Mai 22, 2013

AUTORA

S. Rodrigues, Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Materna e Obstetrícia

Trabalho realizado no âmbito da monografia de Licenciatura em Enfermagem

CORRESPONDÊNCIA

E-mail: sofia.i.borges@gmail.com

2.RESUMO

A hospitalização constitui um risco de infeção, que justifica o facto de a infeção urinária nosocomial (IUN) permanecer uma problemática constante, apesar do seu longo historial temporal.

O processo de investigação desenvolvido teve por objectivos determinar se os enfermeiros conhecem os principais fatores de risco para a ocorrência da IUN, se utilizam sempre a técnica asséptica no cateterismo vesical, bem como identificar o nível de conhecimentos que detêm sobre a prevenção desta patologia.

Trata-se de um trabalho descritivo-exploratório no qual foi adoptado o método quantitativo. A colheita de dados fez-se pela aplicação de um questionário a 50 enfermeiros, sendo utilizada a amostragem por conveniência.

ABSTRACT

A “simple” hospitalization is a risk of infection, which justifies the fact that nosocomial urinary tract infection remains a constant problem, despite its long history.

The research process was developed had the following objectives: to determine whether nurses know the main risk factors for the occurrence of nosocomial urinary tract infection, if they always use aseptic technique in catheterization, and identify the level of knowledge they have about the prevention of this disease.

This is a descriptive exploratory study in which the quantitative method was adopted. Data collection was done by applying a questionnaire to 50 nurses, by convenience sampling.

3.INTRODUÇÃO

O objectivo principal deste trabalho de investigação é a realização de um estudo comparativo do nível de conhecimentos dos enfermeiros, na temática da infecção urinária nosocomial (IUN), a nível de três instituições distintas de prestação de cuidados de saúde: hospital central, hospital distrital e centro de saúde. Pretende ainda saber-se se os enfermeiros utilizam sempre a técnica asséptica no cateterismo vesical, se conhecem os principais factores para a ocorrência de IUN e identificar o nível de conhecimentos que estes detêm acerca da sua prevenção.

Normalmente, as vias urinárias e a urina são estéreis, ou seja, não contêm microorganismos, mas se por qual quer motivo estes conseguirem penetrar nas vias urinárias, desenvolvem-se com facilidade na urina, ocasionando uma infecção. A infecção urinária é definida como sendo “a presença de organismos patogénicos no trato urinário, com ou sem sinais e/ou sintomas”(1). Por sua vez, a IUN é definida pela “presença de sinais, sintomas e uroculturas positivas após 72 horas do internamento hospitalar e até sete dias após a alta hospitalar desde que não associadas a procedimentos de manipulação ou instrumentalização em ambulatório”(2).

Os cuidados de Enfermagem na prevenção e controle da IUN, baseiam-se em: “conhecer e ter segurança para realizar o ceteterismo vesical dentro da técnica específica; usar técnica correcta para lavagem das mãos e assepsia; manipular o sistema de drenagem do catéter com segurança e observar se não está desconectado ou com alguma obstrução; providenciar para que o colector esteja sempre em local limpo; fazer manipulação do catéter somente se necessário e com técnica adequada; promover a higiene do meato urinário diariamente, dentro da técnica asséptica”(3).

 Para alguns autores consultados “as atitudes chave para prevenir as infecções relacionadas com algália consistem em reduzir a duração da algaliação e garantir que o sistema de drenagem fechado se mantenha fechado”(4). Esta autora defende ainda que devem adoptar-se práticas de prevenção da infecção baseadas na evidência científica, desde a inserção da sonda vesical até à forma de lidar com o sistema de drenagem e aos cuidados a ter com o meato urinário.

Pode então afirmar-se que todos os cuidados de Enfermagem, por mais simples que aparentem ser, desde a lavagem das mãos e uso de luvas, a higiene do meato urinário dos doentes, a execução da algaliação; os cuidados diários de mobilização, mudança e fixação da sonda vesical; os procedimentos de colheitas de urina; a manutenção do circuito de drenagem; as irrigações vesicais; a realização de algaliações intermitentes, até aos cuidados com outros sistemas de drenagem urinária, como sejam a punção suprapúbica, e o sistema Pen’Rose, ou fazendo uso de fraldas descartáveis, até à educação do doente e família, são cuidados que influenciam em muito a prevenção e controlo da IUN.

 4.MATERIAL E MÉTODOS

Esta investigação tem um carácter descritivo-exploratório, situando-se no nível I de conhecimentos, de acordo com a hierarquia dos níveis de investigação sugerida por Fortin(5), pois o seu objectivo é denominar ou descrever, e existem à partida poucos conhecimentos no domínio em estudo. Foi ainda adoptado o método quantitativo, dado que se trata de um processo sistemático de colheita de dados observáveis e quantificáveis.

Hipóteses formuladas

H1 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante o género sexual dos enfermeiros.

H2 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a idade dos enfermeiros.

H3 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a formação profissional dos enfermeiros.

H4 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a instituição de exercício profissional dos enfermeiros.

H5 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a categoria profissional dos enfermeiros.

H6 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante o tempo de exercício profissional dos enfermeiros.

Variáveis em Estudo

Neste estudo, definiu-se como variável dependente o nível de conhecimentos dos enfermeiros acerca da prevenção da IUN. Como variáveis independentes temos: o sexo, a idade, a formação académica, a formação profissional, a instituição em que trabalha, a categoria profissional, o tempo de exercício profissional e o tempo no serviço actual. De referir ainda que todas estas variáveis foram escolhidas, de modo a proporcionar uma descrição o mais real possível da amostra em estudo.

Amostra

A amostra é constituída por 25 enfermeiros que trabalham num serviço de Medicina (sector masculino e feminino) de um Hospital Central, por 18 enfermeiros que trabalham num serviço de Medicina misto de um Hospital Distrital, e 7 enfermeiros que trabalham no serviço domiciliário de um Centro de Saúde. O método de amostragem utilizado foi o acidental, que significa que houve selecção de pessoas “mais prontamente disponíveis como sujeitos de um estudo”(6), e é também conhecido por amostragem por conveniência. Este tipo de amostragem favorece o uso das pessoas mais convenientemente disponíveis como sujeitos de um estudo, e o seu custo “é o risco de tendências e descobertas erróneas”(6).

Instrumento de Colheita de Dados

Dado o carácter do estudo, optou-se pelo questionário como instrumento para a recolha de informação. O questionário elaborado e utilizado incluía perguntas fechadas e perguntas abertas, e encontra-se estruturado em três partes distintas, sendo a primeira respeitante à caracterização da amostra, a segunda parte aos conhecimentos dos enfermeiros na área da IUN (consistindo numa escala de conhecimentos, cotada para 20 pontos), e a terceira e última parte é dirigida aos procedimentos dos enfermeiros, na prevenção da IUN. Antes da aplicação dos questionários procedeu-se ao pedido de autorização para o fazer nas três instituições prestadoras de cuidados, e após a recepção das respostas positivas procedeu-se à sua aplicação no período de 2 a 24 de Junho de 2004. Foram também respeitados todos os princípios éticos devidos na aplicação do instrumento de colheita de dados.

5.RESULTADOS

 No presente capítulo pretende-se dar a conhecer os resultados obtidos, em função de toda a informação colhida através da aplicação do questionário.

Caracterização da Amostra

Nesta amostra o sexo feminino domina com 68% sobre os 32% do sexo oposto, salientando-se um mínimo de 22 anos e um máximo de 52 anos, em que a média se centra nos 31 anos, com um desvio padrão a oscilar em torno da média de 7,33 anos. A maioria dos inquiridos encontra-se, com 36%, na classe etária dos 22 aos 27 anos, seguindo-se a classe etária dos 27-32 anos com 22%., possuindo também, maioritariamente, o grau de licenciados (64%), seguindo-se os bacharéis e pós-graduados com 26% e 6% respectivamente.

Metade da amostra trabalha no Hospital Central, enquanto que 36,00% exercem a sua actividade no Hospital Distrital e os restantes 14% no Centros de Saúde. Relativamente à categoria profissional, constata-se que 54% da amostra são enfermeiros, enquanto que 42% são enfermeiros graduados. Apenas 2% são enfermeiros especialistas e 4% são chefes.

Relativamente ao tempo de exercício profissional, salienta-se um mínimo de 1 ano e um máximo de 33 anos, centrando-se a média nos 8,24 anos, com um desvio padrão a oscilar em torno da média de 7,12 anos. Constata-se que a maioria exerce há menos de 5 anos com 44%, seguido de 40% entre 6 e 15 anos. Apenas 4% exercem a profissão há mais de 25 anos. Já em relação ao tempo no serviço actual, entre um mínimo inferior a 1 ano e um máximo de 33 anos, a média centra-se nos 4,62 anos, com um desvio padrão a oscilar em torno da média de 5,46 anos.    Desta amostra, 72% trabalha há menos 5 anos no serviço actual e 24% entre 6 e 15 anos.

Relativamente aos conhecimentos dos enfermeiros acerca da prevenção da infecção urinária, verifica-se um mínimo de 1 ponto e um máximo de 18 pontos, a média centra-se nos 10,8 pontos, com um desvio padrão a oscilar em torno da média de 3,98 pontos. Verifica-se que a maioria possui conhecimentos insuficientes com 38%, seguido de 34% de conhecimentos satisfatórios. Apenas 6% possuem um nível de conhecimentos muito bom. 76% dos enfermeiros consideram possuir formação suficiente na área da prevenção da IUN, os restantes 24% consideram não ter recebido formação suficiente nessa área.

Análise Inferencial

H1 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante o género sexual dos enfermeiros.

Para testar esta hipótese utilizou-se um Teste t de Student para comparação de médias de grupos independentes (neste caso para comparar as médias de conhecimentos entre homens e mulheres). Mediante os resultados obtidos (t = -0,468 e p=0,642), concluiu-se que não existe diferença significativa no nível de conhecimento entre os indivíduos do sexo masculino e feminino. Contudo, os inquiridos do sexo masculino tendem para melhores conhecimentos (x = 11,19) que os do sexo feminino. Verifica-se não haver diferenças estatisticamente significativas (p=0,642), o que implica a rejeição da hipótese H1 e a aceitação de Ho: “O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN não é diferente consoante o género sexual dos enfermeiros”.

H2 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a idade dos enfermeiros.

Para averiguar a existência de uma relação entre a idade e o nível de conhecimentos do profissional, realizou-se uma correlação de Pearson, verificando-se a existência de uma correlação negativa (r=-0,397 – associação negativa moderada), que significa que com o aumento da idade, diminui o nível de conhecimentos dos inquiridos. Assim, constata-se que essa variação apresenta significado estatístico significativo (p=0,004). Face aos resultados obtidos conclui-se que a hipótese estatística (H0) não é aceite (p=0,004), prevalecendo a formulada pelo autor (H2): “O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a idade dos enfermeiros”.

H3 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a formação profissional dos enfermeiros.

Para testar a H3 aplicou-se uma análise de variância (ANOVA), verificando-se que os enfermeiros com um curso de pós-graduação são os que possuem, em média, melhor nível de conhecimentos (12 pontos), seguidos dos licenciados com (11,75 pontos). Os enfermeiros do CESE (Curso de Estudos Superiores Especializados) são os que têm um nível de conhecimentos inferior (5,5 pontos). Constata-se a existência de diferenças estatisticamente significativas (p=0,035), o que leva à conclusão de que a hipótese estatística (H0) não é aceite (p=0,035), prevalecendo a hipótese formulada inicialmente (H3): “O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a formação profissional dos enfermeiros”.

H4 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a instituição de exercício profissional dos enfermeiros.

Para testar a H4 aplicou-se uma ANOVA, verificando-se que os enfermeiros do Hospital Distrital são os que possuem, em média, melhor nível de conhecimentos (13,72 pontos), seguidos dos enfermeiros do Hospital Central com (9,8 pontos). Os enfermeiros do Centro de Saúde são os que têm um nível de conhecimentos inferior (6,86 pontos). Verifica-se a existência de diferenças estatísticas altamente significativas (p=0,000), o que leva a concluir que a hipótese estatística (H0) não é aceite (p=0,000), prevalecendo a hipótese formulada pelo autor (H4): “O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a instituição de exercício profissional dos enfermeiros”.

H5 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante a categoria profissional dos enfermeiros.

Para estar a H5 aplicou-se uma ANOVA, verificando-se que os enfermeiros chefes são os que possuem, em média, melhor nível de conhecimentos (12 pontos), seguidos dos enfermeiros (11,92 pontos), depois pelos especialistas (com 10 pontos). Os enfermeiros graduados são os que têm um nível de conhecimentos inferior (9,33 pontos). Assim, constata-se a inexistência de diferenças estatisticamente significativas (p=0,162), o que leva a concluir que a hipótese formulada inicialmente (H5) não é aceite (p=0,162), prevalecendo a hipótese estatística: “O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN não é diferente consoante a categoria profissional dos enfermeiros”.

H6 – O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante o tempo de exercício profissional dos enfermeiros.

Ao formular esta hipótese, tentou-se averiguar e existência de uma relação entre o tempo de exercício profissional e o nível de conhecimentos, e para isso, optou-se por aplicar uma correlação de Pearson. Verificou-se a existência de uma correlação negativa (r=-0,316 – associação negativa moderada), que significa que com o aumento do tempo de exercício profissional diminui o nível de conhecimentos. Verifica-se que esta associação apresenta significado estatístico (p=0,026) e, perante os resultados obtidos conclui-se que a hipótese estatística (H0) não é aceite (p=0,026), prevalecendo a formulada inicialmente (H6): “O nível de conhecimentos sobre a prevenção da IUN é diferente consoante o tempo de exercício profissional dos enfermeiros”.

 6.DISCUSSÃO

Após a análise dos resultados, constatou-se que nesta amostra o sexo feminino é dominante, com uma percentagem de 68% enfermeiras e 32% enfermeiros, respectivamente. Esta diferença não surpreende, pois como é de conhecimento comum existe maior percentagem de mulheres a exercerem a profissão de Enfermagem. Relativamente aos conhecimentos, verificou-se pela análise inferencial que não existem diferenças significativas no nível de conhecimentos entre homens e mulheres, se bem que os inquiridos do sexo masculino tendem para apresentar melhor nível de conhecimentos (x = 11,19 pontos) que os do sexo feminino (x = 10,62 pontos).

Relativamente à idade dos inquiridos, foi encontrado um mínimo de 22 anos e um máximo de 52 anos, sendo que 36% encontram-se na faixa etária dos 22 aos 27 anos e apenas 4% na dos 42-47 anos, bem como dos 47-52 (4%), com uma média de 31 anos, ou seja, trata-se de uma amostra jovem. Quanto ao nível de conhecimentos, pela análise inferencial constatou-se que com o aumento da idade diminui o nível de conhecimentos dos inquiridos.

Relativamente à formação profissional, 64% são licenciados, 26% são bacharéis, 6% pós-graduados e 4% do CESE. Na análise inferencial constatou-se que os inquiridos que apresentam melhor nível de conhecimentos são os pós-graduados (12 pontos), seguidos dos licenciados (11,75 pontos), depois dos bacharéis (9 pontos). Isto faz pressupor que os indivíduos bacharéis e os do CESE sejam também os da faixa etária mais elevada, uma vez que se verificou que com o aumento da idade havia um decréscimo no nível de conhecimentos.

Quanto à distribuição por instituição de trabalho, 50% dos enfermeiros inquiridos exercem a sua actividade num Hospital Central, 36% num Hospital Distrital e 14% num Centro de Saúde. Na análise inferencial constatou-se que o nível de conhecimentos dos inquiridos é estatisticamente diferente consoante a instituição onde exercem, pelo que os inquiridos do Hospital Distrital são os que apresentam uma média de conhecimentos mais elevada (13,72 pontos). Por sua vez os do Hospital Central e os do Centro de Saúde apresentam médias baixas, e abaixo do esperado.

No âmbito da categoria profissional, 52% da amostra são enfermeiros, 42% enfermeiros graduados, 4% enfermeiros chefes e apenas 2% enfermeiros especialistas. Relativamente à análise inferencial, constatou-se que os enfermeiros chefes são os que apresentam melhores conhecimentos seguidos pelos enfermeiros e depois pelos especialistas, e os graduados são os que apresentam pior nível de conhecimentos

Relativamente ao tempo de exercício profissional, foi encontrado um mínimo de um ano e uma máximo de 33 anos, sendo que 44% trabalham há menos de cinco anos e apenas 4% há mais de 25 anos. Quanto ao tempo no serviço actual, foi encontrado um mínimo de menos de um ano e um máximo de 33 anos, sendo que 72% dos inquiridos trabalham no seu serviço há menos de cinco anos e 2% fazem-no num período entre 16 e 25 anos, e outros 2% há mais de vinte e cinco anos. Ao analisar estas duas variáveis, pôde também constatar-se que o indivíduo que trabalha há 33 anos esteve também durante todos esses anos no mesmo serviço. Pela análise inferencial constatou-se que o nível de conhecimentos é diferente consoante o tempo de exercício profissional, pois verificou-se que com o aumento do tempo de exercício da profissão diminui o nível de conhecimentos. Isto faz pressupor que os inquiridos não frequentam formações após o curso de base.

No nível de conhecimentos, foi encontrada uma média de 10,8 pontos, numa escala de 20 pontos, com um mínimo de 1 ponto (ou seja, uma única questão correcta), e um máximo de 18 pontos. 38% dos enfermeiros revelaram um nível insuficiente de conhecimentos na área da prevenção da IUN e apenas 6% atingem o nível muito bom. Contrapondo-se a estes resultados, 76% dos inquiridos afirmam ter formação suficiente nesta área e apenas 24% afirmam ter recebido formação insuficiente.

Através da terceira (e última) parte do questionário foram descritos os procedimentos utilizados pelos enfermeiros no seu dia-a-dia do cuidar. Assim, 92% dos enfermeiros afirmam lavar as mãos antes e depois de algaliar e apenas 8% afirmaram não o fazer por usarem luvas e não acharem este acto essencial. O uso de luvas é essencial quando houver contacto com a urina ou com a região de inserção da sonda vesical(7), contudo, e tal como refere Teixeira(8) “antes de mais, é indispensável lavar bem as mãos, antes e depois de qualquer operação”.

