerne a feridas. No entanto ao sabermos que este não sendo esterificado se torna mais eficaz, resolvia-nos metade do problema, mas criava ou pelo menos agravava outro: as bactéria conseguem degradar o principio activo mais facilmente, pelo que a questão fica resolvida pela adição do iodo. A presença de iodo numa concentração de 0,1% não é citotóxico, controla a carga bacteriana e impede a degradação rápida do Ácido Hialurónico por parte de bactérias colonizadoras. O ácido hialurónico tem na verdade um papel multifacetado na reparação tecidular, desde processos inflamatórios precoces, à formação de tecido de granulação e epitelização. Por sí só não é indicado em feridas infectadas! A sua utilização neste tipo de feridas pode comprometer seriamente a rentabilidade deste e comprometer o processo de cicatrização. Dos estudos de caso efectuados, em situações patológicas verdadeiramente complexas, os resultados obtidos foram extremamente satisfatórios, e fazem com que os cuidadores de pessoa com feridas crónicas estagnadas voltem a olhar com outros olhos para este produto, que surge agora naquela que parece ser a combinação ideal para “desencravar” a ferida crónica.

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Ago 3, 2012

STAGNANT WOUNDS APPROACH: FOSTERING EPITHELIALIZATION

ENFOQUE DE LAS HERIDAS ESTANCADAS: FOMENTAR EPITELIZACIÓN

AUTORES: Vítor Santos, José Marques, Ana Sofia Santos, Bruno Cunha, Marisa Manique

RESUMO

As feridas estagnadas constituem sem sombra de dúvida um dos maiores desafios em tratamento de feridas. O seu principal desafio reside na dificuldade em fazer progredir a cicatrização de uma ferida com um leito da ferida limpo, em foi efectuada a exclusão da presença de biofilmes, sem sinais de infecção, com boa gestão do exsudado e factores patológicos sistémicos do individuo controlados, entre outros aspectos. Ainda assim há feridas que “teimam” em não cicatrizar. É fundamental compreender os mecanismo que permitem o equilíbrio do micro-ambiente da ferida, para que a proliferação celular e os mecanismos de cicatrização não sejam inibidos ou destruídos. Para tal, recorreu-se a uma revisão sistemática de literatura na base de dados EBSCO, de modo a encontrar evidência científica, que possa contribuir para a melhoria da prática clinica.

Palavras chave: feridas, estagnadas, Proteinases

ABSTRACT

Stagnant wounds are without a doubt one of the biggest challenges in wound care. Their main challenge is the difficulty in advancing the healing of a wound with a clean wound bed, with excluded presence of biofilms, without signs of infection, with good management of exudate and systemic pathological factors of the individual controlled among other things. Yet there are wounds that “insist” not to heal. It is essential to understand the mechanisms that enable the balance of the micro-environment of the wound, so that the cell proliferation and healing mechanisms are not inhibited or destroyed. To this end, we used a systematic review of literature in the database EBSCO, in order to find scientific evidence that can contribute to the improvement of clinical practice.

Keywords: wounds, stagnant, Proteinases

Introdução

Um conjunto complexo de eventos, tem lugar após a lesão da pele, com vista à sua cicatrização. Este processo apesar de parecer simples, reveste-se de uma relativa complexidade e apesar da vasta investigação efectuada nesta área, ainda há aspectos por esclarecer, pois mesmo com o aumento do conhecimento na área, e desenvolvimento de novas técnicas e materiais, deparamo-nos diáriamente com feridas estagnadas, que não cicatrizam ou vêem ou seu tempo de cicatrização prolongado, apesar dos nossos melhores esforços. Estamos portanto perante uma problemática que causa ansiedade e stress psicológico aos profissionais e doentes e agrava o impacto financeiro, desde sempre significativo, deste tipo de feridas (EWMA, 2006).

Na maioria dos casos, a abordagem da ferida estagnada, envolve não somente a promoção da granulação, mas principalmente da epitelização. A epitelização é alcançada através da migração de células epiteliais através da superficie da matriz extracelular da ferida, sendo este evento alcançado num ambiente rico em fibroblastos, factores de crescimento, ácido hialurónico, colagénio e fibronectina, sendo a sobrevivência deste tecido delicado altamente dependente de um ambiente húmido devidamente equilibrado (Russell, 2000). Com esta revisão sistemática da literatura, pretende-se uma abordagem estruturada do equilíbrio da matriz extracelular da ferida crónica, com vista à promoção da epitelização.

METODOLOGIA

De modo a efectuar a revisão sistemática, recorreu-se à formação de uma pergunta de investigação, o que permitiu definir os critérios de inclusão/ exclusão: (P) Em relação à pessoa com ferida crónica estagnada, quais as intervenções (I) com vista à promoção da epitelização (O)? O objetivo desta revisão sistemática de literatura é divulgar as opções disponíveis para o equilibrio do micro-ambiente da ferida.

Os critérios de inclusão utilizados privilegiam as revisões sistemáticas da literatura, guidelines de instituições com relevância internacional nesta área, RCT’s e outros estudos do tipo experimental e outroas artigos relevantes; possuam delimitação temporal inferior a 20 anos, exceto no caso dos autores de referência de anos precedentes, que poderão também ser incluídos; estejam disponíveis integralmente. Os critérios de exclusão abrangem os estudos que não obedecem aos critérios de significância (importância que o artigo tem para o tema em estudo, para os clientes, para a enfermagem enquanto profissão e ciência), exequibilidade (disponibilidade ou recursos para desenvolver a pesquisa) e testabilidade (a formulação do problema deve ser mensurável tanto por métodos quantitativos como qualitativos). Excluíram-se também todos os artigos pagos. A revisão bibliográfica resultou da pesquisa eletrónica na Base de dados EBSCO, seleccionando as bases CINAHL e Medline.

Em todas as pesquisas foram procurados artigos científicos publicados em texto integral (05-08-2011), publicados entre 1990 e 2011, assim na primeira pesquisa usamos as seguintes palavras-chave: Wound* AND Epithelialization OR Delayed healing. Através desta pesquisa obtivemos um total de 283 artigos, a partir dos quais foram selecionados apenas 13 artigos.

Funções das MMP’s: Metaloproteinases da Matriz

As metaloproteinases da matriz  (MMPs), que fazem parte da família mais alargada das enzimas metaloproteinases, assumem um papel importante na cicatrização das feridas estagnadas (Russell, 2000; Gibson et al., 2009).

Os substratos naturais para as diferentes MMPs variam substancialmente, mas incluem importantes proteínas da matriz extracelular (MEC)s como o colagénio, a gelatina e os proteoglicanos. As MMPs degradam estas proteínas fragmentando-as em pequenas partes (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003).

A designação “matriz metaloproteinase” (ou “matriz metaloprotease”) indica as propriedades-chave partilhadas pelas MMPs.

Todas elas:

– Preferencialmente, degradam as proteínas que compõem a matriz extracelular dos tecidos (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003)

– Requerem um ião metálico (zinco) no centro activo da enzima (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003)

Em cicatrização de feridas normal, as MMPs são produzidas pelas:

– Células inflamatórias activadas (neutrófilos e macrófagos) (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003)

– Células das feridas (células epiteliais, fibroblastos e células endoteliais vasculares) (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003)

Quando sintetizadas inicialmente, as MMPs permanecem em forma latente (inactivas ou pro-MMP). Elas são activadas por outras proteases que recortam uma parte pequena da molécula. Isto abre o centro activo da molécula MMP e permite à MMP ligar-se ao(s) substrato(s) da sua proteína. Outras células chamadas inibidores de tecido de metaloproteinases (TIMPs) podem inibir as MMPs activadas e bloquear a activação de pro-MMPs (EWMA, 2006; Gibson et al., 2009; Schultz, 2003).

Estas enzimas desempenham papéis essenciais e benéficos em pelo menos cinco processos principais da cicatrização normal, através da remoção de Matriz danificada e bactérias (fase inflamatória), degradação da membrana basal capilar para angiogénese e migração de células epidérmicas (fase proliferativa), bem como na contracção  e remodelação da matriz cicatricial (fase remodelativa) (Gibson et al., 2009)

Assim verifica-se que as MMP’s decompõem a MEC danificada que ocorre na margem de lesões cutâneas agudas. Este facto permite que os novos componentes da MEC (ex. o colagénio, a fibronectina e os proteoglicanos) sintetizados pelas células das feridas se integrem correctamente nos componentes intactos da MEC nos rebordos das feridas (Ayello et al., 2004; Schultz, 2003).

As MMP’s degradam a membrana basal em redor dos capilares. Isto permite às células capilares endoteliais migrar de capilares perto da ferida e constituir vasos sanguíneos novos no leito da ferida (Schultz, 2003). São igualmente necessárias para a migração de células epiteliais, fibroblastos e células vasculares endoteliais. As MMPs segregadas por miofibroblastos são necessárias para a contracção da cicatriz da nova MEC sintetizada. Feridas provenientes de grandes excisões em humanos podem contrair até cerca de 20% da área da lesão inicial. Também na remodelação da cicatriz, necessária pelo facto de as feridas cutâneas inicialmente produzirem uma matriz de cicatrização altamente desorganizada, na qual se continuam a produzir níveis baixos de MMP’s muito depois da cicatriz inicial estar formada. Estas MMP’s removem lentamente a MEC desorganizada, que é gradualmente substituída por uma MEC com estrutura mais normalizada e altamente organizada (Russell, 2000; Gibson et al., 2009; Schultz, 2003; Ayello et al., 2004).

Influência das MMP’s no atraso da Cicatrização

Embora as MMPs tenham o papel importante de degradação das proteínas para que novos tecidos se formem, quando as MMPs estão presentes no leito da ferida em demasiada quantidade, por muito tempo, e nos lugares errados, começam a degradar proteínas que não são o seu substrato normal. Esta situação pode resultar na destruição de proteínas erradas, tais como as proteínas de factores de crescimento, de receptores e da MEC, essenciais para a cicatrização, acabando por comprometê-la. Existem provas substanciais que corroboraram que as MMPs em geral existem em níveis muito elevados nas feridas com atraso na cicatrização comparativamente aos níveis encontrados na cicatrização de feridas agudas (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003).

Os potenciais efeitos danificadores destes níveis elevados são agravados pelo facto de que os níveis de TIMP em feridas crónicas em geral estão ligeiramente inferiores aos das feridas agudas (Russell, 2000; Gibson et al., 2009; Schultz, 2003).

As proteases atraíram as atenções na cicatrização das feridas quando se descobriu que a MEC das feridas que não cicatrizavam não continha fibronectina intacta, uma molécula necessária para a adesão celular e acção de factores de crescimento. Outro aspecto relacionado, é o reaparecimento de fibronectina intacta no leito da ferida à medida que esta fez a viragem no sentido da cicatrização. Vários grupos de investigação vieram a demonstrar que a quantidade de MMP-9 activa está inversamente correlacionada com a velocidade de fecho das feridas, ou seja, níveis elevados de MMP-9 estão correlacionados com reduzidas velocidades de fecho de feridas (Gibson et al., 2009).

Contudo, a capacidade de cicatrização é afectada por um amplo espectro de factores intrínsecos e extrínsecos. Por exemplo, a idade avançada, a medicação (ex. esteróides), a alimentação deficiente, as patologias (ex. diabetes, doença venosa, doença arterial periférica) e a biocarga da ferida podem, cada uma independentemente, interferir no processo de cicatrização. Como descrito, estas características resultam num ambiente hostil na ferida em que tecido novo e factores de crescimento são degradados e a ferida é perpetuada. As feridas nesta situação são frequentemente descritas como “estagnadas” na fase inflamatória da cicatrização, onde podem permanecer meses ou até mesmo ano. (EWMA, 2006; Russell, 2000; Gibson et al., 2009; Schultz, 2003; Ayello et al., 2004)

Novo estímulo para o processo de cicatrização

O objectivo principal da abordagem da ferida estagnada, é fazer pender a balança a favor do processo de reparação. No que se refere à ferida, romper o círculo vicioso  e estimular a cicatrização envolverá:

– Tratar a causa – i.e. reduzir a inflamação (Gibson et al., 2009).

– Gerir as consequências – i.e. reduzir a actividade das proteases mantendo em simultâneo um ambiente húmido na ferida (Gibson et al., 2009).

A redução da actividade excessiva das proteases está focada na ferida e pode ser obtida por (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003):

– Eliminação das proteases – ex. pela absorção de fluidos da ferida ricos em proteínas pelos pensos ou pela eliminação com terapia de pressão negativa

– Redução da actividade das proteases – ex. através pensos à base de colagénio

– Inibição da síntese de MMP.

Quando indicado, a biocarga da ferida pode ser reduzida com pensos antimicrobianos (ex. tecnologias baseadas em prata ou iodo) e antibióticos. No entanto, os antibióticos e os antimicrobianos são menos eficazes no tratamento de bactérias num biofilme, e a sua eliminação física por desbridamento ou por agentes surfactantes, são métodos demonstrados para remoção da carga do biofilme (Schultz, 2003; Ayello, 2004).

