O PAPEL DO ENFERMEIRO NA REABILITAÇÃO PSICOGERIÁTRICA

Jan 14, 2013

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ROLE OF NURSING IN PSYCHOGERIATRIC REHABILITATION

PAPEL DE LO ENFERMERO EN LA REHABILITACIÓN PSICOGERIÁTRICA

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AUTORES: Albano Ramos, César Fonseca, Vítor Santos

RESUMO:

A Clínica de Psicogeriatria Frei Júlio dos Santos é uma unidade de longo internamento da Casa de Saúde do Telhal, onde os enfermeiros assumem um papel importante na reabilitação dos doentes do foro mental e psiquiátrico. Aqui a tónica situa-se sobre a autonomização máxima possível dos doentes mentais, evitando ou desconstruindo a ocorrência hospitalismo, integrando sempre que possível a família e a comunidade numa acção concertada de reeducação, formação, socialização e profissionalização tendo a vista a reabilitação possível dos doentes mentais aqui internados.

Palavras-chave: Casa de Saúde do Telhal, Reabilitação, Enfermeiro, Hospitalismo

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ABSTRACT

The Clinic of Psychogeriatry Frei Julio dos Santos is a long term unit home from Telhal House of Health, where nurses play an important role in the rehabilitation of patients in  psychiatric and mental forum. Here the emphasis lies on the maximum possible autonomy of the mentally ill, avoiding or deconstructing the occurrence hospitalism, where possible  integrating family and community in a concerted action of rehabilitation, training, socialization and professionalization with the view to possible rehabilitation of the mentally ill interned here.

Keywords: Telhal House of Health, Rehabilitation Nurse, hospitalism

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A população da Unidade de Sto. António da Casa de Saúde do Telhal, agrupa-se de forma genérica, em adultos e alguns pacientes geriátricos. O primeiro grupo enquadra-se de forma semelhante ao descrito por FLAHERTY, DAVIS & JANICAK (1995:143) “heterogéneo de elementos em termos de patologia. Altamente lábeis e que exibem deficits cognitivos e uma baixa tolerância ao stress ou a estimulação. Necessitam principalmente de vidas estruturadas e de cuidados mínimos de enfermagem”. 5 (FLAHERTY, DAVIS & JANICAK, 1995: 143) Os segundos, enquadram-se em grupo muito idêntico ao definido pelo mesmo autor 5, como de “ex-pacientes mentais, que envelheceram (principalmente esquizofrénicos)” (FLAHERTY, DAVIS & JANICAK, 1995: 143) na instituição. 5

“O modelo preventivo da saúde pública identifica a prevenção terciária como a redução da deficiência relacionada a um episódio de doença,” (STUART & LARAIA, 2001:275) a prevenção terciária, é por conseguinte o conjunto de medidas para reduzir ao mínimo o prejuízo residual da doença “e reinserir os ex-doentes, no ambiente familiar, profissional e social.” (GAMEIRO, 1989; 179).

Na prevenção da deficiência em pessoas com doenças mentais serias e persistentes, a medicação correcta é importante na reabilitação na doença mental, contudo não é o suficiente, já que há que providenciar uma faixa completa de serviços voltados para a reabilitação, para a independência e para a melhor qualidade de vida à pessoa com doença mental. 4

Apesar de a reabilitação estar associada a qualquer episódio de doença, esta surge com uma importância impar em pessoas com doença mental crónica. A reabilitação propõe que as pessoas com doença mental crónica vivam, aprendam e trabalhem nas comunidades, assim a reabilitação psiquiatria é uma abordagem centrada na pessoa. 1,6

Tendo sempre em atenção que só um sistema de reabilitação “precoce e integral pode resolver os problemas relacionados com o hospitalismo” (GAMEIRO, 1989: 179) prevenindo-o, e que “a reabilitação dos doentes em muitos casos pode e deve começar antes mesmo do seu internamento, até mesmo a evitá-lo” (GAMEIRO, 1989:179). 6 É exigido dos enfermeiros, como agentes reabilitadores, que mantenham o seu foco em três elementos essenciais: o sujeito, a família e na comunidade e por conseguinte todas as medidas e intervenções terapêuticas devem ter em conta esta realidade.

Contudo quando por várias circunstâncias, isso não é possível, surgem instituições de caris hospitalares. Aqui a qualidade da assistência prestada é uma das preocupações do cuidar em Hospitalidade. A excelência profissional na prática tem muito a ver com a arte de saber cuidar, por conseguinte, devido ao princípio de beneficência um enfermeiro deve antes de mais cuidar em dignidade. 1 Assim é importante “evitar a segregação, segregação verbal, isolamento, (…) já que tudo isso significa a negação da reabilitação” (GAMEIRO, 1989:180) Contudo quando a segregação é impossível de ser contornada, há que limitá-la, “integrando doentes menos deteriorados e pessoal de reabilitação suficiente que os ajude e preencha as funções de figuras de identificação.”(GAMEIRO, 1989:180) medidas estas, que são procuradas, como filosofia da Unidade de Sto António.

Aqui o enfermeiro como agente reabilitador, deve ter em si o principio de que é um elemento, na reabilitação, ao ajudar a fornecer ao doente uma “ponte, para ele passar de uma dependência hospitalar, para uma independência e autonomia social, total ou pelo menos, parcial.” (GAMEIRO, 1989:188 e 189) Contudo os enfermeiros tradicionalmente não estão preparados para a tarefa de reabilitar, apesar de lhe serem indispensáveis, neste sentido uma formação teórica, apesar de importante, é secundária a uma formação que é mais eficaz quando adquirida e avaliada em contexto profissional. 6 Um outro grande problema que os enfermeiros incorrem, são o risco de por vezes se acostumarem “a trabalhar em esquemas que são possessivos em grande parte e por isso mesmo anti-reabilitadores” (GAMEIRO, 1989:186) já que o exercício dos cuidados na vida quotidiana é polvilhado por dificuldades muito distintas e porque cada ser humano requer cuidados concretos e personalizados isso impossibilita fórmulas e cuidados em série. 1,6 

No nosso entendimento, o principal entrave ao processo reabilitador é o hospitalismo ou Institucionalismo (GAMEIRO, 1989:187) onde doentes de longos internamentos se tornaram excessivamente dependentes do hospital e incapazes principalmente por medo, de viverem na sociedade. 6 Para evitar o hospitalismo, tal como defendido por GAMEIRO (1989:187) a unidade de Sto António, tem em articulação entre vários profissionais e familiares dos doentes, ensaiado frequentemente licenças de fim-de-semana, licenças de curta e média duração do doente na família ou com outros cuidadores significativos e os doentes a nosso cargo, têm licença para passear e deambular fora dos limites físicos da unidade e fora dos portões casa de saúde do Telhal, 6 procurando salvaguardar claro, os esquemas terapêuticos vigentes sejam eles farmacológicos ou outros.