Relativamente à higiene do meato urinário do doente algaliado, 38% dos enfermeiros afirmaram realizar aplicação local de pomada de clorhexidina ou iodopovidona, lavagem diária com água e sabão e uso de técnicas específicas de desinfecção do meato; 30% afirmaram realizar técnicas específicas de desinfecção do meato; 6% afirmam realizar aplicação local de pomada de clorhexidina ou iodopovidona. Apenas 26% afirmam realizar a lavagem diária, com água e sabão, que é o único procedimento recomendado pelos autores consultados: como medida fulcral, é recomendado que se lave o meato urinário do doente algaliado uma vez por dia, mais concretamente a área à volta do orifício uretral, com água e sabão, não sendo necessário aplicar localmente pomada de clorhexidina ou de iodopovidona(8). As bactérias terão tendência a penetrar na uretra durante a limpeza, devendo portanto evitar-se o uso de técnicas específicas de desinfecção do meato urinário(4).

Quanto ao método de drenagem urinária mais frequentemente utilizado nos serviços, domina a algaliação de longa duração (54%), seguida da algaliação intermitente (34%) e do sistema Pen’Rose (12%). Constata-se então que é predominantemente utilizado o método de drenagem vesical que mais aumenta o risco de infecção urinária – Wilson(4) afirma existir uma forte correlação entre o tempo que uma algália fica colocada e o risco de infecção urinária.

Verificou-se que na grande maioria dos casos quem realiza a troca dos sacos colectores de urina são os auxiliares de acção médica (46%), em segundo lugar pelos enfermeiros (36%); 18% dos resultados revelam que tanto os enfermeiros como os auxiliares o fazem, em alguns serviços. Questionamos se os auxiliares de acção médica recebem formação suficiente para procederem à troca dos sacos colectores respeitando a técnica devida.

Na introdução da algália no meato, a grande maioria dos enfermeiros utiliza luvas esterilizadas (84%) e apenas 2% revelaram utilizar o invólucro da sonda. Constata-se que a grande maioria dos enfermeiros adopta a postura correcta, optando pela utilização de luvas esterilizadas no momento da introdução da algália, pois um estudo português(9) mostrou que a utilização de luvas esterilizadas é meio que proporciona uma taxa de infecção significativamente mais reduzida comparativamente às compressas e ao invólucro da sonda, pelo que este último contribui cerca de 2,5 vezes mais para a existência destas infecções.

As algálias mais utilizadas nos serviços são maioritariamente as de silicone (68%), seguidas das de látex (56%), apenas 2% dos enfermeiros referiram utilizar sondas de silicone com prata. A escolha das sondas de silicone é a mais correcta, pois o silicone é um material muito inerte, provocando uma irritação mínima e resistindo bastante à incrustação(4); contudo ainda se verifica uma alta utilização das sondas de látex que são muito irritantes(4). É curioso o facto de 2% dos enfermeiros referir a utilização de sondas de silicone com revestimento de prata, pois a autora referida aponta que estas, apesar de serem as mais vantajosas, uma vez que parecem reduzir a incidência de bacteriúria, não se encontram disponíveis no mercado.

Quanto ao tipo de mobilização da sonda, 64% dos enfermeiros afirmam fazê-lo em sentido rotativo, contrastando com 2% que afirmam fazê-lo em sentido ascendente e outros 2% em sentido descendente. A grande maioria dos enfermeiros questionados adoptam a técnica correcta, pois quando é necessário mobilizar a sonda vesical, deve-se fazê-lo em sentido rotativo(8).

Relativamente ao tempo aproximado que os enfermeiros mantêm a sonda “pinçada” ou clampada, quando necessário, a maioria refere fazê-lo por um período de cerca de uma hora (42%), contrastando com 2% que afirmam fazê-lo por mais de três horas. A sonda vesical nunca deve ser clampada por um período de tempo superior a duas horas, pois tal acto leva a que haja estase de urina na bexiga, o que predispõe à infecção(8). Neste estudo, verificou-se que a maior parte dos enfermeiros adopta a técnica correcta neste acto.

Em relação ao local de fixação da sonda vesical, mais de metade da amostra revelou não fixar a algália (64%), seguindo-se os que a fixam na coxa do doente (34%), e apenas 2% a fixam no abdómen do doente. Tanto os enfermeiros que fixam a sonda na coxa como no abdómen do doente revelam procedimentos correctos e aceites pelos autores consultados: “a sonda vesical deve ser fixada no abdómen ou na coxa (no homem) ou na coxa (na mulher), para evitar movimentos de tracção e ulceração uretral”(8). Infelizmente a grande maioria dos enfermeiros não atribui importância a este acto, uma vez que 64% afirmam não o fazer.

Metade dos enfermeiros afirmaram raramente utilizar a realgaliação como método de colheita asséptica de urina, seguindo-se 42% que afirmaram nunca o fazer, e apenas 8% o fazem frequentemente. De facto a realgaliação, como método de colheita de urina asséptica é contra-indicada dado que uma realgaliação aumenta o risco de infecção urinária(1).

A maioria dos enfermeiros afirmou utilizar punção da sonda vesical como método de colheita de urina em doentes algaliados (48% das respostas), seguindo-se os que o fazem por desconexão do circuito de drenagem (42%), e apenas 10% revelaram fazê-lo por punção do saco colector. As colheitas de urina em doentes algaliados devem ser feitas por punção com técnica asséptica na zona própria para o efeito, não devendo o sistema de drenagem ser aberto para este fim(4). Outros autores acrescentam que nunca se deve desconectar o circuito para obter amostras de urina, pois isto facilita a entrada de microorganismos patogénicos no sistema de drenagem(8). A maioria dos enfermeiros adopta o procedimento correcto para colher urina em doentes algaliados, contudo ainda uma grande porção opta por desconectar o sistema de drenagem.

Nas colheitas de urina em sonda Foley, por punção, 54% dos enfermeiros utilizam uma agulha endovenosa, seguindo-se os que optam pela subcutânea (40%); apenas 6% afirmaram optar pela agulha intramuscular para o efeito. Neste mesmo procedimento, 56% dos enfermeiros afirmaram desinfectar previamente a área da punção com iodopovidona, seguindo-se os que o fazem com álcool a 70º (26%) e 18% afirmam fazê-lo com éter.

Para a punção das sondas vesicais, a maioria dos enfermeiros opta pelo tipo de agulha errado, uma vez que a preconizada pelos autores é a subcutânea, pelo seu menor calibre. Quanto à desinfecção, a grande maioria (82%) optam pelo desinfectante apropriado, pois tanto a iodopovidona como o álcool a 70º são indicados para o efeito(8).

Quanto ao tipo de circuito de drenagem vesical, a esmagadora maioria dos enfermeiros apontou o descendente fechado como sendo o utilizado no seu serviço (92%). Apenas 6% apontaram o descendente aberto e 2% o ascendente aberto. Com a utilização do sistema de drenagem fechado, comparativamente ao aberto, o risco desce para cerca de 5 a 10% por cada dia de cateterismo(10), sendo portanto este sistema o mais indicado. É  bastante positivo constatar-se que mais de 90% dos participantes do estudo utilizam este tipo de circuito de drenagem vesical. Quanto aos circuitos descendente aberto e ascendente fechado, é de referir que o primeiro há décadas caiu em desuso, com o aparecimento dos sacos colectores, e o segundo é inexistente e impossível de realizar.

Relativamente ao tipo de sacos colectores de urina, 82% dos enfermeiros utilizam os de tipo anti-refluxo, mas apenas 6% utiliza esterilizados e outros 6% os que possuem  dispositivo de colheita de urina. A utilização de sacos anti-refluxo, e se possível esterilizados, é a mais vantajosa pois apesar de serem mais caros são trocados menos vezes, e idealmente, deveria utilizar-se sempre um saco de drenagem urinária com dispositivo de colheita de urina, mas ainda não é possível em algumas instituições(8).

Relativamente à posição do saco colector, 92% dos questionados coloca-o em suporte adequado, pendurado na cama do doente; apenas 4% afirmou colocá-lo sobre a cama, ao lado do doente, e 2% no chão, sem que o doente o pise e outros 2% em cima de uma cadeira, ao lado da cama. Constata-se que a quase totalidade dos enfermeiros coloca os sacos colectores de forma a prevenir o refluxo e a evitar o contacto com o chão, uma vez que os colocam no suporte adequado. Este procedimento é preconizado cientificamente, pois a posição incorrecta do saco colector pode contribuir para transportar bactérias do saco colector para a bexiga(4).

Quanto à utilização das irrigações vesicais, 42% dos enfermeiros afirmaram não a realizar. Contudo ainda 30% as realizam quando a sonda está obstruída, e 28% esporadicamente. A realização de irrigações vesicais é um procedimento contra-indicado, pois implica que haja desconexão do sistema de drenagem fechado, o que aumenta a incidência de IUN(4). Além disto, outros autores advertem para o facto de as irrigações vesicais predisporem à colonização e à infecção por organismos resistentes(11).

Na questão do uso ou não de fraldas descartáveis nos serviços, 94% dos enfermeiros responderam afirmativamente e apenas 6% responderam negativamente. Neste aspecto, a quase totalidade dos enfermeiros optam por um procedimento correcto: “para mulheres, as fraldas descartáveis associadas a roupas de cama especiais, devem ser utilizadas sempre que possível”(11).

Quanto à educação do doente algaliado, a maioria dos enfermeiros afirmou realizá-la sempre que possível (58%); apenas 4% referiram não ter tempo para este procedimento. Pela análise dos dados verifica-se que a percentagem de enfermeiros a adoptar esta atitude é ainda inferior ao que se esperava, uma vez que a educação do doente algaliado é muito vantajosa até para o próprio doente. Para Santos(3) a educação é uma estratégia preventiva fundamental, pelo que, sempre que possível, os profissionais de saúde devem fornecer orientações aos doentes, relativas às medidas que podem tomar para evitar a infecção e melhorar as suas defesas naturais. Este deve ser um procedimento a adoptar, pois “estimular o doente a cuidar da sua própria algália diminui o risco de infecção cruzada”(4).

 7.BIBLIOGRAFIA

(1)  LINO, Cristina et al (1996). “Infecção Urinária provocada pela utilização de sacos colectores de urina”. Nursing. 104. Pp. 8-12.

(2) HENRIQUES, Mª Carmo et al (2001). Manuel de Prevenção de Infecções Nosocomiais – Comissão de Controlo de Infecção Hospital S. Teotónio. Viseu: Asta Médica. Pp. 57-61.

(3) SANTOS, Nívea (2003). Enfermagem na Prevenção e Controle da Infecção Hospitalar. São Paulo: Iátria. Pp. 17-24, 37-47, 51-61.

(4) WILSON, Jennie (2003). Controlo de Infecção na Prática Clínica. Loures: Lusociência. Pp. 249-261.

(5) FORTIN, Marie-Fabienne (2000). O Processo de Investigação: da concepção à realização. Loures: Lusociência. P. 22, 37, 48, 100, 202, 368.

(6) POLIT, Denise; HUNGLER, Bernardette (1995). Fundamentos da Pesquisa em Enfermagem. Porto Alegre: Artes Médicas. Pp. 146, 357.

(7) BOLICK, Dianna et al (2000). Segurança e Controle de Infecção. Rio de Janeiro: Reichmann & Affonso Editores. Pp. 79-85, 92-123, 193-196.

(8) TEIXEIRA, Mário (1997). “Prevenção da Infecção Urinária”. Sinais Vitais. 10. Pp. 41-42.

(9) COSTA, Isabel Mª (1999). “Estudo de Incidência de Infecções Urinárias em Doentes Algaliados”. Sinais Vitais. 22. Pp. 29-31.

(10) AZEVEDO, Fabiano (2001). “Infecções Urinárias”. In Manual de Infecção Hospitalar: epidemiologia, prevenção e controle. Editado por Maria Aparecida Martins. Rio de Janeiro: Medsi. Pp. 165-170.

 

(11) GAGLIARDI, Eloisa et al (2000). “Infecção do Trato Urinário”. In Infecção Hospitalar e suas interfaces na área da saúde. Editado por António Tadeu Fernandes. São Paulo: Editora Atheneu. Pp. 459-475.

 

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El MAYOR DEPENDIENTE Y SU FAMILIA

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AUTORES: Vítor Santos, Ana Sofia Santos ,Tânia Silva, Vera Pires,Carla Robalinho,Fátima Nunes

Resumo

Com a evolução dos cuidados de saúde, doenças que anteriormente eram fatais, durante o seu episódio agudo, são agora controláveis, passando a apresentar características de cronicidade. A família, enquanto unidade social perfeitamente funcionante, é o principal apoio do doente com incapacidade/doença crónica, sendo fundamental o contributo da Enfermagem, como parceira de ambas as entidades: doente crónico e sua família. A Enfermagem, tem uma importante palavra a dizer, ao cuidar deste tipo de doente e família, com base numa parceria, que deve ter como principais frutos, uma maior autonomia destes, em lidar com a doença e restaurar o equilibrio do sistema familiar. De modo a desenvolver este tema, foi efectuada uma recensão crítica de um artigo que foca toda esta problemática.

Palavras-chave: Idoso, Dependência, Família, Enfermagem

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Abstract

With the evolution of health care, previously fatal diseases during their acute episode, are now controllable, and gain characteristics of chronicity. The family as a social unit perfectly functional, is the main support of the patient with disability / chronic illness, and the fundamental contribution of nursing, as a partner of both entities: chronically ill and their families. Nursing has an important word to say, to take care of this type of patient and family, based on a partnership, it must have as its main fruit of greater autonomy in dealing with the disease and restore the balance of the family system. In order to develop this theme, was made one critical review of an article that focuses on all this.

Keywords: Elderly, Dependency, Family, Nursing

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De acordo com a OMS, as doenças crónicas, são actualmente a principal causa de morte e incapacidade, no mundo (PORTAL DA SAÚDE, 2005), tendo aumentado exponencialmente nas últimas décadas, como reflexo do grande desenvolvimento tecnológico, social e económico.

Doenças que anteriormente eram fatais, durante o seu episódio agudo, são agora controláveis, passando a apresentar características de cronicidade. Associada a esta evolução de doença, evolui também o conceito de “estar doente” (“illness”), de viver a doença, pelo que se deve apostar fortemente na qualidade de vida de quem sobrevive com a doença, para além do controlo rigoroso dos processos fisiopatológicos subjacentes.

Quanto a este cenário, a Enfermagem, tem uma importante palavra a dizer, ao cuidar deste tipo de doente e família, com base numa parceria, que deve ter como principais frutos, uma maior autonomia destes, em lidar com a doença e restaurar o equilibrio do sistema familiar.

Assim, de modo a desenvolver esta pertinente temática foi efectuada uma recensão critica de um artigo: “ A família do doente dependente”, que reflecte o impacto da doença crónica incapacitante no indivíduo e família. Trata-se de um artigo fruto de uma revisão bibliográfica e análise reflexiva pelos autores, acerca da temática apresentada, sendo o nosso objectivo a recensão crítica deste trabalho, analisando-o à luz da evidência cientifica mais credível e actual, sobre o tema em questão, de modo a complementar as ideias expostas, esperando obter como produto final, uma reflexão critica, mais alargada e profunda.

RECENSÃO CRÍTICA

O artigo, que é alvo desta recensão crítica, foi editado pela revista “SERVIR”, na revista nº3, do volume 53, no ano 2005, em Lisboa, com o título “A família do doente dependente”,  com 6 páginas, sendo da autoria de Carla Correia e Renato Teixeira, enfermeiros do Hospital de São Sebastião (Santa Maria da Feira) e Sónia Marques, enfermeira dos Hospitais da Universidade de Coimbra, requisitada na Escola Superior de enfermagem Dr. Ângelo da Fonseca. É portanto uma obra que nos fala do papel da família, como cuidadora informal do doente crónico em situação de dependência, estruturada em 3 partes, as quais: “A Família”, “Repercussões da doença na vida familiar”,  “O papel da Família”. Trata-se essencialmente do resultado de uma revisão da literatura e análise reflexiva acerca da temática, sendo interessante a perspectiva que nos dá, do ponto de vista da família, das suas funções naturais, do cuidado a um dos seus elementos, no contexto de doença crónica incapacitante e do impacto desta, na vida familiar. O resumo apresentado no artigo, é bastante elucidativo, destacando claramente as dificuldades sentidas pela família no cuidado ao doente em situação de dependência e o impacto desta na dinâmica familiar, sem deixar de referir os aspectos positivos que advêm deste novo contexto. A linguagem utilizada ao longo do texto é clara e objectiva, assim como a mensagem, apresentando ao longo do texto um encadeamento lógico, articulando os vários conceitos apresentados.

Um dos primeiros assuntos abordados na obra em análise é a família. Os autores apresentam a família como “ unidade básica em que nos desenvolvemos e socializamos” e que serve de apoio para “ultrapassar os momentos de crise”. De acordo com HANSON (2005, pág. 4), a definição de família evoluíu ao longo dos tempos, incluindo sempre critérios biológicos, sociológicos, psicológicos e legais. Uma das primeiras e mais completas definições de família, surge na década de 50, “grupo de pessoas unidos por laços maritais, de sangue ou adopção, constituindo uma única unidade familiar, interagindo e comunicando entre sí e partilhando uma cultura comum” (adaptado de BURGESS & LOCKE, 1953, citado por HANSON, 2005, pág.4). Dadas as transformações sofridas ao longo das últimas décadas, a definição que se pode considerar mais actual é “dois ou mais indivíduos, que dependem uns dos outros, para apoio emocional, físico e económico” (Adaptado de HANSON, 2005, pág.6). De facto a família desempenha um papel importante no desenvolvimento do indíviduo, pelo que é também fundamental no apoio ao indivíduo com doença, de modo a tentar compensar esse indivíduo, equilibrando assim a saúde da própria família como uma unidade, que se define como “estado dinâmico de mudança do bem-estar que inclui factores biológicos, psicológicos, espirituais, sociológicos e culturais do sistema familiar” (Adaptado de HANSON, 2005, pág.6). Sem dúvida alguma, a função de apoio da família, depende em grande parte de adaptabilidade familiar, que consiste na “capacidade da família de se reorganizar e alterar funções regras e padrões de interacção em resposta a stress, seja ele situacional ou de desenvolvimento” (PHIPPS, 2003, pág. 156). Trata-se de uma dimensão também valorizada pelos autores do artigo, que se referem a esta flexibilidade da família face à doença, como “um reajustamento enorme, com implicações frequentes na dinâmica familiar” (CORREIA, 2005, pág. 127), face à doença incapacitante/crónica.