Abordagem terapêutica: Controlo das MMP’s

Alguns dos pensos disponíveis no mercado demonstram alguma capacidade para modular a actividade das proteases. Os produtos desenvolvidos para reduzir a actividade proteolítica excessiva e reequilibrar o ambiente da ferida devem, idealmente, desactivar as MMP’s derivadas tanto do hospedeiro como das bactérias. Foi realizada investigação significativa com especial incidência em pensos que actuam para reduzir os níveis de MMP’s pela absorção do exsudado da ferida e através da retenção das proteases na estrutura do penso. De facto, isto limita e desactiva o excesso de MMPs presente no ambiente da ferida (Gibson et al., 2009; Schultz, 2003). Muitos estudos foram publicados acerca do primeiro penso modulador de MMP’s, constituido por celulose regenerada oxidada (ORC) e colagénio, com ou sem prata. Estes ilustram a capacidade deste penso de reduzir a actividade das proteases, eliminar radicais livres e controlar os níveis bacterianos (Martin, 2006). Um estudo clínico controlado randomizado também demonstrou a capacidade dos pensos de colagénio/ORC de reduzirem as proteases, tendo este facto sido correlacionado com um efeito positivo sobre a cicatrização (Martin, 2006).

Também o pH é um aspecto importante no controlo do microambiente da ferida crónica, pois verifica-se que as feridas agudas cicatrizam num meio ácido, como uma resposta fisiológica temporária, resultante de vários factores: 1) produção de ácido láctico; 2) aumento da exigência de O2 e diminuição da perfusão tecidular, com aumento local de pCO2 (Menoita & Santos, et al., 2011). Esta acidose é fisiológica e beneficia o processo de cicatrização. O pH do leito das feridas crónicas encontra-se entre 7,15-8,9 (Menoita & Santos, et al., 2011). Todas aquelas que apresentam um pH mais alcalino apresentam períodos de cicatrização mais demorados (Menoita & Santos, et al., 2011).

 

 

 

 

 

Figura 1: pH da das feridas e cicatrização.

Greener et al (2005) verificaram que a acção das proteases está dependente do pH do meio, como a catepsina G, a plasmina elastase e as MMP-2 que são relevantes para a degradação da matriz provisória (Menoita & Santos, et al., 2011). Foi realizado um estudo a 19 pessoas com feridas crónicas, tendo sido colhidas várias amostras do exsudado. As amostras demonstraram um valor de pH de 7,5-8,9. Os mesmos autores revelam que o pH óptimo para as MMP-2, a plasmina e a elastase é de 8,0 e que uma mudança do pH do leito da ferida para 6,0 implicaria uma diminuição de 40-90% da sua actividade, com implicações sobre a bioquímica da actividade proteolítica, nesta fase (Menoita & Santos, et al., 2011). Rogers et al (1995) encontraram MMP em elevada quantidade no tecido de granulação numa úlcera de pressão, mas com a adição de um produto que acidificasse o meio, verificaram que a sua actividade ficava reduzida (Menoita & Santos, et al., 2011).

Devido o alto teor de ácidos, o pH do mel é de 3,9/3,5. Um estudo realizado por Gethin e Cowman (2006), a 20 feridas crónicas durante um período de duas semanas, concluíram que aquelas que tinham um pH ≤ 7,6 apresentaram uma redução de 30% nas suas dimensões, com a aplicação do mel8. Também a aplicação de maltodextrina + ácido ascórbico, em teoria, é susceptível de induzir este tipo de efeito, apesar da falta de estudos com nível de evidência elevado (Menoita & Santos, et al., 2011).

Existe, também, no mercado uma pomada que controla o pH local da ferida e que modula a actividade das proteases. Esta consiste numa matriz de goma com ligações cruzadas que neutraliza os iões básicos em excesso presentes, conseguindo reduzir o pH para 5. É de ressalvar que esta vai apenas inibir a actividade das proteases, sem provocar a sua desactivação permanente.

Por seu lado o Poliacrilato Super Absorvente, que existe no mercado impregnado com solução de Ringer, ou desidratado, sob a forma de pensos com grande capacidade de absorção, desempenha um importante papel ao neutralizar MMP, absorvendo-as para o seu núcleo, fruto da grande afinidade deste material para com fluídos proteicos (Eming & Smola et al., 2008).

 

 

 

 

 

 

 

Este efeito traduz-se pela redução da actividade das MMP em 88% (Eming & Smola et al., 2008).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Recentemente surgiu no mercado um material que inibe directamente a acção das MMP’s e que promove a acção dos factores de crescimento, o penso impregnado com o factor nano-oligossacarídeo (NOSF) (Schmutz, et al., 2008).

Também o gel tópico de sucralfato, é uma opção bastante válida para o tratamento de feridas crónicas estagnadas, ao promover a angiogénese, o que favorece a formação de tecido de granulação, bem como promove a proliferação de fibroblastos, e logo a formação de colagénio. Estimula ainda o factor de crescimento epitelial (Kouchak et al., 2008).

O ácido hialurónico, é também utilizado desde há muitos anos no tratamento especifico de feridas estagnadas, primeiro sob a forma de apósito seco, absorvível, depois sob a forma de gel mais recentemente, sendo que surge agora associado a antissépticos como a prata ou o iodo em concentrações mínimas, que permitem controlar a colonização critica da ferida. Era esta principal causa de abandono deste tipo de terapêutica, o facto da ferida voltar a estagnar devido a um aumento da carga bacteriana, com o evoluir do tratamento. A sua abordagem é multifacetada, no processo de cicatrização, na medida em que se trata de um componente da matriz extra-celular, responsável pela regulação da hidratação da mesma, facilitando assim a migração de factores de crescimento, células inflamatórias, fibroblastos e queratinócitos. É um forte promotor da angiogénese (e logo, da granulação) e re-epitelização (Slavkovsky, 2010).

Numa segunda linha da abordagem da ferida estagnada, surgem alguns materiais cuja acção incide na regulação do ambiente húmido ideal para a ferida cicatrizar. Um exemplo é o penso de hidrogel com matriz iónica, que promove o equilibrio do ambiente húmido das feridas pouco ou moderadamente exsudativas. Basicamente, o que distingue este material é por um lado a capacidade de fornecer a humidade que a  ferida necessita, sem perda significativa de massa e sem macerar a pele perilesional, sendo que no caso de exsudado ligeiro, tem capacidade para absorção eficaz do mesmo. Existe evidência de que estimula a produção de tecido de granulação e é bastante eficaz no alivio da dor (Armitage, 2004).

Considerações Finais

O controlo do microambiente da ferida estagnada não é uma tarefa fácil para os profissionais de saúde, pois requer uma grande perícia clínica para descartar outras causas mais simples de cronicidade/estagnação, por um lado, bem como uma rigorosa selecção dos materiais a utilizar de acordo com o estadio em que a ferida se encontra, por outro. Esta selecção deve ser criteriosa e não “standardizada”, deve-se procurar o material certo para o doente certo, e não aplicar o mesmo material em todos os doentes sob o pretexto de houve sucesso em casos anteriores, pois este tipo de abordagem deve ser o mais possível custo-efectiva, para o bem dos doentes e sustentabilidade do sistema de saúde. Deve assim imperar o bom senso na selecção dos materiais, e o rigor na análise do doente/ferida e sua história clinica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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(4) Schultz, G. S., Sibbald, R., Falanga, V., Ayello, E. A., Dowsett, C., Harding, K., & Vanscheidt, W. (2003). Wound bed preparation: a systematic approach to wound management. Wound Repair & Regeneration, 11S1-S28.

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 (6) Martin, L. (2011). Healing a chronic wound using Promogran Prisma. Journal of Community Nursing, 25(3), 30-31.

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 (8) Gethin, G., Cowman, S., & Conroy, R. (2008). The impact of Manuka honey dressings on the surface pH of chronic wounds. International Wound Journal, 5(2), 185-194. Disponível em: http://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=rzh&AN=2009988069&site=ehost-live

(9)   Eming S, Smola H, Hartmann B, Malchau G, Wegner R, Krieg T, Smola-Hess S, (2008) The inibition of matrix metalloprotease activity in chronic wounds by a polyacrylate superabsorver. Biomaterials , ISSN: 0142-9612; Vol. 29 (19), pp. 2932-40; PMID: 18400293

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 (10) Schmutz JL; Meaume S; Fays S; Ourabah Z; Guillot B; Thirion V; Collier M; Barrett S; Smith J; Bohbot S; et al.; International Wound Journal, 2008 May; 5 (2): 172-82 (journal article – randomized controlled trial, research) ISSN: 1742-4801 PMID: 18494623

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(11) Kouchak, Maryam; Hemmati, Ali Asghar; Khorasgani, Zahra Nazari; Amiri, Omid. (2008) Toxicology Letters, Oct2008 Supplement, Vol. 180, pS238-S238, 1p; DOI: 10.1016/j.toxlet.

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(12) Slavkovsky, R.; Kohlerova, R.; Jiroutova, A.; Hajzlerova, M.; Sobotka, L.; Cermakova, E.; Kanta, J.. (2010) Clinical & Experimental Dermatology, Vol. 35 Issue 4, p373-379, 7p

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(13) Armitage, Margaret; Roberts, Joan. (2004) British Journal of Community Nursing, Vol. 9 Issue 12, pS16-S22, 6p

Disponível em: http://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=a9h&AN=15399095&site=ehost-live

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Ago 2, 2012

CHRONIC WOUND CLENSING: EVIDENCE BASED APPROACH

LIMPIEZA DE LAS HERIDAS CRÓNICAS: UN ENFOQUE BASADO EN LA EVIDENCIA

AUTORES: Vítor Santos, José Marques, Ana Sofia Santos, Bruno Cunha, Marisa Manique

RESUMO

Cada vez mais se constata a importância de uma efectiva limpeza das feridas crónicas na preparação do leito de feridas crónicas. É fundamental enraizar na prática clínica conhecimentos decorrentes da evidência cientifica que nos orientem acerca de como limpar de forma o mais eficaz possivel as feridas, com indicação para esse efeito, bem como, saber quando essa limpeza deve deixar de ser uma rotina e ser adaptada ou talvez mesmo não ser efectuada. Assim, apresenta-se uma abordagem estruturada da limpeza de feridas crónicas, tendo-se recorrido a revisão sistemática de literatura na base de dados EBSCOhost, de modo a legitimar a evidência obtida, com o maior rigor científico, de modo a construir mais uma ferramenta de trabalho a disponibilizar a quem trata de feridas.

Palavras chave: feridas, limpeza, biofilme

ABSTRACT

It is increasingly noted the importance of an effective cleaning of chronic wounds in wound bed preparation. It is rooted in fundamental clinical knowledge from the scientific evidence to guide us on how to clean up wounds on the most effective way possible, if indicated, as well, as knowing when this cleansing stops being a routine and  should be adapted or may not even be made. Thus, it presents a structured approach to the cleaning of chronic wounds, having been resorted to systematic literature review on the EBSCOhost database, in order to legitimize evidence obtained, with greater scientific rigor in order to build more tools to provide the work of those who treat wounds.

Keywords: wound, cleansing, biofilm

Introdução

O desenvolvimento da investigação científica, nos últimos anos, tem permitido uma constante actualização de conhecimentos na área do tratamento de feridas. No entanto, a utilização de produtos sofisticados e dispendiosos, no tratamento de feridas, apenas se justifica se for possível garantir a formação de um leito da ferida saudável, através da sua adequada preparação5. A preparação do leito da ferida é um conceito, que proporciona uma abordagem estruturada no tratamento de feridas crónicas. As componentes da preparação do leito da ferida e da ferramenta TIME (tratamento do tecido, controlo da inflamação e infecção, equilíbrio da humidade e avanço epitelial/margens) endereçam as diferentes anormalidades fisiopatológicas subjacentes às feridas crónicas. A limpeza das feridas crónicas é um procedimento transversal a todos os componentes desta ferramenta, embora surja mais frequentemente associada ao “T”, no que respeita ao tratamento do tecido. Frequentemente, se verifica que a preparação do leito da ferida, através da utilização de soluções e métodos adequados, é desvalorizada e realizada de modo diferente, pelos profissionais de saúde.

Com esta prática recomendada, baseada numa revisão sistemática da literatura, pretende-se uma abordagem estruturada da limpeza de feridas crónicas.

METODOLOGIA

Uma vez definida a nossa problemática continuámos a desenvolver o processo de revisão sistemática, recorrendo à formação de uma pergunta de investigação, o que permitiu definir os critérios de inclusão/ exclusão: (P) Em relação à pessoa com ferida, quais as intervenções (I) com vista à limpeza dessa mesma ferida (O)? Com esta revisão sistemática de literatura pretende-se sistematizar a evidência disponível no concerne às boas práticas para a limpeza de feridas.

