Mar 11, 2013

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NURSING OUTCOME IN THE PERSON WITH NONINVASIVE VENTILATION AT HOME

RESULTADOS SENSIBLES EN LA ATENCIÓN DE ENFERMERÍA EN LA PERSONA SOMETIDA A VENTILACIÓN NO INVASIVA EN CASA

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AUTORES: Ana Correia, Clara Freitas, Cláudia Pereira, Fátima Ferreira

RESUMO

Objetivo: Demonstrar os resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem à pessoa com VNI no domicílio.

Metodologia: Efetuada pesquisa na EBSCO (na CINAHL Plus with Full Text, MEDLINE with Full Text, British Nursing Index). Foram procurados artigos em texto integral (Janeiro / 2012), publicados entre 2002 e 2011. Foi utilizado o método de PI[C]O e selecionados 10 artigos do total de 98 encontrados.

Resultados: Foram identificados indicadores de necessidades de cuidados que poderão condicionar a adesão à VNI no domicílio a que foram associados variáveis de resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem como: controle de sintomas, segurança / ocorrências adversas, apoio psicológico, utilização dos serviços de saúde, gestão do regime terapêutico e qualidade de vida.

Conclusões: O doente submetido a VNI devidamente apoiado pelos enfermeiros, resolve melhor as complicações inerentes ao tratamento refletindo-se na redução de internamentos hospitalares assim como uma maior estabilização clínica e melhor qualidade de vida no domicílio.

Implicações na prática profissional: Necessidade de formação inicial e contínua dos enfermeiros.

Palavras-chave: Ventilação mecânica não Invasiva (VNI), Resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem, Cuidados de Enfermagem.

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ABSTRACT

Objective: To demonstrate the results sensitive to nursing care to people with NIV at home.

Methodology: The research was carried out in EBSCO (CINAHL Plus with Full Text, MEDLINE with Full Text, British Nursing Index). Articles were searched in full text (January/2012), published between 2002 and 2011. We used the method of PI [C]O and selected 10 items of total 98.

Results: Indicators of care needs that may restrict the adherence to the NIV at home were identified and associated with nursing outcome variables such as symptom management, adverse patient outcomes, psychological support, healthcare utilization, management of therapeutic regimen and quality of life.

Conclusions: The patient receiving NIV duly supported by nurses, best solves adverse outcomes of the treatment being reflected in reduced hospital admissions and greater clinical stability and better quality of life at home.

 Implications for practice: The need for initial and continuing training of nurses.

 Keywords: Noninvasive mechanical ventilation (NIV), Nursing Outcome and Nursing Care.

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INTRODUÇÃO

A ventilação não invasiva tem um papel cada vez mais importante quer em patologia aguda, quer na doença respiratória crónica (Ferreira, 2009). Evita a entubação endotraqueal e consequentemente os riscos associados, como por exemplo lesões da via aérea e pneumonias (Prado, 2008).

 Por ser fácil de instituir e de retirar, pode ser efetuada fora de uma unidade de cuidados intensivos, levando assim a uma diminuição do tempo de internamento hospitalar, da mortalidade e uma diminuição dos custos (Ferreira, 2009). O seu uso em doentes crónicos demonstrou benefícios fisiológicos que levaram à diminuição de necessidade de hospitalização e aumento da sobrevivência (Chang, 2010).

De acordo com a Canadian Thoracic Society (2011) os cuidados de saúde continuam a evoluir, sendo mais sofisticados, permitindo utilizar a tecnologia médica fora do ambiente hospitalar tradicional. Fatores como as preferências do doente e família, tecnologia de fácil manuseamento, escassez de camas a nível de internamento e a pressão económica sobre orçamentos hospitalares têm influenciado a transição de cuidados hospitalares para os cuidados na comunidade.

Em Portugal, o Relatório de Situação de Cuidados de Saúde Respiratórios Domiciliários publicado em 2010 refere que as doenças respiratórias crónicas graves, as perturbações respiratórias do sono e as doenças neuromusculares afetam mais de um milhão de doentes, sendo que no controlo clínico destas doenças estão indicadas a oxigenoterapia e ventiloterapia domiciliárias. A despesa do Sistema Nacional de Saúde com os Cuidados Respiratórios Domiciliários é da ordem dos 55,5 milhões de euros anuais, sendo que mais de 50% deste valor é referente à ventiloterapia. Os estudos disponíveis indicam claramente que a adesão dos doentes é muito baixa em virtude da falta de esclarecimento e supervisão. São vários os fatores descritos associados à tolerância e consequente adesão à VNI (Schneider et al, 2006) e por isso, tal como no doente agudo tratado em meio hospitalar, o doente com VNI no domicílio necessita de monitorização de parâmetros clínicos, supervisão por parte de profissionais e formação contínua (Prado, 2008).

Quando se iniciou o uso da VNI, a sua implementação era realizada exclusivamente por médicos. No entanto, mais recentemente a Enfermagem tem vindo a assumir um papel de grande responsabilidade na gestão deste tratamento (Rose e Gerdtz, 2009). Considera-se primordial que os enfermeiros que cuidam destes doentes tenham conhecimento sobre como implementar o tratamento, avaliar a monitorização e sucesso da intervenção (Jarvis, 2006). Transmitir competência, empatia e cuidado com profissionalismo facilita a adesão à terapêutica através da diminuição do stresse, do aumento da cooperação e motivação do doente (Pertab, 2009).

De acordo com Prado (2008), o doente crónico com VNI apresenta menos exacerbações agudas e menos internamentos, tem maior capacidade de resposta a exacerbações e melhor qualidade de vida. O Relatório de Situação (2010) supracitado acrescenta que estes doentes têm melhor integração familiar e social, e ao mesmo tempo permite uma importante redução de custos hospitalares. A Canadian Thoracic Society (2011) acrescenta ainda que o uso da VNI no domicílio tem aumentado a qualidade de vida destes doentes.

Neste contexto consideramos primordial a realização desta Revisão Sistemática de Literatura de forma a permitir uma reflexão sobre esta problemática. A nossa experiência profissional tem-nos mostrado que muitos dos doentes com VNI domiciliária de longa duração quando são internados apresentam várias dificuldades que condicionam a adesão e o uso correto do tratamento, dificuldades estas que se prendem com condições socioeconómicas dos doentes e familiares, como por exemplo as condições habitacionais, apoio de familiares, dificuldade de acesso aos cuidados de saúde quer primários, quer diferenciados. Existe também por parte das empresas fornecedoras dos equipamentos uma escassez de informação e de manutenção dos mesmos, apesar de todas facultarem um acesso telefónico gratuito no sentido de esclarecimento de dúvidas. Durante a nossa experiência de visita domiciliária de enfermagem deparámo-nos com uma elevada taxa de analfabetismo e idades superiores a 65 anos o que condicionava a exposição de dúvidas tanto aos técnicos como aos enfermeiros (enfermeiro da visita domiciliária respiratória e enfermeiro do Centro de Saúde da área de residência do doente). Estas dúvidas consistiam essencialmente no manuseamento do equipamento, higiene e manutenção do mesmo e complicações inerentes à VNI, pelo que se verificava a necessidade de realizar ensinos à pessoa e cuidador.

Face ao exposto pretendemos com esta Revisão Sistemática da Literatura demonstrar os resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem à pessoa com VNI no domicílio.

CONCEITOS

Segundo Esquinas (2011, p.47),

“Ventilação mecânica não invasiva (VMNI) corresponde à aplicação de suporte ventilatório através de máscara ou de outra interface sem recurso a via aérea artificial invasiva, nomeadamente tubo endotraqueal ou de traqueostomia”.