A segunda parte do artigo, aborda específicamente as repercussões da doença na vida familiar, começando  o autor por nos apresentar a doença como “parte inevitável comum e normal da experiência humana”  (CORREIA, 2005, pág. 127).  Neste ponto é essencial distinguir entre a doença fisiológica (“disease”) e a experiência humana de estar doente (“illness”). A doença fisiológica refere-se à “condição em que existe, de um ponto de vista fisiopatológico, uma alteração na estrutura ou função do organismo” (adaptado de LARSEN, 2006, pág.4). Por outro lado, estar doente, refere-se à “experiência humana de sintomas e sofrimento, à forma como a doença é percepcionada, vivida e a resposta do individuo e familia a esta”  (adaptado de LARSEN, 2006, pág.4). É portanto essencial perceber a experiência humana de estar doente, principalmente na perspectiva da doença crónica (LARSEN, 2006, pág.4). A doença crónica contráriamente à aguda, que tem um “desenvolvimento rápido (…), num curto espaço de tempo, terminando na completa recuperação do individuo ou morte”  (adaptado de LARSEN, 2006, pág.4), continua indefinidamente. Como é referido pelo autor “apesar dos avanços tecnológicos, a doença não deixa de atingir os indíviduos e as famílias” (CORREIA, 2005, pág. 127), o que de facto leva ao aumento do número de pessoas que sobrevivem com problemas incapacitantes/crónicos. De facto todos estes avanços tecnológicos na área da saúde, conseguiram colocar um travão à mortalidade associada a doença aguda, tendo consequentemente fomentado um aumento das doenças crónicas, associado ao aumento da esperança de vida. De acordo com LARSEN (2006, pág.3), “viver mais, leva no entanto, a uma maior vulnerabilidade a eventos que se tornam crónicos por natureza”. E os exemplos dados por esta autora suportam a afirmação anterior: O individuo que anos atrás poderia ter morrido com um enfarte do miocárdio, continua precisar de cuidados para a sua insuficiência cardíaca e o doente oncológico, pode sobreviver com sequelas iatrogénicas do processo de tratamento. Assim, apesar de ser uma alternativa “bem-vinda”, em relação à morte, pode trazer grandes alterações para o individuo e familia, modificando por vezes a sua identidade, qualidade de vida e estilo de vida.

Torna-se ainda importante definir claramente o conceito de cronicidade, que é indissociável do conceito de “danos permanentes”, como verificamos nesta adaptação da definição de doença crónica, da Comissão Americana de doenças Crónicas (1957), citada por LARSEN (2006, pág.5): “todos os danos ou desvios da normalidade, que tenham uma ou mais das seguintes características: ser permanente, incapacidade resídual, causada por patologia não-reversível, requer treino específico do indivíduo, com vista à sua reabilitação, podendo requerer um longo período de supervisão ou cuidados”. Este conceito evoluiu, passando a valorizar não só o indivíduo e o contexto profissional-utente, para passar a incluir todo o ambiente do utente: “doença crónica é a presença irreversível, acumulação ou latência de estados patológicos ou danos, que envolvem todo o ambiente humano, no cuidado e autocuidado, manutenção da função e prevenção de nova incapacidade” (adaptado de CURTIN & LUBKIN (1995), citado por LARSEN, 2006, pág.5), o que nos remete para o papel importante da família no cuidado ao doente crónico, com incapacidade. O que se verifica, na óptica do autor, é que apesar de de estarmos a transferir o doente para um meio mais natural, a família,  a homeostasia desta é facilmente quebrada perante a doença, o que se deve em parte ao “esgotamento dos membros mais implicados nos cuidados ao doente” (CORREIA, 2005, pág. 127).  Assim é de facto inquestionável que a doença de um membro afecta toda a família, que passa a lutar pela restauração do equilibrio desta. Este conceito de doença como factor desiquilibrante do meio familiar, é amplamente desenvolvido pelo autor, reforçando-o com contributos de diversos autores, até que identifica um pré-requisito importante para as familias melhor lidarem com a crise, ou seja “quanto melhor for a organização e integração prévia à situação de doença, melhor é a eficácia em lidar e adaptar aos problemas consequentes”  (OLIVEIRA (1994), citado por CORREIA, 2005, pág. 127).

O autor acrescenta que a “nova família”, surgirá tanto em função da estrutura anterior, com em função do processo evolutivo da história familiar e variáveis relacionadas com a doença crónica do individuo afectado. Assim, facilmente se percebe que a patologia individual se converte em patologia familiar e de facto, “a família como tal, não é a mesma antes, durante e depois da doença” (CORREIA, 2005, pág. 127). Como refere o próprio autor “os papéis e as responsabilidades préviamente assumidas pelo doente delegam-se a outros membros, ou (…) deixam de ser cumpridos”  (CORREIA, 2005, pág. 127). De facto, este é um aspecto bastante relevante, uma vez que a “doença crónica pode ter um impacto negativo na independência e auto-controlo, associados ao nível de desenvolvimento do indivíduo” (adaptado de LARSEN, 2006, pág. 6), sendo portanto importante ter em conta o estadio de desenvolvimento do individuo, quer ele esteja em idade escolar, seja adolescente, jovem adulto, adulto ou idoso, pois a doença crónica em qualquer um destes estadios está muitas vezes associada a “dependência aumentada nos outros” (adaptado de LARSEN, 2006, pág. 6). Assim a alteração nos papéis que desempenham, é evidente, influênciando o desenvolvimento da criança, comprometendo a necessidade de independência do adolescente, afectando a capacidade do jovem adulto de se expandir, numa “fase de grande actividade e produtividade” (adaptado de LARSEN, 2006, pág. 8) ou até mesmo dificultar o desenvolvimento do idoso, que de acordo com “os estadios de desenvolvimento de Erikson (…) o idoso também têm tarefas a cumprir (…), no estadio «integridade versus desespero»” (adaptado de LARSEN, 2006, pág. 9).

Tanto o doente como a familia podem encarar de forma diferente a doença crónica. O indivíduo pode encarar a doença como “um castigo, por comportamentos menos saudáveis (…) associada à vergonha pelo estigma da doença” (ROLLAND (1998) citado por CORREIA, 2005, pág. 127), sendo que em relação à família o mesmo autor refere que esta pode também sentir culpa pela situação de doença. Este sentimento de culpa, referido pelo autor, está relacionado com um aspecto pouco aprofundado no artigo, relativo ao comportamento face à doença, que tem uma forte influência psicológica, social e cultural, visto que na “doença crónica, o indivíduo deve modificar ou adaptar os pápeis prévios, de modo a conciliar tanto as expectativas sociais, como o seu estado de saúde” (adaptado de LUBKIN et al., 2006, pág. 23), reforçando que, a representação da doença e comportamento face a esta, está relacionada com a “forma como os indivíduos respondem a indicações do corpo (…), definem e interpretam sintomas” (adaptado de LUBKIN et al., 2006, pág. 23 e 24). Também o factor económico e demográfico exerce a sua influência, agindo sobre as variáveis social e psicológica, como no exemplo da pobreza, em que se tende a desvalorizar a saúde, uma vez que “quem tem de trabalhar para sobreviver, muitas vezes nega a doença a não ser que traga incapacidade funcional” (adaptado de LUBKIN et al., 2006, pág. 24). Na família também surgem múltiplos problemas e preocupações. Face à incapacidade do individuo  dependente em assumir o seu papel, ela própria própria assume toda responsabilidade pelas decisões a tomar. O assumir deste papel, que pertence ao individuo, é um desvio da normalidade, que afecta o sistema familiar, gerando stress e logo desiquilibrio, sendo ainda outros factores que influênciam o cuidado da família: “intensidade do cuidado prestado, tipo de tarefas, género e caracteristicas pessoais do cuidador e doente; apoio de outros membros da família e obrigações concomitantes do cuidador” (adaptado de MORRIS e EDWARDS, 2006, pág. 261).  O autor refere um facto inquestionável, “a perda é um sentimento comum tanto no doente como na família” (CORREIA, 2005, pág. 128), na situação de doença crónica, sendo este sentimento agravado, na presença de incapacidade que interfira no papel social do doente e família, assim como a nível físico e psiquico, tendo um impacto significativo na qualidade de vida. De facto, tendo em conta que a qualidade de vida é um conceito altamente subjectivo, “ancorado em factores sócioeconómicos, demográficos, e de estilos de vida; características da personalidade, aspectos do ambiente social e comunidade; e em bem-estar físico e mental (adaptado de SCHIRM, 2006, pág. 202), e que relacionado com a saúde, dá mais enfâse à função física e social, assim como ao bem estar emocional, a presença de uma incapacidade crónica vai implicar por parte do indivíduo e família uma redifinição destes conceitos de modo a restabelecer o equilibrio e manter alguma qualidade de vida, aceitável tendo em conta o padrão anterior. Assim, tal como refere o autor, é importante “o doente em causa (…) aprender a viver com a doença, e os restantes elementos da família devem devem aprender a responder da melhor forma a essa doença” (CORREIA, 2005, pág. 128), embora seja um facto, que a autonomia do doente e familia seja posta em causa. No final desta segunda parte o autor reforça a importância dos cuidados centrados na família, como meio de gerir o impacto da doença, terminando ao reforçar que a família é “a instituição fundamental na vida das pessoas e da sociedade” (CORREIA, 2005, pág. 128).

Na terceira parte do artigo o autor aborda o papel da família, no sentido da função que esta desempenha perante o doente crónico com dependência. Nesta parte o autor começa por nos oferecer uma perspectiva interessante da autoria de MOREIRA (2001), acerca das funções familiares, em que o desempenho de determinadas funções em resposta às necessidades da família como um todo, de cada membro individualmente e às expectativas da sociedade são fundamentais de modo a manter a integridade da família. A ausência destas funções não só traria dano ao indivíduo, como retirava o significado de familia, à unidade familiar, o que está plenamente de acordo com as definições de família apresentadas, por HANSON (2005). Neste artigo, o autor à semelhança de HANSON (2005), reconhece que a evolução da sociedade implica também transformações na família, chegando a acrescentar mesmo que “na sociedade contemporânea, um grande número de instituições privadas ou públicas substituem a família em funções anteriormente consideradas como (…) familiares”. No contexto da doença crónica, tal também se verifica, sendo que cada vez mais, temos várias instituições, ou cuidadores informais, distintos da família, sendo o cuidador informal definido por MORRIS e EDWARDS (2006, pág.254), como “alguém que presta cuidados, sem pagamento e quem normalmente tem ligações pessoais com o doente”

No decorrer do artigo, o autor explora detalhadamente as funções familiares, que são perfeitamente actuais e condizentes com a literatura consultada, chegando mesmo a apresentar dois tipos de função familiar básicos, a função interna e externa. A 1ª está relacionada com as funções básicas de apoio e segurança, pelo que faz sentido incluir nestas a função de saúde, cabendo à 2ª função a transmissão de aspectos culturais. A base para o sucesso destas funções, é identificada pelo autor, como sendo a componente afectiva, na medida em que é “esta que mantém as famílias unidas, dando aos seus membros o sentido de pertença que conduz ao sentido de identidade familiar” (KOZIER 1993, citada por CORREIA, 2005, pág. 129). Esta mesma autora considera as funções de saúde, como função básica da família, “que consistem em proteger a saúde dos seus membros e proporcionar cuidados quando eles necessitam” (KOZIER 1993, citada por CORREIA, 2005, pág. 129). Na sequência desta ideia, é referido que “é no seio da família que os indivíduos desenvolvem o conceito de saúde, adquirem hábitos de saúde e estilos de vida saudáveis” (KOZIER 1993, citada por CORREIA, 2005, pág. 129). Na verdade é preciso também ter em conta que apesar do contributo familiar, este não é o único determinante nos estilos de vida, que “reflecte as actividades, os interesses e as opiniões de um indivíduo” (ENGEL, BLACKWELL e MINIARD, 1995, citados por AMARO et al., 2007, pág.116). No que respeita ao cuidado por parte da família, há que ter em conta a especificidade da doença crónica, associada a dependência, na medida em que vai implicar cuidados permanentes/longa duração, implicando um compromisso “para a vida”, no sentido da palavra, pois um familiar será sempre um familiar e essa função está inerente a esse papel. É pertinente clarificar que associada a esta função familiar está uma carga emocional e exigência de cuidado elevada, que leva muitas vezes à exaustão familiar e desistência, ou seja o “burn out and giving up” (MORRIS e EDWARDS, 2006, pág.254). A ideia de família como principal recurso do doente crónico, é reforçada, pelo autor ao longo desta parte do artigo, até que apresenta a ideia da família não só como cuidadora, ou parceira do cuidar, mas também como receptora de cuidados. Este aspecto é muito importante pois a família de modo a poder cuidar bem, necessita de “assegurar o seu próprio bem estar, necessitando de apoio , ajuda e compreensão da restante família e amigos, e do sistema de cuidados de saúde“ (MORRIS e EDWARDS, 2006, pág.268). Como parceiros do cuidar, os familiares têm “um papel activo na prestação de cuidados ao doente, assim como na tomada de decisões”, sendo que, “requerem formação e acompanhamento (…), por forma a reunirem as melhores condições, para lidarem com a situação/problema” (MARTOCCHIO, citado por MARTINS (2000), citado por (CORREIA, 2005, pág. 130). Assim, fica bastante clara a necessidade de educação para saúde, tanto para o individuo, que deve potenciar as capacidades que tem, como para a família, que deve ser capacitada para cuidar adequadamente do seu membro tendo em vista o equilibrio e melhor qualidade de vida para ambos. É importante também ter em conta que a motivação, adesão e compreensão da necessidade de aprendizagem são condicionantes relevantes neste processo de aprendizagem.O autor termina esta parte, concluindo acerca da importância da família no cuidado ao doente crónico com dependência, apesar das dificuldades económicas, precariedade das condições habitacionais, ou mesmo falta de conhecimentos para tal.

Na conclusão o autor alerta para a necessidade de politicas de saúde mais adequadas à necessidade de apoio crescente por parte dos doentes crónicos com dependência, de modo a dar apoio a famílias sobrecarregadas, que são obrigadas a assumir o cuidado de doentes, com pouco apoio de instituições de saúde que têm cada vez mais dificuldades de resposta. O autor faz ainda uma chamada de atenção aos enfermeiros, que devem evitar estar centrados apenas na angústia e sofrimento do doente, sem esquecer que a família também precisa de apoio nesta fase. De facto o autor conclui o artigo focando pontos chave desta temática e o apoio da enfermagem na transição para a família é de facto algo que não devemos descurar, pois apesar de esta ser sempre o destinatário final do utente, na maioria dos casos não está preparada numa fase inicial e está também ela em crise, necessitando primeiro de ser cuidada, antes de ser incluída na parceria dos cuidados.

CONCLUSÃO

Esta recensão obrigou a uma análise séria dos argumentos explanados no artigo e não apenas uma leitura, no sentido literal da palavra. Obrigou a um estudo, também ele bastante aprofundado, da temática em análise, de modo a poder argumentar e complementar credívelmente as ideias apresentadas no artigo.

Foi nossa preocupação analisar os conteúdos da forma mais crítica possível, procurando realçar os pontos fortes dos autores, reforçando-os, sempre que possível, com citações da bibliografia consultada, assim como, procurando desenvolver aspectos, menos desenvolvidos no texto.

Devemos dizer que se trata de uma metodologia algo trabalhosa, pois surge por vezes alguma dificuldade em encontrar as ideias certas junto da bibliografia consultada, de modo a desenvolver o texto, apesar de que no final, o fruto desse esforço seja como disse mos inicialmente, bastante proveitoso, na aquisição de novos conhecimentos.

Com a recensão crítica deste artigo, fica reforçada a ideia de que a família, enquanto unidade social perfeitamente funcionante, é o principal apoio do doente com incapacidade/doença crónica, sendo fundamental o contributo da Enfermagem, como parceira de ambas as entidades: doente crónico e sua família. A doença crónica tem um impacto tremendo em ambos, exigindo uma tremenda adaptação destes e evolução para um estadio de equilibrio, em que se consiga ter uma boa qualidade de vida, adaptando eficazmente os seus papéis sociais. Neste processo o Enfermeiro não deve esquecer que a sua intervenção, apesar de ser maioritáriamente dirigida para a pessoa com doença crónica, também deve incluir a família que deve primeiro ser cuidada, para depois poder cuidar, sob pena de desiquilibrar o sistema familiar, afectando todos os seus membros. Lembrando o conceito de “illness”, como experiência humana de viver a doença, devemos ter sempre presente, que neste contexto, não é só o doente que experiência a doença, mas também aqueles que o rodeiam, devendo portanto, como referido acima, a abordagem ser dirigida ao sistema familiar como um todo, trabalhando com a família como um fim em sí e não como um meio para melhor cuidar um único indivíduo.

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Mar 5, 2013

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NURSING INTERVENTION FOR BIOFILM MANAGEMENT IN COMPLEX WOUNDS

INTERVENCIÓNS DE ENFERMERÍA EN EL TRATAMIENTO DE HERIDAS EN COMPLEJAS CON BIOFILMS

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AUTORES: Inês Pedro, Simone Saraiva

Resumo

A deposição de microrganismos numa superfície, normalmente resulta na formação de biofilme sendo também estratégias desenvolvidas pelos microrganismos para se protegerem de fatores agressivos externos.

Atualmente sabe-se que numa ferida complexa existem vários biofilmes que vivem em completos agregados, e que a sua composição é diferente de biofilme para biofilme.

Objetivo: Com este trabalho, pretende-se criar, sobretudo, um algoritmo de atuação para controle dos biofilmes. Este algoritmo vai consistir em intervenções de enfermagem pois, é a área que nos interessa estudar.

Metodologia: Foi executada uma pesquisa na EBSCO, abrangendo todas as bases de dados disponíveis. Foram procurados artigos científicos publicados em Texto Integral (data da pesq.), publicados entre 2005 e 2011, usando as seguintes palavras-chave: Ferida (Full Text) AND Biofilmes (Full Text) AND Gestao (Full Text). Foram ainda usadas as seguintes palavras chave: Wound (Full Text) AND Biofilms (Full Text) AND Cuidar (Full Text). Foi utilizado a metodologia de PI(C)OD e selecionados 14 artigos, do total de 71.

Conclusão: Com as intervenções identificadas, foi elaborado um algoritmo de intervenções de enfermagem para gestão de biofilmes, tendo por base a mais recente evidência científica.