Os critérios de inclusão utilizados privilegiam as revisões sistemáticas da literatura, guidelines e RCT’s; possuam delimitação temporal inferior a 20 anos, exceto no caso dos autores de referência de anos precedentes, que poderão também ser incluídos; estejam disponíveis integralmente.

Os critérios de exclusão abrangem os estudos que não obedecem aos critérios de significância (importância que o artigo tem para o tema em estudo, para os clientes, para a enfermagem enquanto profissão e ciência), exequibilidade (disponibilidade ou recursos para desenvolver a pesquisa) e testabilidade (a formulação do problema deve ser mensurável tanto por métodos quantitativos como qualitativos). Excluíram-se também todos os artigos pagos. A revisão bibliográfica resultou da pesquisa eletrónica na Base de dados EBSCO, seleccionando as bases CINAHL e Medline.

Em todas as pesquisas foram procurados artigos científicos publicados em texto integral (09-06-2011), publicados entre 1999 e 2011, assim na primeira pesquisa usamos as seguintes palavras-chave: Chronic Wound* AND Cleansing OR Cleaning. Através desta pesquisa obtivemos um total de 291 artigos, a partir dos quais foram selecionados 8 artigos.  Assim, como resultado da pesquisa efetuado, reunimos um total de 7 artigos acerca da temática em estudo

Porquê limpar e como limpar as feridas crónicas?

As feridas crónicas têm um impacto financeiro significativo nos sistemas de saúde e afectam negativamente a qualidade de vida. Logo, a limpeza de feridas, constitui uma importante componente na sua abordagem (Moore, 2008). É necessário remover os tecidos mortos e corpos estranhos antes de serem aplicados os penso(Moore, 2008). A presença de tecido necrótico, o excesso de exsudado, resíduos dos apósitos e resíduos metabólicos na superfície desta, podem impedir a cicatrização e aumentar o potencial de infecção (Barr, 1995, citado por Williams,1999).

Contudo, há dúvidas acerca dos melhores métodos de limpeza (Moore, 2008). Clínicos e investigadores recomendam um elevado número de métodos, o que poderá levar a algumas incertezas e dúvidas (Moore, 2008).

Blunt (2001), citado por Moore e Cowman (2008), defende que a limpeza da ferida pode ter um impacto positivo na sua cicatrização, no entanto, é uma prática que é realizada sem sustentação evidente. Além disto, Briggs & Closs (2006), citados por Moore e S. Cowman (2008), encontraram outros estudos que referem que a limpeza da ferida, contribui para um aumento da dor durante o tratamento. Defende-se ainda, que deve ser dada mais atenção à escolha do tratamento a usar e à possibilidade deste causar efeito negativo na qualidade de vida do paciente.

Um estudo de Mahe et al (2006), citado por Moore e Cowman (2008), verificou ainda que os antissépticos são usados para limpeza da ferida, mesmo sabendo que estes não são considerados como a primeira linha de limpeza. Logo, uma larga proporção das feridas não é gerida de maneira efectiva, destacando-se a necessidade de esclarecer a melhor prática. Desta forma, torna-se evidente que existe pouca informação que permita clarificar a importância da limpeza da ferida, na gestão das feridas crónicas.

Segundo Magson-Roberts (2006), citado por Cabete et al (2006), existem três componentes essenciais para o sucesso na limpeza de feridas. São eles: a técnica, a escolha do equipamento e o agente de limpeza.

Contudo, a limpeza é, muitas vezes, inconsistente entre os Profissionais de Saúde e entre os diferentes estabelecimentos de saúde, não existindo uniformidade quanto ao tipo de soluções e técnicas utilizadas. A prática ritualista, sobrepõe-se à Prática Baseada em Evidências científicas, o que é atribuído à falta de conhecimento na gestão dos cuidados à ferida e à falta de directrizes para orientar a prática. No que respeita técnicas salientam-se três técnicas para limpeza da ferida (Williams, 1999):

  • Swabbing: pode danificar o novo tecido de granulação formado, devendo ser evitado se possível;
  • Irrigação: as pressões aplicadas nos tecidos é uma componente muito importante, visto que as altas pressões podem danificar o tecido de granulação e epitelização. Deste modo, deve ser usada uma pressão óptima, que permita não danificar os tecidos;
  • Banho: São formas de banho agressivas que utilizam a turbulência da água para remover detritos. Aconselha-se antes o uso do duche, que ultimamente tem sido usado em feridas crónicas;

No que respeita a soluções, a primeira escolha para as feridas que não estão contaminadas são a Água Esterilizada, Solução Salina normal ou Água da Torneira (Williams, 1999). Se os profissionais de saúde usam antissépticos como agentes bactericidas e bacteriostáticos, a sua efectividade deve ser avaliada devido aos efeitos nocivos que estes poderão causar ao tecido saudável (Williams, 1999). O Hipoclorito de Sódio não deve ser usado, por danificar o tecido (Williams, 1999).

De salientar ainda a importância a dar à temperatura da ferida, pois a actividade mitótica abranda quando a temperatura das feridas baixa. A ferida após a limpeza, pode demorar 40 minutos para retomar a sua temperatura original e três horas para a actividade mitótica retomar a sua plenitude (Williams, 1999). Desta forma, as soluções devem ser aquecidas e as feridas não devem ficar muito tempo expostas ao ar, pois também arrefecem desta forma (Williams, 1999).

Também a gestão dos biofilmes surge como um aspecto cada vez mais importante a ter em conta na abordagem da ferida crónica, aquando da sua limpeza, pois a presença de bactérias, apesar da irrigação da ferida com Soro Fisiológico, que tem sido defendida como o método mais adequado de irrigação, leva muito frequentemente à formação destes biofilmes, conhecidos por serem resistentes a este método de limpeza e irrigação, bem como ao tratamento com antibióticos (Horrocks, 2006). Os biofilmes consistem em diferentes tipos de bactérias que se agregaram na superfície da ferida numa matriz de polissacarídeo extracelular (Horrocks, 2006).

O produto terapêutico de eleição actualmente para este tipo de casos, é a solução de Polihexametileno Biguanida (PHMB) com Betaína, uma solução de limpeza incolor que contém agentes hidratantes e PHMB um antisséptico não citotóxico, sendo indicada para feridas crónicas. A betaína é um alcalóide surfactante que tem alta solubilidade em água e induz um efeito de stress osmótico aumentando a solubilidade e melhorando a limpeza, através da baixa tensão superficial induzida pelo surfactante, que ajuda na remoção de detritos e bactérias (Cutting, 2010).

Deste modo, conclui-se que a limpeza e irrigação da ferida devem criar condições óptimas de forma a não complicar a cicatrização, removendo os detritos antes da aplicação do novo apósito.

Conclusão

Posto isto, como fruto da revisão sistemática da literatura efectuada, propõem-se como esquema de actuação para a limpeza de feridas crónicas:

1-       No que diz respeito aos solutos de limpeza, considera-se a Solução Salina, como a solução ideal, pelas suas propriedades isotónicas e por não interferir no processo de cicatrização. Este soluto, não causa dano no tecido, não provoca sensibilização ou alergia, nem altera a flora bacteriana normal da pele (Atiyeh et al., 2009; Bee et al., 2009; Fernandez et al., 2010);

2-       No entanto, vários autores recomendam a Água da Torneira para limpeza de feridas crónicas, afirmando que esta é eficiente ao nível do custo efectivo e de fácil acessibilidade, não se verificando efeitos adversos (Atiyeh et al., 2009; Bee et al., 2009; Fernandez et al., 2010; Cutting, 2010)

3-       Convém referir que só pode ser usada se for potável e deve correr 15 segundos antes de ser utilizada (Joanna Brigs Institute, 2006), além de que, deve ter em conta a natureza das feridas e o estado geral da pessoa (Fernandez et al., 2010).

  1. Em Feridas Crónicas pode ser feita a limpeza com Água Potável, se a Solução Salina estiver indisponível (Joanna Brigs Institute, 2006), assim como também pode ser utilizada a água fervida e arrefecida (Joanna Brigs Institute, 2006; Atiyeh, 2009)
  2. Alguns estudos, referem que não existem diferenças estatisticamente significativas em feridas limpas com Solução Salina, comparadas com a Água (Cutting, 2010; Moore, 2008). Sendo assim, para as feridas que não estão contaminadas pode ser utilizada Água Esterilizada, Solução Salina Normal ou Água da Torneira (Williams, 1999)

4-       Por outro lado, vários autores desaconselham o uso de antissépticos em feridas abertas, uma vez que podem conter detergentes, tornando-se agressivos para o tecido em formação. Deste modo, afectam as células normais, alterando negativamente o tecido normal de reparação (Atiyeh, 2009). Contudo, outros autores referem que estas soluções podem ser usadas apenas a título excepcional e com precaução, uma vez que a sua toxicidade pode superar qualquer benefício (Atiyeh, 2009).

  1. Se os profissionais usam antissépticos como agentes bactericidas, a sua efectividade deve ser avaliada, devido aos efeitos nocivos que estes poderão causar ao tecido saudável (Williams,1999), nomeadamente nos queratinócitos e fibroblastos (Atiyeh, 2009). Os queratinócitos que existem na camada basal da epiderme, são mais sensíveis a agentes de limpeza tais como: Peróxido de Hidrogénio, Solução de Dakin, Iodopovidona (Atiyeh, 2009).
  2. Apesar de ser considerado inócuo o Peróxido de Hidrogénio danifica uma série de componentes celulares. É necessário aplicar grandes concentrações, devido a actividade da catálase das principais bactérias patogénicas (Atiyeh, 2009)
  3. O Hipoclorito de Sódio não deve ser usado por danificar o tecido (Williams, 1999).
  4. Relativamente à utilização de soluções de Iodopovidona, estudos demonstram, que mesmo soluções diluídas são tóxicas para os fibroblastos humanos. Esta solução inibe fortemente o crescimento celular, que em concentrações superiores a 0,1% inibe fortemente a actividade mitótica (Balin, 2002). Além disto, verifica-se uma menor taxa de cicatrização de feridas em doentes tratados com altas concentrações de Iodopovidona (Atiyeh, 2009; Balin, 2002).
  5. A solução de PHMB com Betaína, é adequada para a preparação do leito da ferida, remoção do biofilme, gestão de odores, redução do nível de exsudado, bem como redução da dimensão da ferida (Atiyeh, 2009; Horrocks, 2006). Além disto, é altamente histocompatível, não citotóxica, sendo uma das soluções mais utilizadas actualmente, incluindo em feridas infectadas com MRSA (Atiyeh, 2009).

5-       No que diz respeito às técnicas utilizadas na limpeza de feridas crónicas, verifica-se que esfregar e irrigar, são as técnicas mais comuns de limpeza (Bee, 2009). No entanto, esfregar uma ferida não remove da superfície as bactérias, mas redistribui-as, podendo ainda, introduzir corpos estranhos e traumatizar os novos tecidos de granulação e epitelização (Bee, 2009; Williams, 1999).

  1. Pelo contrário, a lavagem por irrigação, assegura uma limpeza adequada do leito da ferida (Bee, 2009; Williams, 1999)
  2. Outro factor a ter em conta, é a pressão durante a irrigação (Bee, 2009). A pressão excessiva, pode conduzir os detritos do leito da ferida, para a profundidade, mas por outro lado, a pressão insuficiente é ineficaz, para remover os detritos ou exsudado (Bee, 2009). Considera-se que a irrigação com pressão compreendida entre 5 – 8 psi, é o método mais eficaz de limpeza (pressão obtida com uma seringa de 20 ml adaptada a uma agulha ou catéter de 18 G) (Atiyeh, 200; Bee, 2009)

6-       Relativamente ao equipamento, verifica-se que os profissionais de saúde, devem privilegiar o uso de luvas e compressas de tecido-não-tecido, em oposição às pinças ou às compressas de gaze. Estas, podem deixar resíduos no leito da ferida, atrasando a cicatrização. Além disto, as pinças não são ser fáceis de usar pela maioria dos profissionais e não impedem a contaminação da ferida (Williams, 1999). A irrigação da ferida prevalece como método mais eficaz (Moore, 2008; Williams, 1999)

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Jul 30, 2012

ROLE OF BIOFILMS IN CHRONIC WOUNDS

PAPEL DE LOS BIOFILMS EN LAS HERIDAS CRÓNICAS

AUTORES: Elsa Menoita, Vítor Santos, Cláudia Gomes , Ana Sofia Santos

Resumo

Começa a amplamente aceite, que as feridas crónicas na sua maioria apresentam biofilme e que este representa um importante potencial infeccioso. O que importa considerar também é o importante papel que este desempenha ao perpetuar o estímulo inflamatório que caracteriza a ferida crónica. A sua complexidade confere-lhe essa capacidade para induzir a libertação de proteinases e outros factores inflamatórios, enfraquecendo o organismo, danificando o leito da ferida e no fundo comprometendo todo o processo de cicatrização. Caracteriza-se ainda por apresentar multiplos mecanismos de resistência às abordagens terapêuticas tradicionais, o que acentua o seu cariz de factor de cronicidade. A necessidade estratégias terapêuticas especificas para esta entidade, é urgente.