Segundo Doran (2011),

Resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem são definidos como cuidados de enfermagem direcionados para as necessidades das pessoas ou grupo, nos seus determinantes da saúde, que têm por base fatores organizacionais, de experiência, e o nível de conhecimento elevado, com impacto direto no estado funcional, auto cuidado, controle de sintomas, segurança/ocorrência adversas e satisfação do cliente. Desenvolvem-se na mesma estrutura de qualidade proposta por Donabedian (2003) e está relacionada com variáveis do cliente (idade, género, educação, tipo e adversidade da doença e co morbilidades) variáveis dos enfermeiros (nível de ensino, experiencia, rácios, organização e carga de trabalho). Este processo engloba as ações independentes (intervenções de enfermagem) e ações interdependentes (comunicação em equipa, coordenação de casos e sua gestão).

Segundo Dalpezzo (2009),

Cuidados de Enfermagem consistem na prestação de cuidados com segurança, qualidade, ética e colaboração através de um processo individualizado, o qual é planeado e concebido com base nas melhores evidências disponíveis, cujos resultados nos doentes se revelam positivos, em relação à otimização da saúde, redução dos sintomas ou na preparação de uma morte pacífica.

METODOLOGIA

Para delimitar um vasto campo de hipóteses inerentes à problemática da VNI e a responder ao objetivo delineado, elaborou-se a seguinte questão de partida, que atende aos critérios do formato PICO (Melny e Fineout-Overholt, 2005): Em relação à pessoa submetida a VNI (Population), quais as variáveis de resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem (Outcomes), com a visitação domiciliária (Intervention)?

Por conseguinte, ao se definir o objeto alvo de estudo e ao se pretender uma compreensão mais ampla deste fenómeno foi levada a cabo uma pesquisa em base de dados eletrónica, na EBSCO em geral e, em particular na CINAHL Plus with Full Text, MEDLINE with Full Text, British Nursing Index). As palavras-chave orientadoras utilizadas foram (Positive Pressure Ventilation OR Continuous Positive Airway Pressure OR noninvasive ventilation) AND (nursing intervention OR nursing OR nurse) AND (HOME care services OR HOME care services OR NURSING care facilities).

Guyatt e Rennie (2002), consideram que as revisões sistemáticas da literatura devem considerar a evidência dos últimos 5 anos, no entanto consideramos o período temporal de 10 anos pelo facto da maior abrangência face ao conhecimento existente sobre a matéria em análise. Para avaliarmos os níveis de evidência utilizamos seis níveis de evidência: Nível I: revisões sistemáticas (meta análises/ linhas de orientação para a prática clínica com base em revisões sistemáticas), Nível II: estudo experimental, Nível III: estudos quasi experimentais, Nível IV: estudos não experimentais, Nível V: estudo qualitativo/ revisões sistemáticas da literatura sem meta análise, Nível VI: opiniões de autoridades respeitadas/ painéis de consenso (Capezuti, 2008; Guyatt, e Rennie, 2002).

Como critérios de inclusão privilegiaram-se os artigos com base na problemática das pessoas submetidas a VNI, com recurso a metodologia qualitativa e/ou quantitativa ou revisão sistemática da literatura, que clarificassem quais os resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem. Nos critérios de exclusão inseriram-se todos os artigos repetidos nas bases de dados, com data anterior a 2002 e todos aqueles sem correlação com o objeto de estudo. O percurso metodológico levado a cabo encontra-se exemplificado na seguinte figura.

Fig.1

De seguida são apresentados os 10 artigos selecionados que constituíram o substrato para a elaboração da discussão e respetivas conclusões.

APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

Q.1

DISCUSÃO DOS RESULTADOS

Como resultado da análise dos artigos anteriormente referenciados é possível denotar que os doentes submetidos a VNI apresentam necessidades de cuidados que poderão condicionar a sua adesão no domicílio e que consideramos passíveis de associar a seis das variáveis identificadas por Doran (2011): controle de sintomas, segurança / ocorrências adversas, apoio psicológico, utilização dos serviços de saúde, gestão do regime terapêutico e qualidade de vida.

Na gestão do regime terapêutico, a seleção do interface utilizado na VNI é considerada por Schneider et al (2006) num estudo prospectivo e randomizado, um dos fatores mais importantes associados à adesão ao tratamento, sua tolerância e eficácia. O mesmo autor salienta que a interação entre enfermeiro e doente é um fator determinante no sucesso da VNI. Stoltzfus (2006) acrescenta que o enfermeiro, em colaboração com a equipa multidisciplinar deve avaliar o tipo de máscara que o doente poderá tolerar melhor. De Silva (2009) baseado em Shee e Green (2003) afirma que a máscara facial é geralmente a mais utilizada. No entanto os doentes reportam sentir desconforto e claustrofobia, que segundo Pertab (2009) pode levar a angústia, o que não acontece com a máscara nasal, permitindo um maior controle pessoal. Segundo Stoltzfus (2006) a máscara nasal permite falar ou vomitar sem risco de aspiração. Maciel, Silva e Teixeira (2009) citando Gonçalves e Pinto (2008) acrescenta que a máscara nasal é mais confortável permitindo expelir secreções, implicando a necessidade de colaboração do doente.

De Silva (2009) citando Hore (2002) refere que a máscara nasal é mais adequada a doentes com barba ou bigode, característica que pode aumentar a probabilidade de fuga de ar no uso da máscara facial. Contudo o seu uso é limitado em doentes com obstrução nasal (Antonelli e Conti, 2000 citado por De Silva, 2009).

A secura nasal e oral e a congestão nasal são complicações também mencionadas por Pertab (2009) e Rose e Gerdtz et al (2009), que podem ser solucionadas através de descongestionantes nasais e humidificação no ventilador. No entanto, Pertab (2009) considera que o uso da humidificação pode aumentar as fugas de ar tornando a VNI menos eficiente. Ainda a British Thoracic Society sugere que a humidificação deve ser usada com precaução porque interfere com os parâmetros do ventilador (De Silva, 2009).

Independentemente do interface usado, o ajuste da máscara deve considerar o conforto do doente, a redução de complicações, como a necrose da pele e controle de outros sintomas (De Silva, 2009 citando Hill, 2004).

De facto, a complicação mais referenciada pelos autores consultados prende-se com a possibilidade de ocorrer ulceração nasal (Pertab, 2009; De Silva, 2009;Rose e Gerdtz, 2009; Stoltzfus, 2006). Barbosa e Marques (2003) numa revisão sistemática de literatura, refere que esta é a complicação mais séria ocorrendo em aproximadamente 8 a 10% dos doentes. A maioria destes autores refere que esta complicação pode ser prevenida/tratada com apósito hidrocolóide, sendo que alguns também referem a importância da alternância dos pontos de pressão da máscara. Uma das causas referenciadas por Rose e Gerdtz (2009) para a ocorrência de ulceração nasal é a necessidade de apertar as tiras de fixação da máscara para que o ajuste seja eficiente com redução de fugas de ar. O facto de esta não ser corrigida está associado à ocorrência de conjuntivite e irritação ocular também descrita por Stoltzfus (2006).

Para Pertab (2009), numa revisão sistemática da literatura a distensão gástrica surge como uma das complicações associadas ao uso da VNI. Stoltzfus (2006) no seu estudo atribui a distensão gástrica e vómitos a elevadas pressões, podendo conduzir à broncoaspiração também referida por Barbosa e Marques (2003). Segundo Jarvis (2006), é importante informar os doentes como retirar rapidamente a máscara em caso de necessidade de vomitar. O mesmo autor refere ainda a possibilidade de recorrer ao uso de antieméticos na presença de náuseas.

Na sua revisão sistemática de literatura, Jarvis (2006) citando Sawkins (2001) alerta para outras complicações que incluem a desidratação e desnutrição. O mesmo autor refere um estudo de 1993 em que 25% dos pacientes com DPOC sofriam de desnutrição atribuída a numerosos fatores. A nutrição dos pacientes é considerada por este autor uma área fundamental dos cuidados de enfermagem que incluem intervenções como encorajar o paciente a comer às horas da refeição e remover a máscara nestes períodos, e se necessário, utilizar oxigénio por sonda nasal.