PALAVRAS-CHAVE: Feridas crónicas, Biofilmes, Gestão, Intervenções

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Abstract

Deposition of microorganisms on a surface, usually results in the formation of biofilm, but also microorganism’s strategies to protect themselves from external toxic factors.

Currently it is known that there are several complex wound in biofilms because they live in complete aggregates and that the composition is different for biofilm to biofilm.

Objective: This study is intended to create, above all, an algorithm for controlling actuation of biofilms. This algorithm will consist of nursing interventions because the area is interested in the study.

Methodology: Research was carried out in EBSCO (all databases). Were searched scientific articles published in full text (…), published between 2005 and 2011, using the following keywords: Wound (Full Text) AND Biofilmes (Full Text) AND Management (Full Text). Also using the following keywords: Wound (Full Text) AND Biofilmes (Full Text) AND Care (Full Text). We used the method of PI(C)OD and selected 14 articles of a total of 71.

Conclusion: With the interventions identified, we organized an algorithm nursing interventions for the management of biofilms, based upon the most recent evidence about this theme.

KEYWORDS: Chronic wound, Biofilms, Management, Interventions

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Introdução

O aumento da esperança média de vida e o acréscimo da co-morbilidade das doenças crónicas na população adulta e idosa, aliada à busca incessante da melhoria da qualidade de vida, estão intimamente relacionados com o progresso dos cuidados de saúde. A elevada prevalência das feridas crónicas no contexto atual e o seu impacto tanto a nível individual como económico, dado os elevados custos associados ao seu tratamento, tornam este aspeto da saúde um assunto relevante em saúde pública e consequentemente remete para a reflexão critica sobre a qualidade dos cuidados de saúde.

Nesse sentido, o tratamento de feridas crónicas representa um grande desafio para os profissionais de saúde, de onde se destacam os enfermeiros pela natureza da sua profissão. Sobre isto, relembramos uma das competências do enfermeiro de cuidados gerais referidas pela Ordem dos Enfermeiros, “em conformidade com o diagnóstico de enfermagem, os enfermeiros (…) utilizam técnicas próprias da profissão de enfermagem, com vista à manutenção e recuperação das funções vitais, nomeadamente, (…) circulação, comunicação, integridade cutânea e mobilidade.” (Ordem dos Enfermeiros: Competências do enfermeiro de cuidados gerais; artigo 9.º, n.º4; 2003).

Neste contexto, tem havido um aumento exponencial da investigação científica na área de tratamento de feridas, cujo conhecimento produzido é fundamental na tomada de decisão clínica dos enfermeiros. A existência de informação é um dos aspetos essenciais para a tomada de decisão.

O tratamento de feridas é uma área complexa que requer uma intervenção avançada, centrada numa abordagem holística da pessoa, para isso há necessidade de haver por parte dos enfermeiros uma prática baseada na evidência, uma a gestão clínica integrada da ferida e um trabalho entre uma equipe multidisciplinar, quando a situação assim o exige. Cientes desta necessidade têm-se como objetivo centrar esta revisão da literatura na gestão de biofilmes em feridas crónicas/complexas, fazendo-se uma breve abordagem sobre a fisiopatologia das feridas crónicas e o impacto dos biofilmes na cicatrização das mesmas.

Sabe-se que as feridas são ruturas estruturais ou fisiológicas no tegumento que incitam respostas de reparação complexa e baseada na interação entre células inflamatórias e mediadores. A cicatrização de feridas é, assim, um processo fisiológico, através da qual o corpo substitui e recupera o tecido danificado, restabelecendo a integridade da pele com a maior brevidade de tempo possível. As feridas agudas seguem progressivamente e de forma atempada as fases de cicatrização: hemóstase, inflamação, proliferação e regeneração ou maturação. Já as feridas crónicas, pela sua natureza complexa, permanecem estagnadas numa das fases, geralmente inflamatória. Segundo Amstrong e Jude (2002) e Yager e Nwomeh (1999), citados por Wolcott et al (2009)23, o estado inflamatório é marcado pelo aumento de citoquinas pro-inflamatórias (Interleucina-1, Fator Necrose Tumoral-α, Interferão-gama), elevação dos níveis de metaloproteinases (MMP2, MMP8, MMP9) e quantidade excessiva de neutrófilos; sendo estes fatores que prolongam o tempo de cicatrização para além do normalmente esperado.

Existe uma série de barreiras para a cicatrização e fatores que aumentam o risco de infeção numa ferida, como por exemplo a idade, doenças sistémicas (diabetes mellitus, alterações hematológicas, doenças cardiovasculares…), nutrição pobre, desidratação, baixa resposta imunitária, baixa perfusão tecidular de oxigénio, etc. Infelizmente, mesmo quando estas barreiras são bem geridas, os resultados nem sempre parecem ser significativamente melhorados (Cutting, 2010; Percival e Cutting, 2009; Wolcott e Rhoads, 2008).2,16,24

Na ferida crónica há várias abordagens a ter para que esta evolua de uma forma positiva até à sua completa cicatrização. Por conseguinte, têm sido feitos vários estudos para detetar as causas que inibem a sua cura, levando a ferida a ficar estagnada.

É inevitável que feridas crónicas sejam colonizadas por microrganismos, mas o sistema imunitário quando inato, geralmente elimina a carga microbiana no decurso da cicatrização de feridas. No entanto, quando este está comprometido, a proliferação da carga microbiana sobrecarrega a resposta do sistema imunológico podendo levar à colonização crítica e até à infeção (Steinberg e Siddiqui, 2011)19.

Os microrganismos multiplicam-se e proliferam na forma planctónica ou séssil. Na forma planctónica os microrganismos apresentam-se em suspensão e dispersos num líquido aquoso; enquanto em formato de biofilme, estes apresentam-se na sua forma séssil aderidos a superfícies sólidas.

Os biofilmes têm sido associados a infeções crónicas em feridas, porque estes organismos geralmente resistem aos mecanismos de defesa do hospedeiro e às intervenções dos antimicrobianos, aproveitando-se das condições da ferida para ganhar vantagem e proliferar. Pensa-se que 65% a 80% das feridas devam a sua cronicidade e complicações infeciosas adjacentes, à formação de biofilmes (James et al, 2008; citados por Lenselink e Andriessen, 2011)10. Ainda a acrescentar que segundo James et al (2008) citados por Steinberg e Siddiqui (2011)19, a evidência direta da presença de biofilmes em feridas foi comprovada em 2008, quando biópsias de feridas agudas e crónicas foram recolhidas e analisadas por microscopia eletrónica. A mesma fonte refere que 60% das feridas crónicas mostrou biofilme, em comparação com apenas 6% das feridas agudas.

Os biofilmes são comunidades geralmente polimicrobianas em constante mudança que estão fixas a superfícies bióticas ou abióticas. Este forma-se e fixa-se numa ferida segundo três estadios principais: adesão reversível, adesão irreversível e maturação da substância polimérica extracelular (EPS). Tal como refere Phillips et al (2010), no primeiro estadio, os microrganismos encontram-se na forma planctónica, e pela sua natureza, tendem a fixar-se numa superfície e, eventualmente, tornar-se-ão num biofilme; contudo nesta fase a adesão ainda é reversível. No segundo estadio, a adesão passa a ser irreversível pois, os microrganismos multiplicam-se, diferenciam a sua expressão genética e aderem mais firmemente à superfície, no intuito de sobreviverem. No último estadio, os microrganismos sintetizam e excretam uma substância polimérica extracelular protetora que adere firmemente a uma superfície viva ou inanimada, constituindo-se assim o biofilme. Depois de fixos e maduros, os biofilmes também têm a capacidade de dispersar para outras localizações e estabelecer novos biofilmes (Steinberg e Siddiqui, 2011).19

De acordo com Phillips PL et al (2010)18, em Biofilms: made easy da Wounds International, um biofilme pode ser descrito como conjunto de bactérias incorporados numa camada espessa e viscosa – substância polimérica extracelular (EPS), que protege os microrganismos contra ameaças externas. A composição da EPS está de acordo com o microrganismo presente, mas geralmente é constituída por polissacarídeos, proteínas, glicolípidos e ADN bacteriano (Stoodley, 2009; Flemming, 2007; e Sutherland, 2001; citados por Phillips et al, 2010)18.

Os microrganismos que constituem o biofilme podem atuar sinergicamente, utilizando moléculas de Quorum Sensing para comunicarem uns com os outros e assim garantir a sua sobrevivência. Isto leva a que algumas espécies prosperem juntas e formem comunidades polimicrobiana que, por sua vez, têm maior virulência e patogenicidade. Tal, leva a que se verifique uma reduzida suscetibilidade aos antimicrobianos e se reforce a formação de novos biofilmes (Percival e Wolcott, 2011).17

Como é mais difícil suprimi-lo, os microrganismos e seus componentes extracelulares, que incorporam o biofilme, vão prolongar a fase inflamatória da ferida indefinidamente, atrasando o processo de cicatrização (Percival e Cutting, 2009)16. Como a resposta inflamatória crónica nem sempre é bem-sucedida na remoção do biofilme, o próprio biofilme ao proteger-se aumenta a produção de exsudado, o que proporciona uma fonte de nutrição que o ajuda a perpetuar-se.

Como se pode perceber, os biofilmes são estruturas microscópicas, sendo considerados por vários autores como uma entidade invisível, pois atualmente o método mais fiável para confirmar a presença de biofilme microbiano é a microscopia especializada (Phillips et al, 2010)18.

Então o biofilme passa a ser uma entidade com que os enfermeiros se devem preocupar, quando tratam da pessoa com ferida, para que esta evolua até à sua cicatrização total. Para que isto seja possível, torna-se pertinente fazer uma revisão da literatura das intervenções e estratégias de enfermagem na gestão de biofilmes que estão presentes em grande parte das feridas complexas/crónicas. Tal, garante a eficácia dos cuidados de enfermagem, ultrapassando as limitações e barreiras causadas pelos biofilmes na cicatrização da ferida e consequentemente contribuiu para a melhoria da qualidade de vida da pessoa com ferida crónica e sua família.

Metodologia

No processo da Prática Baseada na Evidência, recorre-se ao formato “PI(C)O”, para a formulação da pergunta de investigação, que será a seguinte: “Na ferida crónica ou complexa (P), quais os cuidados de enfermagem a ter (I) para a gestão de biofilmes (O)?”. Onde o problema/participantes são as feridas crónicas ou complexas sem evolução cicatricial. Como é uma revisão bibliográfica não se realizaram intervenções e os outcomes são as intervenções de enfermagem para gestão de biofilmes.

Foi consultado o motor de busca EBSCO, com acesso às bases de dados: Business Source Complete, CINAHL (Plus with Full Text), MEDLINE (Plus with Full Text), Cochrane Database of Systematic Reviews, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Library, Information Science & Technology Abstracts, Nursing & Allied Health Collection: Comprehensive, MedicLatina, Health Technology Assessments, Academic Search Complete e ERIC; tendo sido procurados artigos científicos publicados em Texto Integral (25 a 28 de Maio de 2012), publicados entre 2000 e 2012, usando os seguintes descritores (palavras-chave): Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Management (Full Text); Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Chronic (Full Text); Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Intervention (Full Text); e  Biofilm (Full Text) AND Wound (Full Text) AND Nurs* (Full Text).

Obteve-se um total de 71 artigos, tendo sidos selecionados 14 artigos através de um conjunto de critérios de inclusão e exclusão.

Considerou-se um período temporal de 12 anos, de modo a beneficiar de uma maior abrangência face ao conhecimento existente sobre a matéria em análise.

No problema/participantes os critérios de inclusão foram artigos que abordem feridas crónicas ou complexa com suspeita ou certeza da presença de biofilme e os critérios de exclusão foram artigos que abordem ferida aguda exclusivamente, artigos com repetição de guidelines e artigos que falem exclusivamente do diagnóstico de biofilmes.

Nas intervenções os critérios de inclusão foram as intervenções de enfermagem a pessoa com ferida com suspeita ou mesmo presença de biofilme e os critérios de exclusão foram as intervenções dirigidas à pessoa com ferida aguda e as intervenções à pessoa com ferida sem presença de biofilme.

No desenho os critérios de inclusão foram todo o tipo de artigos e os critérios de exclusão foram todos os resultados da pesquisa que não apresentem o tipo de estudos dos critérios de inclusão.

Para conhecer e organizar os diferentes tipos de produção de conhecimento e metodologias científicas patentes nos artigos filtrados, utilizou-se a escala de seis níveis de evidência de Guyatt & Rennie (2002)6.

Resultados

O desbridamento é essencial, rentável e eficaz na indução da cicatrização de feridas estagnadas. 2,5,17,18,19,20,23,24 Este facilita uma oportunidade para intervenção de antibiótico e antimicrobianos, e é rentável pois diminuí custos com antibióticos, amputação, hospitalização e morte.23

Remover o biofilme e prevenir a sua reconstituição pelo desbridamento é necessário para inverter desequilíbrios moleculares e iniciar a cura.19 No entanto, nenhuma forma de desbridamento ou limpeza é suscetível de remover a totalidade de um biofilme, e todas as bactérias remanescentes tem o potencial de regenerar o formar biofilme maduro em poucos dias.18 Pois, por si só, não garante que o biofilme se reconstitua, sendo necessária a utilização de antimicrobianos.5

Existem vários tipos de desbridamento contudo, os mais eficazes para a gestão do biofilme são o desbridamento cortante conservador (slice), o desbridamento mecânico (fibra de monofilamentos e lavagem pulsátil), o desbridamento cirúrgico e o desbridamento biológico (larvaterapia).

Vários autores defendem que a técnica de desbridamento cortante é a mais eficaz porque minimiza o stress, infeção, inflamação, exsudado e tecido necrótico causado pelo biofilme.23 Pois remove células senescentes, promove o equilíbrio dos materiais biológicos, melhora a microcirculação e normaliza a nível bioquímico.23

Os princípios do desbridamento cortante são: primeiro alterar a anatomia do leito da ferida, removendo locas, sinus tractus e tunelizações; segundo remover fibrina e tecido desvitalizado (incluindo a EPS do biofilme); e terceiro remover ossos descorados, fazendo o diagnóstico de osteomielite.24

Já o desbridamento mecânico, fibra de monofilamentos artificial remove bactérias, exsudado sero-purulento e biofilme bacteriano. Demonstra maior potência na remoção microbiana quando usado com um líquido de limpeza detergente e é fácil de utilizar. Por isso, é eficiente e rentável face a outros métodos de desbridamento mecânico.7

A larvaterapia ou terapia larval é outra forma de desbridamento eficaz porque as secreções e excreções das larvas inibem a formação de biofilme, reduzindo os fatores de degradação envolvidos na acumulação de biofilme.19,23

No entanto, nenhuma forma de desbridamento ou limpeza é suscetível de remover a totalidade de um biofilme, e todas as bactérias remanescentes tem o potencial de regenerar o formar biofilme maduro em poucos dias.18 Pois por si só não garante que o biofilme se reconstitua, sendo necessária a utilização de antimicrobianos tópicos como a prata.5 A prata tem um efeito letal sobre os microrganismos, mas em concentrações elevadas de biofilme, a quantidade necessária pode ser 10-100 vezes superior à concentração necessária para matar os microrganismos em forma planctónica 19, quantidade que não é aconselhada a existir nos pensos tópicos atuais para o tratamento de feridas pelo risco de toxicidade. Vários estudos in vitro têm indicado que aplicação tópica de prata e iodopovidona, por si só, têm pouco efeito sobre os biofilmes.10

Os princípios envolvidos na prevenção da reconstituição do biofilme incluem a utilização de pensos e de agentes antimicrobianos de largo espectro como: prata, iodo, mel e PHMB que existem em diversas formulações.18

O cadexomero de iodo é um agente eficaz anti-séptico para feridas cronicamente exsudativas que atua contra a produção de glicocálix ou material polimérico, destruindo diretamente a estrutura do biofilme.19 Este pode ser usado na supressão de biofilmes sem causar dano significativo nas células do hospedeiro.16

A polihexanida é uma solução eficaz e segura na limpeza de feridas crónicas, principalmente quando há suspeita de presença de biofilme.2,8 Tem atividade biocida de amplo espectro e não há relatos de bactérias resistentes. Provoca lise celular, induzindo na membrana um stress osmótico.2 A irrigação com a solução de polihexanida com o surfactante (betaína) é adequada para preparação do leito de feridas para remover biofilmes antes de um tratamento posterior e para a absorção de odores da ferida.8 Para feridas cavitárias existe a polihexanida com betaína em gel.

Lenselink e Andriessen (2011)10 dizem que penso de polihexanida contendo biocelulose permite o tratamento antimicrobiano contínuo. Este promove com a limpeza das feridas, a redução do biofilme em feridas estagnadas, sendo a sua aplicação segura, confortável e com dor reduzida para os pacientes. 10

O mel é bactericida contra todas as estirpes de bactérias19, atuando inclusive em estirpes bacterianas, como o Staphylococus aureus resistente à vancomicina.16 Contém substâncias bactericidas que penetram no biofilme.19 Verificou-se que o mel tem propriedade biocida, provocando efeitos sobre o ciclo celular, pois é inibidor da mitose celular.13 Atua nos vários estadios do biofilme e em diferentes estirpes de bactérias e, uma vantagem dos múltiplos modos de ação do mel é que o risco de desenvolvimento de resistência bacteriana é diminuído sendo, por isso, uma alternativa aos antibióticos.13 A sua ação biocida prende-se com o aumento da osmolaridade e teor de glucose, que estimula a ação dos macrófagos e, com habilidade para diminuir o aporte de água às bactérias e o pH.13

Wolcott e Rhoads (2008)24 defendem que com o desbridamento, o ideal é a utilização de agentes antibiofilme que rompam a estrutura do biofilme. O uso simultâneo de antibiofilmes com antimicrobianos tradicionais provavelmente terá um efeito sinérgico sobre o tratamento de infeções de biofilme. Também referem que a lactoferrina, xilitol e prata podem ser aplicados em simultâneo e que têm um poder sinérgico no combate aos biofilmes. Inclusivamente afirmam a existência de pensos impregnados com prata ou cadexómoro de iodo, combinados com a Lactoferrina ou o Xilitol. Os mesmos autores referem que agentes antibiofilme como:

  • RIP (RNA-III inhibiting peptide) e Furanona C30, que inibe o Quorum Sensing;
  • Dispersin B, alginase e depolimerases fago são agentes que degradam a substância polimérica extracelular (EPS);
  • EDTA (Ácido Etilenodiamino Tetra-Acético), deferoxamina e transferrinas são catadores de ferro;
  • Gallium e açúcares em álcool são metabólitos falsos.