Palavras chave: Biofilmes, Cicatrização, Ferida Crónica

Abstract

It is becoming widely accepted that biofilm is present in most of chronic wounds and that it represents an important potential for infection. It is also important to consider the important role it plays in perpetuating the inflammatory stimulus that characterizes the chronic wound. Its complexity gives it the ability to induce the release of proteinases and other inflammatory factors, weakening the organism, damaging the wound bed and compromising the entire healing process. It is still characterized by presenting multiple mechanisms of resistance to traditional therapeutic approaches, which enhances its factor of chronicity nature. The need for specific therapeutic strategies for this entity, is urgent.

Key words: Biofilms, Wound Healing, Chronic Wound

1. Introdução

Os biofilmes desempenham um papel importante na natureza e em processos tecnológicos. Do ponto de vista do interesse do Homem podem ser benéficos ou prejudiciais. Como exemplo de biofilmes benéficos existem aqueles que se acumulam em ambientes naturais nos depósitos dos rios, lagos ou ambientes marinhos, e que se desenvolvem em associação com as raízes de algumas plantas, fornecendo-lhes alguns nutrientes. São também biofilmes benéficos aqueles que são utilizados em biotecnologia ambiental com grande sucesso no tratamento de efluentes, removendo poluentes orgânicos e inorgânicos de águas contaminadas. Na indústria alimentar, os biofilmes apresentam inúmeras vantagens, podendo ser utilizados na produção de alimentos fermentados, como por exemplo, na produção de vinagre. Contudo, na maioria das situações, a adesão de microrganismos a superfícies sólidas é indesejável, pois, de uma maneira geral, está associada à deterioração das superfícies e/ou ambiente circundante.

1.1. Biofilmes e a cronicidade

Aos biofilmes estão associados a um grande número de problemas de saúde, tais como infecções em tecidos, infecções do trato urinário, infecções desencadeadas por dispositivos médicos, como cateteres vasculares, infecção e consequente rejeição de próteses e implantes e infecções da placa dentária, entre outras (Costerton et al., 1999). No entanto, a ecologia e a gestão dos biofilmes ainda não são bem conhecidos na medicina (Costerton, et al., 1999 citados por Wolcott & Rhoads, 2008). Pelo menos a sua valorização na prática clinica, ainda não atinge a relevância devida e isso é comum a todas as áreas da prestação de cuidados de saúde.

Nos últimos anos, constatou-se que os biofilmes têm um papel preponderante na patogenese de numerosas infecções que não envolvem bio-materiais. De facto, cerca de 65% das infecções humanas de etiologia bacteriana poderão envolver biofilmes (Costerton, et al. 1999; Potera, 1999). The National Institutes of Health (NIH) sugere, mesmo, que 80% das doenças infecciosas é causada por biofilmes podendo causar infecções crónicas (Association for the Advancement of Wound Care, 2008; Wolcott & Rhoads, 2008; Rhoads et al., 2008; Widgerow, 2008). De acordo com Wolcott (2010), há mais de 14 milhões de infecções por biofilme nos EUA cada ano, resultando em mais de 350.000 mortes – uma taxa de mortalidade semelhante à do cancro. Os consórcios de biofilmes podem, mesmo, serem agentes causais de infecções graves em indivíduos imunocomprometidos (Costerton et a.l, 1999). Assim, todos estes dados epidemiológicos, devem servir de alerta para um problema grave, que deve ser encarado como real, as estratégias para o seu controlo devem ser mobilizadas e até mais desenvolvidas.

Rhoads et al. (2008) referem que, as bactérias isoladas em feridas crónicas são geralmente cultivadas e estudadas através de métodos tradicionais aplicáveis somente às bactérias em estado planctónico. No entanto, as bactérias planctónicas cultivadas em laboratório comportam-se de forma diferente das bactérias em biofilme localizadas no leito das feridas crónicas.  É já sobejamente conhecido que mais de 99% das bactérias encontradas na natureza existem em estado séssil, formando biofilmes (Widgerow, 2008), e crê-se que o mesmo se aplica às feridas crónicas (Rhoads et al., 2008). Os biofilmes são de um modo geral heterogéneos, contendo mais do que um microambiente distinto, por exemplo, no mesmo biofilme podem ser encontrados estratos aeróbios e estratos anaeróbios (Characklis & Marshall, 1989; Van Der Wende & Characklis, 1990), apesar de que, de acordo com Flemming (1993) cerca de 70 a 95% da matéria orgânica da massa seca do biofilme seja constituido por substância polimérica extracelular (“Extracellular Polymeric Substances” – EPS).

A presença de biofilme no leito da ferida crónica tem vindo a ser mencionado em estudos há vários anos (Mertz, 2003; Welsh, et al., 2003, Serralta et al., 2001, Bello et al., 2001, citados por Wolcott & Rhoads, 2008), mas actualmente há evidências concretas da sua presença (James et al., 2008).

Num estudo realizado num  modelo suíno, por microscopia eletrónica e microscopia confocal a laser, verificaram, em queimaduras infectadas por Pseudomonas aeruginosa, que as bactérias se encontravam envolvidas numa matriz polimérica (Serralta et al., 2001, citados por Cooper, 2010).

Quadro 1: Forma planctónica versus biofilme: explicação para as observações clínicas
Adaptado: Wolcott (2008) – A study of biofilm-based wound management in subjects with critical limb ischaemia.

Noutra ocasião foi efectuado um estudo de referência por James et al. (2008), citados por Phillips et al., (2010) e Wolcott e Rhoads (2008), através de microscopia de imagem electrónica a 50 feridas crónicas e 16 agudas. Os autores verificaram que, 60% das feridas crónicas possuíam biofilme e apenas 6% das feridas agudas apresentavam biofilme

(Steinberg, 2011; James et al., 2008; Widgerow, 2008). Estes resultados sugerem para os autores que, não só as feridas crónicas apresentavam biofilme, como, também, a sua presença pode prejudicar a cicatrização, contribuindo para a cronicidade das feridas. Wolcott e Rhoads (2008) corroboram esse facto, sublinhando que, os biofilmes podem ser uma das causas da cronicidade das feridas. Phillips et al., (2010) consideram, mesmo, que é provável que quase todas as feridas crónicas tenham biofilme, em pelo menos uma parte do leito da ferida.

Curiosamente, a libertação “deliberada” de bactérias planctónicas do biofilme tem sido proposto para manter uma resposta inflamatória em feridas (Wolcott et al., 2008 citados por Cooper, 2010).

De um microrganismo plantónico a uma comunidade complexa com impressionantes defesas, incluindo um aumento da resistência aos antibióticos, biocidas, e imunidade humana, pode levar somente 10 horas (Fux, et al., 2005, citados por Wolcott & Rhoads, 2008; Widgerow, 2008).

Já de acordo com Costerton (1984) e Bester et al. (2010) citados por Phillips et al. (2010), estudos experimentais têm mostrado que as bactérias planctónicas (como por exemplo, estafilococos, estreptococos, Pseudomonas e Escherichia coli), geralmente:

– Fixam-se em poucos minutos;

– As microcolónias formam-se dentro de 2-4 horas;

– A EPS forma-se em 6- 12 horas, tornando o biofilme cada vez mais resistente a biocidas e a antibióticos;

– O biofilme maduro pode começar a desprender bactérias planctónicas dentro 2-4 dias.

– Um biofilme maduro depois de libertar células bacterianas pode recuperar num espaço temporal de 24 horas.

Stoodley et al. (2001), citados por Association for the Advancement of Wound Care (2008), também, referem que o biofilme leva cerca de 24 horas para restabelecer a sua biomassa. Estes achados experimentais são fundamentais para a gestão dos biofilmes, pois significa que depois de desencadear a ruptura de células bacterianas planctónicas com desbridamento e tratamento tópico, como por exemplo com surfactantes, há uma janela de oportunidade de 24 horas, utilizando antimicrobianos, de forma a não se recuperarem.

Um biofilme pode se reconstituir numa ferida por (Phillips et al., 2010):

– Crescimento a partir de bactérias planctónicas deixadas pelo desbridamento / limpeza;

– Crescimento por  microorganismos  recém  introduzidos.

Segundo Gibson et al. (2009), parece provável que, em muitos casos, as feridas agudas sejam colonizadas por bactérias que em dias se transformam em bactérias de biofilme persistente, estabelecendo uma fonte inflamatória a longo prazo. Numa fase inflamatória prolongada existe um estímulo pró-inflamatório constante, com aumento de libertação de neutrofilios e leucócitos para o leito da ferida. Estes libertam espécies reactivas de oxigénio (ERO) e enzimas (Philipps et al., 2010).

As espécies reactivas de oxigénio são moléculas capazes de modificarem outras moléculas, como proteínas, hidratos de carbono, lipídos e o ácido desoxirribonucléico (DNA). Estas desenvolvem-se a partir do metabolismo aeróbio do oxigénio, causando stress oxidativo.  As ERO podem romper a membrana lipoproteica, destruir as funções enzimáticas celulares, alterar o DNA e conduzir à morte celular.

As enzimas produzidas pelas células inflamatórias são proteínas que facilitam reacções biológicas e que geralmente actuam sobre um número limitado de moléculas (conhecidas como substratos das enzimas), transformando-as fisicamente noutras substâncias. As proteinases (também conhecidas como proteases) são enzimas que actuam sobre as proteínas, geralmente fragmentando a molécula da proteína (Gibson et al., 2009; Schultz et al., 2009). Uma família especifica de proteinases,  as metaloproteinases da matriz – MMP’s, são prticularmente nocivas para o leito da ferida. Os substratos naturais para as diferentes MMPs variam substancialmente, mas incluem importantes proteínas da matriz extracelular (MEC), como o colagénio, a gelatina e os proteoglicanos. As MMPs degradam estas proteínas fragmentando-as em pequenas partes.

Segundo Gibson et al. (2009), a designação “matriz metaloproteinase” (ou “matriz metaloprotease”) indica as propriedades-chave partilhadas pelas MMPs. Todas elas, preferencialmente, degradam as proteínas que compõem a matriz extracelular dos tecidos e requerem um ião metálico (zinco) no centro activo da enzima. Rhoads et al. (2008) defendem que, provavelmente, o biofilme pode desencadear uma resposta imunitária com aumento de MMP, como a MMP -2, MM-8, MMP -9 e a elastase, para além de desencadear senescência com incapacidade funcional dos fibroblastos, queratinócitos, e das células endoteliais para iniciar a angiogénese.

Quando sintetizadas inicialmente, as MMPs permanecem em forma latente (inactivas ou pro-MMP). Elas são activadas por outras proteases que recortam uma pequena parte da molécula, abrindo o centro activo da molécula MMP, permitindo ligar-se ao(s) substrato(s) da sua proteína. Outras moléculas designadas como inibidores de tecido de metaloproteinases (TIMPs) podem inibir as MMPs activadas e bloquear a activação de pro-MMPs (Gibson et al., 2009).

Enquanto a maioria das MMPs é segregada para a MEC (matriz extracelular) circundante, algumas MPPs mantêm-se associadas a membranas celulares, sendo conhecidas como MMPs “tipo membrana” (MMP-TPs). Pensa-se que este grupo de MMPs desempenha um papel importante na activação de pro-MMPs, bem como na activação de pro-TNF (factor de necrose tumoral – um mediador  importante envolvido na inflamação e morte celular) (Gibson et al., 2009).

As MMPs, que essenciais para a cicatrização em feridas agudas, tornam-se prejudiciais nas crónicas, destruindo ou corrompendo continuamente as proteínas essenciais da MEC (Gibson et al., 2009; Schultz et al., 2009). Adicionalmente, as proteinases captam os factores de crescimento, tornando-os indisponíveis para o processo de cicatrização.

1.2. Mecanismos de resistência de bactérias

A capacidade de sobrevivência do biofilme é um resultado de estratégias de adaptação desenvolvidas ao longo de milhões de anos (Association for the Advancement of Wound Care, 2008).

Um dos grandes avanços da medicina tem sido o controlo de infecções através do uso de antibióticos, contudo estes têm uma eficácia limitada nos biofilmes, podendo estes ser mil vezes mais resistentes a antibióticos do que o mesmo organismo em forma plantónica, sendo ainda parcialmente protegidos da acção destruidora dos fagócitos (Davey & O’toole, 2000). Para Wolcott et al. (2009), os biofilmes podem 50 a 1500 vezes mais ser resistentes aos antibióticos. Os biofilmes bacterianos são muito resistentes à eliminação efectuada pelos anticorpos do hospedeiro, pelas células inflamatórias, pelos antibióticos e pelos antissépticos (Gibson et al., 2009; James et al., 2008; Costerton J, Stewart, 2001). Wolcott e Rhoads (2008) corroboram, defendendo que o sistema imunitário e os antibióticos são mais bem-sucedidos em destruir bactérias individuais do que em biofilmes.