Reabilitar requer sensibilidade e técnica, porque cuidar de um ser humano constitui uma tarefa de grande complexidade com muitas variáveis a ter em conta. 1,6 A tarefa de cuidar o outro vulnerável, como uma pessoa com doença mental, deve ser contemplada, em si mesma, como uma acção positiva, contudo devemos ter cuidado com todas as formas de paternalismo que podem pôr em causa a liberdade da pessoa com doença mental, 1,6 e devemos sempre acreditar nas capacidades dos doentes reabilitados. 6 Tudo isto não é contudo, uma tarefa fácil, nem arbitrária, necessitando por parte do enfermeiro um grande poder criativo e organizativo, 6 porque o ser humano, é na sua profundidade, um mistério único. 2,6

O ser humano deve ser cuidado, especialmente quando atravessa uma situação vulnerável, como é o processo reabilitativo, mas deve ser cuidado de um modo adequado, 3 já que reabilitar de uma pessoa humana é cuidar de um sujeito único e singular com uma história única. 6

Reabilitar na nossa óptica vai de encontro à tónica de que não consiste em substituir, ocupar o lugar do doente ou reduzi-lo a nada, cada um tem o seu espaço natural e o cuidador deve promover o outro, na sua autonomia moral e em ultima análise na sua autenticidade, criticamos modelos de cuidar e reabilitar dominadores que reduzem o sujeito cuidado a um mero objecto. 1,6

O enfermeiro, deverá por conseguinte “adoptar medidas [reabilitadoras] de natureza (re) educativa, formativa, social e profissional”, (GAMEIRO, 1989:179) de modo a atingir o objectivo de reabilitação., já que “todos os doentes mentais são capazes de um certo grau óptimo de reabilitação de modo a permitir o máximo de independência pessoal” (GAMEIRO, 1989;179).

Procurando respeitar a estruturação mencionada por GAMEIRO (1989:179), na unidade de Sto. António – Casa Saúde do Telhal, como terapêuticas reeducativas procuramos a reeducação por parte dos doentes que perderam determinadas capacidades e habilidades, principalmente na aquisição hábitos de higiene pessoal, higiene oral, higiene das mãos, vestuário adequado e comportamentos de alimentação adequados.

 Na temática da formação, passa principalmente em fomentar capacidades e habilidades em doentes não o demonstram essas mesmas capacidades, passando principalmente hábitos de vida saudáveis, hábitos de higiene pessoal e hábitos e comportamentos de alimentação adequados e a aquisição de hábitos de lazer, muito importantes na quebra do ciclo vicioso do hospitalismo 6.

Do ponto de vista de terapêuticas reabilitadoras socais, procuramos realizar reuniões de grupo, reuniões de unidade, actividades de lazer em grupo de modo a fomentar a interacção social entre os vários doentes ao nosso cargo fomentando regras básicas de cortesia e investimos bastante na integração da família nos cuidados. 1

Como medidas de natureza profissional, passa bastante pelo pela articulação e incentivo dos doentes para sua integração e manutenção em projectos que existem nesse sentido na própria Casa de Saúde do Telhal ou em instituições externas articuladas com a Casa de Saúde do Telhal para esse fim, contudo dentro da própria Unidade, procuramos fomentar nos doentes a realização de tarefas individuais ou em grupo para a manutenção e funcionamento da unidade, indo individualmente ao encontro das preferências e história pessoal do pessoa com doença mental. 1

Reabilitar será antecipar o potencial do outro e ajuda-lo a actualizar as suas potencialidades. Cada um de nós tem as suas potencialidades e os seus limites, cuidar é assim antecipar o poder de ser em cada um dos nossos doentes, e promover essas habilidades e capacidades que o doente é capaz agora e no futuro. Neste sentido o enfermeiro enquanto agente reabilitador, necessita de um enorme poder organizativo e criativo já que irá intervir no processo reabilitador numa uma tónica de antecipação, de pré-ocupação e de pré-visão sempre orientada para o outro e no outro (ROSELLÓ, 1999:162). 1

Neste sentido reabilitar é libertar o outro dos obstáculos que dificultam o seu processo de construção pessoal, capacitando-o de antecipar, prever e superar esses mesmos obstáculos, aqui a educação tem um papel importante já que cria essas capacidades antecipatórias, 6 contudo sem deixar que o doente, neste processo de transformação, se sinta sozinho, ajudando-o a viver o choque da readaptação, articulando-se e servindo de agente catalizador conjuntamente com os outros profissionais de saúde intervenientes em todo o processo e funcionando também como elo de ligação entre a pessoa com doença mental e a sua família.1,6


Referências Bibliográficas:

1. ROSELLÓ, Francesc Torralba; Humanización, pastoral y ética de la salud – Lo ineludiblemmente humano – Hacia una fundamentación de lá ética del cuidar in revista Labor Hospitalaria 3-99 n.º 253; 1999 Institut Borja de Bioètica

2. G. BRUCKZUNSKA, Moya J.; Nursing Care; Edward Arnolf, London; Melbourne, 1992

3. PHILLIPS, S; BENNER, P; The Crisis of care; Georgetown University; Washington, D.C.; 1994; p44.

4. STUART, Gail W; LARAIA, Michele T; Enfermagem Psiquiátrica – Principios e Prática; 6ª Edição; Artmed editora; 2001; Porto Alegre; ISBN: 85-7307-713-1

5. FLAHERTY, Josheph A.; DAVIS, Jonh M.; JANICAK, Philop G.; Psiquiatria, diagnóstico e tratamento; 2º Edição; Artes Médicas; 1995

6. GAMEIRO, Aires; Manual de Saúde Mental e Psicopatologia, 4ª Edição, Edições Salesianas; 1989; Porto; ISBN: 972-690-187-1

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O DOENTE PSIQUIÁTRICO E A ADESÃO TERAPÊUTICA

Jan 14, 2013

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PSYCHIATRIC PATIENT AND TREATMENT ADHESION

EL PACIENTE PSIQUIÁTRICO Y ADHESIÓN AL TRATAMIENTO

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AUTORES: Albano Ramos, César Fonseca, Vítor Santos

Resumo:

Na doença mental, a adesão à terapêutica constitui o factor determinante do êxito ou falência da terapêutica e do consequente prognóstico do doente.