No tratamento de feridas crónicas com biofilme, se deve incluir o desbridamento, agentes antibiofilme (lactoferrina, xilitol, farnesol) e antissépticos tópicos, como o iodo e a prata iônica. 17

Já Fonseca (2011)5 e Percival e Cutting (2009)16  completam e complementam a informação sobre agentes anti-biofilme, nomeadamente:

  • Lactoferrina, proteína presente nos fluidos gengivais e na saliva, que tem propriedades de ligação do ferro, bloqueando a fixação de bactérias planctónicas a uma superfície e inibindo o primeiro passo na formação de biofilme; 5,16
  • Gallium, este perturba processos dependentes do ferro pois, muitos sistemas biológicos não conseguem distinguir Ga3+ de Fe3+; 5,16
  • Xylitol, este interfere com a formação do biofilme; 5,16
  • Dispersin B, este atinge a substância polimérica extracelular, degradando a estrutura do biofilme; 5,16
  • Mel, este possui atividade antibacteriana e modula a atividade da célula monocítica. 16

Fonseca (2011)5 ainda menciona que foi descrita, recentemente, a aplicação de gel de EDTA numa ferida e que esta pode ter alguma eficácia contra biofilmes de pseudomona aeruginosa.

Os agentes antibiofilme têm demonstrado ser menos tóxicos que os antimicrobianos tradicionais.16

O uso simultâneo do desbridamento cortante e ultra-sons são os mais eficazes. 5,18 Outra estratégia é perturbar o biofilme em feridas por meio da ultrassonografia e estimulação elétrica.5 A ultrassonografia é utilizada para remover tecido não viável e interromper o Quorum-Sensing (QS), diminuindo a virulência coordenada; e a estimulação elétrica é utilizada para promover a penetração de agentes tópicos.5,19

Em alguns casos, os autores recorrem ainda a tecnologias avançadas, como: derivados de plaquetas, fator de crescimento das células beta e oxigenoterapia hiperbárica.24

A utilização de substâncias naturais que estimulam o crescimento celular pode promover a melhoria do processo de regeneração, como é o caso do uso de células derivadas da medula óssea ou células estaminais. A utilização de fagos, que particularmente os biofilmes jovens parecem ser mais suscetíveis.5

Além de desbridamento e antibiofilmes ainda se pode utilizar antibioterapia sistémica adequada. Os antibióticos foram considerados por alguns autores um adjuvante nesta questão, mas sempre de forma cautelosa. Pois a preocupação crescente em relação ao aumento de resistências bacterianas com antibióticos, encoraja a examinar alternativas, possivelmente melhores.24

Conclusão

Pelo difícil diagnóstico e irradicação do biofilme em feridas estagnadas, o biofilme e considerado por muitos autores como a entidade mais preocupante no tratamento da ferida. No tratamento de feridas para a gestão do biofilme, devem ser utilizadas concomitantemente estratégias para a eliminação de microrganismos em forma planctónica e forma séssil.17

Atualmente, e no âmbito do tratamento de feridas, faz todo o sentido explorar-se cientificamente intervenções de gestão do biofilme em feridas crónicas, de forma a atingir a excelência e inovação dos cuidados de enfermagem. A prática baseada na evidência é o caminho para a promoção da qualidade de vida dos doentes e o equilíbrio entre custo-eficácia nas instituições de saúde.

Por isso, foi criado um algoritmo (figura.1), centrando na área de enfermagem, de atuação para a gestão de biofimes em feridas estagnadas, que será exposto a seguir.

Fig.1

Referências Bibliográficas

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10.Lenselink, E.; Andriessen, A. (2011). A cohort study on the efficacy of polyhexanide-containing biocellulose dressing in the treatment of biofilms in wounds. Journal of Wound Care, Vol. 20, No11. [10]

11.Machado, Sílvia M. O. (2005). Avaliação do efeito antimicrobiano do surfactante cloreto de benzalcónio no controlo da formação de biofilmes indesejáveis. Tese de Mestrado: Universidade do Minho. [11]

12.Menoita, E., Santos, V., Testas, C., Gomes, C., Santos, A. (2012). Biofilms: Knowing the entity. Journal of Aging & Innovation, 1 (2): 23-32. [12]

13.Merckoll, Patricia; et al. (2009). Bacteria, biofilm and honey: A study of the effects of honey on ‘planktonic’ and biofilm-embedded chronic wound bacteria. Scandinavian Journal of Infectious Diseases, 41, pp. 341 – 347. [13]

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15.Plano Nacional de Saúde (2004/2010). Orientações Estratégicas. Lisboa: Ministério da Saúde, Vol. 2, pp. 132-133. [15]

16.Percival, S. L.; Cutting, K. F. (2009). Biofilms: possible strategies for suppression in chronic wounds. Nursing Standart, Vol. 23, No32. [16]

17.Percival, S. L.; Wolcott, R. D. (2011). Biofilms and their management: from concept to clinical reality. Journal of Wound Care, Vol. 20, No5. [17]

18.Phillips, P. L.; et al. (2010). Biofilms made easy. Wounds International. Vol. 1, Issue3. [18]

19.Steinberg, John; Siddinqui, Farah (2011). The Chronic Wound and the role of biofilme. Podiatry Management. [19]

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22.Wolcott, R. D.; et al. (2010). Chronic wounds and the medical biofilme paradigm. Journal of Wound Care, Vol. 19, No2. [22]

23.Wolcott, R. D.; et al. (2009). Regular debridement is the main tool for maintaining a healthy wound bed in most chronic. Journal of Wound Care, Vol. 18, No2. [23]

24.Wolcott, R. D.; Rhoads D. D. (2008). A study of biofilme-based wound management in subjects with critical limb ischaemia. Journal of Wound Care, Vol. 17, No 4. [24]

 

 



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Fev 27, 2013

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ADVANTAGES OF USING BARRIER CREAMS VS POLYMERIC FILMS IN CONTACT DERMATITIS AND MOISTURE LESIONS

VENTAJAS DEL USO DE CREMAS BARRERA VS PELICULAS POLIMERICAS EN DERMATITIS DE CONTACTO Y LESIONES POR HUMEDAD

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AUTORES: Joana Martinho, Liliana Faustino, Maria Escada

RESUMO

Com esta prática baseada na evidência pretende-se determinar as características, as vantagens/desvantagens do uso da película polimérica e cremes barreira realizando uma revisão da literatura com o objetivo de comparar estes dois produtos, tendo em conta o seu custo-efectividade.

Objectivo: Identificar com base na evidência científica existente, tendo em conta a população seleccionada (> de 18 anos) as vantagens e desvantagens da película polimérica vs cremes barreira na prevenção e tratamento das dermatites de contacto (nomeadamente as irritativas) e lesões por humidade.

Metodologia: Realizamos uma pesquisa na EBSCO (código S1 e S2) abrangendo todas as bases de dados disponíveis.

Foram procurados artigos científicos publicados em texto integral entre 1990 e 2012, usando as seguintes palavras-chave: Código S1 – Barrier cream OR No Sting Barrier Cream AND Skin*; Código S2 – Dermatitis AND Incontinence AND Skin*. Foi utilizada a metodologia de P(I)CO e seleccionados 12 artigos no total. Do primeiro código de pesquisa do total de 158 foram seleccionados 7 artigos e do segundo código de pesquisa do total 76 artigos foram seleccionados 5.

Resultados: Como resultado de toda esta pesquisa foram identificadas vantagens e desvantagens no uso da película polimérica e dos cremes barreira na prevenção e tratamento de dermatites de contacto (nomeadamente irritativas) e lesões por humidade.

Conclusão: Com os resultados obtidos elaboramos uma tabela de dupla coluna com as vantagens e desvantagens do uso dos diferentes produtos tendo por base a mais recente evidência científica.

Palavras-chave: Cremes barreira, película polimérica, dermatites, incontinência, pele.

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ABSTRACT

This practice based on evidence is intended to determine characteristics, advantages/ disadvantages of the use of the polymeric film and barrier creams performing are view of the literature in order to compare these two products taking into account their cost-effectiveness.

Objective: Taking into account the selected population (>18 years) we pretend to identify the advantages and disadvantages of the polymeric barrier film vs barrier creams taking in account the prevention and treatment of contact dermatitis (including irritative) and lesions by moisture, based on scientific evidence.

Methods: We conducted a search in EBSCO (code S1 and S2) covering all available databases.

Were searched for articles published in full text from 1990 to 2012, using the following keywords:

S1 Code- Barrier Cream OR No Sting Barrier Cream AND Skin *;

S2 Code – Dermatitis AND Incontinence AND Skin*.

The methodology used was P(I)CO. Were selected 12 articles in total. The first search code of the total of 158 articles were selected 7 and from the second search code of the total of 76 articles were selected 5.

Results: As a result of all this research were identified advantages and disadvantages of the use of the polymeric film and barrier creams for prevention and treatment of contact dermatitis (including irritative) and lesions by moisture.

Conclusion: Based on these results we developed a dual column table with the advantages and disadvantages of using different products based on the latest scientific evidence.

Keywords: Barrier Cream, polymeric film, Dermatitis, Incontinence, Skin.

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Introdução/ Justificação da Problemática

No âmbito da pós-graduação em Gestão de Feridas Complexas: Uma Abordagem de Boas Práticas elaborámos uma revisão sistemática da literatura tendo como intuito dar resposta à seguinte pergunta P(I)CO: (O) Quais as vantagens (C) do uso de cremes barreira vs película polimérica na prevenção e tratamento das dermatites de contacto e lesões por humidade (P) em indivíduos com idade superior a 18 anos?

A prevenção de lesões na pele constitui um dos pilares da prestação de cuidados de enfermagem e é por isso um desafio para todos os profissionais de saúde na sua prática diária. A taxa de incidência de lesões ao nível da pele é um indicador bastante sensível acerca dos cuidados de enfermagem prestados.

A estrutura e funções da pele sofrem várias alterações fruto do envelhecimento (Fernádez et al, 2006). As lesões cutâneas, nomeadamente as feridas crónicas são uma das causas de morbilidade e mortalidade e de consideráveis custos económicos e sociais nos cuidados de saúde (Guest, 2011). As dermatites de contacto apesar de serem situações geralmente agudas podem trazer várias complicações e aumentar a dependência dos indivíduos.

A dermatite consiste num processo inflamatório que é caracterizada pelo aparecimento de eritema, vesículas e, numa fase crónica ou eritema em regressão a pele torna-se descamativa, habitualmente acompanhado de prurido. Segundo Venes (2010a), a inflamação da pele pode ser causada por várias condições, incluindo o contacto com irritantes da pele, estase venosa, edema entre outras. A dermatite de contacto pode ser classificada em irritativas ou alérgicas.

As dermatites de contacto irritativas constituem um processo inflamatório causado pelo dano da matriz água-lipido-proteína da pele devido ao contacto prolongado com a substância irritativa. Dependendo da fase e do tipo de lesão da dermatite pode-se observar edema, eritema, vesículas, erosão cutânea, exsudação, crostas, descamação e prurido (Zulkowski, 2008).

As lesões por humidade aparecem comummente sob a forma de dermatite de contacto irritativa na região perineal, porção proximal da coxa e nádegas associada a situações de incontinência (Driver, 2007). A prevalência das dermatites associadas a situações de incontinência está aproximadamente entre 5% e 41% (Gray, 2010). Um estudo de Jurkin e Selekof (2007 citado por Gray, 2010) em dois hospitais dos EUA e com uma amostra de 607 indivíduos mostra uma prevalência de 8% (19,7% dos quais com incontinência).

Os sintomas das dermatites de contacto provocadas pela humidade passam pela sensação de ardor e prurido. As lesões podem ser superficiais, irregulares com os bordos difusos e dispersas ou então pode aparecer sob a forma linear limitada ao sulco anal (Junkin e Selekof, 2008). Para que se possa afirmar que a causa de uma lesão é a humidade este mesmo factor tem que estar presente, como por exemplo a existência de urina, fezes ou suor.

A dermatite de contacto irritativa é muitas vezes diagnosticada sem firmes critérios ou quando os testes epicutâneos para dermatite de contacto alérgica são negativos.

A dermatite alérgica, segundo Bourke e Coulson (2009), envolve a activação do sistema imunitário através do contacto com uma substância alergénica especifica. Um dos passos para o tratamento da dermatite passa inicialmente pela realização de anamnese, incluindo muitas das vezes também visitas ao domicílio, ao local de trabalho ou de qualquer elemento de lazer e ocupacional a fim de determinar o possível factor alergénico. É possível isolar e confirmar o factor alergénico através dos testes epicutâneos. Apesar das dermatites alérgicas serem comuns, na pesquisa elaborada constatou-se que são muitas vezes associadas a situações do foro ocupacional.

A prevenção das dermatites de contacto é um aspeto muito importante nos cuidado à pele tendo como objetivos minimizar o agravamento de lesões já existentes e o aumento da sua incidência. A prevenção passa por várias intervenções, nomeadamente, uma adequada limpeza e secagem da pele, o uso do apósito mais adequado em caso de lesão e a utilização de produtos barreira.

Produtos barreira são aqueles que conferem um revestimento impermeável ao excesso de humidade ou à ação irritativa da urina e fezes. São exemplo de produtos barreira a película polimérica e as preparações à base de óxido de zinco, petrolato e dimeticone.

As preparações à base de óxido zinco e petrolato são os produtos barreira mais comummente utilizados devido à sua acessibilidade, resistência e custo (Fernández et al, 2006).

A película polimérica é constituída por diferentes componentes cuja fórmula varia de laboratório para laboratório, mas de uma forma geral contêm polímeros de acrilato.

Os cremes barreira por si só são de valor questionável na protecção contra o contacto com agentes irritantes, apesar de alguns autores como Venes (2010b) consistirem um produto de aplicação tópica que permite limitar ou evitaro contacto com irritantes, alérgenos, parasitas ou toxinas.

No caso específico das dermatites alérgicas (Bourke e Coulson, 2009) o tratamento de eleição passa pela utilização de corticóides tópicos e afastamento do elemento que causa alergia.

Os cuidados à pele são muito valorizados pela indústria cosmética, mas o mesmo não é tão evidente no âmbito da prestação de cuidados de saúde. Os cuidados são muitas vezes práticas ritualistas e pouco baseados em evidências (Voegeli, 2007 citado por Voegeli, 2010). Torna-se imprescindível escolher o melhor produto barreira de prevenção e concomitantemente de tratamento para evitar complicações graves como a ulceração. A escolha do produto barreira mais adequado deve cada vez mais ter em conta os custos e benefícios em saúde, avaliados a longo prazo (Guest, 2011).

Metodologia

O motor de busca consultado foi a EBSCO, sendo que foram recrutadas todas as bases de dados disponível para a pesquisa em causa. Foram procurados artigos científicos publicados em Texto Integral (21/09/2012), entre 1990 e 2012. Os descritores (palavras-chave) utilizados foram repartidos em dois códigos de pesquisa (S1 e S2) de forma a ampliar e conseguir o maior número de artigos. Assim, em S1 os descritores seleccionados foram: Barrier Cream (Full Text) OR No Sting Barrier Film (Full Text) AND Skin* (Full Text). Obteve-se um total de 158 artigos, dos quais foram seleccionados apenas 7 através de um conjunto de critérios de inclusão e exclusão descritos no Quadro I. No código S2 os descritores seleccionados foram: Dermatitis (Full Text) AND Incontinence (Full Text) AND Skin* (Full Text). O número total de artigos obtidos foi de 76, dos quais apenas foram seleccionados 5 com base nos mesmos critérios já referidos. Obtivemos no final um corpus de análise composto por 12 artigos.

O intervalo temporal de pesquisa foi definido com base na informação de que a película polimérica surgiu no mercado na década de 90 (Schuren, Becker e Sibbald, 2005).

Quadro 1

Quadro I – Critérios de inclusão/exclusão da amostra

Análise de Dados

No artigo, 3M Cavilon no sting barrier film in the protection of vulnerable skin” (Clare Williams, 1998) com um nível de evidência V, a autora conclui que a película polimérica não causa ardor nem dor quando não tem componente alcoólica. A durabilidade da película polimérica é superior aos restantes produtos barreira americanos. Para além disso, não altera os produtos de incontinência (fraldas, etc), nem interfere com a adesividade de apósitos ao contrário dos produtos há base de petrolato. A película polimérica é transparente e fácil de aplicar, não deixando resíduos. Os resultados justificam o custo/benefício.

No artigo, A liquid film forming acrylate for peri-wound protection: a systematic review and meta analysis (3MTM CavilonTM no sting barrier film)” (J. Schuren, A. Becker, R. Gary Sibbald, 2005) nível de evidência I, pode concluir-se que a película polimérica é um produto barreira seguro e efectivo na protecção da pele perilesional das feridas crónicas. Não foram encontradas diferenças entre as propriedades dos diferentes métodos barreira. Comparada com a ausência de tratamento ou o uso de placebo, a película polimérica tem um significativo contributo.

No terceiro artigo analisado, “ A practice based evaluation of a liquid barrier film” (Nicola Harding, 2002) nível de evidência IV, pode constatar-se que o uso da película polimérica teve uma avaliação positiva em vários aspectos. Foi eficaz na prevenção e tratamento da pele. Promoveu o conforto em utentes em situação de doença terminal.

No quarto artigo analisado, “A comparison of cost and efficacy of three incontinence skin barrier products” (Zehrer, C L, Lutz, J B, Hedblom, E , Ding, L, 2004) nível de evidência III, os autores chegaram à conclusão que o uso da película polimérica é uma alternativa aceitável em relação aos cremes barreira tendo em conta o custo-efectividade na prevenção de dermatites de contacto irritativas devido a incontinência.

No quinto artigo analisado, “Clinical and economic evidence supporting a transparent barrier film dressing in incontinence–associated dermatitis and periwound skin protection” (J.F. Guest, M.J. Greener, K Vowden, P. Vowden, 2011) nível de evidência I, pode constatar-se que a película polimérica é descrita como tendo semelhante eficácia aos produtos com petrolato e óxido de zinco. No entanto, tem maior custo-efectividade em situações de dermatite por incontinência e maceração da pele perilesional das feridas. Os cremes tradicionais apesar de mais acessíveis, a longo prazo acarretam mais custos para as instituições.