Para além das já mencionadas resistências, os biofilmes demonstram, também, resistência acrescida à radiação UV (Elasri & Miller, 1999) e à desidratação, pois a matriz de EPS é altamente hidratada. Flemming (1991) e Mittelman (1998) acrescentam, defendendo que os biofilmes têm processos de protecção contra factores ambientais agressivos, como por exemplo as flutuações de pH, concentração de sais, desidratação, substâncias químicas agressivas, agentes bactericidas (biocidas), predadores, antibióticos.

Existem algumas explicações que defendem as suas multi-resistências, tais como as que iremos explanar.

  1. O desenvolvimento preferencial em superfícies inertes, tecidos mortos e instrumentos médicos (Costerton et a.l, 1999, Yasuda et al., 1994).
  2. A capacidade para estabelecer e colonizar nichos ecológicos (Flemming, 1991; Mittelman, 1998).
  3. A facilidade de desenvolvimento de microconsórcios que permitem o estabelecimento de relações de simbiose, bem como a utilização de substratos de difícil degradação (Flemming, 1991; Mittelman, 1998). Os biofilmes são ambientes ideais para o desenvolvimento de relações sintróficas, que é um tipo de simbiose onde dois tipos de organismos metabolicamente distintos dependem um do outro para utilizarem certos substratos, na produção de energia.
  4. A matriz polimérica parece funcionar como uma barreira protectora contra factores agressivos externos – efeito Blocking (Phillips et al., 2010). De acordo com alguns autores, esta matriz EPS tem o potencial de prevenir o acesso físico de certos agentes antimicrobianos (Allison, 2003; Elvers & Lappin-Scott, 2000;).
  5. O quorum sensing regula actividades celulares, como a produção de metabolitos, como enzimas citotóxicas, conforme já referido. Loryman e Mansbridge (2007), citados por Steinberg (2011), observaram que o efeito do quorum sensing inibia a migração de queratinócitos.
  6. O aumento da concentração de nutrientes nas interfaces líquido-biofilme uma vez que a matriz polimérica favorece a adsorção de moléculas de nutrientes (Flemming, 1991; Mittelman, 1998).
  7. Os componentes da membrana externa das bactérias envolvidos na aderência, tais como pili, e a actividade flagelar por parte das células fixas inicialmente, designada por twitching motility, são necessárias para o desenvolvimento de biofilmes, como a de P. aeruginosa (O’Toole & Kolter, 1998).
  8. O crescimento lento dos biofilmes é um factor facilitador à resistência (Costerton et a.l, 1999; Yasuda et al., 1994). Estas microcolónias têm ecologia diferente das formas planctónicas, pois elas proliferam mais devagar, prejudicando, portanto, a sua resposta a muitos antibióticos que agem essencialmente quando as células se encontram na fase mitótica. De acordo com Phillips et al. (2010), as bactérias em biofilme podem se encontrar, mesmo, em estado de hibernação, conforme já referido, em que as células estão metabolicamente quiescentes. As bactérias precisam de ser metabolicamente activas para poderem ser eliminadas pelos antibióticos.
  9. A libertação de antigénios que levam à produção de anticorpos específicos e formação de imunocomplexos que podem provocar lesões nos tecidos adjacentes (Phillips et al., 2010; Costerton et a.l., 1999).
  10. A possibilidade de troca de material genético devido aos longos tempos de retenção dos microrganismos (Flemming, 1991; Mittelman, 1998). Assim, esta comunidade bacteriana adquire novas informações genéticas. O designado processo de conjugação, ou seja, o mecanismo de transferência de plasmídios (porções de DNA), ocorre a uma taxa superior entre células em biofilmes do que entre células livres (Roberts et al. 1999; Steinberg, 2011), e estirpes de relevância médica contendo certos plasmídios demonstram maior tendência para a formação de biofilmes (Ghingo, 2001). Assim, com esse mecanismo, uma mesma bactéria pode adquirir resistência simultânea contra diversos antibióticos diferentes das bactérias vizinhas (Steinberg, 2011; Phillips et al., 2010).
  11. Apresentam processos de transferência diferentes (Stewart, 2003), ou seja, as implicações físicas do crescimento em sistemas geometricamente tão diferentes, como o caso dos biofilmes em comparação com as células livres. Em culturas de células livres ou planctónicas, o transporte de solutos do meio líquido (normalmente bem homogeneizado) para uma célula, ou vice-versa, é um processo relativamente rápido, não constituindo um passo limitante na totalidade dos bioprocessos que ocorrem na célula. Agregados microbianos, no entanto, são ambientes densamente empacotados onde o fluxo de líquido é limitado. Apesar do facto de se observar fluxo de líquido ocorrendo nos canais de água dos biofilmes (De Beer et al. 1994; Stoodley et al., 1994), nos agregados em si, toda a transferência de massa se dá através de difusão (De Beer et al., 1994), um processo muito mais lento. Este facto é ainda agravado por limitações difusionais acrescidas, causadas pela matriz do biofilme (Stewart, 2003). Em agregados microbianos suficientemente espessos, usuais em biofilmes, as distâncias difusionais são suficientemente grandes para que o transporte de solutos de e para as células bacterianas interiores se torne lento em comparação com as cinéticas de bioprocessos dos microrganismos. Nestas situações formam-se gradientes de solutos no biofilme, e a transferência de massa torna-se num processo limitante para os bioprocessos (Characklis et al., 1990). Limitações de transferência de massa que impedem penetração eficiente de antibióticos no biofilme são também, frequentemente, apontadas como possíveis causas para a resistência a antibióticos.

De acordo com Donlan e Costerton (2002) e Gilbert et al. (2003), as limitações difusionais à passagem do agente pela matriz extracelular, são muitas vezes acompanhados por alterações/mutações fenotípicas das células no biofilme e ainda com o desenvolvimento de mecanismos de resistência por alteração do genótipo das células.

Nestes ambientes em limitação de transporte de solutos, os gradientes de concentração formados constituem condições favoráveis para a criação de micro-nichos. Baixas concentrações de oxigénio podem originar micro-ambientes propícios à proliferação de organismos anaeróbios, apesar da presença de oxigénio em solução no meio líquido.

Em suma, a resistência ocorre em função de inúmeros factores inter-relacionados, incluindo actividade metabólica diferencial, barreiras de difusão e ultra-estrutura da parede celular.

É fundamental, ainda, fazer a diferenciação dos 3 tipos de resistência: 1) resistência natural ou inerente ou intrínseca; 2) resistência adquirida devido à mutação e, 3) resistência por adaptação (Cloete, 2003; Heinzel, 1998).

Dos diferentes tipos de resistência bacteriana, a resistência intrínseca é considerado o mecanismo mais utilizado pelas bactérias para se adaptarem às condições físico-químicas agressivas a que são submetidas (McDonnell & Russell, 1999).

Bactérias intrinsecamente resistentes são aquelas cujas propriedades naturais podem reduzir ou prevenir acções bacterianas. Um microrganismo, que apresente uma maior capacidade de produção de polímeros extracelulares, adere com maior facilidade a substratos sólidos por ligação entre as cadeias de polímeros situadas na parede do organismo e no substrato. Geralmente é verificado que as bactérias Gram – são menos susceptíveis a biocidas e antibióticos do que as bactérias Gram+ (McDonnell & Russell, 1999).

No caso da resistência adquirida, os mecanismos de resistência surgem, geralmente, como resultado da aquisição de material genético ou de mutação. Também podem ocorrer trocas genéticas resultantes da conjugação, transformação ou mutações no genoma da célula (Cloete, 2003; Lambert et al., 2001). Numa colónia de biofilme, onde as células microbianas estão mais próximas umas das outras, acredita-se que esta proximidade pode aumentar a troca de material genético.

A resistência adaptativa é um tipo de resistência que as bactérias rapidamente perdem assim que se alteram as condições fisiológicas (Heinzel, 1998).

1.3. Considerações Finais

O biofilme cada vez mais revela ser uma entidade de extrema relevância clínica, pois não somente constitui um entrave à cicatrização, pelo componente infeccioso, mas também consequentemente, pelo estímulo inflamatório que promove a cronicidade da ferida crónica.

Mais uma vez a evidência científica disponível vem a salientar a complexidade desta entidade, que lhe confere ainda uma série de mecanismos de resistência face às modalidades terapêuticas tradicionais. Mais do que salientar o papel do biofilme na cronicidade da ferida, pretendeu-se com esta revisão, alertar para a necessidade de desenvolver estratégias cada vez mais diversificadas de abordagem deste problema, bem como para o abandono de algumas, ditas tradicionais, que podem trazer mais maleficio que beneficio, ao potenciar o desenvolvimento de microorganismos multi-resistentes, sendo que ficou bem patente a capacidade desta comunidade microbiológica, em desenvolver variados mecanismos de resistência.

A ideia central que fica, assenta na necessidade de desenvolver estratégias dirigidas ao biofilme, sempre que haja probabilidade da sua presença, para podermos ter um verdadeiro “biofilm based wound care”, pois se não encararmos esta entidade como associada à ferida, mas diferente desta, as consequências podem vir a ser desastrosas para o prognóstico da ferida.

É fundamental portanto saber reconhecer sinais e sintomas, que sugiram grande probabilidade de presença de biofilme e dispor de alternativas capazes para o seu tratamento, algumas já existentes, outras em desenvolvimento, mas que sejam verdadeiramente efectivas pois o biofilme já mostrou ser verdadeiramente complexo e eficaz, no que respeita à sua sobrevivência em relação a agressões exteriores.

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Jul 30, 2012

BIOFILMS: KNOWING THE ENTITY

BIOFILMS: CONOCER LA ENTIDAD

AUTORES: Elsa Menoita, Vítor Santos, Carlos Testas , Cláudia Gomes, Ana Sofia Santos

Resumo

Dada a complexidade de algumas feridas complexas/crónicas e sua dificuldade de cicatrização, os biofilmes têm sido apontados como entidades que atrasam todo este processo. Para se poder gerir os casos de feridas com biofilmes é indispensável conhecer a sua origem, estrutura e composição, perceber o seu ciclo de vida de modo a se obter o conhecimento necessário para intervir na sua prevenção e controlo. Como tal, foi efectuada uma revisão bibliográfica de literatura relevante e recente, com vista a caracterizar objectivamente esta entidade, que ainda permanece desconhecida para quem cuida de pessoas com feridas.

Palavras chave: Biofilmes, Cicatrização, Ciclo de Vida

ABSTRACT

Due to the complexity of some complex/chronic wounds and their hard to heal status, biofilms have been described as entities that delay this process. In order to manage the cases of wounds with biofilms it is essential to know its origin, structure and composition, understand its life cycle in order to obtain the necessary knowledge to intervene in the prevention and control. As so, a literature review of recent and relevant knowledge was made, in order to objectively characterize this entity, which still remains unknown to caregivers of people with wounds.

Key words: Biofilms, Wound Healing, Life Cycle Stages

1. Introdução

Actualmente, muitas feridas complexas/crónicas, simplesmente estagnam sem razão aparente.  Não respondem ao tratamento com material de penso avançado, que inclui mesmo os mais recentes avanços no campo dos antimicrobianos e controlo das metaloproteinases da matriz. Isto porque algumas destas feridas apresentam  sinais de infecção local evidente, sem resposta ao respectivo tratamento e outras embora sem sinal de infecção evidente ou  tecido inviável, persistem sem cicatrizar mesmo com a utilização de moduladores e inibidores das proteases, moduladores do pH entre outros. Já é consensual a atribuição de deste atraso na cicatrização à presença de biofilme no leito da ferida em alguns casos especificos, um conceito que começa a merecer mais atenção na área de tratamento de feridas. No entanto será que conhecemos suficientemente esta entidade, de modo a podermos intervir eficazmente no seu controlo? Torna-se fundamental conhecer o seu processo de formação, estrutura e ciclo de vida, para melhor podermos traçar um plano de tratamento de feridas, verdadeiramente custo-efectivo, permitindo em última instância uma melhor qualidade de vida para a pessoa com ferida complexa/crónica.

1.1. Biofilmes microbianos: comunidade complexa

Os microrganismos são estruturas simples, que estão presentes nos mais diversos habitats, mas capazes de desenvolverem comportamentos bastante complexos.

Em 1800, Robert Koch formulou os conhecidos postulados de Koch que foram muito úteis para provar que uma bactéria seria o agente causal de uma determinada doença. Estes postulados basearam-se no paradigma uma-doença/uma-bactéria, e requeriam o isolamento numa cultura pura da bactéria supostamente patogénica. Este conceito da etiologia mono-microbiana das doenças infecciosas ajudou a sedimentar a noção de que cada espécie bacteriana se comportaria como uma entidade isolada tanto no homem como na natureza. A microbiologia tradicional caracterizou durante anos as células encontradas em suspensões como planctónicas (Widgerow, 2008). Estas células foram exaustivamente avaliadas, isoladas e identificadas. Algumas das bactérias planctónicas estudadas têm a capacidade de aderir em várias superfícies, formando biofilmes.