Sundling et al (2009) num estudo qualitativo alerta para a necessidade de o doente e cuidador terem conhecimentos técnicos sobre o manuseamento do ventilador, uma vez que situações não previstas podem levar a momentos de stresse. Maciel, Silva e Teixeira (2009) e Barbosa e Marques (2003) referem a importância de promover a correta manutenção e higiene do equipamento.

De acordo com Eng (2006) o envolvimento do doente nas decisões sobre o tratamento é considerado um fator importante na adesão ao mesmo. A informação e apoio psicológico ao doente e cuidador são considerados primordiais para reduzir a ansiedade e conseguir a autonomia do doente (Pertab, 2009), melhorando a sua qualidade de vida.

O sucesso da VNI depende de uma equipa treinada e experiente (Maciel, Silva e Teixeira, 2009), contribuindo para a redução do número de internamentos hospitalares (Eng, 2006), diminuição de mortalidade e morbilidade (Rose e Gerdtz, 2009) e diminuição de gastos hospitalares (Stoltzfus, 2006; Barbosa e Marques, 2003). Pertab (2009) considera essencial a relação e comunicação entre enfermeiro e doente e Barbosa e Marques (2003) acrescenta que o enfermeiro desempenha um papel importante na prevenção e resolução de complicações.

Tendo por base as variáveis definidas por Doran (2011) e considerando as necessidades de cuidados identificadas anteriormente, podemos inferir os resultados identificados no seguinte quadro:

Fig.2

CONCLUSÃO

Tendo por base o nosso objeto de estudo, realizámos uma análise dos artigos selecionados que nos remetem para os indicadores de necessidades, sendo resolvidos através de intervenções que se traduzem em resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem.

Os artigos selecionados dão relevo à intervenção de enfermagem, associando o sucesso da VNI ao treino, experiencia e formação destes profissionais de saúde, pelo que a estes se exige uma prática profissional baseada na evidência e em linhas de orientação que elevem os cuidados prestados ao doente a um nível de excelência.

Como vimos anteriormente, o enfermeiro desempenha um papel importante na prevenção e resolução de complicações associadas à VNI, ação que no domicílio só é possível através de ensinos adequados e envolvimento do doente na gestão do seu tratamento. Tendo em conta que os doentes do foro respiratório são muito ansiosos e receiam sempre o pior, é importante que o enfermeiro estabeleça uma relação de empatia e demonstre competência no que diz respeito ao tratamento com VNI. Conseguindo a cooperação e motivação do doente, mais facilmente o sucesso da VNI será atingido.

Face ao exposto, um doente submetido a VNI devidamente apoiado pelos enfermeiros, resolve melhor as complicações inerentes ao tratamento refletindo-se na redução de internamentos hospitalares assim como uma maior estabilização clínica e melhor qualidade de vida no domicílio.

Implicações na Prática Profissional

Tendo em conta o crescente número de doentes com doenças respiratórias crónicas, o recurso à VNI fazendo parte do seu tratamento também tenderá a aumentar.

Consideramos ser importante a realização de novos estudos que evidenciem a necessidade de apoio destes doentes no domicílio, por enfermeiros e ainda a formação específica destes profissionais nesta área.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DOENTE ESQUIZOFRÉNICO NO SEIO FAMILIAR

Jan 14, 2013

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SCHIZOPHRENIC PATIENT WITHIN FAMILY

 

EL ENFERMO ESQUIZOFRÉNICO EN FAMILIA

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RESUMO

A doença mental e, em particular, a esquizofrenia afecta profundamente a família, e aceitar
que um familiar sofre desta doença leva o seu tempo. Na nossa sociedade ainda existe um grande estigma em volta das pessoas que sofrem de doenças mentais, não havendo um grande conhecimento sobre elas, daí que quando esta surge na família, estes não sabem como agir com o seu familiar, a quem recorrerem, não compreendendo os comportamentos cada vez mais anormais, ficando por isso sujeitas a grandes pressões

Palavras chave: Família, esquizofrenia, doente

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ABSTRACT

Mental ilness and, particularly, schizophrenia, profoundly affects the family, and takes his time having to accept the fact that one of your own suffering from this disease. In our society, there´s still a huge stigma surrounding people who suffer from mental illness, without a great knowledge about it, so when it appears in your own family, they do not know how to act, who use aid, not inclunding the increasingly abnormal behaviour, leaving therefore subject to great pressure.

Keywords: Family, schizophrenia, patient

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INTRODUÇÃO

A família é um sistema muito complexo, uma vez que não existem duas famílias iguais, é a principal unidade básica de desenvolvimento pessoal a que pertence um indivíduo e, igualmente o local onde se vivência um conjunto de experiências fundamentais para a formação da sua personalidade. Desde sempre tem havido a consciência de que a família é uma estrutura social importante, que tem um impacto crucial no desenvolvimento e na saúde do indivíduo.

Se a doença que surge num dos membros da família for do foro da  saúde mental, é vivida pelos familiares de forma mais dramática, originando uma situação  de crise que modifica a estrutura habitual da família e o movimento natural do ciclo de vida  familiar.

O doente esquizofrénico não deve ser considerado como um indivíduo isolado, afectado de perturbações intrapsíquicas de base hereditária, constitucional, somática ou bioquímica, mas inserido num contexto social no sentido mais lato, desde a classe social,  meio cultural ao ambiente familiar, que influencia o indivíduo de maneira fundamental, condicionando o conjunto de valores educativos, as atitudes, a posição social nas quais o  doente esquizofrénico se forma e desenvolve.

A ADAPTAÇÃO DA FAMÍLIA PERANTE O SURGIR DE UM DOENTE ESQUIZOFRÉNICO NO SEU SEIO

O conceito de família tem vindo a mudar ao longo dos tempos, acompanhando as mudanças económicas, culturais e religiosas no contexto onde se encontra inserida. Todas as famílias passam por várias crises durante o seu desenvolvimento, provocando uma série de mudanças nas suas funções, originando a aquisição de um maior ou menor grau de capacidade de reestruturação do seu modo de vida, estabelecendo-se um padrão próprio para lidar com a crise. Quando surge uma nova etapa ou um novo elemento, se esta família não tiver capacidade de se organizar surge então o conflito.

A doença mental e, em particular, a esquizofrenia afecta profundamente a família, e aceitar que um familiar sofre desta doença leva o seu tempo. Na nossa sociedade ainda existe um grande estigma em volta das pessoas que sofrem de doenças mentais, não havendo um grande conhecimento sobre elas, daí que quando esta surge na família, estes não sabem como agir com o seu familiar, a quem recorrerem, não compreendendo os comportamentos cada vez mais anormais, ficando por isso sujeitas a grandes pressões ( WIKIPÉDIA 2005 ).

A família é um sistema aberto, integrado por partes em interacção, que se modificam se algum dos seus elementos se alterar. Todos mudam para manter o equilíbrio dinâmico, mesmo que, aparentemente, só um tenha sofrido alterações. De certa forma, a patologia individual converte-se em patologia familiar, porque todos sentem a influência negativa do sofrimento. A família como tal não é a mesma antes, durante e depois da doença.

A doença, como crise, supõe uma ruptura do equilíbrio anterior da família, que a desestabiliza perturbando os respectivos membros. Esta situação constitui uma das dificuldades que o doente esquizofrénico sente.

Geralmente, a alteração do comportamento do doente esquizofrénico, é notada por um ou mais membros da família.