No sexto artigo analisado, “3M Cavilon Durable Barrier Cream in skin problem management” (Clare Williams, 2001) nível de evidência V, pode verificar-se que os cremes barreira com dimeticone e terpolímero de acrilato demonstrou ser eficaz na gestão da humidade da pele e na protecção da pele dos idosos. Para além disso é hidratante, com maior durabilidade e não interage com fraldas ou com a adesividade de apósitos.

No sétimo artigo analisado, “Incontinence associated dermatitis: protecting the older person” (Pauline Beldon, 2012) nível de evidência IV, recorrendo a estudos de caso o autor comprovou que associado a uma adequada limpeza da pele e aplicação de creme barreira consegue-se restabelecer a integridade da pele lesada. O creme com dimeticone apresentado tem maior durabilidade, necessitando de menos aplicações.

No oitavo artigo analisado, “Barriers creams for skin breakdown” (Debbie Fliynn e Sally Williams, 2011) nível de evidência IV, o autor constatou que a aplicação do produto de limpeza e do creme barreira com dimeticone mostrou-se eficaz no tratamento das dermatites por incontinência. O creme apresenta uma bioadesividade que lhe permite ter maior durabilidade.

No nono artigo analisado, “Prevention and treatment of incontinence –associated dermatitis: literature review” (D. Beeckman, L. Schoonhoven, S. Verhaeghe, A. Heyneman e T. Defloor, 2009) nível de evidência I, pode verificar-se que a existência de programas estruturados de cuidados à pele perineal reduz a incidência de dermatites por incontinência. Recomendam que esses protocolos incluam a utilização de vários produtos. Evidenciam a necessidade de desenvolvimento de instrumentos mais objetivos de avaliação das dermatites por incontinência e de uma análise mais rigorosa dos custos totais das intervenções.

No décimo artigo analisado, “Effectiveness of topical skin care provided in aged care facilities” (B. Hodgkinson e R. Nay, 2005) nível de evidência I, verificou-se que na prevenção e tratamento das dermatites por incontinência um creme à base de óxido de zinco com popriedades antissépticas mostrou-se mais efetivo na redução do eritema do que um outro creme com o tradicional óxido de zinco. A existência ou não de um plano estruturado na prevenção das dermatites por incontinência não foi conclusiva em termos de efetividade.

No décimo primeiro artigo analisado, “Perineal Dermatitis in Critical Care Patients” (Donna S. Driver, RN, CS, CWOCN, 2007) nível de evidência IV, os autores constataram que o uso de toalhetes de limpeza da pele dimeticone na sua constituição mostrou-se mais eficaz e com maior adesão por parte dos participantes. A aplicação do creme com óxido de zinco foi inconsistente devido a algumas desvantagens como a dificuldade na remoção dos resíduos.

No décimo segundo artigo analisado, “The use of honey in incontinence associated dermatitis” (Alison Bardsley, 2008) nível de evidência V, verificou-se que uma boa prática nos cuidados à pele exige o uso de vários produtos, nomeadamente produtos que protejam a pele da humidade e infeção. Tendo em conta o atual aumento da resistência à antibioterapia, o uso de cremes barreira com mel representa uma opção efetiva na prevenção e tratamento das lesões da pele e na prevenção de possíveis infeções.

Discussão

Os artigos seleccionados contribuíram para dar resposta, de um modo adequado, à nossa pergunta P(I)CO, uma vez que todos eles abordam aspectos essenciais da prevenção e tratamento de dermatites e lesões por humidade.

É consensual de que a primeira linha de cuidados deve ser sempre a prevenção de situações de lesão visto que, com a existência de lesão há um aumento dos custos de saúde, bem como um aumento das horas de cuidados de enfermagem.

Com a análise dos artigos seleccionados foi possível verificar que existe um conjunto de intervenções de enfermagem interligadas que contribuem para a prevenção e tratamento das dermatites. Verificou-se que, em pelo menos dois artigos, a criação de programas estruturados de intervenção nas dermatites por incontinência é referida como uma medida base (Beeckman et al, 2009 e Hodgkinson e Nay, 2005). Segundo Beeckman et al (2009), estes programas contemplam a aplicação de vários produtos com funções complementares. A higiene da pele com produtos de limpeza que não alterem o pH deve ser preferencial ao uso do tradicional “sabão”. Após isto, deve aplicar-se um hidratante/emoliente que pode estar associado a um dos outros produtos. E por fim, nos utentes considerados em risco de desenvolver uma dermatite por incontinência recomenda-se um agente que tenha a função de protecção, que pode ser um creme barreira ou a película polimérica. Na literatura consultada a maioria dos cremes barreira continha como substância ativa o óxido zinco, dimeticone ou petrolato. O uso de fraldas/ absorventes de incontinência com maior capacidade de absorção e de afastar a humidade do contacto com a pele é também descrito como uma medida adjuvante.

Um dos artigos analisado reforça ainda a importância de uma correcta avaliação da pele lesada, de forma a distinguir dermatites de contacto ou lesões por humidade de úlceras de pressão. Esta medida é essencial para melhor direccionar as intervenções e os cuidados à pele (Beeckman et al, 2009).

Essencialmente todos os autores tentam encontrar dados sobre o custo-efetividade dos diferentes produtos barreira embora haja limitações relacionadas com a dimensão e composição da amostra e a adesão dos profissionais que participam nos estudos.

Dois artigos que revelam estudos comparativos afirmam não encontrar diferenças significativas entre as propriedades protetoras da película polimérica e outros métodos tradicionais como alguns cremes barreira, em termos de eficácia clínica (Guest et al, 2011 e Harding, 2002). No entanto, algumas publicações referem a película polimérica como mais eficaz clinicamente que os produtos a base de petrolato ou óxido de zinco (Beeckman et al, 2009 e Zehrer et al, 2004). O maior custo-efetividade da película polimérica, atendendo às suas características mais vantajosas é referido praticamente em todos os estudos comparativos encontrados. Vários são os artigos que comprovam com valores monetários o maior custo-efetividade da película polimérica face aos outros cremes. Zehrer et al (2004) refere no seu artigo que a aplicação de película polimérica quer seja uma vez por dia ou três vezes por semana é mais económica do que a aplicação de cremes barreira à base de petrolato usados diariamente. Neste contexto, o custo anual do uso do creme barreira referido é de $38.325, enquanto o da película polimérica é de $16.425 se aplicado diariamente ou de $7.118 se for três vezes por semana. O artigo de Guest et al (2011) apresenta em termos económicos, conclusões semelhantes.

As propriedades da utilização da película polimérica são várias, pois para além de benefícios económicos, permite maior conforto e menor dispêndio de tempo na sua utilização. A menor frequência de aplicações durante um tratamento está diretamente ligada à sua maior resistência (Harding, 2002; Schuren, Becker e Sibbald, 2005 e Williams, 1998). O facto de ser transparente e permitir a monitorização contínua da área lesada facilita a prestação de cuidados (Schuren, Becker e Sibbald, 2005 e Williams, 1998). Por outro lado, alguns cremes barreira apresentam limitações quanto à sua cor, consistência e facilidade de remoção que por vezes dificulta a prestação dos cuidados à pele e diminui a aceitação ao produto (Driver, 2007; Guest et al, 2011 e Schuren, Becker e Sibbald, 2005). Alguns autores referem ainda a interacção dos cremes barreira com a absorção de fraldas e adesividade de apósitos ao contrário da película polimérica (Schuren, Becker e Sibbald, 2005 e Williams, 1998).

É descrita, pelo menos em três artigos, a aplicação de cremes barreira que apresentam ingredientes à base de silicone, como o dimeticone. São cremes que possuem propriedades mais vantajosas na sua aplicação. Os cremes são mais fáceis de aplicar e apresentam maior durabilidade, tal como estimulam a hidratação da pele ( Beldon, 2012; Flynn e Williams, 2011 e Williams, 2001). Num destes artigos é descrito um creme com dimeticone e terpolimero de acrilato que não interfere com a absorção das fraldas e que permite aplicar adesivos (Williams, 2001).

O artigo de Driver (2007) documenta o uso de uma nova estratégia de mercado que contempla um produto de limpeza da pele com creme barreira incorporado. O produto surge sob a forma de toalhetes com 3% de dimeticone. Mostrando-se eficaz clinicamente e para além disso aumenta a adesão por parte dos cuidadores por ser também uma estratégia combinada.

Dois estudos sugerem a aplicação de um creme com óxido de zinco e propriedades antissépticas como mais eficaz que o óxido de zinco tradicional (Beeckman et al, 2009 e Hodgkinson e Nay, 2005). Apesar do primeiro não ser comercializado em Portugal parece ser uma sugestão que vai responder preventivamente ou como tratamento de possíveis infeções secundárias, muitas vezes responsáveis por situações de moderada/grave severidade das lesões. O uso do creme barreira com mel para além da função protectora tem também uma função antibacteriana que permite contornar o problema da resistência aos antibióticos, bem como antifungica. A sua elevada viscosidade hidrata a pele e promove a acidificação do pH da pele (Bardsley, 2008).

CONCLUSÃO

As dermatites de contacto, nomeadamente as provocadas por incontinência, são um problema frequente principalmente na população idosa, diminuindo a sua qualidade de vida e acarretando custos às instituições de saúde.

Cada vez mais as instituições e os profissionais de saúde devem investir na prevenção através da criação de programas estruturados de prevenção, intervenção e de diagnóstico das situações de dermatite. Estes programas devem incluir o uso de um produto de limpeza que não altere o pH da pele, um emoliente e um produto barreira, não esquecendo os cuidados na secagem da pele e a escolha das fraldas/absorventes de incontinência. Os produtos barreira devem, cada vez mais, ter um maior custo-efetividade e trazer vantagens a quem aplica e a quem é alvo dos cuidados. A facilidade na aplicação e remoção do produto, a diminuição da frequência de aplicações e o conforto são os aspetos que mais refletem o custo-efetividade. A adesão à aplicação do produto é essencial para a eficácia clínica. O uso na prevenção da pele em risco de um produto de limpeza com creme barreira incorporado pode aumentar essa adesão.

A película polimérica apresenta várias vantagens decorrentes das suas propriedades. Os cremes barreira mais recentemente desenvolvidos tentam aproximar-se destas propriedades em termos de durabilidade e facilidade de aplicação, como é o caso dos cremes com dimeticone e polímeros de acrilato. A adição de substâncias antissépticas ou de mel aos cremes barreira tradicionais pode ser vantajoso na prevenção e tratamento de situações infeciosas.

Em suma, pensamos ser pertinente a recolha de mais dados sobre o custo-efetividade dos produtos barreira em Portugal, nomeadamente os gastos monetários com os cuidados e a incidência e prevalência de dermatites de contacto, nomeadamente as decorrentes da incontinência. Os custos económicos deveriam incluir não só os gastos em produtos e material, mas também as horas de prestação de cuidados e a qualidade de vida dos utentes.

Uma das limitações do nosso trabalho é a não existência de estudos comparativos entre o uso da película polimérica e os cremes mais recentes com dimeticone, não deixando de ser uma sugestão para futuros estudos.

De forma a sistematizar as vantagens e desvantagens da película polimérica e dos cremes barreira acima referidos esquematizámos os dados no quadro que se segue (Quadro II).

Quadro 2

Quadro 3

 

 

Referências Bibliográficas

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2. Beeckman, D., Schoonhoven, L., Verhaeghe, S., Heyneman, A., & Defloor, T. (2009). Prevention and treatment of incontinence-associated dermatitis: literature review. Journal Of Advanced Nursing, 65(6), 1141-1154.

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Fev 26, 2013

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NURSING PRACTICE BASED ON EVIDENCE: THE CASE OF WOUNDS

PRÁCTICA DE ENFERMERÍA BASADA EN LA EVIDENCIA: EL CASO DE LAS HERIDAS

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AUTORES: César Fonseca, Ana Ramos, Dora Santos, Liliana Gaspar, Marta Ferreira

Resumo

As Feridas crónicas são um problema e um desafio sempre presente na prática da enfermagem a nível da sua etiologia, evolução, tratamento e reabilitação, particularmente na grande idade, onde a incidência e a prevalência é elevada, perdurando situações de alta complexidade e dificil resolução. A prática baseada na evidência deve estar presente a todos os níveis do cuidar em Enfermagem, mas por motivos sócio-económicos, que cada vez mais pesam no sistema de saúde, é urgente uma séria integração desta filosofia no tratamento de feridas.

Palavras-chave: Feridas Crónicas; Prática Baseada na Evidência; Enfermagem.

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Abstract

Chronic wounds are a problem that always present a challenge in nursing practice in terms of its etiology, progression, treatment and rehabilitation, particularly in the aged persons where the incidence and prevalence is higher, with situations of high complexity and difficult resolution. The evidence-based practice should be present at all levels of nursing care, but for socio-economic reasons, which increasingly weigh on the health system, it is seriously urgent the integration of this philosophy in wound care.

Keywords: Chronic Wounds; Evidence Based Practice; Nursing

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INTRODUÇÃO

A Prática de enfermagem baseada na evidência emerge como um eixo estruturante da sistematização do saber produzido, em que o objectivo consiste em planear e implementar cuidados de enfermagem que integrem a melhor evidência científica. Este conceito engloba, portanto, o conhecimento da fisio-patologia, o conhecimento de questões psicossociais, as preferências e valores dos clientes em relação à tomada de decisão dos seus processos terapêuticos (Bullock et al, 2010). A evidência científica pode incluir a investigação fundamentada, linhas de orientações das práticas e estudos de caso (Fineout-Overholt et al, 2010; Melnyk  et al, 2010).

A sua transposição para o contexto clínico é essencial para que a pessoa, sujeito activo de cuidados de saúde, receba os melhores cuidados possíveis, individualizados de acordo com a sua situação no contínuo saúde/ doença, com elevado nível de qualidade e proficiência (Heater et al. 1988).

A implementação deste processo, a prática baseada na evidência (PBE), constitui a última e quarta etapa, na medida em que primeiramente é fundamental delinear um foco de atenção, que habitualmente surge no contexto de trabalho, onde se pretenda incrementar os ganhos e resultados em saúde. Peritos nas questões epistemológicas, no domínio da enfermagem, advogam a existência de outras três etapas orientadoras do processo (Melnyk e Davidson, 2009): (1) definição de uma pergunta de partida pertinente, (2) pesquisar a melhor evidência e (3) realizar uma apreciação crítica do conhecimento e sintetizá-lo (Melnyk et al, 2009). Assim, este artigo tem como objectivo clarificar as suas vantagens, bem como potenciar a sua implementação estrutural em Portugal, por parte de várias sectores como no ensino, na gestão, na prática e na investigação, na área dos cuidados de enfermagem em relação ao tratamento de feridas (Lloyd-Vossen, 2009; Pieper, 2009; Robson, 2009; Zuelzer, 2009).

CONTEXTUALIZAÇÃO DA PROBLEMÁTICA

É consensual que a transferência dos contributos da PBE para a prática pode demorar em média 17 anos  (Stillwell et al, 2010). Grande parte deste atraso da integração da investigação nas práticas relaciona-se com o sentimento de exterioridade que os enfermeiros demonstram face aos resultados científicos e, consequentemente, não os consideram como um elemento chave da sua perícia técnico-científica diária (Pravikoff et al. 2005), como é o caso particular do tratamento de feridas (Gwynne e Newton, 2006; Harrison, 2006; Healey e Oliver, 2009). Um dos outros factores apontados está associado à pedagogia tradicional utilizada no ensino da investigação, como por exemplo, trabalhos académicos sem relevância clínica, um processo centrado no fazer pesquisa em vez de utilizar a pesquisa, contribuiu para o desenvolvimento de anti-corpos, que funcionam como entrave na sua mobilização para os contextos reais (Melnyk et al, 2009; Stillwell et al, 2010). Deste modo, uma nova concepção do que é a pesquisa e da sua utilidade é crucial, onde as próprias organizações de ensino devem valorizar os espaços onde os estudantes são actores e repensar as metodologias utilizadas, que possibilite descobrir a emancipação/ a autonomia oferecida pelo conhecimento das melhores evidências científicas (Melnyk et al, 2009). Neste sentido, é necessário ultrapassar o discurso, frequentemente, referenciado nas conclusões de trabalhos de investigação, onde se recomenda mais estudos sobre a mesma problemática. Considera-se indispensável uma mutação de paradigma, com o abandono de uma postura de passividade perante os ganhos da investigação para a adopção de uma atitude de utilização e transformação na prática, desse mesmo saber válido acumulado ao longo de anos pela prática dos enfermeiros na prevenção e tratamento de úlceras (Gethin, 2009; Gray, 2008; Griggs, 2009). Para conseguir este envolvimento na tradução dos resultados de investigação para a prática, torna-se fulcral vencer alguns dos obstáculos apontados: a falta de conhecimento e habilidade, o seu acesso nos espaços de acção e o reduzido número de especialistas na PBE (Fineout-Overholt et al, 2010; Melnyk  et al, 2010). Como forma de abordagem e desenvolvimento da temática PBE, aplicada ao tratamento de feridas de diversas etiologias (Dick, 2008; Eisert et al, 2010; Ellis, 2009)  a literatura recomenda uma discussão, particularmente, baseada na capacidade de reflexão (Melnyk  et al, 2010). A aplicação desta pesquisa para a prática exige uma cuidadosa análise sobre as condições para a sua implementação, tais como: a actual filosofia orientadora da prática, os recursos disponíveis, a confiança nas evidências disponíveis, assim como a identificação dos membros interessados que irão influenciar todo este processo (Stillwell et al, 2010). Nas organizações educativas recomenda-se uma clara definição do quadro teórico que norteia os procedimentos inerentes à PBE, de forma a facilitar a sua exequibilidade e eficácia na melhoria do cuidado prestado ao outro.