O conceito de biofilme tem emergido gradualmente de estudos científicos durante longo período de tempo, porém, nas últimas duas décadas, essa concepção tem avançado consideravelmente.

Inicialmente, as observações de biofilmes foram realizadas por Antonie Van Leuwenhoek que, estudando amostras de dente, no seu microscópio, notou mais fragmentos de células agregadas do que planctónicas. Porém, a primeira publicação detalhada que descreve biofilmes foi descrita por Zobell em 1943, onde o autor iniciou estudos sobre a adesão de bactérias marinhas em cascos de navios e em diferentes tipos de superfície que incluíam vidro, metal e plástico que estavam submersas.

Técnicas de microscopia mais sofisticadas e efectivas foram empregadas por Costerton em 1978, o qual verificou que a maioria dos microrganismos nos ambientes naturais se encontrava fixo a substatos, e não na forma dispersa em suspensão. Aos microrganismos aderidos foi atribuído o nome de biofilme, composto por células microbianas de fisiologia distinta, chamadas sésseis. A partir de então, o conceito de biofilme tem evoluído e várias pesquisas têm sido realizadas em muitas áreas relacionadas com a ecologia microbiana.

 Estima-se que mais de 90% dos microrganismos vivem sob a forma de biofilmes (Costerton et al., 1987) e praticamente não existe nenhuma superfície que não possa ser ou vir a ser colonizada por bactérias (Characklis & Marshall, 1990).

Em suma, os microrganismos apresentam-se nos ambientes aquosos, tanto na forma planctónica com na forma séssil (Costerton et al., 1987; Characklis et al., 1982). Na forma planctónica os microrganismos encontram-se em suspensão e dispersos no meio aquoso, e na forma séssil encontram-se aderidos a superfícies sólidas sob a forma de biofilmes (Phillips et al., 2010).

 1.2. Estrutura e composição do biofilme

O biofilme microbiano é definido como uma associação de células microbianas fixadas às superfícies, bióticas ou abióticas, envolvidas numa complexa matriz extracelular de substâncias poliméricas, juntamente com os nutrientes capturados para a formação da matriz.

Na década de 1980, considerava-se que os biofilmes fossem representados por uma simples estrutura plana, principalmente 2D, com espessura relativamente constante.

 No entanto, um modelo conceptual formulado a partir da investigação de um sistema particular não deve ser generalizado para a totalidade dos sistemas de biofilmes, como aconteceu com o modelo designado water channel model (Costerton et al. 1994). Tal generalização é incorrecta, em especial considerando a evidência de que cada comunidade microbiana é única (Tolker-Nielsen & Molin, 2000).

Depois de várias investigações, foi possível afirmar que existem, no mínimo, três estruturas diferentes de biofilme. A primeira é a tradicional, plana, visão homogénea da estrutura do biofilme. A segunda, denominada de “Modelo do Mosaico Heterogéneo”, e foi descoberta utilizando-se microscopia de contraste de interferência diferencial (DIC), para examinar amostras crescidas em superfícies internas de sistema de distribuição de água. Desta forma os investigadores observaram mosaicos constituídos por microcolónias de bactérias ligadas umas às outras por uma substância polimérica extracelular e apresentando colunas (Figura nº1).

O terceiro tipo de biofilme representa o modelo na forma de cogumelo ou tulipa, com estrutura porosa e canais capilares de água, por onde ocorre a distribuição de nutrientes e água (Figura nº2).

Os biofilmes são constituídos por microrganismos, material polimérico extracelular e resíduos do ambiente colonizado, aderidos a uma superfície sólida, formando uma estrutura porosa e altamente hidratada, contendo pequenos canais, abertos por entre as microcolónias (Allison, 2003; Sutherland et al., 2001). Os microrganismos representam somente uma parte da massa de biofilme que, frequentemente, é menor que 10%. Os biofilmes possuem uma enorme diversidade de espécies microbianas, em que os microrganismos frequentemente encontrados são microalgas, fungos, protozoários, bactérias e vírus (Characklis et al., 1990), sendo, no entanto, devido à sua maior versatilidade e resistência, as bactérias os microrganismos predominantes. As bactérias, devido às suas características (como tamanhos reduzidos, elevadas taxas de reprodução, grande capacidade de adaptação e de produção de substâncias e estruturas extracelulares que as protegem do meio circundante), são, de entre todos os microrganismos, consideradas como excelentes produtoras de biofilme (Characklis et al., 1990).

Os biofilmes, complexos ecossistemas microbianos, podem ser formados por populações desenvolvidas a partir de uma única, ou de múltiplas espécies (Rhoads et al., 2008).

Os microrganismos têm sistemas de comunicação entre si, um dos quais chama-se quorum sensing (QS). Estudos baseados numa cultura pura de biofilme de P. aeruginosa cultivado em fluxo laminar (Davies et al. 1998) indicam que quorum sensing é possivelmente importante para a formação de estrutura em biofilmes. Quorum sensing é um mecanismo para regulação de certas actividades celulares, dependente da densidade celular (Salmond et al. 1995), ou seja, é um mecanismo intercelular de sinalização, que tanto pode ocorrer em células microbianas da mesma espécie como em interespécies (Rhoads et al., 2008). As bactérias, sintetizam compostos sinalizadores de baixo peso molecular, os autoindutores (AIs), que são excretados no ambiente. Quando se atinge uma quantidade crítica desses compostos, as bactérias detectam a presença de um número suficiente ou quórum de bactérias e respondem por meio da activação ou repressão de certos genes. Em baixas densidades populacionais, há, proporcionalmente, baixas concentrações destes autoindutores e, por esta razão, talvez não haja seu impacto sobre a expressão genética. Entretanto, quando a densidade populacional de microrganismos se eleva, o mesmo acontece com a concentração de AIs no meio, havendo, assim, influência sobre a regulação genica.

Assim, as etapas do ciclo de um biofilme requerem um sistema adequado de comunicação célula-célula (Steinberg, 2011). A sua fundamental importância consiste na distribuição, na ordenação e na sincronização, para a manutenção da relativa homeostase da comunidade microbiana, o que favorece o acesso a nutrientes ou a nichos ambientais mais favoráveis, permite que as bactérias organizem respostas defensivas, além de optimizar a capacidade das bactérias de se diferenciarem em formas mais bem adaptadas a sobreviverem em ambientes hostis.

Verificou-se portanto, que os microrganismos alteram a transcrição genética como resposta aos AIs, variando, desse modo, a produção de exopolissacarídeos, a motilidade, a produção de enzimas, como proteases, lípases e alginases e, também, a produção de compostos bactericidas e/ou bacteriostáticos. Este processo coordenativo influencia a própria sobrevivência do microrganismo em condições desfavoráveis, principalmente no estágio maduro, no qual há limitação na disponibilidade de oxigénio, nutrientes, componentes orgânicos e inorgânicos, e, até mesmo, a restrição quanto ao espaço físico. Por outro lado, os microrganismos podem rapidamente começar a produzir até 800 novas proteínas para formar microcolónias dentro horas (Sauer, et al, 2002 citados por Wolcott & Rhoads, 2008), através do referido mecanismo de quorum sensing (Rhoads et al., 2008).

Para Flemming (1993), a substância polimérica extracelular (“Extracellular Polymeric Substances” – EPS) que envolve todas as células microbianas representa cerca de 70 a 95% da matéria orgânica da massa seca do biofilme, formando glicocálix. Glicocálix é uma camada abundante de material polimérico extracelular produzida pelas células bacterianas, quando aderentes (Cooper, 2010). Para Bakke et al. (1984), a EPS pode variar entre 50 e 90% do total da matéria orgânica dos biofilmes. Rhoads et al. (2008) por sua vez defendem que, geralmente o biofilme é constituido por 80% de EPS e os microorganismos cerca de 20%. A composição química das EPS é muito heterogénea e complexa, no entanto, de um modo geral, são os polissacarídeos que predominam (Wimpenney et al., 1993). A matriz polimérica pode ser constituída por proteínas, substância húmicas, ácidos nucleicos (DNA, RNA), (Jahn & Nielsen, 1995), glicoproteínas, fosfolípidos (Phillips et al., 2010), etc.

Os exopolissacarídeos da EPS são considerados componentes importantes que determinam a estrutura e a integridade funcional do biofilme microbiano. A EPS age como barreira defensiva, protegendo as células para que não sejam arrastadas pelo fluxo de substâncias, auxiliando a célula a resistir a condições de stress múltiplo, tais como a diminuição de nutrientes e água, a presença de biocidas e outros agentes antimicrobianos e condições ambientais.

Em alguns casos, o EPS é capaz de captar catiões, metais e toxinas, conferindo, também, protecção contra radiações UV, alterações de pH, choques osmóticos, etc.

Assim, a matriz polimérica é a responsável pela morfologia, estrutura, coesão, integridade funcional dos biofilmes e a sua composição determina a maioria das propriedades físico-químicas e biológicas dos biofilmes (Flemming & Wingender, 1999).

No que concerne à distribuição da populacional, as células microbianas presentes nas camadas s superficiais externas têm propriedades semelhantes às das células planctónicas com acesso fácil a oxigénio e nutrientes, são metabolicamente activas e não têm dificuldade na eliminação de detritos metabólicos, sendo que as células incorporadas na matriz estão protegidas de agentes stressores, são metabolicamente menos activas e em fase de dormência.

Conforme já referido, um biofilme é considerado uma estrutura muito adsorvente e porosa (possui espaços intersticiais com água), sendo constituído essencialmente por água, pois contém cerca de 80 a 95% de água. A água é a fracção mais significativa da massa total do biofilme, podendo variar entre 70 a 95% da massa total do biofilme (Flemming, 1993). Outros autores, como Christensen e Characklis (1990); Neu (1994) e Azeredo e Oliveira (2000) referem que a razão massa de água/massa de biofilme pode ser até próximo de 99% ou mesmo atingir valores superiores.Os canais aquosos dos biofilmes (Figura nº3) podem ser comparados a um sistema circulatório primitivo, permitindo a troca de nutrientes e metabólitos, assim como a remoção de metabótilos potencialmente tóxicos. Assim, os biofilmes que se encontram em ambientes naturais são de um modo geral heterogéneos, contendo mais do que um microambiente distinto. No mesmo biofilme podem ser encontrados estratos aeróbios e estratos anaeróbios (Characklis & Marshall, 1989; Van Der Wende & Characklis, 1990). Os primeiros situam-se nas zonas mais superficiais do biofilme e os segundos nas mais profundas, junto ao substrato sobre o qual o biofilme se desenvolve. Esta estratificação deve-se à dificuldade de difusão do oxigénio presente na água através do biofilme, conjugado com o facto do oxigénio disponível ser logo consumido pelos microrganismos que compõem as camadas mais superficiais. De referir ainda que a composição dos biofilmes é dependente das condições do meio (como a temperatura, composição do meio, pressão, pH e oxigénio dissolvido) (Flemming, 1991; O’Toole et al., 2000) e não é necessariamente uniforme, podendo até englobar partículas sólidas (argilas, areias, partículas orgânicas) provenientes do meio aquoso onde está imerso (Characklis e Marshall, 1990; Wimpenny et al., 1993), ou fragmentos proteicos, como fibrina, corpos estranhos como parte de certos materiais de penso, no caso de feridas complexas/crónicas.

 

 

 

 

 

 

1.3. Ciclo de vida do biofilme

A acumulação de biofilme em superfícies é um fenómeno natural que resulta de processos físicos, químicos e biológicos que ocorrem simultaneamente. Na Figura nº 4 estão esquematizadas as diferentes etapas de formação de biofilme.

O transporte de células livres do meio líquido para uma superfície sólida, e sua subsequente fixação, é a base de todo o desenvolvimento de um biofilme. Esta fase ocorre em poucos minutos após o transporte e adsorção à superfície de substâncias orgânicas dissolvidas no meio aquoso (Etapa 1 e 2). Os microganismos, denominados colonizadores primários, que se aderem a uma superficie, passam a se desenvolver, originando microcolónias, que sintetizam a EPS (Rhoads et al., 2008), que passam a ser um substrato para

a aderência dos colonizadores secundários. Estes últimos podem se aderir directamente aos primários, ou promoverem a formação de coagregados com outros microrganismos e então se aderirem aos primários. De facto, uma vez formada a primeira camada de microrganismos, a adesão de outros microrganismos é favorecida. O desenvolvimento e reprodução dos primeiros colonizadores podem, também, contribuir para a modificação das propriedades superficiais da superfície do suporte, tornando-a mais adequada para a colonização subsequente dos microrganismos secundários, favorecendo assim a acumulação de biofilme (Charackils et al. 1990).