A adesão à terapêutica é pois o verdadeiro “calcanhar de Aquiles” da toma da medicação nos doentes mentais. Contudo, é possível alterar comportamentos e melhorar a adesão dos doentes mentais à terapêutica, através de um investimento específico dos profissionais de saúde e consequente participação activa dos doentes no seu próprio plano terapêutico.

O médico/enfermeiro deve tentar perceber quais os factores que funcionam como obstáculo para uma completa adesão e procurar meios para os ultrapassar.

Palavras-chaves: Adesão, Terapêutica, Doentes Mentais

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ABSTRACT

In mental illness, adherence to therapy is the key to success or failure of therapy and subsequent prognosis. Adherence to therapy is the true “Achilles heel” of taking the medication on mentally ill. However, you can change behaviors and improve adherence to treatment of the mentally ill through a specific investment of health professionals and consequent active involvement of patients in their own treatment plan. The doctor / nurse should try to understand the factors that serve as obstacles to a full membership and find ways to overcome them.

Keywords: Adhesion, Therapy, Mental Illness

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Introdução

A adesão, definida como «(…) o grau em que o paciente adere ao tratamento prescrito ou o grau em que o comportamento da pessoa coincide com o conselho ou a prescrição médica» (Davidson; Turk & Meichenbaum: 424), é um dos problemas centrais da medicina actual, calculando-se que pelo menos um terço dos utentes não seguem a rigor ou na totalidade os tratamentos que lhe são prescritos (Haynes, Taylor & Sackett).

Ao abordarmos a problemática da adesão no contexto da doença mental temos de tomar consciência da sua verdadeira importância e amplitude, visto que se exige a estas pessoas uma adaptação rápida a um diagnóstico que afecta totalmente o seu projecto de vida, e uma série de mudanças profundas e simultâneas que levam o indivíduo a alterar determinados comportamentos sociais, alimentares, hábitos, dependências, rotinas sociais e profissionais, e a introduzir no seu plano de vida as idas regulares à consulta e as tomas diárias de terapêutica (que para além de ser complexa, pode levar ao aparecimento de efeitos secundários) (Marques 1999).

Segundo Marques (1999), face à necessidade de mudança de comportamentos enraizados, verifica-se por parte destes indivíduos a existência de resistências, manifestando-se através da negação da doença e da não adesão à medicação prescrita.

Assim, na doença mental, doença muitas vezes de carácter “crónico”, a adesão constitui o factor determinante do êxito ou falência da terapêutica e do consequente prognóstico do doente, factor esse que é limitante à difícil decisão de prescrever ou não a terapêutica (Poças www.aidscongress.net in Internet), uma vez que as estimativas de não adesão à mesma estão relatadas «entre uma média de 35 e 50%» (Eldred et al.; Giofford et al.; Singh et al.,: 276).

Factores limitativos da adesão à terapêutica

Sendo este grupo de doentes considerado de menos aderente que os restantes, é importante os profissionais de saúde não os designarem de aderentes e/ou não aderentes, podendo esta dicotomização «(…) ser em simultâneo, estigmatizante e precipitada» (Poças www.aidscongress.net in Internet), uma vez que os indivíduos, podem apresentar distintos comportamentos de adesão em diferentes momentos e circunstâncias da sua vida, condicionados pela influência de numerosos factores (Castro, 2000).

Segundo Poças (www.aidscongress.net in Internet), Marques (1999), Casquilho e Castro (2000), existem diversos factores identificados como limitativos da adesão de um sujeito com doença mental a uma dada terapêutica, que podemos dividir em:

  • Factores relacionados com o sujeito;
  • Factores relacionados com a doença;
  • Factores relacionados com a relação equipa de saúde/doente;
  • Outros factores, tais como a distância geográfica entre o serviço de saúde e o local de habitação do doente; as dificuldades no acesso à consulta (face à falta de médicos, ao grande número de doentes inscritos e às numerosas listas de espera); e o grande espaçamento do período de tempo entre as diferentes consultas, que funcionam como limitativos e/ou impeditivos da adesão do doente à consulta e à terapêutica.

Também as características do serviço de saúde funcionam como estímulo para o doente a ele se deslocar e para a adesão deste aos tratamentos e à terapêutica. Assim, é extremamente importante que estas estejam adequadas à realidade das necessidades dos utentes e da equipa multidisciplinar, que permitam a existência de um ambiente fidedigno e confidencial, de um atendimento personalizado e que haja articulação condigna entre ao diferentes serviços inter e extra institucionais, de forma a que se prestem cuidados com qualidade, atendendo sempre às necessidades do doente/família.

A intervenção das equipas de enfermagem na adesão à terapêutica em doentes mentais

A adesão à terapêutica é pois o verdadeiro “calcanhar de Aquiles” da toma da medicação nos doentes mentais. Contudo, é possível alterar comportamentos e melhorar a adesão dos doentes mentais à terapêutica, através de um investimento específico dos profissionais de saúde e consequente participação activa dos doentes no seu próprio plano terapêutico.

Assim, ao aferir a existência de diversas dificuldades ao nível da adesão, a equipa multidisciplinar dos serviços de apoio aos doentes portadores de doença mental, deve contribuir para melhorar a conduta do sujeito nesta área, recorrendo «(…) a técnicas específicas que ajudem o doente concreto a desenvolver e a consolidar a sua capacidade de auto-domínio» (Marques, 1999: 32).