No nosso país existe ainda um longo caminho, observando-se uma clara dicotomia entre a teoria e a prática clínica, sendo esta abordagem da PBE, uma oportunidade de aproximar estas vertentes a partir da conceptualização das reais necessidades dos contextos clínicos (Bullock et al, 2010). No momento actual, observamos um grupo de enfermeiros que prestam cuidados e um grupo de enfermeiros que ensina cuidados de enfermagem, numa clara dicotomia nada abonatória do desenvolvimento da disciplina e da profissão (Stillwell et al, 2010). A legislação sobre a carreira de enfermagem negociada com organizações sindicais representativas da profissão e o Ministério da Saúde, deixa do lado de fora dos organismos públicos o conhecimento produzido pelos vários cursos de Mestrado e Doutoramentos experienciados por vários enfermeiros clínicos, ao invés de outros grupos profissionais (fisioterapeutas, médicos, terapeutas ocupacionais, entre outros) que têm alicerçado a evolução nas respectivas carreiras com base no desenvolvimento cientifico dos seus membros. Este fulgor legislativo não vem facilitar a utilização do conhecimento e o desenvolvimento dos enfermeiros com base na introdução do melhor conhecimento científico, nas suas práticas clínicas, na gestão e não cria em nossa opinião as melhores condições à PBE em relação ao tratamento de feridas.

PRÁTICA BASEADA NA EVIDÊNCIA O PAPEL DO EDUCADOR

Quando os educadores utilizam uma estrutura (suporte, sistema) conceptual de Prática Baseada na Evidência, permitem aos estudantes compreender como os conceitos se relacionam entre si, a fim de conseguirem melhores resultados junto dos doentes e, consequentemente,compreender a sua utilidade (Melnyk e Davidson, 2009; Melnyk et al, 2009).

Figura 1

Saber como o conceito pode ser utilizado, aprendendo sobre o mesmo em contexto de sala de aula ou em contexto prático, é essencial para que este seja valorizado no futuro. Por exemplo, quando um educador explica que os padrões de conhecimento são importantes para o processo de prática baseada na evidência (Feinstein, 2008; Melnyk, 2006), a relação desses padrões com o processo em si deveria ser demonstrada, estabelecendo uma ligação entre o conteúdo dos padrões de conhecimento (ex. empírico, estético, pessoal, étnico e sociopolítico) e os aspectos da estrutura conceptual da Figura 1.

Mais especificamente, poderiam ser estabelecidas ligações simples entre os aspectos do conhecimento empírico e a vertente da investigação (Cornforth, 2009; Day e Boynton, 2008). O conhecimento pessoal e estético poderia ser relacionado com a forma como é desenvolvida a experiência clínica; o conhecimento sociopolítico e a sua influência no processo de tomada de decisão clínica e na forma como os recursos de saúde são utilizados (pelos enfermeiros); o conhecimento ético e a sua influência no processo de tomada de conhecimento, valorização e incorporação das preferências dos doentes por parte dos enfermeiros; e, consequentemente, seria abordada a forma como padrões de conhecimento interagem com todos os aspectos do processo Prática Baseada na Evidência (Melnyk e Davidson, 2009; Melnyk et al, 2009). Reflectir sobre o que é ensinado acerca da implementação e porque é que tem sido ensinado faculta aos alunos os alicerces para que os conceitos teóricos sejam aplicados na prática. Assim, a aprendizagem com a finalidade prática de melhorar os cuidados ao cliente será facilitada, ao invés de ser apenas um exercício intelectual, este é o modelo que descrevemos como profícuo aplicado nas Pós Graduações da Formasau, em especial na Pós Graduação em Gestão de Feridas Crónicas.

O Modelo Transteórico de Mudança Organizacional é uma abordagem que pode ser utilizada pelos educadores para orientar a sua prática pedagógica (Day e Boynton, 2008). Este modelo inclui cinco estádios, nomeadamente a pré-contemplação, contemplação, preparação, acção e manutenção (Melnyk et al, 2009). São descritos dez processos que podem produzir mudança, três dos quais são (a) considerar que a mudança é importante para o sucesso pessoal (auto-reavaliação); (b) acreditar que uma mudança pode ter sucesso e fazer um compromisso firme para com a mudança (auto-libertação); (c) considerar que a mudança terá um impacto positivo no ambiente de trabalho (reavaliação ambiental) (Melnyk et al, 2009). Este modelo tem vindo a ser utilizado no campo da mudança organizacional, o que, se empiricamente suportado, poderia comprovar a eficácia pragmática da teoria.

A Teoria de Controlo é outra abordagem que pode orientar os educadores (Melnyk  et al, 2010). Esta teoria defende que a discrepância entre um objectivo ou meta individual (prática baseada na evidência) e o seu estado actual (prática não-baseada na evidência) deverá motivar comportamentos para alcançar esse objectivo ou meta (Feinstein, 2008; Melnyk, 2006). No entanto, existem determinadas barreira que podem condicionar o início dos comportamentos que permitirão alcançar esses objectivos ou metas individuais. Exemplos dessas condicionantes são: incerteza sobre como alcançar o objectivo ou meta; défice de conhecimentos ou capacidades; elevado número de doentes ou sobrecarga de trabalho e fracas expectativas em relação aos possíveis resultados (Melnyk, 2006). O educador tem a responsabilidade de eliminar essas condicionantes promovendo a aprendizagem individual através de momentos de ensino, que são interpretados como uma oportunidade educacional onde o estudante é direccionado e sensibilizado para aprender sobre algo (Day e Boynton, 2008). Assim sendo, questões sobre que condicionantes existem e como contorná-las para alcançar os referidos objectivos ou metas deveriam ser tópicos de discussão abordados em sala de aula, em qualquer nível de formação (Stillwell et al, 2010).

As duas teorias apresentadas sustentam o Modelo de Colaboração entre a Investigação e Prática Clínica (Fineout-Overholt et al, 2010; Melnyk  et al, 2010)). O elemento-chave deste modelo é o mentor da Prática Baseada na Evidência – uma pessoa com conhecimentos profundos sobre a PBE e com grande motivação para influenciar o desempenho com base na evidência – incluindo a sua experiência na tomada de decisão, as preferências da pessoa e outros dados concretos (Fineout-Overholt et al, 2010). Para preparar os alunos para o actual ambiente de trabalho, as escolas podem ser consideradas como mentoras da PBE no que à educação diz respeito.

O papel do mentor da PBE passa por facilitar a aprendizagem e o desenvolvimento de capacidades sobre a mesma, conduzindo os estudantes a ir para além do pré-estabelecido. As evidências apontam para o facto de que os enfermeiros e educadores que mais acreditam na PBE influenciam os seus pares (Melnyk et al. 2010).

O sector de ensino em Portugal e do ponto de vista da utilização do melhor conhecimento científico no ensino é ainda incipiente, ensina-se nalguns casos o que se ensinava nas duas últimas décadas do século passado, numa claro desajustamento entre o conhecimento e a docência. A pouca percentagem de Docentes das escolas superiores de enfermagem, com o Grau de Doutor, tem atrasado o reconhecimento do ensino da profissão ao nível universitário, o que só comprova a falta de estratégia científica.

O actual fulgor de cursos de Mestrados Profissionais virá atrasar ainda mais o desenvolvimento de planos de intervenção ao nível dos cuidados de enfermagem prestados segundo estruturações a partir do conhecimento científico internacional. Relatórios de estágio medíocres do ponto da produção científica serão às centenas nos próximos anos em Portugal, numa clara sugestão do desconhecimento científico publicitado no ensino politécnico para obtenção de graus de mestrado.

ESTRATÉGIAS POTENCIADORAS DA FUSÃO DOS RESULTADOS DA INVESTIGAÇÃO NA PRÁTICA CLÍNICA

A tentativa para acelerar a investigação sobre a prática exige (a) verdadeira parceria entre enfermeiros investigadores e os enfermeiros na prestação directa de cuidados, parceria essa baseada nas necessidades dos clientes e com base nas melhores evidências disponíveis, e (b) uma melhor utilização da ciência actual sobre o desenvolvimento organizacional e a mudança relacionados a PBE em relação ao tratamento das feridas (Charbonneau et al, 2009; Cornforth, 2009). Há uma necessidade de reforçar a institucionalização da PBE, para atingir esta meta, toda a estrutura da saúde deve ser sensibilizada sobre como criar e lidar com uma infra-estrutura e cultura para apoiar PBE.

Não existem métodos infalíveis disponíveis para assegurar a adopção de melhores práticas individuais com base em investigação em qualquer ambiente clínico. As evidências das investigações actuais sobre a implementação das melhores práticas, bem como as conclusões gerais sobre as mudanças organizacionais sugerem que elementos contextuais são susceptíveis de influenciar o sucesso ou o fracasso dos esforços da PBE (Feinstein, 2008; Melnyk, 2006). Esses elementos incluem a liderança, cultura organizacional, e presença de estruturas organizacionais e sistemas que suportam o uso rotineiro da PBE. Os enfermeiros e outros profissionais de saúde para conseguir a aprovação de rotina da PBE, devem entender a natureza das evidências, o processo de implementação, mudança organizacional e os principais elementos contextuais (Ashton e Price, 2006; Ayello et al, 2006). Tal exige a disponibilização de programas específicos ou mentores PBE, bem como uma estruturação e mudança nos planos curriculares. Os enfermeiros podem então aplicar esse conhecimento para criar um ambiente que é encorajador, solidário e sustentável da PBE, que inclui um foco na utilização da investigação (Melnyk, 2006).

A disponibilidade de um perito de PBE (Bullock et al, 2010), um corrector de conhecimento ou um facilitador da sua aplicação no ambiente para a prática é recomendada. Esta função sugere a prática de educação avançada, esse especialista é preparado no sentido de desempenhar um papel de advocacia e proporcionar um ambiente rico de aprendizagem em torno da PBE.

TRÊS PRIORIDADES DE CONVERGÊNCIA NACIONAL PARA A PBE

Descrevem-se as principais prioridades para o avanço da PBE traçadas nos Estados Unidos, com as respectivas estratégias de implementação (Feinstein, 2008; Melnyk et al, 2009):

  1. Formar uma estratégia de PBE nacional de investigação ou uma rede de instituições com uma política que facilite a realização de estudos de eficácia e efectividade.
  • Publicar um documento conceptual que descreva a estratégia para desenvolver e designar uma rede nacional;
  • Prosseguir para com a estratégia de PBE nacional de investigação, com contactos com a Agência de Investigação de Saúde e Qualidade (AHRQ-US) e com Organizações de Saúde. Criar um Instituto Nacional de Pesquisa em Enfermagem, para discutir estratégias de financiamento possíveis e examinar as prioridades actuais para as oportunidades de financiamento específicas.

2. Implementar um programa de orientação nacional da PBE

  • Estabelecer um consórcio nacional, parceria entre os centros de excelência estabelecidos na PBE e organizações nacionais;
  • Desenvolver uma lista de mentores peritos PBE;
  • Construir os critérios para as aplicações;
  • Planear a experiência de tutória PBE;
  • Definir os resultados do programa de formação em PBE.

3. Elaborar normas para os planos curriculares a fim de integrar a PBE

  • Parceria com o Ministério da Saúde, Ordem dos Enfermeiros, Escolas Superiores de Enfermagem, Universidades e outros intervenientes no processo de formação para desenvolver novos padrões;
  • Propor que as normas da PBE passem a ser uma parte integrante da acreditação de escolas, entidades formadoras e organizações de profissionais de saúde;
  • Publicar um guia curricular da PBE para todos os níveis da educação;
  • Não permitir curso pós graduados sem docentes responsáveis com o Grau de Doutor.

 

CONCLUSÃO

O desenvolvimento da Investigação em Enfermagem é fundamental, e em particular no tratamento e prevenção de feridas, permite a construção de um corpo de conhecimento próprio, o aperfeiçoamento dos cuidados prestados ao cliente, baseados em conhecimento científico e o enriquecimento do profissional e da sua prática (Ashton e Price, 2006; Ayello et al, 2006). Actualmente, começa-se a compreender esta necessidade de transição do modelo de pensar nas práticas dos cuidados de saúde, onde se revela imprescindível uma decisão clínica baseada em evidências, em detrimento de uma decisão exclusivamente regida pelas opiniões e experiência do profissional de saúde isoladamente (Melnyk e Davidson,  2009). Deste modo, a pesquisa e a acção complementam-se, recriam-se num fluxo bi-lateral, numa lógica contínua de auto-aprendizagem partilhada em equipa, que minimiza a adopção de condutas e intervenções que rapidamente se desactualizam e perdem o seu valor terapêutico (Eisert et al, 2010; Ellis, 2009). A enfermagem baseada na evidência propõe a (re)construção de novas competências, que conduzem a uma avaliação crítica sistemática das informações disponíveis, para a tomada de decisão. Este é um processo que ao exigir novas habilidades, abre espaço para definir critérios com a eficácia, a efectividade e a eficiência para avaliar a qualidade e incorporar nos contextos de trabalho as conclusões válidas e consolidadas da pesquisa (Melnyk e Davidson,  2009). A utilização prudente da experiência clínica individual em parceria com a evidência clínica externa deve, portanto, ser encarada como um recurso que possibilita propor a intervenção mais adequada e segura para responder às necessidades individuais da pessoa.

Observamos que do ponto de vista das instituições de cuidados, de ensino e representativas da profissão uma cisão ao nível dos vários arquétipos que compõe este desenvolvimento. Sendo necessário o empenhamento de todos na construção de programas que promovam a PBE como estratégia de desenvolvimento dos cuidados de enfermagem, com base na introdução do melhor conhecimento cientifico, com base no conhecimento da fisopatologia, nas preferências dos cliente e na experiencia clínica dos enfermeiros. Deste modo o futuro papel do Grupo Feridasau, será congregar um conjunto do melhor conhecimento científico e da prática profissional é exemplo disso o vasto dinanciamento que actualmente experiencia em formação e implementação de linhas de orientação para a prática clínica internacionais. Por certo será um longo percurso, num terreno que se encontra desfragmentado e com necessidade de alterações profundas na legislação de desenvolvimento profissional dos enfermeiros, com base no conhecimento científico produzindo e nos melhores resultados dos cuidados de enfermagem.

 

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Jul 30, 2012

ROLE OF BIOFILMS IN CHRONIC WOUNDS

PAPEL DE LOS BIOFILMS EN LAS HERIDAS CRÓNICAS

AUTORES: Elsa Menoita, Vítor Santos, Cláudia Gomes , Ana Sofia Santos

Resumo

Começa a amplamente aceite, que as feridas crónicas na sua maioria apresentam biofilme e que este representa um importante potencial infeccioso. O que importa considerar também é o importante papel que este desempenha ao perpetuar o estímulo inflamatório que caracteriza a ferida crónica. A sua complexidade confere-lhe essa capacidade para induzir a libertação de proteinases e outros factores inflamatórios, enfraquecendo o organismo, danificando o leito da ferida e no fundo comprometendo todo o processo de cicatrização. Caracteriza-se ainda por apresentar multiplos mecanismos de resistência às abordagens terapêuticas tradicionais, o que acentua o seu cariz de factor de cronicidade. A necessidade estratégias terapêuticas especificas para esta entidade, é urgente.

Palavras chave: Biofilmes, Cicatrização, Ferida Crónica

Abstract

It is becoming widely accepted that biofilm is present in most of chronic wounds and that it represents an important potential for infection. It is also important to consider the important role it plays in perpetuating the inflammatory stimulus that characterizes the chronic wound. Its complexity gives it the ability to induce the release of proteinases and other inflammatory factors, weakening the organism, damaging the wound bed and compromising the entire healing process. It is still characterized by presenting multiple mechanisms of resistance to traditional therapeutic approaches, which enhances its factor of chronicity nature. The need for specific therapeutic strategies for this entity, is urgent.

Key words: Biofilms, Wound Healing, Chronic Wound

1. Introdução

Os biofilmes desempenham um papel importante na natureza e em processos tecnológicos. Do ponto de vista do interesse do Homem podem ser benéficos ou prejudiciais. Como exemplo de biofilmes benéficos existem aqueles que se acumulam em ambientes naturais nos depósitos dos rios, lagos ou ambientes marinhos, e que se desenvolvem em associação com as raízes de algumas plantas, fornecendo-lhes alguns nutrientes. São também biofilmes benéficos aqueles que são utilizados em biotecnologia ambiental com grande sucesso no tratamento de efluentes, removendo poluentes orgânicos e inorgânicos de águas contaminadas. Na indústria alimentar, os biofilmes apresentam inúmeras vantagens, podendo ser utilizados na produção de alimentos fermentados, como por exemplo, na produção de vinagre. Contudo, na maioria das situações, a adesão de microrganismos a superfícies sólidas é indesejável, pois, de uma maneira geral, está associada à deterioração das superfícies e/ou ambiente circundante.

1.1. Biofilmes e a cronicidade

Aos biofilmes estão associados a um grande número de problemas de saúde, tais como infecções em tecidos, infecções do trato urinário, infecções desencadeadas por dispositivos médicos, como cateteres vasculares, infecção e consequente rejeição de próteses e implantes e infecções da placa dentária, entre outras (Costerton et al., 1999). No entanto, a ecologia e a gestão dos biofilmes ainda não são bem conhecidos na medicina (Costerton, et al., 1999 citados por Wolcott & Rhoads, 2008). Pelo menos a sua valorização na prática clinica, ainda não atinge a relevância devida e isso é comum a todas as áreas da prestação de cuidados de saúde.

Nos últimos anos, constatou-se que os biofilmes têm um papel preponderante na patogenese de numerosas infecções que não envolvem bio-materiais. De facto, cerca de 65% das infecções humanas de etiologia bacteriana poderão envolver biofilmes (Costerton, et al. 1999; Potera, 1999). The National Institutes of Health (NIH) sugere, mesmo, que 80% das doenças infecciosas é causada por biofilmes podendo causar infecções crónicas (Association for the Advancement of Wound Care, 2008; Wolcott & Rhoads, 2008; Rhoads et al., 2008; Widgerow, 2008). De acordo com Wolcott (2010), há mais de 14 milhões de infecções por biofilme nos EUA cada ano, resultando em mais de 350.000 mortes – uma taxa de mortalidade semelhante à do cancro. Os consórcios de biofilmes podem, mesmo, serem agentes causais de infecções graves em indivíduos imunocomprometidos (Costerton et a.l, 1999). Assim, todos estes dados epidemiológicos, devem servir de alerta para um problema grave, que deve ser encarado como real, as estratégias para o seu controlo devem ser mobilizadas e até mais desenvolvidas.