A velocidade a que ocorre a formação inicial do biofilme depende da concentração de moléculas orgânicas no meio aquoso que contacta com a superfície sólida, da afinidade das moléculas para com o suporte e das condições hidrodinâmicas do meio líquido (Chamberlain, 1992), sendo de capital importância para a adesão das moléculas orgânicas as características da superfície do suporte (carga superficial, energia livre de superfície, rugosidade da superfície) (Marshall & Blainey, 1990; Flemming, 1990). Quando presentes alguns apêndices celulares, como pili, flagelos e fímbrias o processo de aderência e formação do

biofilme está facilitado (Steinberg, 2011).O pili é um componente competitivo muito importante no processo de adesão inicial e colonização da superfície, essencialmente para microrganismos gram-negativos. O pili tipo IV pode-se ligar a uma grande variedade de superfícies sejam elas abióticas, bem como bióticas, onde se tem adesão célula-célula. É de ressaltar que a colonização de superfícies e o deslocamento de microcolónias, onde o pili tipo IV está presente, é um movimento social, ou seja, envolve o contacto célula-célula, orientando-se este por nutrientes e sinalizadores, a que se designa por quimiotaxia. Os flagelos são utilizados para locomoção do microrganismo, e são constituídos por unidades de flagelina e emergem por uma extensão da membrana externa, sendo a sua força motora garantida pela diferença de potencial osmótico de sódio transmembrana e pela degradação de grupos fosfato.

Após ter ocorrido a formação inicial do biofilme, ocorre o transporte de células microbianas desde o meio aquoso até à superfície sólida (Etapa 3).

Esse transporte ocorre devido ao gradiente de concentrações de microrganismos entre o meio aquático e a superfície. As moléculas existentes no desenvolvimento inicial do biofilme podem estabelecer ligações para uma adesão forte e estável através da formação de cadeias poliméricas com os microrganismos existentes à superfície, ou em consequência da motilidade que os microrganismos apresentam devido à existência dos referidos apêndices externos filamentosos, tais como flagelos que permitem a mobilidade, pili, fímbrias que permitem a adesão (Characklis, et al., 1990; Widgerow, 2008).

O processo de dispersão/desprendimento de porções de biomassa de biofilme pode ter origem em fenómenos de erosão superficial, descolamento (“sloughing off”), abrasão e ataque por predadores (Characklis et al., 1990; Gjaltema, 1996) (Etapa 4). A erosão consiste na perda contínua de porções de biofilme causada pelas alterações ambientais. A taxa de remoção do biofilme aumenta à medida que o biofilme se vai desenvolvendo. O descolamento ou “sloughing off” acontece quando há destacamento de grandes porções de biofilme em resultado da alteração de certas condições dentro do próprio biofilme. A abrasão corresponde à perda de biofilme devido a repetidas colisões entre a superfície que suporta o biofilme e as partículas existentes no fluído, ou a colisões de partículas suspensas com biofilme (Gjaltema, 1996). O ataque por predadores (“grazing”) pode também reduzir consideravelmente a acumulação de biofilme (Ratsak et al., 1996). As próprias células englobadas no biofilme podem  provocar o seu desprendimento pela segregação e excreção de enzimas que podem  levar à quebra das ligações da matriz polimérica (Boyd & Chakrabarty, 1994).

Deste modo, de acordo com Bott (1993), a acumulação de biofilme é um processo natural, que ocorre segundo um padrão sigmoidal (Figura nº 6), como resultado de um balanço entre vários processos físicos, químicos e biológicos que ocorrem em simultâneo.

1.4. Considerações Finais

A percepção da forma como as comunidades microbianas co-existem com o seu substrato, como por exemplo o leito de uma ferida, são extremamente importantes, de modo a perceber como abordar este potencial impedimento do processo de cicatrização. Perceber que na sua maioria, os microorganismos vivem em comunidades como biofilmes,

e conhecendo as suas propriedades e modo como se organizam, ajuda na adequação do tratamento e controlo desta entidade.

Por seu lado, também a percepção do biofilme não como uma massa de bactérias e outros microorganismos, mas essencialmente uma massa composta maioritariamente por substância polimérica extracelular, na qual se alojam  e desenvolvem  estas entidades, é factor fundamental na adequação da estratégia de tratamento.

Também fundamental para nortear a nossa intervenção neste tipo de situação, é perceber como é que evoluem estas comunidades ao longo do seu ciclo de vida, de modo a abrir uma nova janela de oportunidade, sob a forma de prevenção do seu crescimento ou reconstituição.

Apesar de ser uma temática relativamente recente na área do tratamento de feridas, os biofilmes já cá estavam antes da humanidade, e estão para continuar. É nosso dever aprender a co-habitar com estes, de modo a podermos assegurar os nossos próprios objectivos pessoais, que neste caso especifico, passa pelo tratamento de feridas, algo também tão antigo como a humanidade.

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Jul 26, 2012

WOUND HEALING: STAGNANT/ CHRONIC WOUNDS PARTICULARITY

CICATRIZACIÓN DE HERIDAS: LA PARTICULARIDAD DE LAS HERIDAS CRÓNICAS/ESTANCADAS

AUTORES: Vítor Santos, Elsa Menoita, Cláudia Gomes, Ana Sofia Santos, José Testas

RESUMO

O conhecimento dos processos fisiológicos envolvidos na cicatrização de feridas é essencial para os profissionais. É não só fundamental identificar os principais processos celulares e moleculares da cicatrização, como compreender as diferenças fundamentais entre feridas agudas e crónicas. Apesar de uma preparação do leito da ferida crónica adequada usar métodos padronizados, algumas falham na cicatrização ou cicatrizam lentamente devido a uma fase inflamatória não resolvida. O tratamento bioactivo conduz à reversão de alguns defeitos celulares e moleculares que existem nas feridas crónicas, permitindo (re)iniciar a cicatrização. A compreensão da fisiologia subjacente a estes eventos e sua correcta abordagem são vitais para um sistema de saúde que deve ser o mais custo-efectivo possível, e com uma população alvo cada vez mais envelhecida e com cada vez mais co-morbilidades.

PALAVRAS-CHAVE – Feridas Crónicas, cicatrização, fisiologia.

ABSTRACT

Knowledge of the physiological processes involved in wound healing is essential for the professionals involved. It is not only essential to identify the key cellular and molecular processes of wound healing, but also understand the fundamental differences between acute and chronic wounds. Although the wound bed preparation uses appropriate standard methods, some fail wounds to heal wound or heal slowly due to an unresolved inflammatory phase. The bioactive treatment leads to reversal of some cellular and molecular defects that exist in chronic wounds, allowing to restart healing. The understanding of the physiology behind these events and their correct approach is vital for a health system that has be the most cost-effective as possible, and has a target population growing older and with more co-morbidities.

KEY WORDS – Chronic Wounds, healing, physiology

INTRODUÇÃO

A cicatrização de feridas é um processo complexo que envolve a organização de células, mediadores químicos e matriz extracelular com o objectivo de reparar o tecido lesado. Logo o tratamento de feridas busca o encerramento rápido da lesão de forma a se obter cicatriz funcional e esteticamente satisfatória. Como tal, é indispensável uma melhor compreensão do processo biológico envolvido na cicatrização de feridas e regeneração tecidular. Com a lesão dos tecidos, inicia-se de imediato o processo de cicatrização, que compreende uma sequência de eventos moleculares levando à restauração do tecido lesado. Só durante a fase fetal a reparação de lesões se dá sem a formação de cicatriz, ocorrendo perfeita restauração do tecido pelo processo de neoformação tecidular. Após o nascimento, o organismo falha nesse processo, levando à formação da cicatriz. É portanto de vital importância, compreender como de desenrola este processo e quais as condicionantes existentes no caso das feridas crónicas/complexas.

1.PROCESSO DE CICATRIZAÇÃO EM FERIDAS AGUDAS

O processo de cicatrização das feridas é contínuo (JONES et al, 2006) composto por uma série de estágios complexos, interdependentes e simultâneos, que são descritos em fases (BLANES, 2004). Do ponto de vista morfológico, identificam-se quatro fases consecutivas, havendo um dinamismo com sobreposição entre elas. É um processo dinâmico e envolve uma resposta coordenada de múltiplas células. A cicatrização é descrita em quatro fases: hemostase, inflamatória, proliferativa e remodelação. A fase de hemostase é uma resposta de emergência biológica, em que ocorre nos minutos seguintes a uma lesão aguda e inicia-se um extravasamento sanguíneo que leva ao preenchimento da área da lesão com plasma e elementos celulares, principalmente plaquetas. A agregação plaquetária e a coagulação sanguínea formam um tampão, rico em fibrina, que para além de restaurar a hemostase, forma uma barreira contra a invasão de microrganismos, organiza uma matriz preliminar necessária à migração celular e é também um reservatório de citoquinas e factores de crescimento, que serão libertados nas fases seguintes do processo de cicatrização (MENDONÇA e NETO, 2009).

Em resultado da activação da cascata de coagulação e juntamente com a libertação de factores de crescimento, produzem-se numerosos mediadores vasoactivos e factores quimiotáxicos que promovem o recrutamento de células inflamatórias para o leito da ferida dando-se inicio à fase inflamatória (MENDONÇA e NETO, 2009). As células inflamatórias são os neutrófilos e os macrofagos, que no leito da ferida, para além de fagocitarem as bactérias, os fragmentos celulares e os corpos estranhos produzem citoquinas (MENDONÇA e NETO, 2009). A citoquina é um termo abrangente referente a mediadores que preparam a ferida para a fase proliferativa que inclui factores de crescimento (como por exemplo, o Factor de Crescimento derivado das Plaquetas – PDGF -, Factor de Crescimento beta Transformador – TGF-beta, o Factor de Crescimento endotelial Vascular – VEGF e o Factor de Crescimento Epidermal – EGF -) (SCHULTZ et al, 2009) e citoquinas pró-inflamatórias (como o Factor de Necrose Tumoral – TNF – α e a Interleucina-1 – IL-1).

As citoquinas pró-inflamatórias produzem, por sua vez, proteinases. As proteinases são enzimas proteolíticas que estão presentes em todos os exsudados de feridas e que quebram as proteínas danificadas da matriz extracelular (ECM) (SCHULTZ et al, 2009), num processo designado de proteólise.

A ECM é constituída, essencialmente, por proteínas estruturais, como o colagénio (identificados pelo menos 19 tipos de colagénio geneticamente distintos, contudo os principais da pele são o colagénio I e III) e elastina; mas, também, por glicoproteínas (como fibronectina, laminina e vitronectina), glicosaminoglicanos – GAG (sendo o mais conhecido o ácido hialurónico) e proteoglicanos a desempenhar um papel fundamental na adesão e migração celular (SCHULTZ et al, 2009).À família das enzimas proteolíticas designa-se por metaloproteinases da matriz (MMP). Assim, estas endopeptidases zinco-dependentes são fundamentais para o processo de cicatrização, mas na quantidade certa e com um tempo de actuação adequado (GIBSON et al, 2009). As MMPs, quando sintetizadas pela primeira vez, apresentam-se numa forma latente, inactiva (pró-MMPs), sendo à posteriori activadas por outras proteases, e a partir daí as MMPs vão-se ligar às proteínas da matriz. Foram identificadas no ser humano, até à data, 23 MMPs. As que têm sido foco de maior investigação na cicatrização de feridas são: MMP1 (Colagenase Intersticial), MMP – 8 (Neutrófilo – Colagenase) e MMP- 13 (Colagenase), que têm uma acção muito especifica em separar a tripla hélice das fibras de colagénio. A molécula de colagénio desnaturada daí resultante pode ser atacada por outras proteases em particular a MMP -2 e MMP-9; MMP-2 (Gelatinase – A) e MMP – 9 (Gelatinase B), que actuam nos colagénios desnaturados, colagénio IV, V, VII, X, elastina e fibronectina; MMP – 12 (Macrofago Metaloelastase), que não só actua nas fibras proteicas da elastina, mas, também, por ser pouco específica pode ligar-se ao colagénio e degradá-lo). A actividade proteolítica na ECM é muito regulada, havendo um controlo na activação e na inibição das enzimas. Os Tissue Inhibitors of Metaloproteinase (TIMP’s) são activados conjuntamente com as MMP’s e a sua função é regular o desempenho destas ligando-se a elas inactivando-as. Para além dos TIMP’s, existem outros inibidores das metaloproteinases, como os Factores de Crescimento Beta Transformadores (TGF-beta) sintetizado por várias células, nomeadamente pelos macrófagos e armazenados nas plaquetas. Nas feridas agudas existe um equilibrio entre os níveis de MMP’s e os TIMP’s.

A fase proliferativa é responsável pela síntese da ECM, com produção de novas proteínas, nomeadamente colagénio, pela acção dos fibroblastos; pela formação de tecido de granulação através do fenómeno de angiogénese, que consiste na formação de novos vasos sanguíneos a partir de células vasculares endoteliais de vasos adjacentes.