Convictos de que adesão é da responsabilidade do doente, do médico e do sistema de saúde, surge um aumento da preocupação dos profissionais de saúde com a qualidade de vida e com a prevenção da doença e uma necessidade de humanização dos cuidados de saúde e promoção da qualidade dos serviços de saúde prestados.

Também os enfermeiros, como elementos activos e participativos das equipas multidisciplinares, encontram-se convictos das necessidades destes utentes, associadas aos múltiplos e complexos problemas, que têm com estas doenças e todos os que com eles vivem e deles cuidam.

Assim, para prestar cuidados a estes indivíduos, sãos ou doentes, ao longo do ciclo vital, e ao grupo social onde se encontram integrados, de modo a manter, a melhorar, ou a recuperar o seu estado de saúde, ajudando-os a atingir um nível elevado de qualidade de vida, as diversas equipas de enfermagem têm necessidade de reestruturar e reorganizar as suas actividades de acordo com a nova realidade, os novos objectivos e, as novas necessidades do utente e das equipas multidisciplinares.

Com vista a tornar realidade essa reestruturação e reorganização desenvolvem-se nos diferentes serviços algumas actividades realizadas pelos enfermeiros, tais como:

  • Recepção e acolhimento do utente/família;
  • Estabelecimento de relação de ajuda empática;
  • Promoção da integração do utente no serviço;
  • Estabelecimento de ambiente terapêutico;
  • Prestação de cuidados de enfermagem de acordo com as necessidades do utente, atendendo à prescrição médica (administração de terapêutica, realização de exames);
  • Preparação e administração de terapêutica, consoante prescrição édica;
  • Colaboração em equipa na realização de exames e sempre que necessário programação de novo tratamento e/ou exame;
  • Elaboração de registos correctos e adequados em folha própria;
  • Elaboração e preenchimento do guia de colheita de dados em processo próprio, demonstrando confidencialidade dos dados colhidos;
  • Avaliação e registo de sinais vitais e dados antropométricos;
  • Identificação dos conhecimentos do doente sobre:

– A sua patologia;
– Efeitos colaterais da medicação;
– Importância da toma da terapêutica prescrita.

  • Distribuição de panfletos de ensino específicos à sua patologia;
  • Esclarecimento das dúvidas manifestadas pelo doente/família;
  • Ensinos ao doente/família sobre a necessidade de terapêutica e seus benefícios;
  • Reforço dos ensinos efectuados ao doente/família;
  • Promoção do encaminhamento e da continuidade dos cuidados de enfermagem após a alta;
  • Sensibilização da família para a continuidade dos cuidados a prestar ao utente;
  • Participação nas acções de formação em serviço.

ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM NA ADESÃO À TERAPÊUTICA

Actualmente é importante que cada Unidade/Serviço instaure um programa de adesão à terapêutica, sendo necessária a colaboração de todos os elementos da equipa multidisciplinar. Assim, os enfermeiros como elementos desta e preocupados com a implementação e continuidade destes programas cuja finalidade é minimizar ou solucionar a problemática da não adesão terapêutica por parte dos doentes mentais, consideram fundamental o envolvimento da enfermagem, como colaborador activo entre toda a equipa na negociação e estabelecimento de estratégias eficazes a esta adesão.

Estratégias de Intervenção de Enfermagem a implementar:

√  O acolhimento do cliente/família na unidade;

√  A elaboração de ensinos sobre a patologia, cuidados a ter, reforçando a comunicação médico/doente, com o objectivo de ajudar o doente a compreender e a acreditar no diagnóstico;

√  A elaboração de ensinos sobre as necessidades, benefícios e efeitos secundários da terapêutica, com o intuito de antecipar a eficácia do tratamento prescrito;

√  A conversa informal, para avaliar e discutir com o doente o impacto potencial da sua doença, e posteriormente com ele definir as estratégias seguintes, tendo em vista a obtenção de comportamentos de adesão ao tratamento e terapêutica por parte deste;

√  A elaboração de ensinos sobre auto-administração de terapêutica, de forma a encontrar com o doente a maneira mais fácil de tomar a medicação, e mais compatível com a sua vida social e laboral, verificando para tal:

  • Se o doente tem como suporte social algum amigo ou familiar, incentivando-o a colaborar neste processo, de forma a apoiar/ajudar o doente.

√   Realização de reuniões com a equipa multidisciplinar para a definição de estratégias de intervenção comuns face à realidade de cada doente.

√  Reestruturação de panfletos informativos existentes nas Unidades/Serviços e elaboração de outros, nomeadamente sobre a terapêutica TOD – toma da medicação controlada a todos os doentes.

Elaboração de uma brochura que estimule a adesão à terapêutica, podendo ser utilizadas as características e efeitos secundários dos fármacos de uma forma pedagógica e com humor.

Este projecto de intervenção tem a finalidade de incentivar o doente a aderir na totalidade aos tratamentos e terapêuticas prescritas, com o objectivo de promover a Qualidade de Vida dos Doentes. A intervenção de Enfermagem neste projecto não deverá permanecer só ao nível do doente durante o internamento, tornando-se mais globalizante e inter accionista, actuando também ao nível dos cuidados de saúde primários, das instituições de apoio a utentes mentais, comunidade, da família. Assim:

  • A articulação de cuidados de enfermagem entre os Serviços e os Centros de Saúde/Unidades de Apoio deve ser feita mediante contacto telefónico e Carta de Transferência/Alta, com o intuito de se aferir os cuidados a prestar ao cliente e de esclarecer dúvidas
  • A intervenção de enfermagem junto dos familiares ou elemento de referência deve ser sempre feita com o conhecimento e a autorização do doente. Consiste na informação da situação de saúde do utente, no ensino pormenorizado sobre a mesma e dos cuidados a ter, é ainda solicitado um contributo especial da família na colaboração e vigilância da toma da terapêutica, sendo para tal efectuado ensino especifico.

Com isto tudo verifica-se que para a eficácia de qualquer tratamento é importante a adesão do doente. Por comportamentos de adesão entende-se o conjunto de comportamentos relacionados com o envolvimento activo, voluntário do doente e de acordo com a prescrição médica (Rogado, Trindade, Carvalho Teixeira, 1997).