Rhoads et al. (2008) referem que, as bactérias isoladas em feridas crónicas são geralmente cultivadas e estudadas através de métodos tradicionais aplicáveis somente às bactérias em estado planctónico. No entanto, as bactérias planctónicas cultivadas em laboratório comportam-se de forma diferente das bactérias em biofilme localizadas no leito das feridas crónicas.  É já sobejamente conhecido que mais de 99% das bactérias encontradas na natureza existem em estado séssil, formando biofilmes (Widgerow, 2008), e crê-se que o mesmo se aplica às feridas crónicas (Rhoads et al., 2008). Os biofilmes são de um modo geral heterogéneos, contendo mais do que um microambiente distinto, por exemplo, no mesmo biofilme podem ser encontrados estratos aeróbios e estratos anaeróbios (Characklis & Marshall, 1989; Van Der Wende & Characklis, 1990), apesar de que, de acordo com Flemming (1993) cerca de 70 a 95% da matéria orgânica da massa seca do biofilme seja constituido por substância polimérica extracelular (“Extracellular Polymeric Substances” – EPS).

A presença de biofilme no leito da ferida crónica tem vindo a ser mencionado em estudos há vários anos (Mertz, 2003; Welsh, et al., 2003, Serralta et al., 2001, Bello et al., 2001, citados por Wolcott & Rhoads, 2008), mas actualmente há evidências concretas da sua presença (James et al., 2008).

Num estudo realizado num  modelo suíno, por microscopia eletrónica e microscopia confocal a laser, verificaram, em queimaduras infectadas por Pseudomonas aeruginosa, que as bactérias se encontravam envolvidas numa matriz polimérica (Serralta et al., 2001, citados por Cooper, 2010).

Quadro 1: Forma planctónica versus biofilme: explicação para as observações clínicas
Adaptado: Wolcott (2008) – A study of biofilm-based wound management in subjects with critical limb ischaemia.

Noutra ocasião foi efectuado um estudo de referência por James et al. (2008), citados por Phillips et al., (2010) e Wolcott e Rhoads (2008), através de microscopia de imagem electrónica a 50 feridas crónicas e 16 agudas. Os autores verificaram que, 60% das feridas crónicas possuíam biofilme e apenas 6% das feridas agudas apresentavam biofilme

(Steinberg, 2011; James et al., 2008; Widgerow, 2008). Estes resultados sugerem para os autores que, não só as feridas crónicas apresentavam biofilme, como, também, a sua presença pode prejudicar a cicatrização, contribuindo para a cronicidade das feridas. Wolcott e Rhoads (2008) corroboram esse facto, sublinhando que, os biofilmes podem ser uma das causas da cronicidade das feridas. Phillips et al., (2010) consideram, mesmo, que é provável que quase todas as feridas crónicas tenham biofilme, em pelo menos uma parte do leito da ferida.

Curiosamente, a libertação “deliberada” de bactérias planctónicas do biofilme tem sido proposto para manter uma resposta inflamatória em feridas (Wolcott et al., 2008 citados por Cooper, 2010).

De um microrganismo plantónico a uma comunidade complexa com impressionantes defesas, incluindo um aumento da resistência aos antibióticos, biocidas, e imunidade humana, pode levar somente 10 horas (Fux, et al., 2005, citados por Wolcott & Rhoads, 2008; Widgerow, 2008).

Já de acordo com Costerton (1984) e Bester et al. (2010) citados por Phillips et al. (2010), estudos experimentais têm mostrado que as bactérias planctónicas (como por exemplo, estafilococos, estreptococos, Pseudomonas e Escherichia coli), geralmente:

– Fixam-se em poucos minutos;

– As microcolónias formam-se dentro de 2-4 horas;

– A EPS forma-se em 6- 12 horas, tornando o biofilme cada vez mais resistente a biocidas e a antibióticos;

– O biofilme maduro pode começar a desprender bactérias planctónicas dentro 2-4 dias.

– Um biofilme maduro depois de libertar células bacterianas pode recuperar num espaço temporal de 24 horas.

Stoodley et al. (2001), citados por Association for the Advancement of Wound Care (2008), também, referem que o biofilme leva cerca de 24 horas para restabelecer a sua biomassa. Estes achados experimentais são fundamentais para a gestão dos biofilmes, pois significa que depois de desencadear a ruptura de células bacterianas planctónicas com desbridamento e tratamento tópico, como por exemplo com surfactantes, há uma janela de oportunidade de 24 horas, utilizando antimicrobianos, de forma a não se recuperarem.

Um biofilme pode se reconstituir numa ferida por (Phillips et al., 2010):

– Crescimento a partir de bactérias planctónicas deixadas pelo desbridamento / limpeza;

– Crescimento por  microorganismos  recém  introduzidos.

Segundo Gibson et al. (2009), parece provável que, em muitos casos, as feridas agudas sejam colonizadas por bactérias que em dias se transformam em bactérias de biofilme persistente, estabelecendo uma fonte inflamatória a longo prazo. Numa fase inflamatória prolongada existe um estímulo pró-inflamatório constante, com aumento de libertação de neutrofilios e leucócitos para o leito da ferida. Estes libertam espécies reactivas de oxigénio (ERO) e enzimas (Philipps et al., 2010).

As espécies reactivas de oxigénio são moléculas capazes de modificarem outras moléculas, como proteínas, hidratos de carbono, lipídos e o ácido desoxirribonucléico (DNA). Estas desenvolvem-se a partir do metabolismo aeróbio do oxigénio, causando stress oxidativo.  As ERO podem romper a membrana lipoproteica, destruir as funções enzimáticas celulares, alterar o DNA e conduzir à morte celular.

As enzimas produzidas pelas células inflamatórias são proteínas que facilitam reacções biológicas e que geralmente actuam sobre um número limitado de moléculas (conhecidas como substratos das enzimas), transformando-as fisicamente noutras substâncias. As proteinases (também conhecidas como proteases) são enzimas que actuam sobre as proteínas, geralmente fragmentando a molécula da proteína (Gibson et al., 2009; Schultz et al., 2009). Uma família especifica de proteinases,  as metaloproteinases da matriz – MMP’s, são prticularmente nocivas para o leito da ferida. Os substratos naturais para as diferentes MMPs variam substancialmente, mas incluem importantes proteínas da matriz extracelular (MEC), como o colagénio, a gelatina e os proteoglicanos. As MMPs degradam estas proteínas fragmentando-as em pequenas partes.

Segundo Gibson et al. (2009), a designação “matriz metaloproteinase” (ou “matriz metaloprotease”) indica as propriedades-chave partilhadas pelas MMPs. Todas elas, preferencialmente, degradam as proteínas que compõem a matriz extracelular dos tecidos e requerem um ião metálico (zinco) no centro activo da enzima. Rhoads et al. (2008) defendem que, provavelmente, o biofilme pode desencadear uma resposta imunitária com aumento de MMP, como a MMP -2, MM-8, MMP -9 e a elastase, para além de desencadear senescência com incapacidade funcional dos fibroblastos, queratinócitos, e das células endoteliais para iniciar a angiogénese.

Quando sintetizadas inicialmente, as MMPs permanecem em forma latente (inactivas ou pro-MMP). Elas são activadas por outras proteases que recortam uma pequena parte da molécula, abrindo o centro activo da molécula MMP, permitindo ligar-se ao(s) substrato(s) da sua proteína. Outras moléculas designadas como inibidores de tecido de metaloproteinases (TIMPs) podem inibir as MMPs activadas e bloquear a activação de pro-MMPs (Gibson et al., 2009).

Enquanto a maioria das MMPs é segregada para a MEC (matriz extracelular) circundante, algumas MPPs mantêm-se associadas a membranas celulares, sendo conhecidas como MMPs “tipo membrana” (MMP-TPs). Pensa-se que este grupo de MMPs desempenha um papel importante na activação de pro-MMPs, bem como na activação de pro-TNF (factor de necrose tumoral – um mediador  importante envolvido na inflamação e morte celular) (Gibson et al., 2009).

As MMPs, que essenciais para a cicatrização em feridas agudas, tornam-se prejudiciais nas crónicas, destruindo ou corrompendo continuamente as proteínas essenciais da MEC (Gibson et al., 2009; Schultz et al., 2009). Adicionalmente, as proteinases captam os factores de crescimento, tornando-os indisponíveis para o processo de cicatrização.

1.2. Mecanismos de resistência de bactérias

A capacidade de sobrevivência do biofilme é um resultado de estratégias de adaptação desenvolvidas ao longo de milhões de anos (Association for the Advancement of Wound Care, 2008).

Um dos grandes avanços da medicina tem sido o controlo de infecções através do uso de antibióticos, contudo estes têm uma eficácia limitada nos biofilmes, podendo estes ser mil vezes mais resistentes a antibióticos do que o mesmo organismo em forma plantónica, sendo ainda parcialmente protegidos da acção destruidora dos fagócitos (Davey & O’toole, 2000). Para Wolcott et al. (2009), os biofilmes podem 50 a 1500 vezes mais ser resistentes aos antibióticos. Os biofilmes bacterianos são muito resistentes à eliminação efectuada pelos anticorpos do hospedeiro, pelas células inflamatórias, pelos antibióticos e pelos antissépticos (Gibson et al., 2009; James et al., 2008; Costerton J, Stewart, 2001). Wolcott e Rhoads (2008) corroboram, defendendo que o sistema imunitário e os antibióticos são mais bem-sucedidos em destruir bactérias individuais do que em biofilmes.

Para além das já mencionadas resistências, os biofilmes demonstram, também, resistência acrescida à radiação UV (Elasri & Miller, 1999) e à desidratação, pois a matriz de EPS é altamente hidratada. Flemming (1991) e Mittelman (1998) acrescentam, defendendo que os biofilmes têm processos de protecção contra factores ambientais agressivos, como por exemplo as flutuações de pH, concentração de sais, desidratação, substâncias químicas agressivas, agentes bactericidas (biocidas), predadores, antibióticos.

Existem algumas explicações que defendem as suas multi-resistências, tais como as que iremos explanar.

  1. O desenvolvimento preferencial em superfícies inertes, tecidos mortos e instrumentos médicos (Costerton et a.l, 1999, Yasuda et al., 1994).
  2. A capacidade para estabelecer e colonizar nichos ecológicos (Flemming, 1991; Mittelman, 1998).
  3. A facilidade de desenvolvimento de microconsórcios que permitem o estabelecimento de relações de simbiose, bem como a utilização de substratos de difícil degradação (Flemming, 1991; Mittelman, 1998). Os biofilmes são ambientes ideais para o desenvolvimento de relações sintróficas, que é um tipo de simbiose onde dois tipos de organismos metabolicamente distintos dependem um do outro para utilizarem certos substratos, na produção de energia.
  4. A matriz polimérica parece funcionar como uma barreira protectora contra factores agressivos externos – efeito Blocking (Phillips et al., 2010). De acordo com alguns autores, esta matriz EPS tem o potencial de prevenir o acesso físico de certos agentes antimicrobianos (Allison, 2003; Elvers & Lappin-Scott, 2000;).
  5. O quorum sensing regula actividades celulares, como a produção de metabolitos, como enzimas citotóxicas, conforme já referido. Loryman e Mansbridge (2007), citados por Steinberg (2011), observaram que o efeito do quorum sensing inibia a migração de queratinócitos.
  6. O aumento da concentração de nutrientes nas interfaces líquido-biofilme uma vez que a matriz polimérica favorece a adsorção de moléculas de nutrientes (Flemming, 1991; Mittelman, 1998).
  7. Os componentes da membrana externa das bactérias envolvidos na aderência, tais como pili, e a actividade flagelar por parte das células fixas inicialmente, designada por twitching motility, são necessárias para o desenvolvimento de biofilmes, como a de P. aeruginosa (O’Toole & Kolter, 1998).
  8. O crescimento lento dos biofilmes é um factor facilitador à resistência (Costerton et a.l, 1999; Yasuda et al., 1994). Estas microcolónias têm ecologia diferente das formas planctónicas, pois elas proliferam mais devagar, prejudicando, portanto, a sua resposta a muitos antibióticos que agem essencialmente quando as células se encontram na fase mitótica. De acordo com Phillips et al. (2010), as bactérias em biofilme podem se encontrar, mesmo, em estado de hibernação, conforme já referido, em que as células estão metabolicamente quiescentes. As bactérias precisam de ser metabolicamente activas para poderem ser eliminadas pelos antibióticos.
  9. A libertação de antigénios que levam à produção de anticorpos específicos e formação de imunocomplexos que podem provocar lesões nos tecidos adjacentes (Phillips et al., 2010; Costerton et a.l., 1999).
  10. A possibilidade de troca de material genético devido aos longos tempos de retenção dos microrganismos (Flemming, 1991; Mittelman, 1998). Assim, esta comunidade bacteriana adquire novas informações genéticas. O designado processo de conjugação, ou seja, o mecanismo de transferência de plasmídios (porções de DNA), ocorre a uma taxa superior entre células em biofilmes do que entre células livres (Roberts et al. 1999; Steinberg, 2011), e estirpes de relevância médica contendo certos plasmídios demonstram maior tendência para a formação de biofilmes (Ghingo, 2001). Assim, com esse mecanismo, uma mesma bactéria pode adquirir resistência simultânea contra diversos antibióticos diferentes das bactérias vizinhas (Steinberg, 2011; Phillips et al., 2010).
  11. Apresentam processos de transferência diferentes (Stewart, 2003), ou seja, as implicações físicas do crescimento em sistemas geometricamente tão diferentes, como o caso dos biofilmes em comparação com as células livres. Em culturas de células livres ou planctónicas, o transporte de solutos do meio líquido (normalmente bem homogeneizado) para uma célula, ou vice-versa, é um processo relativamente rápido, não constituindo um passo limitante na totalidade dos bioprocessos que ocorrem na célula. Agregados microbianos, no entanto, são ambientes densamente empacotados onde o fluxo de líquido é limitado. Apesar do facto de se observar fluxo de líquido ocorrendo nos canais de água dos biofilmes (De Beer et al. 1994; Stoodley et al., 1994), nos agregados em si, toda a transferência de massa se dá através de difusão (De Beer et al., 1994), um processo muito mais lento. Este facto é ainda agravado por limitações difusionais acrescidas, causadas pela matriz do biofilme (Stewart, 2003). Em agregados microbianos suficientemente espessos, usuais em biofilmes, as distâncias difusionais são suficientemente grandes para que o transporte de solutos de e para as células bacterianas interiores se torne lento em comparação com as cinéticas de bioprocessos dos microrganismos. Nestas situações formam-se gradientes de solutos no biofilme, e a transferência de massa torna-se num processo limitante para os bioprocessos (Characklis et al., 1990). Limitações de transferência de massa que impedem penetração eficiente de antibióticos no biofilme são também, frequentemente, apontadas como possíveis causas para a resistência a antibióticos.

De acordo com Donlan e Costerton (2002) e Gilbert et al. (2003), as limitações difusionais à passagem do agente pela matriz extracelular, são muitas vezes acompanhados por alterações/mutações fenotípicas das células no biofilme e ainda com o desenvolvimento de mecanismos de resistência por alteração do genótipo das células.

Nestes ambientes em limitação de transporte de solutos, os gradientes de concentração formados constituem condições favoráveis para a criação de micro-nichos. Baixas concentrações de oxigénio podem originar micro-ambientes propícios à proliferação de organismos anaeróbios, apesar da presença de oxigénio em solução no meio líquido.

Em suma, a resistência ocorre em função de inúmeros factores inter-relacionados, incluindo actividade metabólica diferencial, barreiras de difusão e ultra-estrutura da parede celular.

É fundamental, ainda, fazer a diferenciação dos 3 tipos de resistência: 1) resistência natural ou inerente ou intrínseca; 2) resistência adquirida devido à mutação e, 3) resistência por adaptação (Cloete, 2003; Heinzel, 1998).

Dos diferentes tipos de resistência bacteriana, a resistência intrínseca é considerado o mecanismo mais utilizado pelas bactérias para se adaptarem às condições físico-químicas agressivas a que são submetidas (McDonnell & Russell, 1999).

Bactérias intrinsecamente resistentes são aquelas cujas propriedades naturais podem reduzir ou prevenir acções bacterianas. Um microrganismo, que apresente uma maior capacidade de produção de polímeros extracelulares, adere com maior facilidade a substratos sólidos por ligação entre as cadeias de polímeros situadas na parede do organismo e no substrato. Geralmente é verificado que as bactérias Gram – são menos susceptíveis a biocidas e antibióticos do que as bactérias Gram+ (McDonnell & Russell, 1999).

No caso da resistência adquirida, os mecanismos de resistência surgem, geralmente, como resultado da aquisição de material genético ou de mutação. Também podem ocorrer trocas genéticas resultantes da conjugação, transformação ou mutações no genoma da célula (Cloete, 2003; Lambert et al., 2001). Numa colónia de biofilme, onde as células microbianas estão mais próximas umas das outras, acredita-se que esta proximidade pode aumentar a troca de material genético.

A resistência adaptativa é um tipo de resistência que as bactérias rapidamente perdem assim que se alteram as condições fisiológicas (Heinzel, 1998).

1.3. Considerações Finais

O biofilme cada vez mais revela ser uma entidade de extrema relevância clínica, pois não somente constitui um entrave à cicatrização, pelo componente infeccioso, mas também consequentemente, pelo estímulo inflamatório que promove a cronicidade da ferida crónica.

Mais uma vez a evidência científica disponível vem a salientar a complexidade desta entidade, que lhe confere ainda uma série de mecanismos de resistência face às modalidades terapêuticas tradicionais. Mais do que salientar o papel do biofilme na cronicidade da ferida, pretendeu-se com esta revisão, alertar para a necessidade de desenvolver estratégias cada vez mais diversificadas de abordagem deste problema, bem como para o abandono de algumas, ditas tradicionais, que podem trazer mais maleficio que beneficio, ao potenciar o desenvolvimento de microorganismos multi-resistentes, sendo que ficou bem patente a capacidade desta comunidade microbiológica, em desenvolver variados mecanismos de resistência.

A ideia central que fica, assenta na necessidade de desenvolver estratégias dirigidas ao biofilme, sempre que haja probabilidade da sua presença, para podermos ter um verdadeiro “biofilm based wound care”, pois se não encararmos esta entidade como associada à ferida, mas diferente desta, as consequências podem vir a ser desastrosas para o prognóstico da ferida.

É fundamental portanto saber reconhecer sinais e sintomas, que sugiram grande probabilidade de presença de biofilme e dispor de alternativas capazes para o seu tratamento, algumas já existentes, outras em desenvolvimento, mas que sejam verdadeiramente efectivas pois o biofilme já mostrou ser verdadeiramente complexo e eficaz, no que respeita à sua sobrevivência em relação a agressões exteriores.

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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