Para a família “tudo é muito complicado”, quando há um doente mental em casa.  Todas estas se sentem sós para fazerem face aos problemas. Com efeito, a doença quando surge num dos elementos deste complexo relacional é um dado novo. Geralmente é uma situação que nunca é esperada, não havendo preparação para enfrenta-la. Como tal, cria desadaptações mais ou menos graves nos familiares ditos “sãos”, atingindo a pessoa doente. É pois uma situação problemática e difícil, tanto mais quando se trata de uma doença mental, uma vez que sai do domínio da “normalidade”. A falta de informação dos problemas relativos à doença mental deixa-as desarmadas quando surgem os primeiros sintomas da doença, onde uma maior e melhor informação permitir-lhes-ia compreender o que se  passa e atenuaria a angústia que emerge perante o desconhecido.

As dificuldades materiais que surgem da doença mental contribuem também para modificar a estrutura da família e para criar novas relações entre os seus membros. Alguns deles, o pai ou a  mãe, vê-se obrigado a parar ou a retomar o seu trabalho em função das necessidades do doente.

Esta situação pode provocar-lhes uma reacção de frustração, mesmo um certo ressentimento contra o doente, uma sensação de injustiça perante a sociedade, que não assume a parte das suas responsabilidades. Com efeito, os tratamentos ocasionam despesas que nem sempre correspondem aos critérios de reembolso da Segurança Social.

Devido à doença e às suas consequências, a família percebe-se e é percebida de modo diferente pelo ambiente social. Com frequência, a relação com os outros perturba-se, mesmo que eles se mostrem compreensivos.

Perante estas dificuldades, as atitudes das famílias face à doença são diferentes. MORENO(1992) salienta que, as famílias reagem segundo o contexto que lhes é próprio, oscilando  entre duas atitudes extremas. No primeiro caso, sentem-se responsáveis pela doença:  censuram-se por erros educativos; consideram-na um fenómeno hereditário ou sentem-se  vítimas do destino. No segundo caso: responsabilizam o doente ou atribuem a acontecimentos exteriores traumatizantes, como o serviço militar, desgosto sentimental, intervenção cirúrgica, entre outros.

O desgaste, tensões e conflitos causados pelo convívio com uma pessoa mentalmente perturbada frequentemente constituem os problemas mais graves para as famílias. Os próprios sentimentos dos parentes em relação ao doente e à sua doença contribuem para odesgaste experimentado pelas famílias e tais sentimentos incluem entre outros, a culpa, a ansiedade e a raiva. O sentimento de culpa, isto é, a ideia de que se é responsável pela doença  mental de um familiar próximo, é comum e muito angustiante. A culpabilidade é um dos principais factores que, por vezes, impede as pessoas de pedir e de receber ajuda (WIKIPÉDIA 2005).

O clima emocional da família com um doente esquizofrénico caracteriza-se também por muita  ansiedade quanto à maneira correcta de lidar com o doente e pelos problemas aumentados da vida familiar. Entretanto, segundo (CORDO 1992), o sofrimento é tanto menos aceite pela família quanto mais jovem for o doente. Normalmente, à juventude está associado um bom equilíbrio físico e mental.

Para que a família possa caminhar ao lado do doente, e não no sentido contrário, é imprescindível que os vários elementos da  família respeitem as necessidades de cada um, devem decidir que um tipo de comportamento é inaceitável e devem ser capazes de impor esses limites. Quando é um dos elementos do casal, é importante manter um equilíbrio de poder entre eles, ajustar os papeis dos membros da família para que o doente possa encontrar uma área de competência que contribua para o bem estar da família, assegurar que o outro membro do casal possa ter um tempo para si.

Na opinião de Elenor Smith (citado por SANTÉ ET BIEN-ÊTRE SOCIAL, 1991), é raro a família reconhecer o seu próprio stress. A pessoa doente torna-se uma prioridade e com o tempo a família acaba por se “esgotar”, o que pode originar a depressão, a ansiedade, o esgotamento e doenças psicossomáticas.

O papel activo da família é essencial para o tratamento, reabilitação e reinserção social do seu familiar que sofre de esquizofrenia. Muitas famílias procuram o apoio junto dos técnicos de saúde, permitindo assim que esta superem e sobrevivam às dificuldades que encontram, no entanto, há aquelas que não o fazem levando ao seu adoecimento, ou seja, não conseguem lidar com as crises, conduzindo à sua desestruturação ou destruição.

A família deve estar preparada para o facto de o doente puder ter recaídas ao longo do tempo, o que pode conduzir a um possível internamento hospitalar. É bastante importante o apoio da família ao doente durante o tempo da sua permanência no hospital, através de reforço positivo, comunicação, visitas, mostrar interesse em saber como vai a evolução da sua doença.

É natural que muitas dúvidas surjam na família em relação ao comportamento que vão ter de adoptar perante esta nova etapa da vida do seu familiar. Primeiro que tudo é importante que o familiar comece por se colocar no lugar da outra pessoa.

Os problemas que geralmente ocorrem na família do esquizofrénico são os seguintes (WIKIPÉDIA 2005):

Medo… “Ele poderá fazer mal a si ou às outras pessoas?”

Negação da gravidade… “Isto daqui a pouco passa”

Incapacidade de falar ou pensar noutra coisa que não seja a doença… “Toda a nossa vida gira em torno do nosso filho doente”

Isolamento social… “As pessoas até nos procuram, mas não temos como fazer os programas que nos propõem”

Constante busca de explicações… “Ele está assim por algo que fizemos?”

Depressão… “Não consigo falar da doença do meu filho sem chorar”

RELATO DE UMA FAMÍLIA TIPO

Para ilustrar melhor o sofrimento de uma família tipo, vou transcrever pequenos estratos de uma carta de 11 páginas dirigida ao serviço de admissão de doentes da Casa de Saúde do Telhal , pela mãe de um jovem com esquizofrenia, que ilustra bem todo este problema:

“História de amor…Uma caminhada tão preenchida de muito amor, mas, também de muito sofrimento, por vezes dias tão dolorosos, que, só o companheirismo e o amor nos tem deixado sobreviver….Depois de uma espera e busca para ter filhos, fomos confrontados que não podíamos ser pais biológicos,….

Em 82, estávamos de férias numa vila do interior…adoptámos um bebé…saímos com o nosso T. ao 4º dia de vida do hospital, com um simples papel que foi lavrado em acta por alguns responsáveis do hospital e da misericórdia local….

O T. foi crescendo ao longo dos anos, surgindo alguns problemas, mas era uma criança feliz.

Ao morrer a avó do T. que viveu connosco os últimos anos, ele faz um luto muito complicado, não aceita a perca da avó fica muito agressivo, e começa a fazer um acompanhamento na Clínica da Juventude, a nossa vida começa a fechar-se, os amigos afastam-se, não por falta de amizade, mas, porque o convívio vai ficando impossível, deixámos de poder ter férias,….

…trabalho nove horas por dia para que não me chamem a atenção do tempo que perco com o T, mas mesmo assim é muito difícil, ninguém (ou muito poucas pessoas) está preparado para entender uma doença crónica, em especial do foro psiquiátrico.

Depois de nova mudança de escola a saúde mental do T. agrava-se e entra num período muito complicado, fica muito agressivo, com oitenta quilos, uma força desmedida e descoordenada, revolta-se, assim o vemos ficar sem afectos, agredindo-nos todos os dias, temos cada vez mais dificuldade em o levar para a carrinha, em o segurar na rua, sem capacidade para fazer compras, aí a nossa vida volta a fechar-se mais ainda, sem ajudas, até a família só passa a falar ao telefone e às vezes para se pouparem à realidade até isso vão deixando de fazer…nós pessoas de paz, vivemos momentos de terror…. Vamos para o trabalho nesses dias desfeitos, envolvidos em pancada todas as manhãs, correndo riscos muito sérios de vida,…, vivemos fins-de-semana em que comíamos com as mãos, para não por talheres na mesa, pois isso eram armas fáceis para o T. …ele tinha um pensamento constante, matar e matar o pai, a porta da cozinha estava sempre fechada à chave, só assim se pernoitava, manter de dia a trabalhar com estes inícios de manhã, e a incerteza no coração do regresso a casa, achei que íamos mesmo morrer aqui os três….