Assim, perante o aparecimento destas doenças é necessário um reajuste no estilo de vida mediante uma mudança de atitude do doente, que deverá estar motivado para todo o processo terapêutico tendo um papel activo, quer na aquisição de informação, quer no cumprimento do tratamento, adquirindo a consciência que a adesão terapêutica depende sobretudo da sua atitude, e que desta pode depender o curso da sua doença e consequentemente o seu bem-estar.

ESTRATÉGIAS PARA MELHORAR A ADESÃO

A adesão é responsabilidade do doente, do médico e do sistema de saúde. Idealmente a equipa que trata os utentes com patologia mental deve ser multidisciplinar, incluindo o Médico, o Enfermeiro, o Psiquiatra, o Psicólogo e o Assistente Social, o Terapeuta Ocupacional, o Auxiliar.

Algumas das estratégias utilizadas pelos diversos elementos da equipa multidisciplinar para melhorar a adesão têm sido as seguintes:

– Informação adequada do doente em relação à doença, à eficácia terapêutica dos esquemas utilizados, efeitos laterais potenciais dos fármacos, interacções medicamentosas, consequências da má adesão.

A informação é fornecida ao doente pelo médico durante a observação, sendo complementada pelos enfermeiros.

– Esquema terapêutico fácil e o mais adequado possível ao doente, tendo em conta o seu perfil psicológico e o seu ritmo de vida diário. O mais eficaz método de promover a adesão é a simplificação do esquema terapêutico. Cumprimento de TOD a todos os doentes.

Procurar integrar o esquema nos horários do doente, nomeadamente tendo em conta a hora das refeições, de acordar e de ir para a cama.

– Identificação de doentes de risco para não adesão, nomeadamente, casos de consumo de drogas ou álcool ou ausência de suporte familiar e / ou social.

A comunicação entre os vários elementos da equipa de trabalho é contínua, numa tentativa de identificação destes problemas e sua resolução.

A ligação com Instituições Sociais de apoio torna-se necessária e muitas vezes essencial, tendo em conta que uma grande percentagem dos doentes mentais tem problemas sociais graves.

– Maior investimento para o desenvolvimento de uma boa adesão durante as primeiras semanas do tratamento, pois o nível de adesão na fase precoce de terapêutica é preditiva da adesão a longo prazo.

– Demonstrar disponibilidade e ausência de juízos de valor em relação à adesão. A confiança e um bom relacionamento com a equipa de saúde são factores importantes na promoção de uma adesão adequada. Uma das formas de avaliação do grau de adesão é simplesmente inquirir o doente sobre esta, sem o pretender julgar ou fazer sentir culpado.

Um factor importante para a adesão é a percepção que o indivíduo tem da sua doença, assim como a correcta informação das consequências, a curto e a longo prazo, do não cumprimento da medicação.

É da responsabilidade do médico e dos outros profissionais de saúde fornecer a informação adequada para que o doente faça o seu julgamento e fundamente as suas opções. Muitas vezes a complexidade técnica desta informação leva a que rapidamente seja esquecida. Cabe aos profissionais de saúde torná-la o mais simples e objectiva possível. Mesmo com a informação adequada e interiorizada muitos doentes podem continuar não aderentes. O médico/enfermeiro deve tentar perceber quais os factores que funcionam como obstáculo para uma completa adesão e procurar meios para os ultrapassar.

BIBLIOGRAFIA:

  • Castro, 2000;

  • Davidson, 1982; Turk & Meichenbaum, 1991 ap. Reis, 1999: 424;

  • Eldred et al., 1998; Giofford et al., 1998; Singh et al., 1996; ap. Filipe et al., 2000: 276 ;

  • Haynes, Taylor & Sackett, 1979 ap. Santos e Barros, 1999;

  • Marques, 1999: 32;

  • Poças www.aidscongress.net in Internet;

  • Rogado, Trindade, Carvalho Teixeira, 1997.

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UM OLHAR SOBRE A SAÚDE MENTAL EM PORTUGAL

Jan 12, 2013

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A OVERVIEW ON THE MENTAL HEALTH IN PORTUGAL

UNA MIRADA SOBRE LA SALUD MENTAL EN PORTUGAL

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AUTORES: Albano Ramos, César Fonseca, Vítor Santos

Resumo

Introdução: O Relatório Mundial da Saúde proporciona em muitos aspectos, uma nova forma de compreender as perturbações mentais, dando uma nova esperança aos doentes mentais e às respectivas famílias em todo o mundo. Examina minuciosamente a prestação e o planeamento de serviços e finda com um conjunto de recomendações de longo alcance que cada país pode adaptar de acordo com as suas necessidades e os seus recursos.Objectivos:Estabelecer a aplicabilidade de cada uma das recomendações em Portugal. Métodos: Pesquisa bibliográfica realizada em várias obras, estabelecendo sobretudo uma co-relação entre as recomendações do Relatório Mundial da Saúde para a saúde mental e as Orientações estratégicas para 2004 – 2010 do plano nacional de saúde. Conclusões: Portugal encontra-se em relação à saúde mental, nalguns aspectos, ainda distante daquilo que mundialmente se preconiza e aparentemente sem capacidade para contrariar essa evidência. Assim, é difícil num curto período de tempo preconizar a desinstitucionalização global e bem planeada dos doentes psiquiátricos.

Palavras-Chave: Saúde mental, Portugal, desinstitucionalização.

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Abstract

Introduction: A new way in order to understand mental diseases is given, in many aspects, by the World Health Report, as it becomes as a new hope for mental ill people and their families. Services delivery and planning is accurately examined, and it finishs with a long range whole recommendations, wich every country can adopt, according with their needs and resources. Goals: To settle that each recommendation will be applied in Portugal . Methods: Bibliographic research has been done among several works, in order to establish mostly a co-relationship between World Health Report for mental health and National Health Strategic Plan Orientations for 2004-2010. Conclusion: In a way, concerning mental health, Portugal stands away from world-wide recommendations and apparently without cappabilities in order to oppose the situation. So, in a short time, is rather dificult that a global and well planed psychiatric patients de-establishing will be preconize.

Key words: Mental Health, Portugal, De-establishing.

