Fev 25, 2014

APPROACH OF THE GOUT WOUND
ENFOQUE EN LA HERIDA GOTOSA

Autores
José Marques1, Magda Narciso 2
1 Enfermeiro, Serviço de Urgência, CHO – Caldas da Rainha, 2 Enfermeira, Serviço de Ginecologia / Obstetricia, CHO – Caldas da Rainha
Corresponding Author: zecostamarques@hotmail.com

RESUMO
A gota é um tipo de artropatia inflamatória caracterizada pela acumulação de ácido úrico nas articulações. É uma patologia comum, ocorrendo em mais de 1% da população mundial. A sua incidência ocorre no sexo masculino, sendo que os estilos de vida pouco saudáveis, a diabetes, a hipertensão arterial, e a hiperlipidemia são os principais responsáveis pelo aparecimento da doença.
A gota pode-se desenvolver em vários estadios. Na fase mais grave em que a gota se torna crónica, há acumulação de ácido úrico no tecido subcutâneo, formando os tofos gotosos que podem ulcerar.
No tratamento da ferida gotosa o enfermeiro tem um papel fulcral, uma vez que é essencial que conduza o cliente a mudar o estilo de vida e que conheça o material de penso adequado à cicatrização da úlcera tendo por base a ferramenta TIME.
PALAVRAS-CHAVE: Ferida, Gota, Diagnóstico, Tratamento
Abstract
Gout is an inflammatory arthritis caused by elevated levels of uric acid in the blood. The uric acid crystallizes and it’s accumulated in the joints. This disease affects 1% of the population worldwide and it affects mostly the male gender and people with unhealthy lifestyles however diseases such as diabetes, hypertension and hyperlipidemia can also be responsible for the appearance of gout.

Gout can develop in several stages, in the more severe cases gout becomes chronic and progressive and it can also accumulate uric acid in the subcutaneous tissues forming gouty tophi that can ulcerate.

In relation to the treatment nurses play a fundamental role in appealing to the patient to change the lifestyle as well as becoming aware of the right dressing materials for the healing of the ulcer, based on the TIME tool.

KEYWORDS: Wound, Gout, Diagnosis, Treatment

Introdução

A gota é muitas vezes considerada uma “doença dos reis”, por estar relacionada com o estilo de vida excessivo. Hoje, mais de 1% da população europeia e dos EUA apresentam gota, no entanto a ulceração de tofos gotosos ainda permanece incomum1.

O artigo tem como principais objetivos, dar a conhecer a ferida de etiologia gotosa e possíveis materiais de penso disponíveis no mercado a aplicar nas diversas etapas da cicatrização.

Este artigo está estruturado numa parte teórica em que será abordado a definição, complicações e tratamento da gota. Posteriormente será apresentado um estudo de caso onde se irá descrever os vários tratamentos implementados segundo a ferramenta TIME, como estratégia de gestão destas feridas gotosas.

As doenças reumatológicas são o grupo de doenças mais prevalentes, afetando quase 40% dos portugueses. Constituem a primeira causa de consulta médica nos cuidados de saúde primários e o principal motivo de invalidez, estando na maioria das reformas antecipadas por doença, sendo ainda as maiores responsáveis pelo absentismo ao trabalho, e situam-se num lugar cimeiro no que respeita a custos saúde quer diretos quer indiretos2.

Estas doenças podem ser agudas, ou crónicas, atingem indivíduos de todas as idades, são causa frequente de incapacidade por afetarem o sistema músculo-esquelético e manifestarem sintomas como: a dor, tumefação e rigidez articular, limitação da mobilidade, e fadiga. Quando não são diagnosticadas e tratadas corretamente podem provocar graves repercussões físicas, psicológicas, familiares sociais e económicas2.

Existem seis tipos de artropatias inflamatórias, contudo apenas irá ser abordada a artropatia microscristalina – a gota2.

As artropatias microcristalinas caracterizam-se pelo depósito de microcristais nos tecidos, evoluem com episódios periódicos de crises inflamatórias articulares ou periarticulares agudas, sendo as mais frequentes a gota úrica e a doença por cristais de hidroxiapatite2.