Temos uma vida sem convívio, fazemos tudo um de cada vez, quando um sai nem que seja para beber um café o outro fica em casa com o T.….

Na nossa vida passamos por situações que não agradam ao T., fico triste por o ver tão longe de se encontrar. Também está com uma diabetes insulina-dependente.

Estamos muito cansados, e só queríamos ver o T. feliz, protegendo-o sempre, e ter um tempinho que fosse para viver um pouco o casamento, tomar um café juntos, ler um livro, visitar um museu, ou ir mesmo uma vez ao cinema, não ser só estarmos juntos em situação de remediar todas estas situações sem solução.

Se nada puder fazer por nós, pelo menos leu o nosso testemunho, se me expressei mal ou fui muito descritiva é porque me é difícil falar da nossa vida de amor, mas tão dolorosa e difícil.

O T. é a razão da nossa vida, mas queríamos muito uma restinha de tempo para ver o T. bem, e nós a caminhar juntos bem e orgulhosos pela nossa vida e História de Amor, e de tanta partilha….”

INTERVENÇÃO NAS FAMÍLIAS PERANTE O SURGIR DE UM DOENTE  ESQUIZOFRÉNICO NO SEU SEIO

Os doentes e seus familiares procuram nos Profissionais de Saúde diferentes tipos de ajuda, permitindo assim que superem e sobrevivam às dificuldades que encontram, onde o enfermeiro desempenha um papel de agente facilitador, estimulador e motivador da aprendizagem (Pearson, e outros, 1992).

Depois dos primeiros momentos de desarranjo familiar é importante a ida a uma consulta médica urgente, que permita um diagnóstico claro e precoce da pessoa doente, evitando internamentos e que assegura um melhor prognóstico. Deixar passar o tempo só ajuda a aumentar o sofrimento do doente e família e o risco de cronicidade, desta forma os cuidados de enfermagem têm como primeiro objectivo a promoção da saúde, tendo em conta a manutenção e o desenvolvimento da saúde das famílias e dos seus membros, através de processos de aprendizagem.

O enfermeiro deve ensinar à família o que pode tentar fazer inicialmente para convencer o doente da necessidade de comparecer a uma consulta médica:

Não tratar o doente de forma diferente daquela que sempre se tenha feito;

Criar um ambiente próximo e de afecto para falar do que se está a passar;

Partilhar desde o princípio com o doente a preocupação que cada um dos membros da família tem para que venha a encontrar-se bem;

Falar claramente de cada uma das alternativas que à família ocorrem, já que o doente é o principal interessado;

Também pode ser útil que a aproximação seja feita pelo familiar mais próximo dele, que lhe mereça maior confiança;

Não permitir ao doente “abusar” dos membros da família, a pretexto da sua doença; os familiares devem ser “compreensivos” mas “não permissivos”;

Deve socorrer-se dos argumentos que seriam utilizados numa doença física.

Se o doente resiste em ir à consulta, os familiares devem aproveitar igualmente o espaço terapêutico a que têm direito, utilizando-o para desabafar e aprendizagem familiar. É de primordial importância que o enfermeiro ajude o doente e a sua família a identificar a ou as circunstâncias imediatamente anteriores ao momento em que surgem as crises, para assim as se poderem evitar. O ponto fulcral dos cuidados de enfermagem está baseado na interacção da família, saúde, aprendizagem e colaboração.

Na perspectiva de Moyra Allen o processo de enfermagem baseia-se na aprendizagem por parte da família/indivíduo, de condutas para a promoção da sua saúde, necessitando para isso, do desenvolvimento de uma colaboração essencial entre o enfermeiro/pessoa/família a cuidar, nunca esquecendo o contexto social no qual a aprendizagem se efectua (Pearson, e outros, 1992). Assim o enfermeiro deve dar esperança à família, reforçando em relação ao prognóstico, que muitas pessoas que desenvolvem esquizofrenia podem melhorar e serem capazes de fazer uma vida relativamente normal fora do hospital. Deve também orientar os familiares a enfrentarem a recusa da toma da medicação, em momentos de equilíbrio e não na situação de desespero própria da crise. Deve ensinar à família a proporcionar uma atmosfera calma em vez de argumentativa, com atitudes previsíveis em vez de inconsistentes, com apoio e tolerância para com o doente, em vez de rejeição.

CONCLUSÃO

Como conclusão posso extrair as seguintes ideias chaves:

O “mito” da esquizofrenia, o desapontamento perante a sua imprevisibilidade, o carácter inesperado de que se reveste, o desconhecimento do que deve ou não deve ser feito, são factores que desestabilizam a dinâmica familiar;

O impacto que uma pessoa com esquizofrenia tem na família e a forma como esta se adapta face à situação depende da singularidade de cada um dos seus membros, mas também da forma como a doença surge (insidiosa ou abrupta), o seu curso, as suas consequências, no sentido de haver risco de vida ameaçada ou não (fase de crise à fase crónica), e ao grau de incapacidade gerado. Todos estes factores têm de ser vistos numa perspectiva psicossocial e não isoladamente. O que precisamos de ter em atenção é que o próprio esforço de adaptação por parte da família pode ter como consequência um estado de exaustão por parte desta.

Ver com outros olhos a pessoa doente, confiar nas suas possibilidades, abrirá novas perspectivas à sua saúde e dos seus familiares. Sendo necessário ser claros, não mentir nem emitir mensagens contraditórias, ajudando assim a que o doente vá encontrando o equilíbrio que necessita e a evitar que experimente maior confusão;

Cada pessoa afectada por uma enfermidade mental requer uma atenção individualizada em função da sua especificidade. Quanto mais cedo se iniciar a reabilitação, maiores serão as possibilidades de manter as capacidades de relação consigo própria e com o seu círculo envolvente, será também menor a deterioração.

A partir destas conclusões deste podemos extrair as seguintes recomendações/sugestões:

Seria benéfico para as famílias ter valências de saúde mental distribuídas pela comunidade, de forma a poderem satisfazer as necessidades da população;

São necessários cada vez mais técnicos especializados na área de saúde mental, de forma a poderem ajudar a população.

Todos os membros da família podem ser protagonistas de pequenas mudanças saudáveis na inter-relação, as quais também se repercutem no processo de recuperação do familiar doente;

Nenhuma verdadeira melhoria ocorre da noite para o dia; é importante estar atento a cada pequena mudança que se produz nesse sentido e poder valorizá-la.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BASTEIRO, Sílvia; GIL, Carmen Maria; MARÍN, Remédios (2003). Guia para familiares  e doentes mentais. Lisboa, Federação Nacional das Associações de Famílias Pró-Saúde  Mental.

CARTA dirigida ao serviço de admissão de doentes da Casa de Saúde do Telhal a solicitar internamento (2004).

CORDO, Margarida (Abril – Junho, 1992). Desfamiliarização/refamiliarização dos doentes psíquicos em situação de longo internamento. Hospitalidade, revista de saúde mental,  relações humanas e problemas de marginalização nº 219, 49 – 56.

CORDO, Margarida e Outros (1995). Intervenção nas famílias com doentes psiquiátricos –  1994 Ano Internacional da Família. Telhal, Editorial Hospitalidade.

JENNER, F. A.; CARDOSO, J. A. Zagalo; MONTEIRO, António C. D.; OLIVEIRA, J. A. Cunha. (1992). “Esquizofrenia” – Uma doença ou alguns modos de ser humano? Lisboa, Editorial Caminho, SA.

MARCOLINO, Alberto, M. Carvalhosa (1987, Julho-Dezembro). Conferência Internacional para a promoção da saúde – Carta de Otawa, Revista Portuguesa de Saúde Pública (5), 3- 4.