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INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde procura com a publicação do Relatório Mundial da Saúde despertar a consciência do público e dos profissionais para o real ónus das perturbações mentais e os seus custos em termos humanos, sociais e económicos. Pretende-se também  que ajude a derrubar muitas barreiras, tais como o estigma, a descriminação e a  insuficiência dos serviços que impedem milhões de pessoas em todo o mundo, não fugindo  Portugal à regra, de receber o tratamento de que necessitam e que merecem.
O Relatório  Mundial da Saúde proporciona em muitos aspectos, uma nova forma de compreender as  perturbações mentais, dando uma nova esperança aos doentes mentais e  as respectivas famílias em todo o mundo. Este relatório examina minuciosamente a prestação e o planeamento de serviços em Saúde Mental e finda com um conjunto de recomendações de longo alcance que cada país pode adaptar de acordo com as suas  necessidades e os seus recursos.

RECOMENDAÇÕES PARA A ACÇÃO, SUA APLICABILIDADE EM PORTUGAL

O relatório aponta des ta forma, dez recomendações para a acção e, é sobre a aplicabilidade de cada uma destas dez recomendações em Portugal, que me vou debruçar de seguida:

Proporcionar tratamento em cuidados primários

O nosso país tem uma taxa elevada de  tentes sem se poderem inscrever nos Centros de Saúde devido a vários factores, sendo o mais marcante a falta de clínicos gerais ( médico de família ) e de enfermeiros, entre outros profissionais de saúde. Sem a inscrição nos respectivos Centros de Saúde qualquer utente fica condicionado no acesso aos cuidados primários. Temos assim um número elevado de utentes para um baixo número de profissionais de saúde, juntando a isso uma rede de cuidados primários e comunitários com infra-estruturas inadequadas e insuficientes. “ Num processo de produção em que as novas tecnologias não são substitutivas de mão-de-obra, como sucede noutro tipo de organizações, é reconhecida a carência de profissionais, … – nomeadamente de enfermeiros, médicos, técnicos de diagnóstico e terapêutica, assistentes sociais – que se assume como sendo um dos obstáculos ao desenvolvimento dos projectos de saúde que se pretendem concretizar” ( Ministério da Saúde, 2004 ).

Disponibilizar medicamentos psicotrópicos

Hoje em dia existem múltiplos medicamentos psicotrópicos, sendo uns mais recentes que outros e consequentemente mais eficazes atenuando de forma mais incisiva os sintomas, reduzindo a incapacidade: abreviando o curso de muitas perturbações, prevenindo recorrências; com menor número de efeitos secundários. Em Portugal, estes medicamentos existem, mas não de forma equitativa pelos diversos serviços de saúde, pois se eles são presença assídua nos grandes hospitais psiquiátricos, já não o são a nível dos cuidados de  saúde primários onde quando existem, são em quantidade insuficiente. O preço elevado dos  psicotrópicos de última geração ( considerados mais eficazes ), condiciona a sua prescrição e  administração em meio hospitalar e, de forma mais significativa ao nível dos cuidados de saúde primários.

É o próprio Ministério da Saúde ( 2004 ), a reconhecer que tem que melhorar o acesso aos medicamentos.

Para tal serão contempladas várias intervenções:

Uma harmonização do regime de acesso aos medicamentos destinados a patologias raras debilitantes e às doenças crónicas;
Informação e formação especializada aos profissionais de saúde e através da priorização da autorização de introdução no mercado e comparticipação.
Preconiza ainda contemplar o desenvolvimento de um sistema de cedência de medicamentos a nível dos cuidados de saúde primários, à semelhança do que ocorre em meio hospitalar, de forma a aproximar os recursos disponíveis do cidadão e como estratégia de encaminhamento do cidadão dos cuidados diferenciados para os cuidados de saúde primários. Tal situação torna-se mais importante no que diz respeito às doenças crónicas que possuem condições de ser tratadas em regime ambulatório, evitando dificuldades que possam afectar negativamente a adesão à terapêutica e ao controlo da doença.

Proporcionar cuidados na comunidade 

Nos últimos tempos muito se tem falado no encerramento dos hospitais psiquiátricos públicos e na desinstitucionalização dos doentes aí internados, com a sua consequente integração na comunidade, com o apoio de camas psiquiátricas a nível dos hospitais distritais. Por muito boas intenções que esta ideia tenha, ela é impraticável com as infraestruturas existentes actualmente em Portugal, pois para tal é necessário criar e desenvolver serviços de prestação de cuidados na comunidade, apoiados por camas psiquiátricas nos hospitais distritais e cuidados domiciliários, que respondessem a todas as necessidades dos doentes agora internados nos hospitais psiquiátricos. É uma medida que só se poderá por em prática num médio – longo prazo e, mesmo assim dependendo de uma boa organização e gestão e de recursos.

Segundo Baganha, a prestação de cuidados de saúde é assegurada, em cada região, pelos hospitais e pelos centros de saúde. O que se verifica na prática é que os centros de saúde têm uma posição enfraquecida perante o hospital. Isto apesar de, a nível político, os cuidados de saúde primários sempre terem sido considerados como a base do Sistema de Saúde e, portanto, uma prioridade política. Tal cisão entre a realidade e a prática efectiva é visível na distribuição de verbas, equipamentos e recursos humanos pelos centros de saúde e hospitais. Neste último caso, os dados do Ministério da Saúde ( OPSS, 2001 ) dizem-nos que, no ano de 1998, os efectivos distribuíam-se de forma desigual: 27 % dos efectivos do Ministério da Saúde estava nos centros de saúde e 73 % nos cuidados hospitalares.

De acordo com a obra supra citada, 47% das despesas correntes do Sistema Nacional de Saúde ia para os cuidados de saúde primários e 53 % para os cuidados hospitalares.

Como resultado desta discrepância temos uma oferta de serviços ambulatórios públicos que não consegue corresponder às necessidades da população, o que faz com que haja um aumento da procura dos hospitais ( EOCHCS, 1999 ).