A gota é definida como um tipo de artrite que resulta da acumulação de ácido úrico nas articulações. O ácido úrico está entre as substâncias naturalmente produzidas pelo organismo. Surge como resultado da decomposição das moléculas de purina (proteína contida em muitos alimentos: carnes vermelhas e de caça, enchidosmariscos, feijão, grão, ervilhas). Normalmente, o ácido úrico, permanece no sangue e o restante é eliminado pelos rins. Quando o organismo aumenta a sua produção ou diminui a sua excreção, surgem níveis elevados de ácido úrico no sangue – a hiperuricemia. A gota resulta, assim, da reação inflamatória dos cristais de ácido úrico nos estados de hiperuricemia2.
É uma patologia mais frequente nos homens (surgindo após os 40 anos no homem, e com um valor de ácido úrico> 7mg/dl) do que nas mulheres (surgindo após os 60 anos e com um valor de ácido úrico> 6mg/dl), e afeta indivíduos que apresentam: estilos de vida pouco saudáveis (consumidores assíduos de alimentos ricos em purinas e bebidas alcoólicas), excesso de peso, hipertensão arterial, diabetes mellitus, hiperlipidémia, doença cardiovascular, renal e tiroideia, e síndrome metabólico (caraterizado por hipertensão arterial, níveis elevados de insulina, gordura abdominal). O uso de alguns diuréticos (furosemida e hidroclorotiazida) que aumentam os níveis de ácido úrico e alguns fatores genéticos (como doenças hereditárias metabólicas) são também fatores de risco para o aparecimento da doença3,4.
A gota pode manifestar-se em quatro fases: fase 1 – hiperuricemia, é assintomática,ocorre devido ao excesso de produção de ácido úrico; fase 2 – gota articular aguda, surge devido à acumulação de ácido úrico nas articulações, provoca dor súbita, intensa, lancinante e de carácter pulsátil, inflamação e rigidez da articulação afetada; os sinais e sintomas surgem geralmente durante a noite e por vezes acompanham-se de alterações do estado geral e febre, podem persistir até 21 dias. As articulações mais atingidas são: as primeiras metafalanges, tarso, tibiotársica e joelho. Fase 3 – gota antecrítica, período durante o qual, o individuo afetado é assintomático; e fase 4 – gota crónica, desenvolve-se após vários anos (10 anos) de gota articular aguda recorrente e não tratada, é o estadio mais grave da doença, uma vez que há acumulação de ácido úrico no tecido subcutâneo (tofos), nas articulações (artropatia gotosa) e nos rins. O envolvimento renal (litíase renal e insuficiência renal) pode tornar-se grave e condicionar o prognóstico vital dos doentes pelo risco de insuficiência renal crónica irreversível. Nesta fase as articulações mais afetadas são os pavilhões auriculares, cotovelos, pés (hallux, dorso do pé e calcanhar) e mãos (interfalângicas distais), que ocasionalmente podem ulcerar5.
Os sintomas de uma articulação gotosa (Fig.1) incluem: dor severa, sensibilidade extrema, inchaço, rubor, calor, febre, calafrios e sensação de mal-estar4.
O tratamento deve incluir, medicamentos que proporcionem alívio sintomático da dor e inchaço (mas não diminuem o nível de ácido úrico) como os AINE’s (anti-inflamatórios não esteróides – por exemplo ibobrufeno e o naproxeno) que são de atuação rápida e são considerados tratamento de primeira linha. A colchicina é uma alternativa eficaz aos AINE’s e mais benéfica quando administrada nas 24 horas após uma crise aguda, tem como principais inconvenientes a diarreia e a necessidade de adaptação posológica na insuficiência renal. Os corticosteroides sistémicos ou intra-articulares podem ser utilizados quando os AINE’s e a colchicina são ineficazes ou contraindicados, e estão indicados apenas para tratamentos locais. O tratamento deve também incluir a utilização de agentes que reduzam os níveis séricos de ácido úrico e previnam a formação deste como o alopurinol. Este fármaco nunca deve ser iniciado antes de decorridas três semanas após a crise aguda, e deve ser instituído para toda a vida. O alopurinol é bem tolerado, mas podem surgir efeitos adversos graves: intolerância e hipersensibilidade, hepatopatia e complicações neurológicas e hematológicas2,3.