MORENO, Mariano Galve (Outubro – Dezembro, 1992). As famílias e os círculos malditos  da doença mental. Hospitalidade,  revista de saúde mental, relações humanas e problemas de marginalização nº 221, 8 – 25.

PASCOAES, Teixeira de (1984). São Paulo, Lisboa – Assírio & Alvim.

PEARSON, A. ; VAUGHAN, B. (1992). Modelos para o exercício de enfermagem. Lisboa, ACEPS, 178 p.

SANTÉ, et Bien-Être Social (1991). La Schizophrénie – Guide l´intention des families. Publié en collaboration avec la Societé Canadienne de Schizophrénie, Canadá.

WIKIPÉDIA, Web page internet. Esquizofrenia. http://www.hostgold.com.br/hospedagem-sites/Esquizofrenia. 10-10-2005.

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Nov 21, 2012

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Cross-Cultural and Psychological Concept of Cancer as a Disease

Concepto de Cross-Cultural y Psicológico del Cáncer como Enfermedad

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AUTORES: Antónia Maria Nicolau Espadinha, Vítor António Soares Santos

Resumo

É inegável o impacto e a influência que o cancro exerce na sociedade, que continua a rodear esta doença de mitos e crenças ligadas a representações sociais acerca de uma doença que assume um carácter fatalista, pela sua complexidade, dificil cura e sofrimento associado. Sem sombra de dúvida, são aspectos intemporais e com um impacto significativo na comunicação entre o profissional de saúde e a pessoa com doença oncológica.

Palavras-chave: Cancro; Mitos; Crenças; Comunicação

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Abstract

There is no denying the impact and influence that cancer has on society, which continues to surround this disease with myths and beliefs linked to social representations about a disease which is both fatalistic, because of their complexity, difficulty to achieve a cure and suffering associated. Undoubtedly, aspects these are timeless and have a significant impact on communication between health professionals and the person with cancer.

Keywords: Cancer; Myths; Beliefs; Communication

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Resumen

No se puede negar el impacto y la influencia que el cáncer tiene en la sociedad, que sigue rodean esta enfermedad mitos y creencias relacionados con las representaciones sociales acerca de una enfermedad que es tanto fatalista, debido a su complejidad, difícil curación y el sufrimiento asociado. Sin lugar a dudas, los aspectos son intemporales y tienen un impacto significativo en la comunicación entre los profesionales de la salud y la persona con cáncer.

Palabras clave: Cancer; Mitos; Creencias; Comunicación

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INTRODUÇÃO

Para cuidar de doentes oncológicos os profissionais de Saúde, tem de enfrentar o facto de haver uma doença chamada Cancro, que em alguns casos é curável, muitos doentes podem viver muitos anos com a doença controlada e inevitavelmente outros podem morrer devido a esta.

Como refere SPEESE-OWENS, (1981)  se os profissionais de saúde não conseguirem enfrentar os factos desta forma, eles serão de muito pouca utilidade para o doente e família.

Da nossa experiência profissional é frequente verificar como é difícil a comunicação com doentes oncológicos. No serviço de internamento verifica-se, por exemplo como alguns profissionais têm dificuldade em comunicar com o doente ( ou família ) e como essa dificuldade tem tendência a aumentar, com o decurso natural da doença, levando a que em fases complexas ou terminais desta, a comunicação com o doente se limite mais à execução de tarefas, diminuindo de modo facilmente perceptível a expressão verbal e o “ estar junto”, do doente.

Segundo DENTON (1988:4) as nossas atitudes, crenças, pensamentos ou sentimentos acerca do cancro, determinam a forma como nos comportamos, perante ele, seja como  doentes, familiares, amigos, membros do público em geral ou como profissionais da Saúde.

Temos constatado na nossa experiência profissional, que por vezes os profissionais de Saúde, nomeadamente os enfermeiros, encaram o cancro envolto nos mitos e crenças dominantes no público em geral: doença incurável, sofrimento prolongado, são conceitos frequentemente expressos nos media e por vezes verbalizados por enfermeiros, com quem temos trabalhado.

Para BROOKS,A (1990) a influência das atitudes no comportamento é tão importante que alguns autores afirmam que se o profissional de saúde não consegue estar junto dos seus doentes, dum modo genuinamente caloroso e convicto, então o melhor é mudar de profissão já que não é possível fingir atitudes.

Para muitos Psicólogos a atitude que temos em relação a um objecto influenciará o nosso comportamento em relação a ele e em geral atitudes positivas levam a comportamentos positivos e vice-versa.

Foi com base nestas  referências e nas reflexões que temos feito ao longo da vida profissional, e em situações concretas que vivenciei , que escolhemos este tema, no sentido de conhecer melhor o contexto psicológico do cancro e os mitos e crenças, que o envolvem, para poder melhorar as atitudes no nosso percurso profissional e poder de alguma forma contribuir para desmistificar esta doença.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE CANCRO

O cancro é uma doença conhecida desde a antiguidade.

Segundo DENOIX (1988) encontram-se referências desta doença em papiros egípcios do séc. XVII A.C. ;  em restos de esqueletos datados de há mais de cinco mil anos, também foi descoberta a existência de tumores. No entanto já antes na pré-história, foi observada, no esqueleto de um dinossauro uma alteração que os cientistas atribuem a um tumor maligno.

Denoix  (1977:13) refere que ao longo da história da humanidade foram encontradas múltiplas referências como por exemplo:

  • a seguir à exploração dos túmulos, encerrados nas pirâmides do Egipto
  • no decurso da decifração das tábuas cobertas de caracteres cuneiformes da Biblioteca de Nenive
  • por ocasião da descoberta dos monumentos funerários dos Etruscos
  • depois do estudo das múmias Peruanas

Segundo SONTAG,S (1991:11) o texto mais antigo em que se encontra referência ao cancro, parece ser o papiro cirúrgico Edwin Smith, que dataria de cerca de 2800 anos A.C. e tem sido atribuído a Imuthes, sumo Sacerdote de Heliopólis, o primeiro – ministro do rei Dsojer do antigo Império Egípcio.

DENTON (1988) diz-nos que a denominação de cancro, vem do grego Karkinos e do latim Cancer, cujo significado é caranguejo. Embora se associe com frequência a sua designação à sua forma de propagação, pela semelhança com a destruição que as patas desse crustáceo provocam naquilo que o rodeia quando se movimenta; o médico romano Galero (160 D.C.) atribui-a à semelhança que as veias engurgitadas observadas nas superfícies dos tumores, tinham com as pernas dos caranguejos.

DENOIX (1988) refere que a doença é considerada incurável, de causa desconhecida e misteriosa, desde a Antiguidade e que várias têm sido as concepções científicas e as abordagens terapêuticas que têm a acompanhado.

A medicina Grega, acreditava existirem no corpo, quatro fluidos principais ou humores que determinavam as qualidades físicas e mentais da pessoa: o sangue (vigoroso), a fleuma (fleumático), a bílis branca (colérico) e a bílis negra (melancólico). O cancro era provocado pela bílis negra. As teorias sobre os tumores prevaleceram, em muitos aspectos, até à idade Média. De notar que Hipócrates, o expoente máximo da Medicina grega, reconhecia mesmo que não podia tratar a doença. Galeno médico Romano que viveu no sec. II depois de Cristo, continuou a utilizar a teoria dos fluidos. Ainda segundo o mesmo autor, Galeno desenvolveu uma classificação na qual existiam tumores de acordo com a natureza, tumores excedendo a natureza e tumores contra  natureza. Os tumores malignos, o cancro, estavam nesta última categoria.

DENTON (1988) refere que Zacatus Lusitanus (1575-1642) e Daniel Sennert (1572-1637), clínicos influentes da sua época, afirmaram que o cancro era contagioso, conceito que por vezes ainda se faz sentir nos nossos dias.