A desinstitucionalização de doentes dos hospitais psiquiátricos também só será possível se os próprios organismos do estado mudarem a filosofia actual de internamentos, isto porque hoje em dia, são os próprios organismos do estado ( Segurança Social, hospitais distritais, etc. ) que por não terem capacidade nem meios para, incentivam e solicitam o internamento de doentes nos hospitais psiquiátricos públicos e dos Institutos Hospitaleiros. Quanto aos hospitais distritais, já de si pequenos para tantas necessidades, onde é que irão arranjar espaço para construírem serviços de psiquiatria?

Para agravar ainda mais a situação temos uma  inadequada política de contratação e distribuição dos recursos humanos pelos diferentes serviços de saúde, pois o que se verifica é o aumento de profissionais de saúde ( que não mostram interesse em mudarem pois já aí têm interesses instituídos ) nos grandes hospitais, ficando os cuidados de saúde primários e na comunidade despovoados de profissionais de saúde, acentuando-se ainda mais na periferia das grandes cidades e no interior do país. Segundo o Ministério da Saúde ( 2004 ), a concentração de médicos e enfermeiros nos estabelecimentos de saúde do litoral, nomeadamente em Lisboa, Porto e Coimbra, tem conduzido a problemas de escassez destes profissionais nos serviços da extrema periferia com a consequente dificuldade de resposta às solicitações das populações que servem.

Educar o público

Desde sempre que os “ loucos ” foram estigmatizados e vítimas de exclusão social, sendo sempre que possível colocados em hospícios longe de tudo e de todos. Ainda hoje, no nosso país se vive esse estigma, não estando a população em geral, políticos e até mesmo os profissionais de saúde preparados para viverem lado a lado com pessoas portadoras de perturbações mentais, pois numa sociedade tradicionalmente conservadora como a nossa, difícil é a mudança de mentalidades. Por outro lado, difícil também será educar e sensibilizar a população em geral, políticos e até mesmo os profissionais sobre a importância da saúde mental, pois esta ainda não é vista como parte integrante de uma saúde plena. Sendo no entanto esse um objectivo a prosseguir seguindo todas as orientações de política de saúde Europeia e Nacional.

Investir-se-á na promoção dos direitos humanos das pessoas com doença mental e na implementação de medidas contra o estigma ( Ministério da Saúde, 2004 ).

Envolver as comunidades, as famílias e os utentes

Qualquer tomada de decisão deveria ser acompanhada de uma prévia auscultação às pessoas intervenientes e visadas no respectivo processo. Neste momento em Portugal, prepara-se o Ministério da Saúde para unilateralmente formular e tomar decisões políticas a nível da saúde mental e da psiquiatria sem que tenha consultado as comunidades, as famílias e os utentes envolvidos. Uma decisão como a de encerrar os hospitais psiquiátricos, tendo com principal factor impulsionador o facto de colocar os doentes na comunidade junto das respectivas famílias, deveria ter em conta primeiro a opinião dos doentes mentais e em segundo o facto de mais de 30 % destes não terem qualquer tipo de familiares fora da instituição onde se encontram internados, já para não falar nos muitos deficientes mentais que nem a sua opinião conseguem verbalizar.

É o próprio Ministério da Saúde ( 2004 ), a preconizar a mudança centrada no cidadão: “A    percepção da equidade como um valor  realmente orientador da acção no sector da saúde é essencial para garantir uma maior aproximação entre o cidadão e o poder político, assim como uma cidadania mais centrada na participação activa na vida pública em geral e nas coisas da saúde em particular, aumentando as opções de escolha do cidadão, multiplicando os mecanismos de participação do cidadão no sector da saúde, dando voz à cidadania através de organizações da sociedade civil, combatendo as causas subjacentes às principais doenças relacionadas com os estilos de vida e criando um contexto ambiental conducente à saúde”.

Estabelecer políticas, programas e legislação nacionais

Portugal estabeleceu a introdução de novas políticas, programas e legislação sobre saúde mental a incrementar num curto espaço de tempo, resta agora saber de que forma o conseguirá fazer e com que verbas, uma vez que o país atravessa uma grave crise económica e financeira e que as medidas preconizadas envolvem um impacto tremendo a nível organizacional e são necessárias verbas avultadas para a sua concretização.

A legislação portuguesa referente ao sector da saúde caracteriza-se pela ausência de um código da saúde que centralize todas as normas fundamentais nesta área, e ainda pela existência de leis com grande importância estratégica na saúde que, apesar de nunca terem sido revogadas, se encontram caducas. Por este motivo, é necessário actualizar a legislação de saúde, através da criação de uma estrutura com funções de avaliação e correcção das insuficiências e lacunas da legislação de saúde em Portugal ( Ministério da Saúde, 2004 ).

Preparar recursos humanos

A eficiência de qualquer organismo ou empresa avalia-se entre outras coisas pela quantidade  dos seus recursos humanos mas sobretudo pela sua aptidão e pela formação quer básica, quer pós básica. Em Portugal a juntar ao baixo número de profissionais de saúde temos a sua pouca formação em saúde mental. Quanto à Enfermagem, os cursos bases continuam a não incluír de forma transversal a saúde mental nos seus conteúdos programáticos, optando pela sua inclusão em determinado momento específico do curso; quanto aos cursos de especialização em saúde mental estes tiveram encerrados cerca de 10 anos e aquando da sua reabertura são as próprias escolas a preferirem outras áreas de especialização em detrimento da saúde mental.

No âmbito da formação na área da enfermagem, começa a ser premente a oferta de cursos de pós-graduação, de maior especialização. Com efeito, após a extinção dos cursos de estudos superiores especializados, acentuou-se a carência de enfermeiros especializados ( Amaral, 2001 ).

Num mundo cada vez mais voltado para as tecnologias, também os jovens profissionais preferem iniciar a sua carreira num serviço de urgência, num bloco operatório ou numa cirurgia do que num serviço de psiquiatria, levando a que depois toda a sua formação pós básica seja efectuada em função dos serviços onde trabalham, ficando mais uma vez a psiquiatria para trás, com profissionais cada vez mais idosos e desgastados.

Existem áreas com um forte défice de pessoal, como sejam a da Saúde Materna e Obstetrícia e de Saúde Mental ( em que há um enfermeiro por 6531 habitantes e um enfermeiro por 10362 habitantes, respectivamente ), as idades médias são superiores a 45 anos. Perspectiva-se, assim, uma escassez de recursos humanos nestas áreas ( Ordem dos Enfermeiros, 2000 ).