Alguns fibroblastos têm um papel acrescido – os miofibroblastos, que são responsáveis pela contracção da úlcera. Majno (1996) citado por Balbino et al (2005) relatou que os miofibroblastos são células intermediárias entre as musculares lisas e os fibroblastos. Apesar de seu mecanismo contráctil estar ainda por ser esclarecido, estas células são encontradas alinhadas ao redor de depósitos da nova matriz extracelular, fazendo uniões célula a célula e gerando força de tensão, em que os feixes de miosina encurtam os seus bordos (RUSSEL, 2000). Flanagan (1997) citada por Russel (2000, p. 26), sugere que “a contracção da ferida só ocorre quando a sua base consiste em tecido de granulação, o que explica o facto de não ocorrer diminuição do tamanho da ferida até que a sua base tenha sido trazida até à superfície. As feridas profundas demoram um tempo considerável a contrair e a apresentar cicatrização. A contracção parece ser responsável por 40% a 80% do fecho da ferida.”

Nesta fase a ocorrência predominante é a substituição da matriz básica composta por fibrina, fibronectina, por ácido hialurónico e colagénio – proteína responsável por conferir a arquitectura da pele. Por fim, os factores de crescimento vão também estimular as células epiteliais, que migram só para tecidos viáveis A epitelização caracteriza-se portanto pela migração horizontal das células epitelias basais – Salto de Rã dos bordos da ferida, apêndices epidérmicos e anexos cutâneos, e ainda pela contracção da ferida através dos miofibroblastos (MENDONÇA e NETO, 2009).

A última fase da cicatrização é a remodelação, onde ocorre a tentativa de reestruturação das fibras de colagénio (com substituição progressiva do colagénio III, que vai sofrendo uma degradação, por colagénio I) (JIE LI et al, 2007) e diminuição de todos os elementos celulares pelo processo de apoptose (HUANG et al, 2003; MENDONÇA e NETO, 2009). Este processo pode prolongar-se até dois anos após o encerramento da lesão (DEALEY, 2007 e STEPHEN-HAYNES e HAMPTON, sd, p.3).

Quadro 1: Fase Inflamatória Prolongada

2. PROCESSO DE CICATRIZAÇÃO DAS FERIDAS COMPLEXAS

Primeiramente, é de advertir que o conceito ferida crónica está a entrar em desuso, pois com o seu recurso parece que há uma resignação do seu Status Quo, estando portanto a ser substituído por ferida complexa ou complicada (MAJNO, 2006). Uma ferida crónica/complexa é aquela que permanece estagnada em qualquer uma das fases do processo de cicatrização por um período de seis semanas ou mais (COLLIER, 2003 citado por GOUVEIA, 2003). Hart citado por Jones et al (2006) define quatro factores que podem induzir à cronicidade de uma ferida: corpos estranhos, isquémia, trauma físico repetido e/ou bioburden elevado. Assim, as feridas sujeitas a factores que podem induzir à cronicidade, ficam estagnadas numa fase da cicatrização (STEPHEN-HAYNES e HAMPTON, sd).

Contrariamente às feridas agudas, não existe um equilíbrio entre os níveis de MMP’s e os TIMP’s (ENOCH e PRICE, 2004; JIE LI et al, 2007; SCHULTZ et al, 2009). Numa fase inflamatória prolongada, existe um estímulo pró-inflamatório constante, e consequentemente as células leucocitárias produzem mais MMP’s que, essenciais para a cicatrização em feridas agudas, se tornam prejudiciais nas crónicas, quando em excesso, destruindo ou corrompendo continuamente as proteínas essenciais da ECM (JIE LI et al, 2007; KANE, 2007; SCHULTZ et al, 1998; SCHULTZ et al, 2009). Adicionalmente, as proteinases captam os factores de crescimento, tornando-os indisponíveis para o processo de cicatrização. Assim, a bioactividade do exsudado das feridas complexas é bioquimicamente diferente do das feridas agudas (TARNUZZER e SCHULTZ, 1999), e inibe a proliferação das células endoteliais, essenciais para a fase de angiogénese; de fibroblastos, com impacto na formação de colagénio essencial para a formação da nova ECM e ainda a proliferação de queratinócitos, responsáveis pela epitelização. Em suma, a falha de controlo em que resulta num aumento da actividade proteolítica é uma das causas primárias de desordens na cicatrização das feridas crónicas (GOUVEIA, 2003). Segundo Falanga (2007, p. 29), “(…) o fluido de feridas crónicas bloqueia a proliferação celular e angiogénese e contém quantidades excessivas de metaloproteinases da matriz (MMP’s). (…) O fluido excessivo da ferida não tem que conter MMP’s anormais ou inapropriadamente activadas para ser prejudicial. Os componentes normais no plasma, se presentes continuamente, podem levar ao que tem sido formulado como hipótese de “aprisionamento dos factores de crescimento”.

celular e angiogénese e contém quantidades excessivas de metaloproteinases da matriz (MMP’s). (…) O fluido excessivo da ferida não tem que conter MMP’s anormais ou inapropriadamente activadas para ser prejudicial. Os componentes normais no plasma, se presentes continuamente, podem levar ao que tem sido formulado como hipótese de “aprisionamento dos factores de crescimento”.

Neste ciclo vicioso há inibição do processo de apoptose (morte celular programada) e as células tornam-se senescentes, não respondendo aos factores de crescimento, formando assim, a carga celular. Estes processos impedem a ferida de entrar na fase proliferativa da cicatrização. O facto de por vezes os bordos da ferida estarem elevados pode ser um sinal de resposta inflamatória excessiva, em que os queratinócitos não respondem por senescência ou porque há anormalidades a nível da actividade das proteinases que podem degradar a matriz extracelular enquanto esta se forma (GOUVEIA, 2003). É ainda de acrescento, que por vezes as feridas crónicas podem ficar “paralisadas” na fase de granulação e tal parece dever-se a este processo de inibição de apoptose, que interfere com a migração celular normal, formando-se um tecido de hipergranulação.

Deste modo, a fase proliferativa fica comprometida, ocorrendo uma migração celular defeituosa, com uma angiogénese menos eficiente, resultando na formação de tecido de granulação não viável (ECM defeituosa com colagénio enfraquecido), e portanto as margens da epiderme não avançam na presença de tecido de granulação não viável no leito da ferida (JOHNSON, 2009).

3. Correcção do microambiente biológico das feridas crónicas

Com base no conhecimento da cicatrização das feridas crónicas uma série de estratégias de tratamentos avançados têm sido desenvolvidos e que demonstraram resultados interessantes em feridas recalcitrantes.

Segundo Moffat et al (2007) e Cuzzel & Krasner (2003), os pensos modernos foram desenvolvidos para manter um ambiente húmido (que pode acelerar a cicatrização em 50% em comparação com uma ferida em ambiente seco) e recentemente evoluíram para uma nova geração de produtos “inteligentes”, bioactivos que interagem de forma activa nas diversas fases, de forma a estimularem a cicatrização. Normalmente mimetisam produtos endógenos que por motivos vários não exercem a sua actividade convenientemente. Os produtos bioactivos que são moduladores de proteinases estimulam a cicatrização através da inactivação do excesso de proteinases. Existem outras opções terapêuticas como o colagénio, o ácido hialurónico, os factores de crescimento, entre outros. Segundo Ferreira & Borges (2008, p. 42) estudos sobre aplicações clínicas de colagénio têm vindo a demonstrar que podem actuar como suporte mecânico e como estímulo à migração de fibroblastos fomentando a actividade metabólica do tecido de granulação, bem como no crescimento dos queratinócitos. Este é capaz de manter um ambiente húmido na interface ferida/penso favorável ao processo de cicatrização. Estimula ainda a angiogénese e o crescimento dos fibroblastos, promovendo a proliferação e migração dos fibroblastos. Está indicado em feridas crónicas sem evolução, isentas de tecido necrótico ou fibrinoso e de infecção, previamente limpas. A sua aplicação deve ser realizada de forma uniforme sobre a área lesada requerendo um penso secundário.

– A matriz moduladora das proteinases – O seu mecanismo primário fornece uma matriz de colagénio e de celulose regenerada oxidada (CRO) que actua como uma armação que retém fisicamente as MMP’s e por isso modula mecanicamente as proteinases, retirando-as do leito. Deste modo, a matriz modula e reequilibra o ambiente das feridas crónicas através da combinação de: ligação e inactivação das proteinases; ligação e protecção dos factores de crescimento naturais, que a posteriori são libertados novamente para a ferida; quimiotaxia e proliferação de fibroblastos sob a acção do colagénio e da CRO. Esta matriz demonstrou também propriedades hemostáticas (pela acção do colagénio e da CRO).

(pela acção do colagénio e da CRO). Na presença de exsudado a matriz transforma-se num gel macio, biodegradável (não sendo necessário a sua remoção). Sobre feridas secas deve utilizar-se soro fisiológico ou solução de Ringer. Caso haja tecido necrosado seco deve ser desbridado e se houver suspeita de infecção antes ou durante o tratamento, esta deve ser tratada separadamente, de forma adequada, com um antimicrobiano. Esta matriz deve ser coberta por um penso secundário, que promova um ambiente húmido. Este produto deve ser mudado em feridas exsudativas diariamente ou em dias alternados e em feridas com pouco a moderado exsudado de 3 em 3 dias. Existe uma formulação com baixa concentração de prata de modo a se obter  um controlo da colonização crítica.

– Pomada moduladora da actividade das proteinases – O pH da pele intacta é em torno de 5,5 (intervalo 4,8 – 6,0), impedindo o crescimento bacteriano. As soluções de continuidade tendem a ter um pH neutro ou ligeiramente alcalino (6,5 – 8,5). A actividade proteolítica no leito da ferida é sensível a variações de pH e modulando o pH para um ambiente mais ácido, controla-se a actividade das proteinases. Para além desta vantagem, esta pomada não permite a proliferação das bactérias, promove a remoção da fibrina e absorve o exsudado. Esta não deve ser utilizada em feridas infectadas e com tecido necrosado seco. Recomenda-se, a sua aplicação com 1-2 mm de espessura e deve-se colocar um penso secundário. O penso deve ser mudado pelo menos de 3 em 3 dias.

– De acordo com Elias (2004) o ácido hialurónico é um glicosaminoglicano (hidrato de carbono) da matriz extracelular que devido às suas propriedades hidrofílicas promove a multiplicação e a migração celular. Este pode apresentar-se sobre a forma de creme, gaze não aderente ou gel associado a baixas concentrações de iodo, e tem um papel importante na manutenção do ambiente húmido, fomentando a migração celular, na promoção da angiogénese, na proliferação de queratinócitos e diminui o excesso e consequente deposição de colagénio, reduzindo a probabilidade de formação de uma cicatriz (ELIAS, 2004). O ácido hialurónico está indicado em feridas crónicas com tecido de granulação e sem infecção. Na formulação com iodo pretende-se apenas fazer um controlo da colonização crítica. O penso com este produto deve ser mudado diariamente.

-Poliacrilato Superabsorvente (SAP) – De acordo com SMOLA (2008), o poliacrilato superabsorvente é um material com grande afinidade para moléculas de natureza proteica, sendo que as MMP’s não são excepção. Actua por duas vias, a primeira ao bloquear directamente as proteases, e segunda através da competição pelos iões Ca2+ e  Zn2+  que são essenciais para a actividade enzimática. SMOLA (2008), para além de comprovar in vitro uma inibição da actividade das MMP’s na ordem dos 87%, conseguiu resultados igualmente compatíveis in vivo, o que contribui para o equilibrio do microambiente da ferida crónica, permitindo a evolução do processo de cicatrização. São vários os factores de crescimento responsáveis pela regulação dos processos de cicatrização das feridas. Os macrofagos, as células endoteliais e as células musculares produzem, entre outros, o PDGF (factor de crescimento derivado das plaquetas). Este pode existir em forma de gel ou de biomembrana e tem uma acção quimiotáctica para macrófagos, neutrófilos, granulócitos e fibroblastos, apresentando assim um efeito proliferativo sobre o número de células da ferida. Contudo, a sua aplicação, conforme já referido, tem uma acção limitada em feridas crónicas. Spencer et al (1996) citados por Dealey (2001, p. 86) “sugerem que embora os resultados de testes clínicos tenham sido decepcionantes até agora, o interesse pelo uso de factores de crescimento levou a uma maior compreensão da composição fisiológica dos diferentes tipos de feridas crónicas.” Não existem ainda disponíveis no mercado português apósitos, com factores de crescimento.

4. Conclusão

Ao longo dos últimos 20 anos houve um grande desenvolvimento científico na área das medidas terapêuticas. Actualmente tem havido uma aposta muito forte nos conhecimentos da biologia das feridas complexas estagnadas no sentido de se conceberem linhas de orientação para a prática profissional, onde se incluam boas práticas para a preparação do leito da ferida que não devem descurar os produtos adequados à causa primária da cronicidade das feridas.

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