Além do tratamento farmacológico é necessário que o utente adquira um estilo de vida saudável que lhe permita reduzir as complicações da gota. Deve reduzir ou eliminar o uso de diuréticos de ansa, se possível; otimizar o peso através de uma dieta saudável restrita em alimentos ricos em purinas e bebidas alcoólicas, evitar a desidratação ingerindo 2L de água diários; aumentar a ingestão de produtos lácteos com baixo teor de gordura5. O individuo deve ser ensinado a elevar e imobilizar correctamente a articulação,a realizar alguns períodos de repouso diário, a usar roupas macias e hidratar a pele com creme hidratante6.
A cicatrização de uma ulceração gotosa representa um grande desafio para os enfermeiros que executam o tratamento de feridas, uma vez que os indivíduos que apresentam esta patologia trazem associados à doença inúmeras co-morbilidades (já mencionadas anteriormente) que vão dificultar o tratamento da ferida.

Os tofos gotosos podem também apresentar uma conduta para a infeção microbiana do espaço articular subjacente e os envolvidos, com risco de osteomielite1.

Deste modo, todos os doentes com ulcerações gotosas requerem uma adequada anamnese e uma avaliação cuidadosa da circulação periférica, e de um índice de pressão tornozelo-braço1.

ESTUDO CASO

Utente do sexo masculino de 42 anos, independente nas atividades de vida diária, com cerca de 80 kg, com antecedentes pessoais de gota e medicado com terapêutica antigotosa, que não cumpria. Refere maus hábitos alimentares sendo consumidor assíduo de bebidas alcoólicas, principalmente cerveja, carnes de caça, de porco, e borrego.

Foi internado no Hospital Distrital de Santarém a 3 de Maio de 2013, após ter desenvolvido uma ferida gotosa na região retro maleolar externa do pé esquerdo.

Teve alta clinica a 17 de Maio de 2013, com consulta marcada para observação da ferida pelo médico responsável e terapêutica: omeprazol 20 mg (1cp. jantar), vitaminex (1cp. almoço) alopurinol 300 mg (1cp. jantar) e furosemida (1cp. pequeno almoço e 1cp. ao jantar).
Para uma correta abordagem da ferida foi utilizada a ferramenta TIME que recentemente foi proposta ser substituída pela sigla DIME por alguns grupos, para enfatizar o benefício do desbridamento frequente da ferida (combate de bioflimes)7. Como forma de medição da ferida recorreu-se à fotografia digital associada ao comprimento x altura com recurso à régua. Assim, o tratamento foi iniciado 21/05/2013 com poliacrilato com solução de Ringer com execução de penso diário durante 4 dias associado a limpeza da ferida com solução de polihexanida com betaína e protecção da pele perilesional com película polimérica.
A ferida apresentava tecido inviável (fibrina com coágulos de sangue e tecido de hipergranulação), exsudado sero hemático em pequena quantidade, bordos cianosados e uma área ≈ 16,77cm2. Realizado desbridamento mecânico aos tofos gotosos da ferida, com saída visível de cristais de ácido úrico. Esta técnica segundo o utente foi dolorosa, referindo ter uma dor nível 7 (na escala numérica de avaliação da dor), por isso, fez analgesia 30 minutos antes da execução do penso. Ao final dos 4 dias a área da ferida passou para ≈ 13,32cm2, acompanhada de tecido de granulação e epitelização viável com exsudado seroso em pequena quantidade, e com diminuição significativa da quantidade de tofos gotosos.Como penso secundário utilizámos desde o início até ao final uma espuma de poliuretano para um adequado controle do exsudado (M).
Após a abordagem do desbridamento (D) prosseguimos o tratamento com combate de possível biofilme (I) com matriz de alginato de prata iónica em pasta durante 15 dias associado com solução polihexanida com betaína (utilizada durante 20 dias). No final deste período a ferida apresentava uma área de ≈ 7,48cm2.
Em seguida, para efetuar uma adequada estimulação da epitelização (I) foi iniciado tratamento ácido hialurónico com iodo em gel, tendo a ferida epitelizado totalmente ao final de 15 dias de tratamento.