A constante investigação sobre a doença foi aumentando os conhecimentos com ela relacionados. Segundo o mesmo autor Le Dran, no sec. XVIII, defendia a teoria  de que o cancro é no início uma doença localizada, com tendência a propagar-se para os gânglios linfáticos regionais.

Refere ainda que Percival Pott em 1775, faz em Londres as primeiras referências às causas do cancro do escroto, muito frequente nos limpa chaminés da cidade. Associa-o às deficientes condições de higiene, defende que a cirurgia pode curar a doença e estabelece os princípios que transformados em legislação, virão permitir a erradicação da doença em duas gerações.

DENOIX (1988) refere que o reconhecimento das especificidade do cancro enquanto doença, leva à criação relativamente precoce de hospitais e de serviços para cancerosos.

Segundo MIASKOWSKI (1990) em 1740, foi aberto em Reins, França, por Canon Gaderot o primeiro hospital oncológico, considerado um hospital de doenças infecto-contagiosas. DENTON (1988) refere que em 1775 Percival Pott, na sequência dos seus estudos, inaugura o primeiro serviço de cancro, num hospital central de Londres – O Middlessex. Em 1851 William Mars estabelece o primeiro hospital oncológico em Inglaterra – O Royal cancer Hospital. Ainda para o mesmo autor a cirurgia, como terapêutica do cancro veio a colher benefícios, que permitiram o seu desenvolvimento, contribuíram para a descoberta da anestesia e para o avanço da técnica asséptica a partir dos trabalhos de Pasteur sobre a sépsis. Este conjunto de avanços, com os desenvolvimentos ulteriores que desencadearam, permitiram uma maior agressividade na técnica cirúrgica e o desenvolvimento do conceito de cirurgia oncológica.

MIASKOWSKI (1990) refere que em, 1900 com a descoberta das radiações ionizantes por Marie Curie, surgiram novas hipóteses terapêuticas para a doença, geradoras de esperança na possibilidade do seu controle. Para o mesmo autor, a partir da segunda Grande Guerra Mundial, com a descoberta da quimioterapia, do seu desenvolvimento e de técnicas de apoio e um maior conhecimento da biologia celular, grandes foram os avanços no processo terapêutico.

VOLGELSTEIN et al (1988) refere o desenvolvimento das técnicas de biologia molecular, na década de 80, veio permitir o encontro de novos caminhos no estado da doença ao tornar possível, o estudo de alterações a nível do código genético das células. A sua acumulação é responsável pela transformação neoplásica da célula.

Desde a teoria dos humores de Hipócrates ao conceito actual de que o cancro resulta do acumular de alterações ao nível da célula, mediaram muitos séculos ao fim dos quais, apesar dos avanços científicos, o conhecimento da doença se mantém incompleto e fragmentado. Apesar disto tem sido possível melhorar as taxas de cura (pelo menos em muitas formas de doença) e de sobrevivência e aumentar significamente a esperança de vida dos doentes.

Este facto resulta de uma combinação de factores: por um lado o desenvolvimento de técnicas de terapêutica mais eficazes, isoladamente, ou em combinação das diferentes modalidades, por outro o diagnóstico precoce de algumas doenças, que têm vindo a ser possível, não só pela disponibilidades de meios específicos, mas também por um maior esclarecimento e motivação do público, profissionais de saúde e entidades públicas que se têm empenhado neste aspecto, o que tem tido uma relevante importância para estes resultados.

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS    

Julgamos pertinente abordar embora de uma forma pouco profunda este aspecto, uma vez que ele está intimamente ligado aos mitos e crenças que integramos.

Abordar esta questão obriga no mínimo a procurar resposta para duas perguntas: o que são e como se constróem e modificam as representações DOISE (1986) refere que a noção de representação social foi introduzida no final do século passado por Durkheim (1898). No entanto só recentemente após a publicação do livro de Moscovi – La  Psycahanalyse, son image et son public, (1961), ela foi retomada e utilizada por diversos autores. Citando uma pesquisa efectuada por Jodelet (s.d.) o autor refere que esta mostra que não são sómente os psicólogos sociais que a utilizam. Também os antropólogos, historiadores, filósofos e sociólogos a estudam e discutem os seus domínios específicos.

VALA (1984) cita MOSCOVICI(1969) que afirma que uma representação social compreende um sistema de valores, de moções e de prática, relativa, a objectos sociais permitindo a estabilização do quadro de vida dos indivíduos e dos grupos, constituindo um instrumento de orientação da percepção e da elaboração das respostas e contribuindo para a comunicação dos grupos e da comunidade; e definia como um conjunto de conceitos, proposições e explicações, criadas na vida quotidiana, no decurso da comunicação interdividal. Elas são o equivalente na nossa sociedade os mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais.

Segundo o mesmo autor as representações sociais são teorias implícitas acerca de objectos socialmente relevantes e como tal constituem uma modalidade de conhecimento que serve a apreensão e explicação das ciências colectivas sui generis, pelas quais se procede à interpretação e mesmo à construção das realidades sociais.

VALA (1984) afirma que se se partir do conceito de que se as representações sociais, são um reflexo do mundo exterior, como um reflexo interno de uma realidade externa, as representações serão uma reprodução mental do mundo e do dos outros, sendo o produto de processos psicológicos. Se a partir da perspectiva de que não há corte entre o universo exterior e o interior do indivíduo, de que o sujeito e objecto não são essencialmente distintos, a representação não será entendida como reprodução mas como uma construção.

O mesmo autor refere que a representação é uma criação do indivíduo e não a reprodução rigorosa das qualidades do objecto representado. É a maneira pela qual a pessoa constrói um objecto psicológico e culturalmente significativo.

VALA (1984) afirma que a integração do objecto representado no sistema de pensamento anteriormente existente e as transformações que daí decorem, quer no objecto quer no sistema em que é integrado, ou seja o processo de duplicar a imagem por um sentido é a ancoragem. Assim por exemplo num objecto novo pode ser incorporado num quadro de referencias bem conhecido para o poder interpretar.

VALA (1993) afirma, baseando-se em estudos experimentais, realizados por COBOL (1972) e ABRIC (1987), existirem representações, que os próprios indivíduos controlam e na base dos quais selecionam as respostas que julgam mais adequadas. Acrescenta ainda que, de uma forma controlada ou automática, consciente ou inconsciente, um grande número dos nossos comportamentos, corresponde as nossas representações. Atribui-lhes a designação de comportamentos representacionais, pois são denominados no mínimo pela situação concreta na qual ocorrem e no máximo por factores pré situacionais, que relevam ao nível das atitudes e das representações. Distingue-os dos comportamentos situacionais, nos quais o papel das mediações cognito-avaliativas, nos quais o papel das mediações cognito-avaliativas  é mínimo, sendo máximo o dos factores situacionais.

São os comportamentos, representacionais que estão na base do conceito da funcionalidade das representações. A análise da acção põe em evidência o facto das representações permitirem dar um sentido próprio ao comportamento, facultar a sua leitura à luz de uma representação, escondendo muitas vezes a possibilidade da leitura da acção situacional para o tornar um reflexo ou manifestação de uma representação.

Como vimos, as representações, dizem, regra geral, respeito a objectos socialmente relevantes, conceitos onde não haverá dúvidas em incluir o cancro, os seus mitos, crenças e sentimentos.

MITOS, CRENÇAS E SENTIMENTOS 

Segundo SONTAG (1991) o cancro, considerado como doença intratável, por não ser compreendida e progressivamente mais frequente, foi sendo rodeado de mitos e concepções que se têm mantido muito semelhantes, sendo mesmo imutáveis, ao longo dos anos.

DENTON (1988) refere que o Oxford English Dictionary apresenta como primeira definição de cancro qualquer coisa que incomoda , corrói, corrompe ou consome lenta e secretamente e define-o actualmente como tumor maligno que  tende a disseminar-se  indefinidamente e a reproduzir-se; prolifera rapidamente à custa dos tecidos circundantes a menos que tratado precocemente, quase sempre termina em morte.