Estabelecer vínculos com outros sectores

Um país bem organizado tem uma interligação entre os seus diversos sectores. As novas medidas que se pretendem tomar a nível da saúde e mais concretamente na saúde mental, deveriam ter como pano de fundo uma interligação entre sectores como o da saúde, educação, trabalho, segurança social, justiça, bem como o envolvimento de certas organizações não-governamentais. Como é do conhecimento comum Portugal não prima pela interligação dos seus diversos sectores, o que logo à partida irá comprometer seriamente qualquer medida que seja tomada a nível da reorganização dos serviços de saúde mental e psiquiatria.

Segundo o Ministério da Saúde ( 2004 ) a saúde mental percorre transversalmente todos os problemas de saúde humana, sendo fundamental a articulação dentro da saúde, em particular com os cuidados de saúde primários e o envolvimento com outros sectores e áreas, nomeadamente a educação, a segurança social, o trabalho, a justiça, a defesa, o serviço nacional de bombeiros e protecção civil, as autarquias, as organizações não governamentais e a comunicação social. É de realçar o papel a desempenhar pelos conselhos regionais de saúde mental e, num contexto mais amplo, pelo conselho nacional de saúde mental.

Monitorizar a saúde mental na comunidade

A monitorização é necessária para verificar a eficácia dos programas de tratamento e prevenção de saúde mental e, também para fortalecer os argumentos a favor da dotação adequada de recursos. A saúde mental das comunidades deve ser monitorizada, incluindo indicadores de saúde mental nos sistemas de informação e de notificação de saúde. Em Portugal esta monitorização encontra-se ainda numa fase de gestação ao nível da saúde mental, facto este que, por sua vez, vai dificultar bastante o processo de desinstitucionalização dos doentes mentais dos hospitais psiquiátricos para a comunidade pois essa monitorização ajuda a determinar tendências e a detectar mudanças na saúde mental.

Para o Ministério da Saúde ( 2004 ), no que diz respeito à situação actual da qualidade da prestação de serviços de saúde, reconhece a falta de indicadores de desempenho e de apoio à decisão: “ Os principais agentes de decisão, investigadores em saúde e líderes de opinião convergem na constatação da escassez (ou, mesmo inexistência) de indicadores válidos e fiáveis que suportem a gestão estratégica e operacional do sistema de saúde”.

Apoiar mais a pesquisa

A investigação é deveras importante em todas as vertentes científicas, havendo necessidade de mais pesquisas sobre os aspectos biológicos e psicossociais da saúde mental, de forma a melhorar a compreensão das perturbações mentais e de desenvolver intervenções mais eficazes. Sendo Portugal um país em desenvolvimento, muito se tem descurado a investigação, não por falta de cientistas, pois este existem, mas são “obrigados” a emigrar por falta de verbas destinadas à investigação em geral, e muito mais ainda a nível a investigação em saúde mental.

Para o Ministério da Saúde ( 2004 ) não existe um sistema de investigação em saúde que garanta um conhecimento científico equilibrado sobre a realidade nacional. Em todas as fases do ciclo de vida das actividades de observação ou intervenção incluídas no plano nacional de saúde , é necessário conhecimento cientificamente validado. Dado  que este nem sempre está disponível ou, se existente, não se refere à realidade portuguesa  actual, torna-se indispensável desenvolver projectos de investigação e desenvolvimento cujos resultados virão em apoio ao planeamento, execução e avaliação das diferentes componentes do plano nacional de saúde.

A investigação tem um baixo peso nas carreiras da saúde. Na cultura profissional, o trabalho de investigação não só não é incentivado como é tido como actividade tolerada ou mesmo não desejada. As administrações das instituições de saúde apreciam os serviços exclusivamente à luz do número de actos profissionais praticados. A investigação não é contemplada como uma necessidade nem sequer de prioridade secundária ( Ministério da Saúde, 2004 ).

CONCLUSÃO

É perante um cenário destes que       Portugal se encontra em relação à saúde mental, ainda distante daquilo que mundialmente se preconiza e aparentemente sem capacidade para contrariar, a curto prazo essa evidência. Um dos principais pontos de partida para contrariar essa evidência passará sem dúvida por uma mudança de mentalidade da população em geral, na forma como vêem os doentes mentais e também como encaram a saúde mental. Passará também pelo desenvolvimento de forma estruturada e organizada de toda uma rede quase inexistente de cuidados de saúde primários ao nível da saúde mental e de toda a sua interligação com as respectivas comunidades. Só depois de  concluído este passo de gigante é que se poderá planear e iniciar a desinstitucionalização de alguns doentes dos hospitais psiquiátricos para o seio  das suas famílias e, refiro-me a só alguns pois teremos que excluir deste grupo todos aqueles que não têm familiares e também aqueles que devido à sua profunda dependência física e mental não suportam a saída de um hospital.

BIBLIOGRAFIA

AMARAL, Alberto ( 2001 ). Plano estratégico para a formação nas áreas da saúde.  Relatório preparado para os Ministérios da Educação e da Saúde, ( policopiado ).

BAGANHA, Maria Ioannis; RIBEIRO, Joana Sousa; PIRES, Sónia. Funcionamento do sistema e caracterização sócio-profissional. O sector da saúde em Portugal.

EUROPEAN OBSERVATORY ON HEALTH CARE SYSTEM ( EOHCS ), ( 1999 ). Health Care Systems in Transition – Portugal. Observatório Europeu dos Sistemas de Saúde.

ORDEM DOS ENFERMEIROS, ( 2000 ). Alguns dados sobre os enfermeiros portugueses. Ordem dos Enfermeiros nº 1, Novembro de 2000.

OBSERVATÓRIO PORTUGUÊS DO SISTEMA DE SAÚDE ( OPSS ), ( 2001 ). Conhecer os
caminhos da saúde. Relatório de primavera do OPSS. Lisboa: OPSS.

MINISTÉRIO DA SAÚDE ( 2004 ).– Orientações estratégicas para 2004 – 2010. Mais  saúde para todos.

PLANO NACIONAL DE SAÚDE, Lisboa,Fevereiro de 2004.

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