Atualmente o utente mantém terapêutica com alopurinol 300 (1cp. jantar), furosemida (1cp. jejum) anti-inflamatório não esteroide (1cp. almoço, 1cp. jantar), devido há permanência do edema no pé. Foram realizados ensinos sobre estilo de vida saudável como: alimentação saudável, diminuição do consumo de bebidas alcoólicas e manutenção de um peso adequado à estatura.

CONCLUSÕES

Constatámos que poliacrilato com solução de Ringer é um excelente hidratante para a libertação dos tofos gotosos. O que vai ao encontro de outros estudos em que foram utilizados hidrogéis associado ao desbridamento como forma de hidratação e remoção dos tofos gotosos1. Foi evidente que os tofos gotosos dificultavam a formação de tecido de granulação.
Utilizámos pela primeira vez o alginato com prata em pasta e verificámos elevada eficácia da prata nesta apresentação, redução muito rápida dos sinais de infeção e necessidade de menores aplicações. Este produto interrompe o funcionamento de enzimas e proteínas importantes para o desenvolvimento bacteriano, danifica diretamente a estrutura da parede celular das bactérias e interfere com o seu ADN e ARN, interrompendo assim a produção de proteínas e a divisão celular8. Este efeito foi potenciado com utilização em simultâneo da solução polihexanida com betaína para remoção de eventual biofilme no leito da ferida e limpeza dos detritos da ferida.
Por fim, a utilização do ácido hialurónico com iodo, o mais recente produto de estimulação da epitelização, permitiu reproduzir o ambiente natural de cicatrização, promovendo uma rápida e total epitelização da ferida gotosa.

De salientar, que embora recomendando a utilização da avaliação do índice tornozelo-braço este não foi efetuado pela inexistência deste equipamento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

1) PATEL, GK ET AL (2010) – Ulcerated tophaceous gout. Internacional Wound. Vol. 7.
2) CARDOSO, A. ET AL (2005) – Regras de Ouro em Reumatologia. Direcção-Geral da Saúde. ISBN 972-675-122-5;
2) SCHUB, T.; BOLING, B. (2013) – Gout (quick lesson). Nursing Reference Center by EBSCO. Acedido a 26 de Junho 2013. Disponível em:http://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=rzh&AN=5000000184&site=ehost-live;
3) ALAN, R.; RANDALL, B. (2013) – Conditions in Depth: Gout. Health Library. Acedido em 26 de Junho. Disponível em http://web.ebscohost.com/nrc/detail?sid=0771f989-7bf8-43ea-9b7d-da0d577f4703%40sessionmgr113&vid=8&bk=1&hid=26&bdata=JnNpdGU9bnJjLWxpdmU%3d#db=nrc&AN=2009577502
4) CAPLE, C. (2012) – Gout: Preventing a Recurrent Attack. Nursing Reference Center by EBSCO. Acedido a 26 de Junho 2013. Disponível em: http://web.ebscohost.com/nrc/pdf?vid=4&sid=3db29922-7d06-46a2-a7d7-43e443ad56bf%40sessionmgr110&hid=126;
6) MARCEL, Cherie (2013) – Gout: Diet Therapy. Acedido em 26 de Junho. Disponível em http://web.ebscohost.com/nrc/detail?vid=4&sid=0771f989-7bf8-43ea-9b7d0d577f4703%40sessionmgr113&hid=124&bdata=JnNpdGU9bnJjLWxpdmU%3d#db=nrc&AN=T901399;
5) SCHULTZ, G.; DOWSETT, C. (2012) – Technology update: Wound bed preparation revisited. Wounds International. Vol. 3;
6) OPASANON S, ET AL (2012) – Askina® Calgitrol® Made Easy. Wounds International Vol. 3. Disponível em http://www.woundsinternational.com.

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