TORRINHA (1971), no Dicionário de Língua Portuguesa, define-o como tumor que destrói os tecidos e mal que vai arruinando pouco a pouco.

O Grande Dicionário de Língua Portuguesa Machado (1991) atribui-lhe o significado de tumor que corrói as partes em que se envolve. Estes significados atribuídos a palavra cancro traduzem as concepções e os mitos que são sem dúvida, o conceito da doença prevalecente no público.

LOEHRER (1993) efectuou um estudo na população americana, que demonstrou que um terço dos inquiridos achavam que a cirurgia ( por expor o cancro ao ar ) levava à disseminação mais rápida da doença. Esta população acreditava também no tratamento não convencional através de terapêuticas vitaminicas e curas de fé. O autor afirma que as crenças e o conhecimento inadequado acerca da doença são uma determinante importante no comportamento e podem levar a uso inadequado dos sistemas de Saúde. Segundo o mesmo autor, dois terços dos inquiridos acreditava que a doença se podia originar a partir de um traumatismo.

DENTON (1988) refere que o tratamento por radiações veio facilitar a continuidade dos mitos, uma vez que a radiação não se vê, nem se ouve, não se toca nem se pode cheirar e o doente para ser irradiado tem de ser isolado das pessoas.

SONTAG (1991) na sua obra Ilness as Metaphor diz que as fantasias inspiradas pela tuberculose no século passado e pelo cancro nos nossos dias, são resposta a uma doença tida como intratável e caprichosa, não compreendida numa época em que a premissa central da Medicina é a cura para todas as doenças. Segundo a mesma autora o cancro tornou-se numa doença que não bate antes de entrar, sendo por isso sentida como uma invasão impiedosa e secreta, que assim se manterá até que a sua etiologia e tratamento se tornem tão efectivos como os da tuberculose. Para SONTAG (1991) qualquer doença grave, cuja causa seja obscura e cujo tratamento seja ineficaz tende a ser suja em significado. Os factores mais assustadores, mais temidos (corrupção, decadência, poluição, guerra, morte, etc.) são identificados como a doença. Ela torna-se uma metáfora, entendida na sua significação própria ou rigorosa, de uma palavra que é substituída por outra em virtude da relação de semelhança subentendida, ou, mais simplesmente, o emprego de uma palavra em sentido figurado.

Então para SONTAG (1988) o nome da doença, esse horror, é imposto a outras coisas. A doença torna-se assim um adjectivo. Os sentimentos acerca desses horrores (acontecimentos) são projectados numa doença e esta é enriquecida de significados que são projectados no mundo. Assim as metáforas do cancro são múltiplas e inumeráveis e encontram-se no discurso político, económico, desportivo, etc. O cancro representa os horrores da sociedade e é representado por estes.

Para a mesma autora a percepção do cancro, engloba também, muitas vezes conceitos básicos, que condicionam e justificam por vezes comportamentos terapêuticos extremamente agressivos. A expressão de que o tratamento é pior que a doença é frequentemente ouvida nos hospitais oncológicos, pronunciada quer por doentes, quer por profissionais de saúde. O facto de se considerar o doente sob invasão torna lícita todas as formas de contra-ataque que terá de ser mais violento, para ser mais eficaz. Esses conceitos básicos ressaltam também da linguagem correntemente usada: as celulas cancerosas não se multiplicam simplesmente, mas são invasivas; as micrometástases cuja presença é assumida, não podem ser detectadas; raramente as defesas do organismo são suficientemente rigorosas para fazer frente às células destrutivas de um tumor; apesar da cirurgia radical e a vigilância, as emissões são por vezes temporárias e as células maldosas, desencadeiam um novo assalto ao organismo; os doentes são bombardeados com radiação (metáfora de guerra aérea); a quimioterapia utiliza venenos, que procuram matar as células cancerosas sem matar o doente (guerra química).

A doença é assim concebida como um inimigo ao qual a sociedade declarou, guerra e é uma ameaça que espreita o homem sem que este se aperceba, podendo atacá-lo em qualquer momento. Ela é muitas vezes encarada não apenas como uma condição possivelmente fatal, mas tomou o significado simbólico da própria morte, para alguns.

DENTON (1988) refere também que embora muitas vezes a doença seja identificada com a morte a sua consequência mais temida, e ainda antes dela, é a dor, o sofrimento e a mutilação ou amputação de parte do corpo. O autor afirma que o cancro significa para muitas pessoas a destruição de tudo o que é querido, afirmando muitos doentes que o que mais os assusta não é a morte, mas o modo como ela vai ocorrer. Cita o exemplo de um jovem que confrontado com o diagnóstico de metastização  da sua doença (demonstrara optimismo e esperança na fase inicial da doença), perguntou é uma morte dolorosa? Como é que vai acontecer?

BROOKS (1979) afirma que a conjugação destes factores ( doença para qual a ciência ainda não encontrou tratamento efectivo, muitas vezes mutilante e agressivo sofrimento até à morte …inevitável) transformou o diagnóstico em algo de dramático, por vezes com consequências graves, na forma como o público reage à doença, levando a que muitas vezes os indivíduos não utilizem adequadamente os recursos disponíveis.

Segundo o autor esta conclusão é clara a partir da análise da curva de Berlyne, segundo o qual os indivíduos agem adequadamente quando o seu nível de consciência se encontra  num ponto óptimo. Se eles não estão suficientemente preocupados com a saúde não conseguem agir apropriadamente; o mesmo acontece com os doentes demasiado preocupados. Em termos práticos, o conhecimento dos sinais e sintomas de alarme da doença, dissuadido pela American Cancer Society, se associado a um elevado grau de medo ou ansiedade pode conduzir a comportamentos inadequados ou irracionais.

DENTON (1988) afirma que os avanços tecnológicos no tratamento e diagnóstico precoce do cancro, dos esforços desenvolvidos no sentido de desmistificação da doença, de uma melhoria na técnica cirúrgica e a tendência para que os tratamentos tornem a doença progressivamente menos mutilantes e há um aumento de casos de cura, há ainda autores que afirmam que os mitos associados ao cancro são perpetuados até por profissionais de saúde, o que torna a situação mais preocupante e nos leva a reflectir em estratégias a utilizar para motivar estes técnicos a modificar as suas atitudes e crenças.

CONCLUSÃO      

O nosso maior lamento será o de não termos aprofundado mais a temática, visto implicar um texto e análise cientifica de maior dimensão, que aquela esperada no espaço de tempo da realização deste artigo e próprio formato da publicação.

Também gostavamos de ter incluído aspectos relativos às vivências da vida pessoal e profissional de um dos autores deste texto, no entanto há que fazer opções e de facto uma vez mais o tempo não permitiu a abordagem destes aspectos de forma fundamentada.

É interessante verificar como as representações sociais que temos dos objectos ou factos vão incorporar mitos e crenças que temos neste caso em relação a uma determinada doença.

Vemos que ao longo dos anos, muitos mitos permanecem, quase iguais, o que se deve a uma cultura, mas com certeza ainda mais ao caracter da doença, por muito do que há de desconhecido em redor da sua etiologia não obstante os avanços  técnicos e  avançados  conhecimentos cientificos, de que já somos detentores através dos esforços e investigações que sistematicamente se tem feito e terão de ser continuados pois, o cancro continua a ser uma doença que constitui um enorme desafio à ciência e à humanidade. Infelizmente este tema é tão actual como o seria à 20 anos atrás, embora seja nossas firme convicção de que os avanços da ciência e o papel dos profissionais de saúde na desmistificação da doença, venha a contrariar esta tendência tão antiga como a humanidade e que daqui a outros 20 anos possamos estar a falar deste tema em moldes diferentes daqueles aqui demonstrados.

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